a escola pública pode fazer toda a diferença

antiga ministra da educação socialista, escreve um livro liberal sobre educação

Educar é uma tarefa de titãs, nem simples nem fácil. Não é em vão que vários de nós procuremos saber o que é educar e a melhor maneira do fazer. Somos vários em Portugal que dedicamos o nosso tempo a, como digo eu, introduzir crianças dentro do pensamento social do grupo em que vive. Tinha já escrito em 1994 na nossa Revista Educação, Sociedade e Culturas, editada pelo nosso grupo de Antropólogos e Sociólogos da Educação da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação, Universidade do Porto, publicado por Afrontamento, esta frase, que desenvolvi em trinta páginas, esta questão: o processo educativo: ensino ou aprendizagem? A dúvida existia na mina cabeça e nas ideias do grupo que trabalhava comigo, de Portugal, Espanha, França, Inglaterra, os Neerlandês ou Holandeses, dentro e fora da Ciência da Educação, como essas Antropologia e Sociologia da Educação, fundadas por vários de nós em Portugal. A diferença é simples: a Ciência da Educação, aprendida por mim em Edimburgo e Cambridge, Grã-Bretanha, acrescenta a metodologia da transferência de saberes, o contexto sócio histórico e psicanalítico às ideias e noções do saber.

Porque essa dúvida? Porque há várias formas de entender a realidade dentro da que vivemos. Sem entender essa realidade, nada sabemos. Não me refiro ao saber científico, esse saber provado com hipóteses, investigação e prova do que se afirma, ou conjunto de normas pedagógicas tendentes ao desenvolvimento geral do corpo e do espírito, mas sim ao saber comum usado dentro da nossa cultura. Acabei por entender

que a educação era um processo de aprendizagem para os que entram na interacção da vida social.

Há várias formas de entrar na interacção social, formas que dependem da classe social à qual se pertence. Bem sabemos, como dizem todos os que entendem esta interacção, que vivemos dentro de um sistema denominado do capital, por outras palavras, u sistema no qual o lucro e a mais-valia são o alvo da nossa actividade. Bem sabemos também, que há formas diferentes de aprender, formas que dependem do grupo que nos guarda, agasalha e ajuda a crescer. Como acontece com os grupos que nós antropólogos, especializados em Etnopsicologia da Infância, por outras palavras, no pensamento dos mais novos e o do seus adultos que analisamos com a teoria que estuda a psique individual e de grupo para entendermos em terreno o que essas crianças sabem e o que não, e o que os seus adultos podem transferir desde seu sítio de guardiões dos mais novos, que aprendem de forma ritual as formas polidas do comportamento, como define Malinowski no seu texto de 1926: Crime and custom in savage society, Routledge and Kegan Paul, UK – não sei de versão portuguesa, mas sim Castelhana, Ariel, Madrid, 1969, texto que analisa a organização dual das etnias Massim da Kiriwina, Nove Guiné, e compara com as análises ocidentais de Freud, 1920: “Au-delà du principe de plaisir” (1920) ou Beyond the principle of pleasure,Routledge and Kegan Paul, UK, ou em linha em: http://classiques.uqac.ca/classiques/freud_sigmund/essais_de_psychanalyse/Essai_1_au_dela/au_dela_prin_plaisir.html , ou ainda a colecção em luso brasileiro, Imago, Rio de Janeiro. A transferência de saber se faz como Durkheim tinha já analisado no seu texto Les Formes Élémentaires de le Vie Religiuse, Felix Alkan Paris, 1912, com formas rituais e separados os mais novos do resto da etnia Arunta que ele analisa, no deserto, em jejum, a cerimónia Intichiuma com um sacerdote – Alenteuja- a ensinar a criação das larvas que serão o seu futuro alimento, ou a caça ou a pesca e outras tecnologias para a sua subsistência. Como estudei no meu livro de 2000, Afrontamento, Porto: O saber sexual das crianças das crianças.

Estes textos não são usados por Maria de Lurdes Rodrigues. Não está obrigada. O seu saber é liberal, de engenheira social, debruçando-se sobre formas alternativas de trabalho e estudo. O sucesso educativo de todos os alunos e a redução do abandono constituem o principal desafio das escolas e da política educativa.
Não desistir de nenhum jovem, nem consentir que os jovens desistam de estudar, é uma responsabilidade que tem sido difícil de concretizar. Exige um esforço de valorização do estudo, do saber e do conhecimento, pelas famílias e pelos alunos. Exige a convicção de que todos podem aprender.
Na resposta a este desafio, a escola pública pode e deve fazer a diferença. Para isso são indispensáveis políticas públicas de educação orientadas para a promoção da equidade, da eficiência e da qualidade. O seu elo central é dizer que são experiência provadas em escolas privadas, com imenso sucesso. Dá, como alternativa, o que denomina Novas Oportunidades e propões que no ensino secundário o estudante pode escolher entre estudos profissionais e aprendizagem de ciência. Por outras palavras, a sociedade já dividida em classes pela forma de produção capitalista, é dividida ainda mais com esse facilitar a opção de ser doutor o ser operário. O índice, apenas, indica que o texto é uma politica educativa que não obriga a aprender todo o programa científico para depois o discente escolher entre profissões ou aprofundamento do saber. A autora mostra uma veia liberal dentro do seu socialismo – declara-se socialista independente -, tal como acontece na Grã-Bretanha ou é proposto por Milton Friedman no seu texto de 1962: Capitalism and freedom, The University of Chicago Press, EUA. Friedman propõe escolas privadas para os ricos e públicas com politécnico, para as classes menos favorecidas. O sistema da burocracia escolar está intrometido no ensino quotidiano, o que nada ajuda ao processo de ensinar.

Lamento que estas ideias tenham governado o nosso sistema de ensino, sejam expostos num livro difícil de ler.

Felizmente Isabel Alçada muda esta forma e o livro fica em livro projecto, sem futuro.

Lamento, Maria de Lurdes, tornou a chumbar comigo e com os que entendem de política escolar.

É como respeito e dignidade que faço esta recensão. O PM nem sabe a quem coloca nas chefias centrais do seu governo. Devia pensar melhor…

A escola pública pode fazer toda a diferença criando várias formas de classes sociais, especialmente alargando a gama dos que nada têm e devem trabalhar não estudar.

Comments

  1. Raul Iturra says:

    Não resisto reproduzir este comentário que apoia os meus texto sobre Maria de Lurdes:
    Maria de Lurdes Rodrigues, ex-ministra da Educação, concedeu uma entrevista ao ‘Expresso’ onde destila um desprezo pelos professores que seria impensável em qualquer outra pasta.
    • 0h30
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    Por:João Pereira Coutinho, Colunista
    Alguém imagina um ministro da Agricultura com particular asco pelos agricultores? E, no entanto, a dra. Rodrigues não tem freio: os professores, para ela, recusam a avaliação porque preferem ser todos iguais.
    Que existam milhares de docentes que sejam o contrário desta caricatura e que tenha sido a mediocridade do seu modelo a despertar a ira da classe, eis duas evidências que não perturbam a senhora. Por isso, espanta que o eng. Sócrates, no lançamento de um livro da ex-ministra, tenha apresentado a dra.
    Rodrigues como uma mulher ‘sem ressentimentos’ e, mais, um exemplo de ‘coragem, grandeza e superioridade’. Sobre os ‘ressentimentos’, aplaude-se o momento de humor. Mas não se aplaude a indelicadeza para com a actual ministra, que passou os primeiros tempos a rasgar as medidas da sua antecessora. Será a dra. Isabel Alçada um exemplo de cobardia, pequenez e inferioridade?

  2. Raul Iturra says:

    Experimentei defender a Maria de Lurdes Rodrigues, eram muitos a bater sobre ela. Mas, é impossível. A sua arrogância e más maneiras e falta de educação, no ajudam a defender o indefensável. Reitero a minha primeira carta de crítica, de Março de 2009 e envolvo na minha crítica o PM por não saber governar nem valorizar aos seus colaboradores… como a Ministra Isabel Alçada, que tem em frente de si a tarefa de desfazer o impossível de antiga Rodrigues

  3. Luis Moreira says:

    A ex-ministra tem um mérito. Desfez a gaiola dourada em que viviam os sindicatos do sector que co-governavam a educação juntamente com os burocratas do ministério.Aí é que está a solução do problema. A escola autónoma!

  4. Raul Iturra says:

    Caro Luís, obrigado por ter a paciência de ler os meus postes. Ao longo de todos estes anos tenho colaborado com o Ministério da Educação; Carneiro, Azevedo, Ana Benavente e, bem tentei chamar a atenção da Maria de Lurdes, porque essa “gaiola dourada” mencionada por si, não existe. Quem manda na educação no nosso país, é a burocracia ministerial. Os sindicatos são a sua defesa, fraca e nunca ouvida. Digo-lhe, porque na qualidade de fundador e Presidente da APA, tenho acompanhado esses, normalmente meus discentes que são professores, e não são ouvidos. O ” cume do Dante” foi a anterior ministra. Tenho comigo a papelada toda e ouvi, quase como se for uma confissão, a sobrecarga de trabalho à que foram submetidos, além do número inacreditável de aulas para preparar por escrito e apresentar ao Ministério, em conjunto com o sumário das actividades do dia. Tive que adiar imensas teses do meu Mestrado em Educação: não tinham tempo para tanto abafo! Bem sabe que escrevi uma carta que circulou por todos os blogues e jornais, sem eu querer, era pessoal. Mas, a reacção a carta foi imensa e a quantidade de mensagens que entraram ao meu computador do meu gabinete e cá, era mais do que eu podia responder. No dia que abandonou o Ministério, era necessário, foi metaforicamente apedrejada e eu a defendi acrescentando um parágrafo para tornar a publicar a famosa carta. Mas, ao ler o seu livro e as suas declarações, que enviei a si e ao Carlos, não tive mais remédio que “chumba-la” mais uma vez. A sua arrogância cresceu desde a estudante que sempre vivia a pobre, usava a mesma roupa e sem dinheiro para se alimentar, para uma Senhora que cumprimentei o outro dia, cheia de jóias e vestidos de veludo! Vi-me obrigado a bater nela, especialmente após a sua declaração aos jornais, que enviei a si e ao Carlos. Não é falar mal dela, é procurar justiça para os docentes mal tratados, som a asa de um PM que diz o que diz e que bem sabemos que não é verdade quanto aos seus estudos, porque os académicos de alta patente, temos acesso a informações que sabemos calar. Mas, após a leitura de imprensa de hoje, fui incapaz de me conter e não bater mal em ela… eu também. Raro em mim, como sabe, mas necessário. Tenho imensas leituras dos meus textos sobre “la Rodrigues”, que nem merece o nome próprio, essa socialista independente o é, para guardar a sua horrorosa liberdade. Ou somos, ou não. A rapariga que conheci que apenas bebia café com uma sandes como almoço, é hoje a mulher cheia de pérolas ganhas a custo de punir professores. Essa a sua ideia de escolas profissionais, é o modelo britânico normalmente para ser cooptado após saber toda a ciência escolhida. Entendo o seu pensamento, mas não defenda o indefensável. Coitada da Isabel Alçada! Como eu, fomos convidados a apresentação do dito “livro” Ela devia ir, eu nem por isso. Pode partilhar estas ideias com o Carlos Loures, que vive no medo da retaliação.
    Abrazo
    RI

    • Luís Moreira says:

      caro Prof. enquanto as escolas não estiverem fora dos tentáculos do Ministério e dos sindicatos a educação não passa disto. cada vez pior. Os sindicatos e os burocratas precisam uns dos outros para viverem.

  5. Raul Iturra says:

    É com desgosto que escrevo. Desgosto pelos golos roubados a Portugal e ao Paraguay pelo árbitro que sempre favoreceu a Espanha. Pelo que todos vimos, o jogo de ontem estava ganho por Paraguai e o referi quis invalida-lo e assim foi…Grande latrocínio!
    Quanto a educação: quando era pequeno e por ter o nosso pai a sua indústria de fabrico de electricidade ao pé do mar e em área rural, nunca fui a escola, era ensinado em casa por vários docentes até o limite da lei. Aos 11 anos tive que ser matriculado num Colégio Privado, que acabei aos 15 e gostei. Mas, reparei nas perseguições, os maus tratos, a pedofilia. Não entendia nada. Colégio privado e caro, com padres pedófilos. Eu tive a grande sorte de saber sempre todo e ter a família que tinha: fui imensamente respeitado. Essa experiência é a que faz rebelar contra os latrocínios salesianos, maristas e secundários públicos. Como a antiga ministra alinhou mal, é-me impossível não me meter com ela e defender sindicatos, associações de estudantes, como a que eu presidi no Colégio, enquanto a minha mãe, monárquica e muito católica, organizou e presidiu o Centro de Padres. As nossas perspectivas são fundamentalmente diferentes. A seguir, Pontifícia Universidade Católica, presidi a associação de estudantes e todos os verões os levava as Províncias Rurais de San Felipe e Los Andes, onde o meu tio Governador me entregava o mando, ia a sua consulta e eu governava, com 300 estudantes que alfabetizavam com o Paulo (Freire) e uma rapariga que acabou por ser a minha namorada, mãe dos meus filhos, Avó dos meus netos, namorada do líder, que era eu.
    Eis porque não tolero as Rodrigues, o Sócrates e defendo os sindicatos de docentes e estudantes: a minha experiência estudantil foi 300% diferente, especialmente desde que entrei a Edimburgo e Cambridge, onde sem parar, organizei associações e os estudantes e colegas me ouviam e respeitavam, com um Sir Jack Goody comunista, um Maurice Dobb, um George Orwell, todos lutadores da guerra civil de Espanha, excepto Jack: Auschwitz durante 4 anos, e Lord Kaldor e Lord Kahn, fugidos de Estaline desde a Hungria, todos eles socialistas materialistas históricos, que me ensinaram a mim essa teoria.
    Todo junto, fez de mim socialista materialista histórico. Eis que não suporto esse arrivistas como a Rodrigues, Sócrates, que mentem a torto e direito como me pare e ter provado no meu texto que analisa a escola pública. Que sabem eles desta matérias, porque menosprezam aos docentes e aos seus sindicatos…. Não entendo. Apenas sei que estes dois formam parte do pior governo que temos tido, se simpatia e carisma, apenas essa pretensão de dom de mando.. da que nem rasto do que nem sabem como é mandar. A Rodrigues e o Sócrates caíram na minha desgraça e não haverá texto que não mencione estes factos…
    Obrigado Luís, ajuda-me a desabafar. Hoje não vou escrever: jornais e sesta…

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