Falando de democracia: Um eléctrico chamado socialismo (II)

(primeira parte aqui)

Esta cadeia de acasos da vida apontada por José Ricardo Costa que, por certo, não é exaustiva e se queda pela superfície, pela nata dos nomes conhecidos, este sistema endogâmico, como muito bem diz, a política de casamentos como a nobreza feudal praticava, faz que a elite governante, seja quais forem os resultados eleitorais, nunca mude no que é essencial – mudam e trocam-se alguns nomes, mas a nova aristocracia vai cimentando o seu poder. O «bloco central» não é uma figura de estilo, ou uma «invenção de esquerdalhos ressabiados», como já ouvi dizer. Existe, funciona, faz complicadas operações de engenharia financeira (trafulhices, simplifica o nosso bom povo); por exemplo quando um membro da tribo administra um banco vende acções a baixos preços, sabendo que o seu valor vai subir no dia seguinte, fazendo-o ganhar legalmente centenas de milhares de euros de um dia para o outro (favor que o beneficiado não deixará de pagar na primeira ocasião que se apresente, pois uma das regras do jogo é a não haver almoços grátis); os membros da tribo arranjam cargos e bons empregos uns aos outros, na vida académica amparam-se mutuamente, e quando algum deles ou um familiar tem problemas com a Justiça, logo aparecem os amigos a dar uma mão. É gentinha medíocre, de ideais rasteiros e patrimónios elevados, mas está aí para ficar. Governa, sobe aos mais altos lugares do Estado e desce às mais baixas alfurjas das negociatas obscuras. Não se chamam Bourbons, Habsburgos ou Braganças, têm nomes vulgares, iguais aos de toda a gente, são filhos, não de condes ou de duques, mas de gente comum, com profissões ou negócios comuns, mas usam as mesmas artimanhas dos condes e dos duques, incluindo a política de casamentos. Tráfico de influências? Nepotismo? Não, que ideia, apenas boas relações entre familiares e amigos, mesmo que pertençam a partidos rivais. O fair play prevalece.
A endogamia, termo que na acepção mais próxima da tese de José Ricardo Costa, significa casamento dentro da própria família, tribo, classe ou entre habitantes dum povoado ou região, foi amplamente praticada entre as famílias nobres não só na Idade Média, como na Idade Moderna, chegando mesmo até aos nossos dias nas relativamente numerosas monarquias que subsistem em nações europeias. Sem cair no pormenor, pode dizer-se que em várias épocas e situações, famílias, irmãos, primos, filhos e pais, ocuparam tronos, guerrearam-se entre si, provocaram milhares de mortos, terríveis devastações entre os súbditos. Muitas vezes, depois destas hecatombes horrorosas, passando por cima dos cadáveres e das ruínas, selavam a paz com beijos e abraços, tratando-se por «querido irmão», «amado primo», «meu bondoso pai». Bem sei que aqui em Portugal não estamos a falar de Bourbons ou de Habsburgos, mas sim de gente com linhagens menos ilustres. O que importa salientar é a técnica e a táctica, tão semelhantes. Perguntarão? E só em Portugal é assim? Claro que não. Veja-se o caso de Itália, país com uma democracia com mais de seis décadas, com um nível cultural e económico mais elevado do que o nosso, onde um mafioso truão é, em 2008, democraticamente eleito primeiro-ministro pela quarta vez. De origens humildes, imagem típica do self-made man, é dono de uma das quinze maiores fortunas do mundo. Só há uma diferença – ele não diz que é socialista nem que quer transformar a sociedade…
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«Sistema daqueles que querem transformar a sociedade pela incorporação dos meios de produção na comunidade» (…) «pela repartição, entre todos, do trabalho comum e dos objectos de consumo». O meu querido e saudoso amigo José Pedro Machado enganou-se rotundamente na sua definição ou então estava a falar de outro socialismo. O filólogo brasileiro, sendo menos ambicioso, aproximou-se mais da realidade «conjunto de doutrinas de fundo humanitário que visam reformar a sociedade capitalista para diminuir um pouco das suas desigualdades». Está mais próximo, embora a redução das desigualdades diminua muito pouco, tão pouco que às vezes nem se nota que haja alguma redução. As doutrinas de fundo humanitário são, de facto, um péssimo motor para o socialismo.
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Continuando a usar a metáfora inspirada na bela peça de Tennessee Williams, aonde nos levará este eléctrico chamado socialismo? Não há muitas dúvidas – o eléctrico cor-de-rosa do socialismo transportar-nos-á ao mesmo lugar onde nos levaria o machimbombo cor-de-laranja do PSD (levaria, não, levará, porque a viagem será feita por troços – eléctrico, machimbombo, eléctrico…) até à estação terminus – a entrega total da soberania, do direito de gerirmos os nossos recursos, a centros de poder e decisão «comunitários», localizados, por mero acaso, em Berlim e Francoforte, em Paris, Bruxelas ou Estrasburgo… A aristocracia indígena embolsará o produto da venda e os felás e felaínas (nós) mal nos aperceberemos do que se passou. Perda da independência? Não, que ideia. Eles abrirão e fecharão fábricas quando e como quiserem, dirão como devemos organizar a nossa economia, as nossas vidas, o que devemos comprar, quanto devemos pescar, o que poderemos semear… Mas a selecção nacional de futebol, a bandeira e o hino, símbolos maiores da independência nacional, talvez não nos estejam vedados.
Nem sei porque me preocupo.

Comments

  1. maria monteiro says:

    Preocupa-se porque há um eu, tu, ele, nós, vós eles que também se preocupam

  2. dalby says:

    eu também fico revoltado,, mas há tantas coisas com a que sou obrigado a preocupar-me..eu acho que já passa a política há muito….é mesmo já da natureza humana..há que voltar às igrejas mas com pureza…onde pára a miss Romualdo?? e o Jardim Gonçalves e o Teixeirinha? Eles os ex bcp’s andam todos tão calados??!!!

  3. luis Moreira says:

    É uma matilha que abocanha interesses e lugares de decisão que gerem em circuito fechado.As políticas de Sócrates com os grandes grupos económicos são um exemplo disso.

  4. dalby says:

    Mas descansem aventarinhos e aventarinhas…eles vão de carrinho, vamos ter a nelita Psd outra vez, mais o Bloco na passerrelle..e life goes on and on and on….vamos casar ter muitos filhos e sermos muito felizes for ever and ever…-THE END-LUISINHO ANDA TÃO CALADINHO, NEM COMENTOU O MEU ARTIGO SOBRE ALM E AS MENINAS BONITAS CORRUPTORAS!!!!! jejejejeje..já nem sei que lhe oferecer mais, já viu o que ali vai no video..coloca qualquer ovelha perdida no bom caminho!!!

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