A nuvem da morte chegou há 25 anos

 

Foi há 25 anos. O dia tinha acordado como tantos outros mas depressa veio a tornar-se num pesadelo que se estende até aos nossos tempos.

Na manhã de 3 de Dezembro de 1984 uma grande quantidade de água entrou num tanque da Union Carbide (hoje Dow Chemical), uma fábrica de pesticidas instalada em Bhopal, capital do estado de Madhya Pradesh, na Índia.

 

A água reagiu com 42 toneladas de isocianato de metila atingindo temperaturas elevadas e uma pressão imensa que acabou por provocar a libertação de diversos gases para a atmosfera. A nuvem venenosa espalhou-se pelas localidades nos arredores da unidade industrial. As primeiras pessoas afectadas tiveram a garganta queimada, tal como aconteceu com os olhos. Em poucos horas morreram cerca de quatro mil pessoas. Ao fim de três dias havia 10 mil mortos. Nos anos seguintes acabaram por morrer mais 15 mil pessoas em consequência directa da libertação dos gases.

 

Vinte e cinco anos depois, eleva-se a cerca de 25 mil as pessoas vítimas directas. Estudos publicados no início desta semana revelam que os bairros em redor da fábrica continuam a sofrer os efeitos dos produtos químicos, que contaminaram os lençóis freáticos e o solo, causando malformações física e psíquicas de nascimento e doenças crónicas. Ao todo, cerca de 100 mil pessoas foram e estão a ser afectadas pelos produtos tóxicos então libertados e pelas sequelas provocadas.

 

Os administradores da empresa acusaram primeiro um grupo terrorista pelo incidente. A falta de provas levou a um recuo e à transferência da acusação para um funcionário, responsável pela segurança. Sabotagem, disseram. O indivíduo fugiu e nunca foi detido. A investigação acabou por concluir que as medidas de segurança eram muito fracas. Tinham diminuído de forma drástica devido à redução de verbas aplicada neste segmento pela administração, sentada num gabinete nos EUA.

 

O governo do Estado indiano encarregou-se das instalações em 1998, mas as limpezas foram parciais. Jornalistas que estiveram no local contam que milhares de toneladas de resíduos ainda são encontradas a poucos metros da fábrica, em tanques artificiais de evaporação solar. O governo estatal afirma que este material não é prejudicial e pensou em abrir as instalações no mês passado mas recuou.

 

Em comunicado, a Dow Chemical afirmou ter fechado um acordo financeiro de 470 milhões de dólares assinado em 1989 com o governo indiano, resolvendo “todas as demandas existentes e futuras”. A maior parte do dinheiro terá sido utilizada para pagar indemnizações de mil a dois mil dólares às vítimas que ficaram incapacitadas para trabalhar ou com doenças de longa duração. Muitas delas não receberam absolutamente nada.

Hoje, activistas indianos recordaram o incidente com manifestações e com a exigência de que os responsáveis sejam julgados.

 

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Comments

  1. O desenvolvimento à custa do sofrimento. E a ganância tambem contribui.

  2. Já aqui, num post de 12 de Dezembro, defendi  o estabelecimento de limites à liberdade de comentar. Basta lembrar aquele princípio que a Revolução de 1789 nos legou – a liberdade de um acaba onde começa a liberdade do outro.  

  3. O comentário de cima (ou de baixo) não era para este post . Para este, apenas se me oferece dizer o seguinte: Para as gentes de Bhopal o ano de 1984 foi verdadeiramente orwelliano . Curioso o «negócio» da Dow Chemical com o governo indiano – de facto, mil a dois mil dólares, mesmo na Índia, é uma indemnização generosa para quem ficou incapacitado. E, mesmo assim, houve quem não recebesse nada. E, Luís, quanto dos 470 milhões de dólares terão ido parar aos bolsos de alguns «marajás»? Ou será má vontade minha contra os marajás?

  4. E então na India, com toda aquela pobreza!

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