Na política, todos os argumentos são bons, mas uns são melhores que outros

O poeta TS Eliot, enquanto director da editora Faber and Faber, nos anos 40 do século passado, recusou o manuscrito de “O Triunfo dos Porcos”, de George Orwell, por considerar a obra “nada convincente” e “trotskista”.

Numa carta de 1944 em que justifica a sua recusa em publicar a obra na editora, Eliot afirma que não era “o momento” para publicar o romance declaradamente anti-totalitarismos, mas que soava a anti-estalinista.

“Não estamos convencidos de que seja o ponto de vista correcto. É a obrigação de qualquer editora de interesses e motivos distintos dos meramente comerciais publicar livros que vão contra a corrente do momento”, escreve.

O poeta e editor observa ainda não estar seguro de que aquilo que Orwell conta no seu romance “seja o que há que dizer neste momento”. Na sua carta, Eliot argumenta que o ponto de vista de Orwell, que o poeta considera “trotskista”, “não é convincente”.

Eliot, por esta altura, já tinha trabalhado na área de gestão de contas do famoso Banco Lloyds. Com toda a certeza, deveria ter recebido a cartilha da fundamental conciliação dos interesses com as necessidades, das manobras políticas da arte e da melindrosa arte da política. Não sei se pressionado ou não, mas algo ou alguém deve ter dito ao poeta que não seria boa política publicar o livro “contra a corrente do momento”.

Não foi a história da revolta dos animais de uma quinta contra o agricultor ditador e a futura transformação dos porcos em dominadores de todos os outros animais que melindrou o Nobel de 1948. Eliot deverá mesmo ter apreciado a poesia de uma frase reveladora que ficou para a história: “Todos os animais são iguais mas uns são mais iguais que outros”.

A Eliot parece ter incomodado em particular a caracterização que Orwell faz dos porcos na obra. No romance, Napoleão (nome significativo), o suíno brutal que lidera os porcos ‘maus’, surge com traços de caracterização de Estaline. Napoleão derrota Bola de Neve, um animal mais simpático, benfeitor de outros, que parece apontar para o estilo de Trotsky, ex-dirigente comunista que terá sido assassinado por ordem do georgiano.

Apesar dos elogios à obra, “estamos de acordo em que é uma destacada obra literária: a fábula está tratada com grande habilidade e a narrativa mantém sempre o interesse do leitor”, TS Eliot chumbou a publicação do livro, que qualificou de “boa literatura”, caracterizada por uma “integridade fundamental”.

Em linguagem mais corrente, o chumbo foi aplicado porque não dava jeito que o livro fosse publicado. Naquele momento e apesar dos interesses comerciais.

“O Triunfo dos Porcos” foi publicado em Inglaterra pela primeira vez em Agosto de 1945 pela Secker and Warburg.

A carta aqui citada faz parte da colecção particular da viúva de Eliot, Valery, desde a morte do autor de “Quatro Quartetos”, será mostrada num documentário a exibir em breve na BBC.

Bem vistas as coisas, pouco ou nada muda, ao longo dos tempos, quando se trata de abordar o poder, a política, as conveniências e os momentos pouco ou nada adequados.

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