Deixem-se de merdas, sff!

Por motivos pessoais estive ausente do Aventar durante longos dias.

Pela primeira vez, desde 2002, estive sem acesso à internet mais de seis dias seguidos e sem telemóvel quase outros tantos. Durante esse período, sem saber, o Aventar viveu uma pequena crise interna e uma segunda crise informática. Hoje, regressado às lides e após leitura de mais de meio milhar de mails, apercebi-me que o Aventar viveu dias agitados – como disse Pedro Correia, foi o nosso PREC: Processo Revolucionário Em Casa.

Para contrariar a minha tendência de escrever postas ligeiras – sim, caro CL, eu sei que nem sempre se agrada aos melhores com ligeireza mas atinge-se muitos quando se procura simplificar o difícil – e reconhecendo o meu gosto pela transgressão através de postas propositadamente incendiárias sobre a bola e a Regionalização, o que irrita alguns amigos meus e camaradas de blog, é chegada a hora de, por uma vez sem exemplo, vos falar sobre o Aventar puxando algumas orelhas pois a minha já está em ferida e não vale a pena continuar em esforço pois “sou filho de uma senhora doente”, como se diz aqui pelas bandas da Areosa.

Foi Gilles Lipovetsky que teorizou sobre a sociedade de consumo e na sua fantástica obra “A Felicidade Paradoxal” lançou o mote sobre a actual sociedade do hiperconsumo, abrindo portas a uma discussão séria sobre a vida actual e é seguindo as suas palavras que vos procurarei explicar que nesta sociedade da abundância onde “surgem incessantemente novas vontades de consumir” não se conseguindo colocar termo a este “alargamento indefinido da esfera das satisfações desejadas” entendendo muitos que nunca, daí o tal paradoxo de que fala Lipovetsky, o indivíduo atingiu tal grau de abandono que surgem fenómenos como os blogues.

Nós, Aventar, somos filhos dessa realidade – a exemplo de todos os restantes companheiros/camaradas/irmãos na vizinhança digital. O(s) Blogue(s) é um sistema rico, é um verdadeiro acto de generosidade, como tão bem explica Giuseppe Granieri (na sua obra, “Geração Blogue”), na medida em que é simples elo num sistema de leitura, deslocando a atenção e o leitor para outros fontes e não se limitando a entretê-lo nas suas páginas. Sendo, como afirmou Kerckhove na citada obra, «a primeira criatura da Rede que demonstra a verdadeira maturidade deste meio de comunicar» não se limitando a ser uma mera exibição do eu mas antes da magnífica forma de relacionamento com os outros. Ainda seguindo Kerckhove, a blogosfera é «uma rede de interacções intelectuais directas e navegáveis, resultado da contribuição gratuita, aberta e verificável das consciências e das opiniões de muitas pessoas sobre assuntos de interesse geral e em tempo quase real». Mais, «os blogues são um espaço de reflexão compartilhada».

O Aventar é exactamente isso: um espaço plural que me atrevo a afirmar sem igual na actual blogosfera portuguesa, onde pessoas tão diferentes (em termos sociológicos, ideológicos, religiosos, geográficos, clubísticos, geracionais – da mais nova com menos de 18 anos ao mais velho que já ultrapassou os 70) se juntam para partilhar. Uma partilha de saberes, de experiências de vida, de opiniões, de idiossincrasias, de gostos e desgostos como ponto de partida para o infinito, ou seja, com o outro. Seja ele qual for, esteja ele onde estiver. No fundo, como afirma Lipovetsky, esta é a época da incessante procura pelo “bem-estar” e é isso que cada um de nós, a seu modo, concretiza na sua participação no Aventar.

As tensões internas, como aquela que o Aventar viveu recentemente, fazem parte da construção desse caminho, dessa procura de “bem-estar” que alguns tanto criticam na dita sociedade do hiperconsumo e que nós, todos, diariamente procuramos como forma de fugir ao tal abandono tão bem retratado por tantos filósofos contemporâneos e tão enfatizado por determinadas correntes tremendistas para as quais, esta sociedade global, é um perigo mesmo que nela vivam mergulhados com deleite. Ora, contrariando um ou outro companheiro/camarada/irmão do Aventar e olhando com a distância própria dos inocentes que não assistiram ao momento e que sobre ele, fruto dessa anomalia digital momentânea, mais friamente o podem analisar, só me resta afirmar que libertadas as tensões, passadas as zangas e os amuos, olhando para trás, só nos resta continuar a caminhar relembrando a frase batida: o caminho faz-se caminhando. Com paixão.

Por isso vos digo e repito: é um prazer partilhar convosco este trilho digital.

Nota: O título é para manter a filosofia de ligeireza que muito prezo!

Comments

  1. maria monteiro says:

    é isso Fernando

  2. Ricardo says:

    Vou sair outra vez.

  3. Luis Moreira says:

    Grande Fernando, esta crise resultou porque de ambos os lados estavam pessoas que só pensaram no bem do Aventar De maneiras diferentes, mas a pensar no Aventar!

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