Há noites assim, em que a cidade se enfurece num desassossego de chuva e ventania, e se nos acerca o medo de que a noite não termine nunca. Todas as portas se encerraram, ninguém espreita das janelas, pelas caleiras rotas jorra água sem fim. À luz baça dos candeeiros de rua, saltamos charcos, enfrentamos as rajadas de cara descoberta, e caminhamos com uma réstia de esperança.
Ansiamos por uma luz, um rosto familiar, ou que um rasgo de sorte nos inverta o rumo e que, da sucessão monótona de fachadas cinzentas, se descerre a caverna luminosa de um poeta. E aí nos sentaremos, enquanto a chuva de Janeiro engole a cidade, e o coração se nos acende no peito.
Sabes Carla, fui ao facebook antes de vir aqui e pelas duas frases que lá aparecem, vi logo que eras tu a autora desta prosa única. Tens de arranjar tempo para escreveres…
Perfeito.
Um autêntico poema em prosa
Claro que é um poema, um belo poema.
A poesia não precisa da sua matriz tradicional para ser bela e autêntica. A poesia pode ester num gesto, numa palavra, numa atitude.
A poesia mais do que tudo é um sentimento.
O sentimento poético é um sentimento como o sentimento do amor, como o sentimento da alegria, como o sentimento da tristeza. Parece-me, contudo, ser um sentimento muito subtil, quase mágico, provavelmente de uma neuronalidade muito delicada, uma espécie de musicalidade, uma essencialidade rítmica e harmoniosa que existe dentro de nós e nos permite, quando permite, a mais nobre e sublime expressão da realidade das coisas e da vida.
Os meus antecessores, disseram o essencial. Américo Tomás, o inenarrável «cabeça de abóbora» disse, a propósito de um espectáculo ou de uma exposição :« Só tenho um adjectivo – gostei!».
obrigada a todos, amigos, não sabem a importância que têm para mim as vossas palavras
Lembrei-me do teu texto quando estava, de manhã, com a minha filha ao colo. Quero que ela seja muito feliz e que a vida não lhe custe. Só que, se a vida não lhe custar, as conquistas e as alegrias não têm o mesmo sabor.