Portugal 1975-2015: 40 anos de silêncio

acusar

Ficaram com os ódios e as raivas ali a arderem-lhes. Os ódios muito bem guardados para grandes vinganças vindouras que o destino pudesse favorecer. Escondidos nos sótãos fechados à chave dos seus espíritos, entrar neles dava cabo até mesmo de quem mal sabia por que razões, e embora ainda ardentes, haviam ali sido escondidos. As raivas debaixo do tapete, de onde contudo por vezes saíam, como cabeças de hidra que nenhum hércules pisava para não debelar numa só cabeça que fosse o que fôra guardado com tanta estima há mais de 40 anos. Ovos disso haviam eclodido aos milhares.

Nasceram novas pessoas e foram-lhes ensinados esses ódios e raivas. Quando atingiam uma certa idade, alguém mais velho levava-as lá acima ao sótão e, apontando para o que estava tapado com grandes panos que ninguém levantara desde que lá haviam sido postos, diziam

Estão ali.

Mostrado o esconderijo, apressavam-se a descer, procurando fugir das recordações que logo começavam a invadir-lhes os pensamentos. Dos tapetes escondendo os mais pequenos sentimentos torcidos, limitavam-se a informar

Não se varre ali debaixo nem se aspira.

As novas pessoas assentiam e não se falava nunca mais no assunto. [Read more…]

A ameaça

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(c) Pedro Vieira sobre capa da Time de 1975
[Fonte: Facebook de Paulo Querido]

1975 e 2015 são mundos diferentes. Descansem os traumatizados do excêntrico (e ainda mais para portugueses) PREC, que não é agora que a “ditadura popular” que então se pôs a jeito (e que não avançou por acção determinada também do PS) vai realizar-se em Portugal. Não é porque alguns desses traumatizados não merecessem tal susto, pelo inacreditável aggiornamento que fizeram do seu anterior soberanismo anti-europeísta – berço que agora renegam, em nome de compromissos obscuros (embora claros para muitos) que tornam a política um negócio e apenas isso, e transformam o País numa empresa. Mas é porque o mundo de 2015 é realmente outro – tal como são diversas de 1975 as forças à esquerda do PS, apesar da “vocação” de oposição em que teimaram até agora. Antes tarde que nunca, diz a sabedoria construtiva. [Read more…]

28 de Maio de 1975

Se o de 1926 começou em Braga, este teve como álibi uma história passada em Coimbra.

Em meados de Maio frequentava a sede do MRPP em Coimbra, Av. Fernão de Magalhães (onde hoje Consulado de S. Tomé e Príncipe), um indivíduo, ex-comando na Guiné, que começou a tornar-se suspeito. Vai daí um belo dia alguém decidiu considerá-lo mesmo um agente provocador fascista, da CIA ou algo que o valha, e foi simpaticamente convidado a ficar por ali, sujeito a umas perguntas sobre as motivações dos seus comportamentos.

Vigiado à vista (estava detido com tanta eficácia que tinha conseguido apanhar uma lâmina de barbear abandonada e tentado cortar os pulsos), no alvorecer do dia 26 de Maio (penso eu de que) ao preparar-me para dormir depois de uma noite de colagens (contexto histórico: o MRPP tinha sido proibido de concorrer às eleições, e era por tabela um partido ilegalizado) ouço a porta da rua bater, não fazia sentido, e constato que o camarada com a função de vigilante ressonava. O indivíduo era deficiente de guerra, coxo, eu na altura corria umas coisas, quando cheguei à rua já não o vi. [Read more…]

Tenham Medo (1): Torre Bela

Inicio aqui uma série para Abril, Tenham Medo,  filmes e revoluções, com a pedagógica intenção de alertar as jovens gerações reaccionárias para os riscos que correm, ou como diria Mao Tse Tung: a contra-revolução não é o chá das 5. [Read more…]