situações irreais deste país

uma das coisas que me choca neste país é a precariedade no trabalho. o novo código laboral, posto em vigor no ano passado, retirou alguns dos direitos do trabalhador português, a mando da “necessária” mercadorização, a.k.a flexibilização pretendida pela troika, finando, entre outros, os direitos que este tinha ao nível de indeminizações por despedimento (despedimento mais barato) e introduzindo o célebre banco de horas, banco até 150 horas anuais, que, a bom da verdade, não é mais do que uma maneira subtil que as entidades patronais têm de fazer o escravo suar mais um bocadinho em troca de uma miragem de mais dias de férias.

as mudanças no acesso ao subsídio de desemprego, agora expedito apenas aqueles que efectivaram descontos durante 12 meses ininterruptos de trabalho para a mesma entidade patronal, assim como a criação de um fantasmagórico subsídio social de desemprego (acedível apenas aqueles que cumpriram 180 dias de trabalho; salvaguardando uma das porcalhotas do nosso mercado de trabalho, o contrato a termo certo de 6 meses) contem afinal armadilhas que beneficiam cada vez mais a construção de um sistema altamente esclavagista e ávido a pagar apenas ao trabalhador um caldo e uma côdea de broa.

dou um exemplo prático de como pérolas a porcos não quer dar este governo.

alguém que celebrado hipoteticamente um contrato a termo certo de 24 de fevereiro a 23 de agosto, cumprindo nem mais nem menos do que 178 dias não-uteis de trabalho, auferindo 5 meses de trabalho, 5 dias de trabalho no mês de fevereiro, 23 do dia de agosto, metade do subsídio de férias correspondente ao seu salário, metade do subsídio de natal consequente e uma indeminização de 18 dias de trabalho (ou seja 9 para 6 meses de trabalho) como mandam as novas regras quanto aos fundos compensatórios, não poderá pedir subsídio de desemprego ao estado e não poderá pedir subsídio social de desemprego também. isto porque lhe faltam 2, 2 míseros dias sob contrato para poder pedir o último, subsídio esse que é atribuído de forma discricionária pelos tecnocratas da segurança social com base na condição de recursos do requerente até um valor máximo de 419,60 (1 IAS), sendo que pessoas cujo agregado familiar ultrapasse 300 e picos euros per capita (calma rapaziada, não se excitem porque a minha máquina também falha às vezes) não recebe um único tusto.

contudo, e como a lei em portugal é pródiga em ter multiplas interpretações e multiplos esquemas de adorno e contorno do problema, convém dizer que isto tem solução. para efeitos de subsídios do estado, manda a lei que cada mês de trabalho seja contabilizado em 30 dias. logo, neste caso prático, a lei autoriza que o mês de fevereiro, contabilizado até 28, possa ser contabilizado até 30 para o efeito, dando ao trabalhador um subsídio pendente por condição de recursos com base em 2 dias que não existem ordinariamente no seu calendário.

a ideia subjacente na exclusão, ou melhor, na exclusão do numero máximo possível de pessoas deste tipo de apoios sociais, não tem a meu ver caso com a necessidade de redução de despesa do estado. temos que admitir que neste momento existe uma falange enorme dentro do meu escalão etário a trabalhar ora a recibos verdes ora por intermédio destes célebres contratos de curto prazo a termo certo. a ideia é beneficiar o sistema. cortando o acesso ao subsídio, atrapalhando a vida de jovens casais em início de vida ou a vida de milhares de jovens que necessitam da côdea de broa com sardinha que estes “empregos” lhes dão para sobreviver, a ideia é continuar a tornar o mercado de trabalho bem qualificado, bem dotado tecnicamente mas acima de tudo, perdoem-me a rima, barato para o baronato. não me venham portanto dizer que todas as leis são gerais e abstractas porque não o são. são o garante de uma ordem exclavagista que tem apenas e unicamente como objectivo enriquecer os tubarões em detrimento da miséria de outros.

Comments

  1. Reblogged this on O Retiro do Sossego.

  2. Isto sem o novo acordo ortográfico, era mais interessante de ler.

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