Real ou virtual?

Pois bem, Fernando, vamos desfazer confusões e pôr as cartas na mesa:

1-Pedro Passos Coelho pensa que “A Constituição tem implícito um programa de governo, ao dizer que a Educação e a Saúde têm de ser tendencialmente gratuitas”. Eu penso que não se trata de um programa de governo, mas sim de um modelo de sociedade cuja formulação a própria social democracia não renega. Acho mesmo que, se há que cortar despesas, se há que limitar benesses, estes direitos devem ser os últimos onde tocar, dada a sua natureza social e simbólica.

2-Mais estado, ou menos estado, não deve ser apenas um slogan que se atire da boca para fora, é necessário dizer-se onde e como. O que anda na boca de muita gente e está à vista de todos, é propor menos estado em sectores que são negócios apetecíveis para certos grupos privados  e intervenção do estado quando se trata de salvar negócios especulativos e ruinosos como o BPN, por exemplo.

Na educação e na saúde, caro Fernando, eu sou por mais e melhor estado, naturalmente que mantendo a existência e a presença dos privados nessas áreas.

3-O registo neo-liberal de Passos Coelho é antigo e conhecido.

4-No auge do “ataque especulativo à economia portuguesa” PPC tomou a iniciativa de telefonar a Sócrates a propor um encontro. Terminado o encontro ambos os líderes afirmam que vão trabalhar em conjunto para “colocar o interesse do país acima de tudo” e que o encontro se destinara a dar aos mercados uma imagem de confiança e estabilidade: “Não queremos deixar nenhuma dúvida na nossa disponibilidade”, sustentou o líder da Oposição, que garantiu que vai acompanhar “de muito perto toda esta situação” nas próximas semanas e combater a “desconfiança”. No dia seguinte, em entrevista a um jornal espanhol, PPC afirma, entre outros ataques, que Sócrates perdeu a “credibilidade e capacidade política“. Ora se estas declarações, com 24 horas de intervalo, dão confiança aos mercados e transmitem estabilidade… Mais tarde vem a rábula do pedido de desculpas, antecedido pela oferta de solidariedade.

Se achas que “apunhalar” e “puxar o tapete” são expressões muito fortes, Fernando, eu amacio e digo que PPC dá com uma mão e retira com a outra. Dir-me-ão que faz parte da política; eu acho que se trata da mesma politiquinha que vimos tendo até aqui.

Penso que respondo aos pontos principais do teu poste. Muito mais haveria a dizer pelos sinais e contradições que detecto aqui e ali, mas esperemos pelo futuro e veremos. Garanto-te que me sentirei aliviado se tu estiveres certo e eu errado.

Comments

  1. Luis Moreira says:

    Pedro, dar um sinal de confiança aos mercados apoiando o PEC não pressupõe que apoie a política de Sócrates, pois a ser assim, não seria uma alternativa. Quanto à saúde acho que devemos defender o SNS, mas defendê-lo, é mantê-lo viável, não é dizer que é possível ter um SNS inteiramente gratuito, porque não é possível. Que ninguem fique sem tratamento por não ter dinheiro mas quem tem, por exemplo, seguros de saúde, deve accionar o seguro quando for a um hospital público. E a educação, idem…

  2. Pedro says:

    Exactamente, Luís, por isso é que eu não me refiro a frases como “Não passamos um cheque em branco ao governo” ou, cito de memória, “o governo não espere que governemos em seu nome”, que me parecem justas e verdadeiras. Mas quando um líder SE OFERECE para dar estabilidade e combater a desconfiança, e no dia seguinte diz que o aliado (que é primeiro ministro de um país) perdeu a credibilidade, aumenta a desconfiança sobre o país, parece-me. Quem é que confia num tipo que perdeu a credibilidade? E num país governado por um tipo sem credibilidade? Isto não é demarcar-se, é dar com uma mão e retirar com a outra, ou seja, é perder também credibilidade.

    • Luís Moreira says:

      Isto é complicado. O PPC teve que lhe dar a mão no PEC e a seguir ou se deixa colar a ele ou afasta-se dizendo que só o apoia no PEC. Eu, e nisso, estou de acordo contigo, jamais estaria de acordo com aumentos de impostos, sem garantias de pararem oa investimentos e de se saber onde vão cortar na despesa.

  3. Vamos a isso, Pedro:

    1. A melhor Constituição que conheço é a Americana. Seria um bom caminho.

    2. Diz-me tu: Por que raio o Estado continua a ter um banco? E seguradoras? E uma televisão? E rádios? E, e, e….Servem para?

    3. A entrevista ao ABC foi dada dias antes. As desculpas eram devidas. Se pensares friamente e analisares com cuidado a cronologia das coisas verás que é exactamente ao contrário.

    Um abraço. E assim se prova a pluralidade do Aventar.

  4. Ricardo Santos Pinto says:

    «A melhor Constituição que conheço é a Americana. Seria um bom caminho.» Acho que sim, copiemos o modelo americano no que diz respeito à Saúde.

    «Por que raio o Estado continua a ter um banco? Porque dá lucro e, a par dos sectores estratégicos, o Estado deve manter as empresas que dão lucro. Neste caso, a Banca também é um sector estratégico. Aí estão os liberais: o Estado fica com o que dá prejuizo, privatize-se tudo o que dá lucro. Os nossos amigos precisam.
    Claro que o Estado não devia ter televisões nem rádios, mas isso ja passa pela tentação ds Governos de controlarem a comunicaçao social. Quero ver se o PPC muda isso.

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