O 11 de setembro que mudou o mundo

Friedman e Pinochet

No dia 11 de setembro de 1973 um golpe militar chefiado por A. Pinochet derrubou o governo do Chile presidido por Salvador Allende, eleito socialista que governava recuperando a unidade dos primeiros governos de Frente Popular. Foi para a esquerda um acontecimento que fecundou na altura discussões eternas sobre via eleitoral e via revolucionária, já para não falar da denúncia da mãozinha do Kissinger, sua CIA e governo dos States. A nostalgia ainda hoje é essa.

Para o Portugal que poucos meses depois iniciou um Processo em Curso que a bem dizer nunca foi Revolucionário, o massacre da esquerda chilena (30 000 mortos, segundo a Amnistia Internacional, fora campos de concentração e tortura) pairava nas constantes ameaças de pinochetazo, abortadas num 11 de março precoce e desaparecidas com um 25 de novembro versão português suave.

Isto mudou o mundo?

aparentemente não, o mundo não é o Chile. O aparentemente serve para a versão politiqueira que os media e algumas ciências de ocasião vão fazendo.  Mas mudou, e muito.

Em 1958 a Pontificia Universidad Católica de Chile tinha estabelecido um acordo com a Universidade de Chicago através do qual vários dos seus alunos foram aprender com Milton Friedman aquilo que hoje chamamos de neo-liberalismo. Augusto Pinochet abriu-lhes a porta para governarem, assumindo o que ficou conhecido pela experiência dos Garotos de Chicago, feliz tradução na Wikipédia para Chicago Boys.

Sob uma repressão brutal e 20% de desempregados a mais torcionária das ditaduras sul-americana do fim do século passado, construiu isto:

Uma fantasia que Paul Krugman desmonta assim:

Na verdade, como podem ver pelo gráfico, o que aconteceu foi isto: o Chile viveu uma  enorme crise económica no início dos anos 70, que foi, sim, parcialmente devida a Allende e às concomitantes convulsões sociais. O país conheceu, depois, uma recuperação motivada em grande parte por massivos influxos de capital, que essencialmente serviram para reconstruir o terreno perdido. No início dos anos 80 uma nova crise aconteceu, subsidiária da mais vasta crise da dívida da América Latina, embora o Chile a tenha vivido mais intensamente do que a maior parte dos restantes países. Foi apenas no final da década de 80, altura em que as políticas agressivas de libertação dos mercados se suavizaram consideravelmente que o Chile finalmente saiu do lugar onde se encontrava no princípio dos anos 70.
Ou seja: as políticas de liberalização dos mercados foram aplicadas, e rapidamente! A prosperidade aconteceu, 15 anos depois.

A seguir veio a Baronesa Thatcher, partiu a espinha aos sindicatos e tornou a coisa tão natural que um Tony Blair seguinte se encantou (com um Labour já afastado da sua base social) e continuou a obra. Depois apareceu Reagan do qual mesmo assim viríamos a ter saudades quando a presidente chegou o Texas, na sua fórmula clássica de petróleo e armas, e o caminho perdeu o regresso, até ver.

De que falamos? do tempo em que acabou o trabalho com direitos, acabou o tempo, como sempre invocam, a partir de causa, lógica ou razão nenhuma, um tranquilo regresso ao século XIX sem a violência explícita de um Hitler e com uma eficácia muito superior.

Ora acabar com o tempo, sem dúvida que mudou o mundo.

O outro 11 de setembro, o de 2001

O acontecimento que hoje se evoca, sempre faz 10 anos e os números redondos têm a sua peculiar magia, também pode ter mudado o mundo. Tirou logo do mundo 3000 humanos em Nova York e mais tarde uns números ainda mais redondos no Iraque e no Afeganistão. Teve o simbolismo das primeiras baixas de guerra em casa do Império, sem dúvida um marco no seu declínio.

Se calhar mudou o mundo mas disso ainda não temos tempo para certezas, não sendo ajuizado confundir a habitual propaganda de guerra, este ano 10 vezes reforçada, com a História. A construção do tempo em que acabou esse tempo também passa por aqui mas não acabou aqui. Ainda agora a procissão vai no adro e falta lavar muito cesto para se acabar a vindima.

Comments

  1. JJ, está excelente!

  2. Concordo, mais abriiu um poco os olhos do mundo
    IDE POR TODO MUNDO PREGAI O EVAGELHO A TODA CRIATURA

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