Ainda as Presidenciais: Coelho, Nobre e o resto

Coelho e Nobre incandesceram a noite das presidenciais. Homens da comunicação social, politólogos, comentadores e gente anónima assim ajuizou. Concordo também, recusando,embora, deter-me na mera constatação dos factos. Há capítulos da história eleitoral para investigar e tentar interpretar as causas do sucesso de ambos. Sim, as causas existem e são diferentes para cada um deles.

Os votos em Coelho, perfazendo 4,50%, foram produzidos por razões demográficas e políticas distintas, se considerarmos a distribuição geográfica dos eleitores. O discurso cru e terra-a-terra, no Continente, rendeu-lhe os votos de descontentamento e do protesto em relação à classe política convencional; na Madeira, onde colheu 39% de votos, abaixo apenas 5% de Cavaco Silva, poderá significar que, naquele arquipélago, o estilo boçal e dominador do Alberto João, apenas, será susceptível de ser combatido com eficácia, se as armas utilizadas estiverem no mesmo comprimento de onda.

Passamos a Fernando Nobre. Tido por  homem bom, mas sofrendo de entropia comunicacional, chegou ao resultado de 14,1%,  o qual até parece ter surpreendido o próprio. Se Nobre comunicava de forma deficiente  e, em reportagens das TV’s, revelava fraca atracção popular, excepto no Bolhão, como se justifica, então, a percentagem de votos alcançada? Uma das explicações, a meu ver, foi ter contado com o suporte da máquina soarista; da qual o rosto mais emblemático foi a mandatária Margarida Pinto Correia – havia sido há anos mandatária para a juventude de Mário Soares.

 

No entanto, o médico Fernando Nobre, ao contrário de Coelho, é um homem com um registo mais complexo de decifrar, tanto na fala como nos actos. Desempenha com talento o papel de quem não diz coisa com coisa; comportamento, aliás, susceptível de induzir em quem o ouve e vê um sentimento de adversativa compaixão: “Ora aqui está um  homem bom, mas …”. A  aparente candura é apenas artificial degenerescência de um alter-ego, este sim desmistificador da personalidade do candidato a Presidente da República – lembro as aproximações à Causa Monárquica. Fernando Nobre é, de facto, uma putativa figura. E Soares e soaristas andaram por ali perto.

Nobre teve o saber de, em 1984, ter criado a  Fundação de Assistência Médica Internacional (AMI), cujos méritos de acções humanitárias em diversos pontos do mundo ninguém nega. Porém, este organograma, de uma organização de superestrutura familiar, pode lançar dúvidas sobre a pureza dos ideais da benemerência praticada. A AMI, com o estatuto de fundação, também vive de dinheiros públicos. Mais concretamente do Ministério do Trabalho e Solidariedade Social e de diversos municípios. Por sua vez, o Relatório e Contas de 2009 revelava que, no final desse ano, a AMI detinha várias participações de capital (página 90 e 91) e obteve um lucro líquido de 2.222.849,88 (página 84). Em Portugal, da Worten à AMI, é comum praticar o bem com a generosidade alheia. Se o dinheiro  servir para beneficiar quem necessite de ajuda, tudo certo. De contrário, tudo errado.

Comments

  1. O que você afirma em relação a Fernando Nobre é um rotundo absurdo. Eu estive ligado à campanha e nunca houve nenhuma «máquina soarista» (esta nunca passou de pura invenção de uma certa comunicação social acéfala e boateira). Toda a campanha foi um esforço de cidadãos (a maioria) anónimos, pela simples razão de que acreditaram no candidato, pelo seu valor humano e por estarem fartos de um regime devorado pela partidocracia. Quanto às valências comunicacionais de Fernando Nobre, você hiperboliza-lhe o amadorismo político com intuito pejorativo óbvio. Conhece Fernando Nobre pessoalmente? Eu fui-lhe apresentado na informalidade de um almoço de apoio, em que a comunicação social só esteve presente para um registo à entrada do candidato…. Durante esse almoço foi óbvio para toda a gente que ali estava um ser humano real, um homem de grande abertura e conhecimento do mundo e não mais um tubarão da política. Quanto à questão monárquica, tantas vezes empolada pela comunicação social para denegrir o candidado – como se ser simpatizante da monarquia fosse pecado de lesa democracia ou doença atávica contagiosa – posso garantir-lhe que não houve qualquer apoio monárquico expressivo. Havia alguns monárquicos, uma dúzia, pouco mais, entre muitos milhares de Portugueses republicanos que, de Norte a Sul, se envolveram na campanha. E se eu me envolvi, posso garantir-lhe, que não foi por ser monárquico, mas porque acredito que um Chefe de Estado não deve vir dos Partidos, mas da cidadania.

    As suspeitas finais que você lança sobre a AMI nem merecem comentário! É evidente que não há nenhuma base factual para o que você afirma em todo o artigo, é apenas um artigo de opinião, e má.

  2. E a insistência na máquina soarista continua. Quando não se vislumbra uma explicação mais complexa coloca-se um rótulo e já está. Caro amigo foram milhares de voluntários que acreditaram em Nobre que o elevaram a valer 2 PCPs.

    Em Vizela não há máquina soarista e o candidato teve + de 13% de votos: 3 vezes o PCP com muitas máquinas, e em Braga há soaristas?

    Mais uma semana de campanha e Nobre discutiria com Cavaco a presidência da república.

  3. carlos fonseca says:

    QUANDO ESCREVI ESTE ‘POST’ JÁ ESTAVA PREPARADO PARA O BOMBARDEAMENTO DAS HOSTES DO NOBRE. TO

  4. carlos fonseca says:

    Sr. Klatuu,
    Quanto à máquina soarista, para além das declarações do próprio, conheço suficientemente no terrreno as estruturas que foram montadas, silenciosa e discretamente – Algarve, Alentejo e Norte. E até conheço vários socialistas pró-Soares que dirigiram várias comissões concelhias. De resto, tive o cuidado de reproduzir uma peça jornalística que dá conta da disponibilidade de Mário Soares para apoiar Nobre – o velho “patriarca da democracia portuguesa”, de resto, tinha contas a ajustar com Alegre.
    Quanto aos monárquicos, v. próprio confirma a existência deles no apoio a Nobre – Uma originalidade portuguesa: ser republicano e monárquico em simultâneo. E já não é novidade.
    Diz que, como outros, foi um apoiante anónimo. Acredito que sim. Com um heterónimo “Klatuu Embuçado”, quem teria coragem de o negar.
    Quanto à AMI, aceda aos documentos para que fiz hiperligação. São da própria AMI. O organograma, no topo, é encimado pelo clã Nobre: a mulher, Luísa Nemésio, a irmã Leonor Nobre, a filha Isabel Nobre e mais um Carlos Nobre que julgo pertencer também à família. Por último, recomendo-lhe que leia e interprete, se souber, o Relatório e Contas de 2009 de uma ponta à outra. Foi o que fiz.
    É pelos políticos que temos e por falsos ingénuos do tipo de FN que participei no maior partido nacional. Sempre fomos cerca de 5.000.000. Valemos quase dez ‘Nobres’.
    DOU POR ENCERRADA A DISCUSSÃO!

    • 1º parágrafo: Nenhum facto: ouvir dizer, diz que disse, fontes na boateira dos media. A verdade é esta: quando Mário Soares soube da candidatura de Fernando Nobre ficou surpreendido – Nobre avançou sem informar ou consultar fosse quem fosse (tanto quando saiba, excepto a esposa). Houve soaristas, como de tudo um pouco, os soaristas não imprimiram nenhum rumo à campanha (aliás, quase sem apoios oficiais e sempre com verba baixo do mínimo exigível – daqui também o «milagre» da votação alcançada). E as contas a ajustar de Soares nunca foram as de Nobre, e isso ficou claro nas suas intervenções.

      2º parágrafo: Simples boutade, e já mais que gasta, que releva de uma falácia. Vejamos: a república não privou os monárquicos de direitos cívicos e políticos (nem de deveres); se um monárquico vota em república esse facto não faz dele um republicano – excepto no pensamento de alguns republicanos e de alguns monárquicos fanáticos e tontos.

      3º parágrafo: Uma aleivosia infantil. Sabemos que não se apoia um candidato com pseudónimos, não têm valor legal em actos do género, tendo-o somente no domínio da autoria se universalmente reconhecidos.

      4º parágrafo: Não há nada de ilegal na AMI e nas suas contas, como demonstra a fiscalização das entidades competentes, desde que a mesma existe.

      5º parágrafo: O voto é livre; mas os eleitores cada vez mais tomam consciência do bipartidarismo rotativo do PSD/PS que tem afundado o país.

      Términus: Que coisa mais maiusculamente idiota, meu caro.

  5. carlos fonseca says:

    Caro José Manuel Faria,
    Fala tanto no PC que até dá a impressão que escrevi o ‘post’ como comunista ressabiado. Não tenho qualquer filiação partidária e abstive-me. Esclarecido?
    Quanto aos apoios soaristas, sei de muitas terras onde eles existiram. Em diversas localidades, através de vereadores e médicos de Centros de Saúde socialistas e pró-Soares. E isto de Norte a Sul.
    O que digo de Nobre é fruto do que conheço da vida e, sobretudo, do mundo médico. São estas e outras que me levaram à abstenção. Aliás, eu e perto de 5.000.000 de cidadãos, fora brancos e nulos. Se somados todos, atinge-se 60% dos eleitores. São muitos e não há Nobre que os convença.
    Cptos.,
    CF

  6. não concordo com tudo o que disse, mas teve um sentido crítico apurado 🙂

  7. (estava a falar do post, e não dos seus comentários.. acho que nos comentários levou demasiado a sério a indignação natural de quem apoia um candidato e vê numa crónica um ataque pessoal)

    • carlos fonseca says:

      Percebi e respeito a opinião. Mas, de facto, há-de reparar que não trato os dois comentadores de modo igual. E cá tenho as minhas razões.
      Cptos.,
      CF

  8. Madalena says:

    Este Senhor Carlos Fonseca tem um grave problema: “dor de cotovelo”!!!
    Deixe-se de fazer ataques pessoais e olhe para si mesmo!!! Qual o problema de soaristas se envolverem na camapanha???? Isso não quer dizer que Fernando Nobre tenha decidido candidata-se “a mando “de Mario soares, posteriormente pode ter recebido apoio de soaristas como de cidadaos anónimos!!! Os politicos que nos têm governado é que levaram o pais ao caos, não foi o Dr Fernando Nobre!!! Que pessoa cinzenta que é !!! Sabia que há pessoas que se preocupam com os outros de forma nao demagógica??? Pois , eu sei que não sabia…

  9. carlos fonseca says:

    D. Madalena,
    Está no seu direito de contestar e de tentar ofender-me. Fique certa, porém, que só me ofende quem eu quero (provérbio chinês).

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