Carta da AAP

Exmo. Senhor

Ministro dos Negócios Estrangeiros

Dr. Luís Amado

ministro@mne.gov.pt

Cc. gmne@mne.gov.pt

Palácio das Necessidades, Largo do Rilvas

1399-030 Lisboa

Senhor Ministro Dr. Luís Amado:

A Associação Ateísta Portuguesa (AAP) ficou perplexa e indignada com o teor do recente discurso de apresentação das Cartas Credenciais do novo Embaixador de Portugal junto do Vaticano que, no nosso entendimento, aproveitou a ocasião para exprimir a sua subserviência e devoção pessoal à Igreja em desrespeito do seu dever de representar este país laico e soberano.

Assim, a AAP vem junto de V. Ex.ª solicitar que se digne informá-la se o discurso do Sr. Embaixador representa o pensamento do Governo ou se, pelo contrário, foi um discurso que merece a reprovação do Governo de Portugal, por se apresentar o Sr. Embaixador como «o intérprete da arreigada devoção filial do Povo Português à Igreja e a [Sua] Santidade», ignorando o pluralismo ideológico, os princípios de liberdade religiosa, e uma boa parte da população do País que o Sr. Embaixador foi incumbido de representar.

Para o Sr. Embaixador pode ter sido a maior honra pessoal e profissional da sua vida dirigir-se ao «Beatíssimo Padre», mas o embaixador Fernandes Pereira não foi nomeado para representar um grupo de peregrinos. Portugal é um Estado laico, não um protectorado do Vaticano, e muitos portugueses reprovam o mal que as políticas de cariz teológico desta Igreja têm feito à humanidade, nos países onde a SIDA dizima populações, nas posições em relação à contracepção e planeamento familiar, à saúde reprodutiva da mulher, à sexualidade e à igualdade de direitos entre os sexos.

A alegada emoção do Sr. Embaixador com a canonização de D. Nuno Álvares Pereira também não é partilhada por muitos portugueses que, uns pela sua descrença e outros pela sua crença, consideram que declarar milagrosa a cura do olho esquerdo da D. Guilhermina de Jesus, queimado com uns salpicos de óleo de fritar peixe, é uma decisão pouco digna e menos justificável ainda. A AAP reconhece ao Sr. Embaixador o direito de ter a sua opinião acerca desta matéria, mas exige de um Embaixador de Portugal que represente o seu País e não apenas a sua opinião pessoal.

O discurso do Sr. Embaixador ofende muitos portugueses pela linguagem beata e a falta de pudor com que, em ano do Centenário da República, humilhou todos os que dispensam a bênção papal. Ateus, agnósticos, cépticos, crentes de outras religiões, e talvez até alguns católicos, repudiam o pedido que, em nome destes todos, o Embaixador dirige ao Papa para «que paternalmente se digne abençoar Portugal, os Portugueses e os seus Governantes». A prédica foi uma oração rezada de joelhos em nome de Portugal, um acto de vassalagem  individual que fere a consciência de muitos portugueses que o Sr. Embaixador tem a obrigação de representar.

Obrigando a Constituição da República Portuguesa à separação do Estado e das Igrejas, é difícil acreditar que tão insólito discurso tenha sido proferido em nome do Estado Português mas, a esse respeito, gostaria esta associação (AAP) de conhecer o pensamento do Sr. Ministro da tutela.

Aguardando a resposta de V. Ex.ª,

Apresentamos-lhe os nossos melhores cumprimentos.

Associação Ateísta Portuguesa – Odivelas, 31 de Outubro de 2010

Comments

  1. Sandra says:

    Caro Adão Cruz,

    Comparado ao bilhete da aluna do Arnaldo Antunes, essa carta sim é um escândalo.

    Como se não bastasse um vangloriar-se publicamente de sua ignorância, mas juntar-se a outros numa associação exigindo reparos a um ministro de Estado, vê-se que a fama de burros a nossos primos fundamenta-se.

  2. Quais primos?

  3. Sandra says:

    Caríssimo,

    Eu estou em São Paulo, Brasil, de onde, desde criança, eu ouço a lenda da burrice dos portugueses – nossos primos, os quais, estamos a ver diariamente, contaminam-nos do lado de cá do Atlântico.

    A ver também, a contaminação a solapar os bolsos da classe média que é a que sempre paga a conta ao fim ao cabo:

    http://economia.estadao.com.br/noticias/negocios+setor-financeiro,itau-unibanco-lucra-r-3-bilhoes-no-3o-trimestre-e-bate-recorde-do-bradesco,not_41702,0.htm

  4. Caríssima
    Entre a burrice dos portugueses e a espertice dos brasileiros que nós conhecemos de gingeira, venha o diabo e escolha. Está tudo cheio deles por aqui, em todos os cantos, esquinas e vãos de escadas. Mas não é dessa burrice nem dessa espertice que este blog vive. Este blog tem nobreza e sabedoria e trata de coisas sérias, que, infelizmente, não são acessíveis a muita gente…talvez porque são burras… e não sabem. Não há maior ignorante do que aquele que nem sabe o que não sabe.

  5. maria monteiro says:

    subscrevo na integra a carta da AAP
    Maria Monteiro

    Portugal a caminho
    … do Estado Novo

  6. João Paulo says:

    O assunto aqui chamado faz-me lembrar o outro assunto da cor dos pensos rápidos.
    Há gente que à falta de mais que fazer… nada faz.
    Coisas de funcionário publico, certamente.

  7. Amigo João Paulo, por mim não sou funcionário Público. E comparar estes assuntos a pensos rápidos leva-nos a crer que os nossos neurónios são, de facto, fios de fazer crochet.

  8. Maria, o fim do teu comentário mostra que não precisarás de óculos por muito tempo.

  9. João Paulo says:

    Adão,
    Tens razão. Um penso rápido é muito mais útil que esse assunto ou essa coisa .

  10. A. Pedro says:

    Peço desculpa ao autor do poste, Adão Cruz, por, em vez de comentar o assunto, fazer um reparo lateral. Sandra:
    Não sou seu primo, nunca fui, não penso vir a ser. Pode ficar descansada que eu não a contamino, pelo menos com burrice, você não precisa de mais. Generalizações racistas com base em nacionalidade, credo e raça são burrices em que não caio. Além disso já não tenho idade para acreditar em lendas.

  11. xico says:

    Parece-me justo que a AAP proteste contra posições do senhor ministro, alegando a laicidade do estado. Esse argumento era suficiente.
    Não precisava de ficar a saber que a AAP considera indigna a cura da vista de uma anciã, ou que o trabalho que missionários dedicados vêm fazendo em África, conseguindo apoios e dinheiros para as vítimas da Sida, sejam uma desgraça para a humanidade. Será que esses missionários perturbam o trabalho que os associados da AAP vêm fazendo junto daquelas populações flageladas?
    http://www.southworld.net/index.php?option=com_content&view=article&id=319:south-africa-the-churchs-response-to-aids&catid=96:churches-august-10

  12. maria monteiro says:

    atendendo ao valor da vida humana espero que os apoios e dinheiros também cheguem para a distribuição de preservativos. Sempre se evitava a propagação da Sida.

  13. xico says:

    Não faço juízos técnicos com essa ligeireza. Certamente enriqueceria os fabricantes dos mesmos. Quanto ao evitar a propagação, não é assim tão simples, tendo em conta o que dizem especialistas, nomeadamente de Harvard. E não estou a falar da fiabilidade dos mesmos, mas de hábitos. África não é Chelas ou a Lapa.
    Mas se põe a sua fé no preservativo, é consigo.

  14. maria monteiro says:

    tendo em conta o que dizem os não especialistas é uma protecção…. marca a diferença entre andar num carro descapotável ou num com vidros à prova de bala.

  15. xico says:

    Entre culpar a igreja de males à humanidade pela não distribuição de preservativos e ir lá distribuí-los, a AAP fica-se pela crítica.
    Marca a diferença entre ter um bom par de botas para calcorrear montes e vales e umas pantufas para ver a TV.

  16. maria monteiro says:

    por acaso não estava a pensar num bom par de botas mas sim no papamóvel. Onde é que está a Fé quando se necessita de tanta protecção?

  17. maria monteiro says:

    eu culpo a igreja pelo discurso que ela utiliza em relação ao uso do preservativo.

    Sou católica praticante fazendo parte daqueles que continuam à espera do CVii

  18. graça dias says:

    Esta carta da aap – é tao importante como a cultura da batata. Só mesmo ex funcionário publico, ainda a trabalharem no privado. Bem se a menória não me atraiçar!…

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