Para o fundo – a gravidade e a oferta e a procura

Vai sempre tudo para o fundo! Quem o diz é gente insuspeita ali no Blasfémias que por sua vez o foi beber a um tal Joaquim, que começa o seu texto explicando que as leis de mercado se aplicam à saúde. Sem qualquer dúvida ou excepção, e dando como exemplo a Lei da Gravidade em que tudo obedece mesmo que seja uma bala de canhão, vai sempre tudo para o fundo e com as lei da oferta e da procura tambem é assim, aplica-se sempre.

Por acaso a crise que estamos a viver seria um muito melhor exemplo. Está tudo no fundo!

POEMAS ESTORICÔNTICOS

Essa manhã

Mal a luz do dia beliscou a frincha da janela
ele acordou.
Acordou
como sempre
com pedaços do passado agarrados ao pijama
às mãos e aos cabelos
sentou-se na beira da cama
e um sonolento Oh! que merda!
soltou-se da garganta
ainda seca do bagaço da véspera
quando os pés palparam a falta dos chinelos.
Moldou os passos ao chão
de modo a evitar a madeira fria do soalho.
Sobre a cómoda continuava a tristeza
à mistura com águas de colónia de vários tipos.
Abriu um sorriso quando viu no tapete
o artigo que acabara de escrever na véspera
e que o sono fizera escorregar-lhe das mãos.
Dera-lhe o título Orgasmo
inspirado numa dessas tardes
em que o fim do domingo
abre as portas à demência.
A caminho do quarto de banho
ia pensando nas palavras que nada dizem
e na flatulência da comunicação
que o fizera deitar-se tão tarde
e acordar
assim
com a gema de fora.
Sempre nele permanecera uma grande dúvida
quanto à eficácia de debates como o da véspera.
Será que têm algum valor
como profilácticos da deterioração mental
que a idade e os tempos acarretam
ou são
eles próprios
catalisadores dessa mesma deterioração?
Sobretudo se tais debates não passam de confusões
sinfonias de mediocridade e estupidez
discutindo pessoas reles
factos ridículos
ideias banais
estafadas e apodrecidas.
Sobretudo se tais debates
se processam entre corruptos
golpistas e terroristas
que invadem as casas
maquilhados de gente de bem
e cobardemente espantalhados
de homens dignos.
Sempre pensara
que não deve transformar-se em espectáculo
o perigo da lavagem dos rostos
com o sabão da ingenuidade.
A verdade é só uma
e ele não aderia
de ânimo leve
à tese de que cada um teria a sua verdade.
A verdade existe
está lá
está sempre lá
dentro das coordenadas humanas.
Há quem dela se aproxime e quem dela se afaste
mas o único caminho da verdade
é o caminho do entendimento
e não há lucidez que não assente na razão.
Sem deixar de considerar
que a irracionalidade
é o caminho das trevas
cada um tem o direito
de escolher o seu caminho da verdade.
Mas aí tem-se o direito de o julgar pela escolha
se se conhece a formação ou a deformação
a inteligência ou a indigência
a humildade ou a petulância
o rigor ou a confusão
a seriedade ou a manigância.
Grande respeitador do relativo
e da cultura da diferença
considerava-se adversário do consenso
do consenso acima de tudo
que destrói e anula o indivíduo
e da tolerância
tolerância como virtude
que implica sempre
alguém que tolera
e alguém que é tolerado.
Acordou mal disposto
porque não acreditava
na existência de debates fluidos
corajosos e pedagógicos
e
mesmo assim
cedera-lhes parte do seu tempo de sono.
Convidar tanta gente de caras
e tantas caras de gente
fazer cócegas em temas profundos
inacessíveis a mentecaptos
meter num mesmo saco
capazes e incapazes
lúcidos e ineptos
fazer de assuntos sérios estéreis discussões
criar espectáculos de feira
sem receio de sujar a consciência
e ofender a verdade
era mais do que razão
para o incómodo acordar dessa manhã.
Já no café da esquina
deu de caras
com a mulher de longos cabelos negros
rosto comprido
e olhos paradoxalmente achinesados
a quem pedira há cinco anos atrás
para posar para si.
Esguia
quase linear
de uma beleza que parecia desenhada
a sua figura prendia os olhos que nela tocavam.
Sempre que a via
recordava-lhe alguém
e bulia com qualquer coisa dentro dele.
Na mesa do lado
via-se que um outro homem
seguramente um habitante dessas ilhas
que se escondem no ventre da cidade
tentara encontrar uma camisita de riscas verdes
a condizer com o verde das calças.
Se bem que mais escuro
aceitava-se
não era muito boa a combinação
mas percebia-se a ideia.
Já não era de aceitar tão facilmente
aquela senhora vista de trás
relativamente escorreita
blusa da moda e saia quase mini
moldando formas enganadoramente jovens
que o virar da cara logo atraiçoava
ao denunciar as engelhas dos setenta.
Ninguém tem nada com isso
e
se mentalmente o comentava
é porque considerava o sentido do ridículo
irmão gémeo da inteligência.
Uma outra senhora tentava limpar
com um guardanapo de papel
os pingos de baba
que o marido
por força de tentar sorrir
deixava escorrer dos lábios inertes
sobre a gravata cinzenta.
Deve ter sido acometido
de acidente vascular cerebral.
Mesmo hemiplégico
nem por isso deixou de sugerir
com a mão válida
que a mulher esfregasse suavemente
o guardanapo
um pouco abaixo da fivela do cinto
ao que ela acedeu
de maneira afável e sorridente.
Em paga
ele abriu o livro de cheques
e mostrou o que havia por lá.
Ela arregalou os olhos
e inspeccionou-lhe
com falsa displicência
o pavilhão auricular
tentando arrancar-lhe docemente
uns pêlos esbranquiçados e eremitas
que teimaram isolar-se do mundo cabeludo.
Ciente de que a poderosa dinâmica da vida
quer se queira quer não
reside no sexo
não tinha dúvidas em aceitar
que o homem do livro de cheques optaria
– se fosse possível dar-lhe a escolher-
por poder levantar o pénis
em vez da mão paralítica.
Do outro lado
uma mulher cheirava a perfume que tolhia.
Bafejou os óculos
limpou-os a um pequeno lenço
e pô-los em contraluz para ver o resultado
mas os seus olhos
em vez de fitarem o vidro
fizeram esguelha para o companheiro
que tinha na frente o generoso cruzar de pernas
de uma dessas liberais
criadoras de pulsões.
Na televisão
as eméticas telenovelas
e todos os Bancos
caridosamente solidários
a abrirem uma conta
para as vítimas dos incêndios!

                        (adão cruz)

(adão cruz)

BI-QUADRA DO DIA

Por sistema dizem ter
Tranquila a consciência
Não têm vergonha na cara
Nem um resto de decência.

Aparecem na têvê
Com o maior dos desplantes
Como santinhos papudos
No altar dos ignorantes.

ETICA E EDUCAÇÃO (9)

ETICA E EDUCAÇÃO (9)
Considerações sobre Ética e Educação escolar
Com a liberdade, a virtude e o bem como bagagem indispensável, está pronto um filho para sair da família e iniciar a sua grande viagem da vida, começando pela escola. A escola continua a ser a única instituição cuja função oficial e exclusiva é a educação. Há uma relação dialéctica entre a escola, a ética e educação. Há uma ética da educação e uma educação da ética. Por outro lado há uma grande afinidade entre ensinar, educar e aprender. Ensinar e aprender é por demais sabido que constituem as duas faces de uma mesma moeda. O formando também é sujeito de produção do saber. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender. Embora diferentes, quem forma também se forma, ao formar, e quem é formado, também forma, ao formar-se. Ambas as faces constituem um todo, de tal maneira que uma nunca acontece sem a outra. O estatuto ético da relação educativa, enquanto relação interpessoal marcada por uma intenção e por um projecto, obriga, antes de tudo, ao respeito mútuo, numa profunda partilha de testemunhos, sonhos e vontades. O respeito devido àquele que ensina, que se presume bem preparado do ponto de vista intelectual, emocional e comunicacional, que dá testemunho de uma experiência e de um saber, que explica e que interpela, que abre caminho a verdades desejadas, tem de ter como base indispensável a motivação e a disponibilidade de quem aprende, a disponibilidade e o interesse para se deixar ensinar, a disponibilidade para acolher e valorizar a presença daquele que ensina. O respeito pelos educandos, infelizmente inexistente na incompetência e fraca formação de alguns educadores desmotivados e pouco evoluídos, deve ser considerado um direito de quem aprende, e o reconhecimento deste direito é o primeiro dever de um professor.

                         (manel cruz)

(manel cruz)

ELEIÇÕES DE CAPOEIRA

ELEIÇÕES DE CAPOEIRA

O ridículo destas eleições domésticas sem ideias, projectos, sonhos e utopias enoja-me.
Este emaranhado de mentes obsoletas, desertificadas, desenraizadas de tudo cria em mim um tédio avassalador.
Esta indigência mental atrofia-me.
Esta capoeira, alheia á abrangência dos problemas do mundo, arranha-me o espírito.

Da infernal religião do mercado, dos rituais dos sacerdotes do poder, espalhados por todos os cultos reverenciais do dinheiro, em congressos de ética onde é notório o défice de moralidade, ou em cimeiras de repartição do que ainda resta do terceiro mundo, nada se diz.
Da perversão dos conceitos, inversão e anulação de valores, nada se fala.
Da descarada hipocrisia, nesta floresta de enganos e desvios, em que as grandes nações vendem a morte dos filhos da humanidade, nada se julga.
Da invenção e criação de organizações ditas humanitárias para lavar o rosto e as mãos das manchas de sangue, nada se comenta.
Da despudorada ingerência externa no coração dos povos soberanos ninguém quer saber.
Da submissão e prostituição da própria ciência perante os apetites do poder, ninguém se importa.
Do tenebroso domínio do poder económico sobre o poder político, do ameaçador “pensamento único” que tenta criar um homem desprovido de razão, vontade e emoções, ninguém fala.
Da arte e da cultura, consideradas supérfluas e perigosas ninguém se lembra.
Da ética e da dignidade, valores supremos do homem, ninguém se vale.

Aleluia, aleluia! Bem-aventurada a proliferação de falsos profetas que proclamam a morte das ideologias.
Aleluia, Aleluia! Bem-aventurados os homens com etiquetas de preço e comportamentos negociáveis.

Autonomia na Gestão Escolar

É consensual para todos os partidos políticos mas a forma de pôr a ideia em prática é diferente. O PSD quer atribuir a generalidade dos poderes de gestão e administração do projecto educativo às escolas.

O PS já só quer aplicar o novo modelo de organização e gestão das escolas, concentrado sobre as capacidades de contratação e gestão dos docentes e continuar a avaliação externa pela Inspecção-Geral da Educação, e quer descentralizar mais competências para as autarquias e encorajar maior corporação com outras instituições de formação e agentes sociais e económicos ( enfim, dá para tudo…)

O BE propõem-se descentralizar mas não querem colocar os directores da escola na dependência e ao serviço dos Presidentes das Câmaras e sem partidarização da gestão das escolas públicas.

O PCP manifesta-se contra a municipalização do ensino básico e acusa o governo de atacar os princípios da colegialidade e de eleição nos orgãos de gestão das escolas e defende uma nova Lei de gestão democrática.

O CDS quer menos Estado e menos poder asfixiante sobre as escolas e propõe mais contratos de autonomia.

Nós aqui no Aventar temos pugnado por uma escola autónoma o que é completamente diferente e bem mais ampla do que a mera gestão escolar.

O reyno do Chile


Napoleão no Chile? Engano meu? Velhice que engana o intelecto? Nem por isso. Napoleão Bonaparte andou por todos os sítios dentro e fora da Europa, em pessoa ou por meio de representantes. A França, por causa das guerras de Conquista de Napoleão, governava a Europa e decretou um bloqueio dos portos do Velho Continente para derrotar a Grã-bretanha e cercá-la pela fome. Até estar certo de ser obedecido, raptou o rei Bourbon, em Espanha, Carlos IV e o príncipe herdeiro, mais tarde Fernando VII. Nomeou o seu irmão José, Rei de Espanha entre 1808 e 1813, e entrou em Portugal para raptar os Bragança e dividir o país em três reinos. Mas os Bragança fugiram rapidamente para a sua colónia do Brasil, com D. João IV como rei e a corte toda, instalando a Capital do Império Português no Rio de Janeiro. Épocas e tempos em que todas a monarquias europeias tinham como escravos os membros do Novo Continente: trabalho sem pagamento, arrecadação de bens, vendidos mais tarde a outras colónias latinas ou metrópoles europeias a preço de ouro. Napoleão ditou um código em 1804 (1), que ainda nos governa, para criar igualdades entre governos centrais, cidadãos europeus nas colónias e crioulos ou filhos de europeus nascidos nos países dominados, esses apropriadores da terra nativa para seu proveito. Fernando de Bourbon derrubou no seu pais Calos IV que, no seu dourado exílio francês, passou a ser Fernando VII sem coroa, sem Estado nem colónias para mandar. As colónias, conforme o uso dos tempos, pertenciam às famílias reinantes.
No Reyno do Chile, essa parte da propriedade da família Bourbon, entre 1808 e 1813, sentiu-se sem ninguém para a governar. O representante da coroa teve de ouvir os intriguistas de sempre, todos esses bascos que tinham boas terras e fazendas, exportações de indústrias de curtumes, especialmente na região do Maule, cidade de Talca, o rim da aristocracia chilena durante esse anos – e ainda hoje: fazem-se chamar Talca, Paris e Londres. Cidade e região que explorou os proprietários da terra – o clã Picunche (que eu estudo), da etnia Mapuche, habitante do Chili de tempos sem memória e sem escrita. Para todos os proprietários com o nome com duas letras r no apelido (bascos), os Picunche eram os seus jornaleiros, denominados inquilinos que na língua da terra, o mapudungun, significa subjugados, como tenho definido no meu texto de 1998 (2). A escravidão tinha sido abolida no Chile nos anos 50 do Século XIX, eufemismo que continua até aos nossos dias: o inquilino trabalha as terras do proprietário, sem mais pagamento do que a entrega de alguma terra para sustento da família que a tem de trabalhar. Na época da conquista da terra do fim do mundo (3), os Mapuche, fossem Picunche, Huilliche, Mapocho ou Pehuenches, eram os livros dos invasores. Invasores desconhecedores do cultivo da batata, da beterraba, do milho e do trigo. Engrolavam os reais donos da terra, que dormiam em terra soterrada feita prisão, como tenho estudado nos arquivos dos jesuítas do Século XVII, que por bom azar encontrei escondidos ao pé das palmeiras da vila de Pencahue, Talca, Do que li, estudei e interpretei, com a minha equipa chilena, resultaram, pelo menos, cinco livros. Quem caia morto durante o trabalho, era de imediato enterrado numa finca destinada a cemitério, perto de Curepto, entre Talca e Linares, Vilas as duas. O terreno era denominado Huenchumali, a terra dos mortos, em mapudungum. Levei as crianças por mim analisadas para entender a história do país, escreveram textos, ainda comigo, em 1997, base de vários livros meus sobre crianças, especialmente o do ano 2000 (4).
O Governador em nome do rei da Espanha, o criollo (5) Dom Mateo de Toro e Zambrano, reparou um dia que não tinham Rei, convocou um Cabildo ou Concelho de Governo que o apoiava na gestão e declarou: Não há rei, não tenho direito a Governar. Dou-vos o bastão e o mando. Lá ficaram os membros do Cabildo a deliberar, escolheram o Conde como Governador, nesse dia de 18 de Setembro de 1810. Foi o dia da declaração da Independência. O Conde da Conquista faleceu em 1813, e um Consulado de três, foi criado para governar o país. Havia os que queriam Rei, os que queriam República e os do Governo por Cabildos. 100 anos durou o debate na base de Governos Presidenciais, eleitos por sufrágio aberto para os ricos. O povo não votava. O Consulado, presidido por José Miguel Carrera, mandou organizar um Congresso. Congresso bicameral, no qual o herói mais importante do Chile, Manuel Rodríguez Elroiza, foi membro. Um Manuel Rodríguez que, aquando da tentativa da Monarquia Ibérica retomar as sua colónias, não apenas ajudou a organizar o Exército Libertador, chefiado pelo recentemente aparecido agricultor, filho do Vice-rei de Espanha no Peru, Bernardo O’Higginns Riquelme, que com a colaboração da primeira República libertada, Argentina e o seu Ditador, o General José de San Martín, como participou na batalha travada contra as forças realistas, ganha por estas gentes do Novo Continente, que em 1818, ficaram livres dos espanhóis. Manuel Rodrigues organizou os montoneros ou resistência dentro do país que foram a base da liberdade, sempre pensada como realizada pelo exército chileno argentino.
Nesse ano de 1818, no sítio da derradeira batalha, Maipú, à entrada da Capital, a Nossa Senhora do Carmo foi jurada Padroeira do Chile. Até ao dia de hoje é dia livre e santo o dia da batalha de Maipú, 5 de Abril de 1818. O dia da Padroeira que em Castelhano é La Virgen Del Cármen, se comemora a 15 de Junho de cada ano, dia da sua primeira aparição no Monte Carmelo no Século VI, na Itália. Bernardo O´Higgings e José de San Martín juraram a La Virgen del Cármen, como a Padroeira dos chilenos. A seguir, O’Higgins foi declarado Director Supremo da Nação, governou até 1822, data do seu exílio pelo Congresso. Entregou as insígnias do mando oferecidas pelos Depautados, saiu nu de poder, enveredou para o seu cavalo, foi-se embora ao Peru e nunca mais voltou a pisar terras chilenas. Aos finais do Século XIX, em acto de reparação por parte dos poderes, o seu cadáver foi repatriado e preside, em Mausoléu, o Cemitério Geral, que ele fundara para os ateus como ele.
Chile foi Descoberto pelo Adiantado Mor Diego de Almagro em 1539. Nada interessante encontrou. O Extremenho e Capitão Pedro de Valdivia, a sua Companheira Inês de Suárez mais doze soldados e uma série de yanaconas ou nativos Quechua, persistiram e fundaram Santiago do Chile a 12 de Outubro de 1542.
O que comemoramos hoje é o dia de liberdade: esse primeiro 18 de Setembro de 1810: 199 anos de liberdade, uma República sempre em formação, como o eram também a Europa do mesmo Século e a fundação, por Karl Marx, da União dos trabalhadores em Londres, no ano de 1861. Mundos distantes, mas sempre o mesmo ensejo: sermos livres e sabermos optar.
Como é o Chile de hoje. Não pela Padroeira, mas sim pelos esforços livres dos seus habitantes na sua capacidade de optar.

1) O Código Napoleónico (originalmente chamado de Code Civil des Français, ou código civil dos franceses) foi o código civil francês outorgado por Napoleão I e que entrou em vigor em 21 de Março de 1804. O Código Napoleónico propriamente dito aborda somente questões de direito civil, como o registo civil ou a propriedade; outros códigos foram posteriormente publicados abordando direito penal, direito processual penal e direito comercial. O Código Napoleónico também não aborda como as leis e normas deviam ser elaboradas, matéria para uma Constituição.
Este Código, propositadamente acessível a um público mais amplo, foi um passo importante para estabelecer o domínio da lei. Antes, a lei era a vontade do Soberano – eis o motivo para designar o mona
rc
a – e o proprietário das terras retiradas aos nativos pelo chamado direito de Conquista, baseado no Direito Romano. O Código Napoleónico baseou-se em leis francesas anteriores e também no Direito Romano e seguiu o Código Justiniano (Corpus Juris Civilis) dividindo o direito civil em:
1. a pessoa
2. a propriedade
3. a aquisição da propriedade
A intenção por detrás do Código Napoleónico era a reforma do sistema legal francês de acordo com os princípios da Revolução Francesa. Antes do Código, a França não tinha um único corpo de leis, que dependiam de costumes locais, criando-se frequentemente isenções e privilégios dados por reis ou senhores feudais. Durante a Revolução os vestígios do feudalismo foram abolidos e os vários sistemas legais deram lugar a um único código. Entretanto, devido às agitações revolucionárias a situação não caminhou até à era napoleónica. Fonte: a obra de Ferdinand Braudel, o livro Tratado Elementar do Direito Romano, de Èugene Petit, 1ª edição, 1989 e as Institutas e Digesta do Código Civil do Imperador Justiniano, de 535 da nossa era, textos comigo em edições do Século XIX. O de Justiniano foi a base, como diz Petit, do liberalismo do Código de Napoleão, ditado por ele ao seu grupo de juristas entre 1801-1804. Motivo que o levou a expandir o liberalismo pelos quatro cantos do mundo.

2) Iturra, Raúl, 1998: Pedagogia do oprimido. As minhas memórias de Paulo Freire, em Educação, Sociedade e Culturas Nº 10, Outubro, Afrontamento, Porto, pp 83-108. Pode-se ler em: http://www.fpce.up.pt/ciie/revistaesc/ESC10/10-3-iturra.pdf .

3) Palavra Aimara que assim define o Chile ou Chili, enquanto para os Quechua do Peru, Bolívia e Equador , Chili é o país do frio. Fonte: as minhas pesquisas no Chile a partir de 1994, época em que, desde a Grã-bretanha e Portugal, voltei para estudar o meu país de origem.

4) Iturra, Raúl, 2000: O saber sexual das crianças. Desejo-te, porque te amo, Afrontamento, Porto, 150 pp.

5) Criollo no Chile desses tempos, eram os filhos de Ibéricos nascidos no Chile. Desde 1823 passaram todos a ser chilenos, por Decreto assinado pelo agora Director Supremo do Chile, o Libertador Bernardo O’Higgins, por Decreto que declara a Independência do Chile e cria a cidadania chilena para todos os que tenham nascidos dentro do limites da nova República, Decreto que passa a ser lei na Primeira Constituição de 1822. Relatado e analisado no meu livro Como era quando não era o que sou. O crescimento das crianças, Profedições, Porto, 175 pp.

Cartazes das Autárquicas (Elvas)

elvas-PS
Rondão Almeida (actual Presidente), PS
elvas-PSD
António Simões das Dores, PSD.
(enviado por Maria Monteiro)

Ambiente – o desafio da UE

“As alterações climáticas envolvem ciência, economia e tecnologia. Porém, neste momento um acordo depende de decisões políticas. Precisamos de uma abordagem nova e precisamos dela rapidamente.” (Ministro dos Negócios Estrangeiros Britânico).

Este é o próximo desafio para a UE, não chega ver o Ambiente como troca entre países de produção de CO2 ou mesmo empurrar para os países menos desenvolvidos as indústrias mais poluentes. Não, trata-se de um novo modelo económico assente em novas tecnologias que exigem inovação e competências novas.

As alterações climáticas que dentro de poucos anos poderão ser dramáticas, assim o exigem. A União Ambiental, próximo desafio da UE deve constituir o elemento catalisador para um mundo liberto de carbono, ou para além dele.

A não ser este o caminho a percorrer a escassez de recursos é um dos mais dramáticos problemas que se colocam no horizonte, e que já foi a segunda razão mais importante na actual crise, logo a seguir à escassez de crédito. Vamos ter movimentos migratórios em massa, seca e escassez de água, com enormes conflitos sociais nacionais e internacionais.

O Ambiente deixou de ser um problema de uns quantos jovens hiperactivos e passou a ser um problema global.

PS: No ano passado estive na Patagónia, no sul da Argentina, fui ver as neves que deixaram de ser eternas, a serem sugadas inexoravelmente, pelas águas da baía de Vito Moreno. A milhares de quilómetros de distância da mais próxima fonte de poluição

Guardar coisas

De vez em quando descobre-se um idoso que vivia soterrado na sua própria casa, entre toneladas de lixo de vária ordem, tudo aquilo que foi recolhendo ao longo de décadas e depositando entre quatro paredes. A notícia é sempre recebida com um misto de fascínio e asco, os especialistas explicam que é uma doença, claro, nem podia ser outra coisa, um distúrbio designado como “síndroma de Diógenes”.

O Diógenes que dá nome ao distúrbio viveu cerca de três séculos antes de Cristo e, segundo se conta, tinha como casa um barril e como único bem uma tigela, que usava para lavar a cara. Tendo visto um dia um rapaz lavar a cara no rio colocando as mãos em posição de concha terá atirado a tigela para o lado, dizendo que já não lhe fazia falta. Tortuoso o destino que fez com que o seu nome viesse a designar a psicose dos que acumulam.

Diógenes, em quem os anarquistas quiseram ver um precursor, desprezava qualquer tipo de convenção social e terá defendido ideias tão revolucionárias quanto a igualdade entre sexos (não nos esqueçamos que a democracia grega excluía as mulheres do conceito de “cidadão”), a liberdade sexual ou a supressão das armas. A história mais famosa a seu respeito conta que, estando esparramado ao sol, veio Alexandre O Grande perguntar-lhe o que podia fazer por ele e, que, tendo-se posto numa posição em que fazia sombra a Diógenes, este lhe terá respondido que não lhe tirasse o que não lhe podia dar.

Diógenes e a síndroma homónima vieram-me à mente quando fazia uma intervenção de urgência no caos em que se estava a transformar a minha casa, e me dei conta de como são por vezes incoerentes os critérios que nos fazem guardar coisas cuja relevância é difícil de explicar. Já nem falo de objectos com evidente valor sentimental, como fotos ou cartas, mas de insignificâncias às quais se associam memórias que tememos perder. Fica o objecto como uma espécie de cópia de segurança, carregado de significados que só nós podemos ver. Lamentamos a perda do último laço tangível com algo que só na memória sobrevive… e guardamos.

E quando o bom senso e a falta de espaço nos dizem que está na hora de nos vermos livres de alguma coisa, como escolher? Uma a uma pegamos em cada memória, sorrimos ou afastamos o olhar, perdemos a coragem e voltamos a guardá-la. Acabarei os meus dias a recolher das ruas um parafuso partido, a cabeça de uma boneca, uma caixa de detergente vazia? Virão salvar-me da minha demência com os camiões de lixo preparados à porta? Ou os anos irão trazer-me o despojamento e acabarei abdicando até da tigela, atirando para o lixo tudo quanto se revelar inútil?

Que razões levarão as vítimas da síndroma de Diógenes a acumular tralhas inúteis? Será para sentir algum conforto no vazio? Será o mesmo mecanismo, ainda que a outra escala, que leva tantos a encher as casas com peças de mobiliário, fotos, estatuetas, quadros por todas as paredes, de forma a que não se encontre o vazio em lado nenhum?

Em cada arrumação obrigo-me a abdicar de algo cujo valor se tenha aligeirado e orgulho-me do meu desprendimento. Mas a gaveta dos trastes não se esvazia, e já quase não consigo fechá-la.

Para o BE chegou o momento

O BE irá crescer até sucumbir ao poder, quando não for mais possível crescer à custa das franjas do PS. Para continuar a crescer terá que entrar nos eleitores do PS e mesmo nos que vagueiam entre o PS e o PSD, e nessa altura vai começar a ter que tomar decisões que desagradam a muitos. E não pode continuar fora do exercício do poder sem pôr em causa o voto útil. Se não quer governar precisa dos votos para quê ?

Esta dificuldade viu-se bem no debate com Sócrates quando percebeu que as suas medidas quanto aos PPR podem ser lidas como retirar milhões de euros à classe média, o que ,a bem da verdade, não tem que ser assim. Mas, pela primeira vez, titubeou e isso foi um momento que poucos esquecem. Talvez o momento mais importante de todos estes debates.

Outra coisa poderá ser o seu papel enquanto facilitador da governação a nível parlamentar, ajudando as maiorias para concretização das políticas inadiáveis ao país. Nesta função poderá ser de uma grande utilidade assim tenha sentido de Estado, mas sem largar mão do que o diferencia do PS e do PSD.

Os grandes investimentos públicos e a dívida externa, o tecido empresarial criador de riqueza e as grandes empresas públicas e os seus monopólios, a Banca e a sua posição de favor, a Justiça e a sua complexidade de interesses estabelecidos…

Para o BE chegou o momento da verdade!

Patrick Swayze (1952 – 2009) e o meu 12.º ano


Morreu ontem o actor Patrick Swayze, que já estava doente, com cancro no pâncreas, há dois anos.
Poupo-vos as exéquias fúnebres ou a biografia oficial. Antes quero relembrar essa excelente série, «Norte e Sul», que foi transmitida em Portugal em 1989 e na qual desempenhava o papel do sulista Orry Main.
Lembro-me como se fosse hoje. Estava fazer o meu 12.º ano, no Garcia de Orta, à noite, porque nesse ano não havia 12.º ano de dia. À segunda-feira, logo que acabavam as aulas, deixava de ir ao «Novidali», o único café que então existia por ali, e zarpava para casa para ver o «Norte e Sul». Poucas vezes fiquei colado à televisão como durante esses episódios, que retratam a guerra civil norte-americana.
Patrick Swayze desempenhou muitos outros papéis na televisão e no cinema, como «Dirty Dancing» ou «Saturday Night Live». Não vi. Sinceramente, vi apenas «Norte e Sul». E chegou-me. Paz à sua alma.

A aventadora Ana Anes na SIC mulher

Estava com o comando do mundo na mão a passear pela madrugada quando dou com a nossa Ana Anes a arrasar os homens num exercício chamado “Ciência da atracção”. Os homens são tipo “buffet”, escolhidos a gosto, em exposição, há muito que perderam a influência, a mulher agora tem carreira, já não precisa do CV dos homens.

O Luís Pedro Nunes metido entre duas mulheres bem que tentava aguentar-se, mas a resistência era muito débil, que as mulheres gostam de homens casados, estes já provaram serem estimáveis, aguentam uma relação estável, são funcionais, seja lá isso o que for, mas os solteiros não dão a mesma garantia, enquanto a Ana e a apresentadora (um borracho muito estilizado sem grande interesse), cúmplices, davam cabo dos homens com a Ana a dizer, e eu a acreditar, que não tem nada de feminista mas o mundo deu uma grande volta, e os homens estão no sótão da memória.

A Ana é apresentada como cronista, tem o ar de quem tem o ás de trunfo sobre estes assuntos, o seu verbo é fácil e breve arruma as ideias em frases simples e curtas, tudo com uma certa bonomia de quem não está para, nem quer dar o golpe fatal, por outras palavras, gosta de homens e com esta ideia reconfortante vim a correr escrever esta crónica que sempre me ajuda a conciliar o sono.

Gato Fedorento Esmiúça os Sufrágios foi o programa mais visto ontem

O programa Gato Fedorento Esmiúça os Sufrágios, que estreou ontem na SIC, foi o programa mais visto do dia, com uma média de 1,348 milhões de espectadores. É o que indicam os dados da Marktest divulgados hoje.

O programa começou às 21h25 e teve uma entrevista final com o primeiro-ministro e candidato do PS, José Sócrates, como primeiro convidado. Registou uma audiência média de 14,3 por cento e um share de 35,8 por cento.

Os Gato Fedorento entrevistam hoje Manuela Ferreira Leite, no dia 16 Paulo Portas, no dia 17 Francisco Louçã e no dia 21 Jerónimo de Sousa. Falta saber é se as audiências se aguentam ou resultam, sobretudo, do efeito novidade.

O primeiro programa foi bem conseguido. É uma quase cópia do Daily Show, de Jon Stewart, mas o quarteto já tinha assumido essa influência e apresenta uma adaptação a contento ao estilo nacional. É capaz de valer a pena seguir este esmiuçar.

Aveiro, a ria, e as minhas irmãs

Esta cidade está linda. Tem belos edificios assinados por arquitectos conhecidos em conjunto com as belíssimas casas de pescadores e de salineiros, reabilitadas as antigas salinas, agora belas árvores cobrem a urbe e as gentes.

Foi sempre bonita , lá passei as melhores férias da minha vida, em casa das minhas irmãs, todos os anos saía de Castelo Branco e ía para as praias da Costa Nova e da Barra, à boleia, quando não havia perigo nenhum.

As “jeunes filles” belgas e francesas tambem davam ali à costa, uma maravilha para os olhos, eu como era muito tímido limitava-me a ver os meus amigos a namorar. Como só eu é que arranhava o francês de praia lá me ía safando de quando em vez, o problema é que eu me apaixonava doidamente, e elas “Louis, isso foi ontem” e lá íam ao “engate”, ao namoro, ao baile nas casas de praia que ficavam vagas durante a semana.

O campus universitário é uma maravilha, cheio de sol e relva, belos edificios e muito mérito, em várias áreas do conhecimento, como o trabalho de pesquiza na ria que é de Aveiro.

Estive lá no fim de semana com as minhas irmãs, a mais velha teve que ser operada ao coração de urgência aí no Santo António, hospital que tanto trabalho me deu para o modernizar, contra tudo e contra todos, muitos inimigos arranjei eu, mas está aí, moderno, muito bem equipado.

O primeiro edificio a ser construído em Portugal para ser hospital, tem um irmão gémeo em Viseu, mais pequeno e que agora está transformado num Lar para cuidados continuados, depois deste vosso amigo ter, juntamente com o Presidente da Câmara, o Dr. Ruas, reunido as condições para lá estar aquele moderno e bem equipado hospital de S. Teotónio. A minha assinatura juntamente com mais umas quantas está na base de um pilar, diz-se a primeira pedra, mas esta foi mesmo a primeira seguida de muitas outras.

Mas voltando a Aveiro, onde se fez tambem um belo bloco operatório, fico com vontade de chorar, foi ontem, cabiam todos os sonhos, vou cheirar os cantos da ria, do jardim, espreitar as casas dos pescadores onde ficava noite fora a ouvir as preces das mulheres e os gritos dos homens trazidos pelas ondas do mar em noites de tempestade.

Como eu fui feliz em Aveiro! Agora já não tenho as minhas irmãs todas à minha volta, a Carmem este ano faltou, têm mais quinze anos que eu, o Luis que andou ao colo de todas elas e que representa uma espécie de medalha , nenhuma delas pôde estudar mas o irmão vingou-as, tirou um curso superior, é de todos, só foi assim porque quinze anos faz toda a diferença neste país padrasto, havia uma escola e sete igrejas .

Quando elas se casaram eu morri por cada uma delas, roubaram-mas, depois veio um rancho de filhos, toda gente bonita como elas, fui roubado outra vez, mas tudo gente bonita e boas pessoas, maravilhosas eu adoro a minha gente.

E sabem uma coisa, eu sou o mais feio e o mais débil e o que vale menos, não tenho ponta de comparação com a coragem e a sabedoria delas e, no entanto, ando feito medalha ao peito de todas elas.

Agora atrevam-se a dizer que eu não sou um homem abençoado!

Domingos Lopes sai do PCP

Domingos Lopes abandonou 40 anos de militância no PCP. É da natureza de classe dos seus dirigentes, funcionários afastados da realidade e do mundo do trabalho, vendidos à sua condição pequeno-burguesa de pequenos e sumo-sacerdotes  que os partidos estalinistas alimentam a sua fé.

Depois de deixar de ser funcionário, obtendo autonomia financeira e regressando ao mundo real, Domingos Lopes compreendeu finalmente que “o PCP continua a ser o único partido no mundo que mantém o apoio à invasão da Checoslováquia, em 1969, pelas tropas do Pacto de Varsóvia, ao golpe militar da Polónia que levou Jaruzelsky ao poder, à invasão do Afeganistão pelas tropas da URSS”.

Na sua carta de afastamento, hoje revelada pelo Público, constata igualmente que “a direcção do PCP considera, de acordo com o seu último congresso, que países como Coreia do Norte e China se orientam para o socialismo, quando o primeiro não passa de uma ditadura familiar brutal que abusivamente se apoderou do simbolismo do socialismo para o ridicularizar” e a China “emerge como uma ditadura do aparelho do partido e do aparelho militar com vista à implantação do capitalismo com o mínimo de sobressaltos sociais”.

Mais vale tarde do que nunca. Mas temos de convir, em particular no caso da brutal invasão da Checoslováquia, que a realidade tem muitos anos, a capacidade de a ver é que tardou em chegar.

Os estrangeiros

Manuela Ferreira Leite jura que não se intimida. Acho bem. Garante que as obras servem para dar emprego a cabo-verdianos e ucranianos. Acho mal e não é verdade. Assegura que o TGV só interessa aos espanhóis. Também não é verdade e mesmo não sendo adepto de um projecto como o TGV, nem especialista em transportes, sei que não é assim.

Manuela Ferreira Leite usa a demagogia. Até aqui, nada de extraordinário. Todos os políticos, todos, usam a demagogia em período eleitoral.

Manuela Ferreira Leite parece estar a ensaiar um excesso de patriotismo, que roça o nacionalismo bacoco. Até fala dos “estrangeiros”.

A líder do PSD dá ideia de só estar interessada em ver Portugal como um elemento isolado, num “orgulhosamente sós”. No mundo global dos dias de hoje é uma opção inaceitável. Num cenário de economia aberta, acenar com o espectro dos “estrangeiros” não é bonito, muito menos para quem já foi assalariada de espanhóis.

Cartazes das Autárquicas (Campo Maior)

campo maior-JBurrica
João Burrica (actual Presidente), candidato independente.
campo maior-PS
Ricardo Pinheiro, PS.
campo maior-PSD
Pedro Nabeiro, PSD.

Apontamentos & desapontamentos: Fechando o caderno

É tempo de fazer um balanço a este caderno de apontamentos e desapontamentos e de o encerrar. Em cerca de 20 textos, abordei diversos temas. Comecei com uma homenagem ao meu amigo José Pedro Machado que, com os seus «Grande Dicionário» e «Dicionário Etimológico» e muitos outros livros sobre o nosso idioma, continua, todos os dias, a ensinar-me, como fazia em vida, amenamente, à mesa do «Pardieiro», no Largo da Graça, ou da «Chineza», da Rua do Ouro. Aproveitei para, de raspão, aludir à função catártica dos blogues, de que modo os posts nos aliviam de frustrações, de como as palavras que neles colocamos precisamos de as dizer, para delas nos libertarmos. Até para homenagear amigos que já não estão entre nós. Não esqueci o grande jornalista e amigo que foi o Adriano de Carvalho.
Recordei as «primaveras» de Praga e a marcelista que, em 1969 nos deram alguma infundada esperança, e gravei na pedra e no bronze deste blogue a heróica «Operação Papagaio». Verberei o consumismo elevado à categoria de religião e as malditas claques dos clubes de futebol. Referi impressões de uma inesquecível viagem a Cuba. Na onda das minhas embirrações de estimação, não me esqueci da televisão – dediquei-lhe quatro desapontamentos, num deles citando a frase de Luiz Pacheco – «a televisão é para estúpidos!». Lembrei o filósofo Albert Jacquard e a sua fórmula mágica para acabar de vez com o desemprego – acabar antes com o trabalho. Não esqueci também nem os nossos irmãos brasileiros, nem os irmãos galegos.
Falei sobre a palavra como instrumento da evolução, do primado do conteúdo sobre a forma, e sobre a sobrevivência, ou não, do livro na era digital e, a propósito, dei os parabéns a Ray Bradbury, um defensor do livro impresso, e um indagador do Futuro. E não me esqueci de Marx, de Groucho Marx o tal que dizia ter princípios, mas que os podia mudar num ápice, caso não estivéssemos de acordo com eles – e nesta acepção, verifica-se que os nossos políticos, ou quase todos, são «marxistas». É precisamente por causa dos políticos, da classe política, que falo mais do passado, não porque seja saudosista – sendo falador (escrevinhador, no caso vertente) falo sobre aquilo que melhor conheço – o Passado. Também conheço razoavelmente o Presente, mas há dias em que faço por esquecê-lo. Dias em que nem ligo a televisão. Como quando não olhamos para o espelho por haver dias em que não suportamos enfrentar o próprio rosto. Por isso é que nestes «apontamentos & desapontamentos», falei mais de mortos do que de vivos, mais do passado do que do futuro. E quando falei do presente foi para dele me queixar. É que não estou a gostar nada do presente. E agora vêm aí eleições em dose dupla e todo o lixo está a vir ao de cima. Mas vejo que a maioria dos «aventadores» se está a divertir com a chegada do circo. Do mal o menos.
Paul Auster, um autor norte-americano de que não perco um livro, em «A Noite do Oráculo» (2004), cria uma personagem, um escritor que se habitua a escrever nuns cadernos, ou blocos de notas, azuis, fabricados em Portugal, que compra na loja de um chinês em Brooklyn e que lhe estimulam a veia criativa: «A partir do momento em que começamos a escrever neles, nunca mais nos apetece escrever em mais coisa nenhuma.», diz. Não indo tão longe na minha caderno-dependência, escrevo e tomo os meus apontamentos, desde há anos, nuns cadernos pautados de capa preta revestida de plástico, salvo erro produzidos pela Ambar (será que a Ambar me vai conceder um patrocínio devido a este discreto anúncio?). Foi a esses cadernos que fui buscar alguns dos apontamentos e desapontamentos de que aqui vos dei conta. Sempre que vou de férias ou de viagem, levo um caderno destes. No entanto, ao contrário do que aconteceu com os cadernos azuis do escritor do Auster, que deixaram de se fabricar (interrompendo-lhe a produção literária), estes belíssimos cadernos de capa negra continuam a encontrar-se em qualquer grande superfície.
Em suma, é tempo de fechar este caderno de «apontamentos & desapontamentos». Outro caderno será oportunamente aberto.

Contos Proibidos: Memórias de um PS Desconhecido. Mário Soares e o financiamento do PS

Mário Soares ia, entretanto, aproveitando algumas das suas viagens enquanto ministro dos Negócios Estrangeiros para angariar alguns fundos para o PS. Mas, apesar de alguns contributos iniciais dos partidos sociais-democratas escandinavos, do SPD e de uma campanha de angariação de fundos lançada na Holanda pelo PVDA (PArtido Trabalhista), os apoios financeiros estavam longe de ser o que muitos imaginavam e se insinuava. Segundo consegui apurar, o movimento sindical noruguês deu pela primeira vez ao PS, em Maio de 1974, após visita a Oslo de Francisco Ramos da Costa, cem mil coroas norueguesas. E demonstrando os seus bons contactos internacionais e capacidade de angariação de fundos, também o PSD da Dinamarca forneceria cinquenta mil coroas enviadas através do Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa.(…)
Pelos meus cálculos, com base na pesquisa informal que eu próprio faria posteriormente, deduzi que, em 1974, o PS não recebeu de partidos «irmãos» montantes significativos e nem de longe minimamente comparáveis aos que os serviços de informação americanos afirmavam o PCP estar a receber! Aliás, só o secretário-geral sabia exactamente quanto e de onde recebia o dinheiro, sendo certo que, na prática portuguesa, o controle financeiro dos partidos está intimamente ligado ao controle do próprio partido. Não admira que este tipo de informação permaneça fechado e que as leis da chamada transparência, aprovadas pelos principais partidos políticos, permaneçam ainda hoje tão opacas!

25 Guitarras de Aço (3)

steve howe 04os yes foram um dos principais supergrupos do designado rock sinfónico da década de 70. e representam-no de tal forma que, para o bem e para o mal, ainda hoje são um fenómeno de profundo amor ou profundo ódio na utópica e mutante pop culture. não valerá a pena contar a história. toda a gente a sabe. o punk rebelou-se, em termos musicais – foi muito mais do que isso, é certo – contra os excessos de virtuosismo na qual a pop se enredou a partir dos primeiros anos da década de 70. os yes representam, muito provavelmente, o limite último na tentativa de atribuir à pop uma roupagem sinfónica – isto se exceptuarmos os devaneios de david greenslade e o seu pentateuco. claro está, existiam os floyd, os soft machine de robert wyatt, os genesis de peter gabriel, os van der graaf de peter hammill, os jethro tull de jon anderson, os gentle giant, os caravan, os henry cow etecétera e tal – em muitos aspectos bem mais importantes. não obstante, sem os yes, o rock progressivo/sinfónico teria sido bem diferente. eles representaram o lado diurno, brilhante e límpido do movimento. a sua influência foi visível em toda uma série de bandas menores por todo o mundo, de portugal – os tantra por exemplo- ao japão. Steve Howe não foi um dos seus fundadores mas entra – substituindo peter banks – naquele que será o primeiro album em que a banda assume a sonoridade pela qual ficou conhecida, «the yes album» 1971, assinando a solo a faixa «the clap». será neste mesmo ano que os yes editam a primeira das suas primeiras obras-primas, «fragile». nesse momento, são um quinteto de músicos portentosos. para além do famoso jon anderson – responsável por grande parte do imaginário místico e quase animista da banda e dono de dotes vocais pouco usuais  – bill bruford (king crimson, uk), um dos maiores baterista de sempre, rick wakeman (o homem dispensa apresentações, incluíndo mesmo a quantidade de material de gosto discutível que quase sempre produziu a solo) – já agora uma curiosidade: sem rick wakeman dificilmente o «hunky dory» do david bowie teria a mesma sonoridade; parece mentira mas não é – e o indesmentível líder da banda, chris squire e o seu fabuloso baixo. steve não deixa de nos maravilhar em, por exemplo, «mood for a day», um instrumental por ele composto. em 1972 surge a segunda obra-prima, «close to the edge», e no ano seguinte o duplo «tales from topographic oceans». incluímos ainda no rasto brilhante dos yes «relayer» de 1974, já com patrick moraz (moody blues) e alan white na formação. a partir daqui muito pouco interessa. steve howe abandonou, voltou, abandonou outra vez, voltou outra vez a integrar a formação mas os tempos eram outros e a fórmula esgotava-se. tal como já estava quando formou os asia, com john wetton,  a primeira banda «rock-fm» da história da música pop !?

do clássico ao jazz, a sua formação e influências é vasta. não há instrumento de corda que steve howe não utilize para compor sonoricamente o emblema «yes», de guitarras clássicas a bandolins. a lista de instrumentos de aço usados no seu «the steve howe album» de 1979 é de 14 instrumentos, incluindo steel guitars e banjos. usava com o mesmo apreço «fenders» e «gibsons», algo pouco característico nos mestres de guitarras, para incluir nos yes toda a extensão de sonoridades possíveis. steve howe não é/foi david gilmour e muito menos robert fripp, mas estes também nunca poderiam ter feito o que ele fez. 

quer goste ou não, faça o favor de ouvir a introdução de «close to the edge» onde steve howe, para utilizar uma expressão prosaica, «é tão bom que até chateia!»

yes close to the edge

ps: como se afirmou, não se pretende hierarquizar este tema nem aprofundar matérias do foro técnico. depois de george clinton, johnny marr e steve howe, o próximo deverá ser peter green ou talvez jack white ou talvez derek bailey, quem sabe.

O melhor ponto da carreira

Federer … sem legendas