as minhas memórias-11-o meu fuzilamento e pena de morte para mubarak

Víctor Jara, com as mãos partidas pela tortura, morra canta à liberdade

O povo derruba um ditador, frase da primeira página do Diário de Notícias de hoje, Sábado 12 de Fevereiro de 2011. O ditador de mais de trinta anos do povo do Egipto, Hosni Mubarak, renunciou ontem ao seu cargo, que não era mandato, era flagelação dos pobres cidadãos do país das pirâmides, a quem congratulo e digo, como membro de Amnistia Internacional, que ao longo de todos estes anos salvámos muitos cidadãos da morte ou do apedrejamento.

Felizmente, os ditadores acabam sempre assim: escondidos, sem dinheiro – no caso específico, este detinha entre 50 a 70 bilhões de dólares. Todos os bancos,

nomeadamente os suiços, congelaram as suas contas, por ser dinheiro roubado dos cofres do Estado e do povo. Povo que tinha de pagar até se quisesse uma audiência com um burocrata qualquer, enquanto o ditador, proprietário dos transportes públicos, aumentava os preços quando lhe parecia não estar a ganhar o que lhe parecia que era devido à sua empresa, paralelamente, aceitava coimas para contratos com as suas empresas ou para realizar contratos internacionais. Determinadamente, o povo egipcio lutou contra ele, sem disparar uma bala, encabeçado pelo Prémio Nobel da Paz, Mohamed El-Baradei, quem é pensado como o Próximo Presidente do Egipto. Entretanto, os poderes presidenciais foram entregues ao Marechal Mohamed Tantawi, que lidera a junta de militares que governa o país e organiza as eleições de Setembro.

Não há jornal ou noticiário, que não coloque esta dúvida: será que os militares com o poder na mão, abrirão as democráticas urnas para o povo escolher os seus mandatários? Esquecem que o país é islâmico, e palavra dada, palavra empenhada, como legisla o Alcorão, o livro sagrado de muçulmanos e da fé Islâmica. Quem não cumpre o prometido é apedrejado, enforcado ou exilado. O Marechal é um profundo conservador muçulmano que nunca abriu a sua boca para comentários contra o Ditador, é um oficial da elite de Mubarak, mas, durante estes dezoito dias de luta, apareceu, à distância, entre o povo que lutava pelo direito à democracia.

A forma de produzir bens denominada capital, isto é, investir pouco na força de trabalho ou valor variável (os operários), é o que os ditadores, sejam presidentes de uma república, banco, indústria ou empresa, mais consideram, porque é desse capital variável e do trabalho da sua família, que advém o lucro, o valor mais procurado por quem tudo possue. O segredo do enriquecimento de Mubarak, era a posse de indústrias como capital fixo, material, dele. Mas, enganou-se: a fórmula de mais valia não rendeu o que ele esperava, pelo contrário: fê-lo mais pobre do que nos tempos da sua primeira candidatura a presidente. Ora vejamos: Muhammad Hosni Said Mubarak, em árabe محمد حسنى سيد مبارك, (Monufia, 4 de Maio de 1928), militar egípcio, governou o seu país de 14 de outubro de 1981 a 11 de Fevereiro de 2011, quando apresentou a  renúncia ao cargo com 82 anos, após 18 dias de protestos no Egipto. De oficial a vice-presidente da república, houve apenas curtos anos de distância. Licenciou-se quando jovem pela Academia Militar em 1949 e pela Academia da Força Aérea Egípcia em 1950. Assumiu posições de comando na Força Aérea entre 1966 e 1969. Em 1972, o presidente Anwar el-Sadat nomeou-o comandante-chefe daquele ramo das Forças Armadas. O seu desempenho na guerra de Yom Kippur com Israel em 1973 valeu-lhe a promoção a marechal, que lhe foi concedida em 1974.

Em 1975 Sadat nomeou-o para o cargo de vice-presidente. Nos anos que se seguiram, Mubarak esteve envolvido em importantes negociações diplomáticas com outros países do Oriente Médio. Foi o principal mediador na disputa do território do Saara Ocidental, entre Marrocos, Argélia e Mauritânia.

Após o assassinato de Sadat, tornou-se presidente do Egipto, em 1981, sendo reeleito por quatro vezes: em 1987, 1993, 1995 e 1999. Renunciou à Presidência, em Fevereiro de 2011, após quase trinta anos no poder, no meio de sérios distúrbios populares. Fonte: os jornais destes dias e as palavras da Wikipedia  http://pt.wikipedia.org/wiki/Hosni_Mubarak#cite_ref-0. Há poucas fontes sobre o ditador, por ser mal conhecido no ocidente.

Esta revolução sem balas, deixa o Egipto perante dois caminhos: ou é governado pelos militares, ou escolhe um outro membro do partido de Mubarak, o Partido Nacional Democrático, contudo, um terceiro pode aparecer no horizonte se Mohamed El-Barabei for seduzido a candidatar-se. O que duvido. Um Prémio Nobel da Paz não tem as agalhas para a luta armada, como o próprio indica:  É curto o tempo para se recuperar de uma ditadura disfarçada de presidência, para ir às urnas abertas pela liberdade ainda hoje, conquistada.

Mubarak faz-me lembrar a imensa quantidade de ditadores que acabaram os seus dias mortos ou no Tribunal Internacional de La Haia, como Slobodan Milošević, Presidente da Yugoslavia e da Sérvia, morto, aos 64 anos de idade, durante o julgamento por crimes; o antigo General Jorge Videla, da Argentina, em prisão perpétua ou o do Chile, morto réu e em tribunal, só e sem apoiantes. Todos eles, entre muitos outros, morreram despojados dos bens mal havidos, retirados de honestos cidadãos, que mandavam matar e confiscar, para, eles, o seu dinheiro. Não esquecerei a denominada Operação Cóndor, chefiada pelo ditador do Chile,  pactuada com outros, como o do Uruguai, Espanha, Argentina….

Festejar esta libertação, é abrir um caminho incerto para a República do Egipto. Se Mubarak era tão famoso, muito é devido à expulsão dos Cristãos Coptos, como me contara em Edimburgo a minha amiga egípcia, Frida Hadad: um dia estás com eles, no dia a seguir ou meia hora depois, “falas” com um homem assassinado. Ela é cristã copta e solicitou asilo na Grã-Bretanha, país que também me protegia a mim e à minha família.

O fuzilamento não foi uma aventura. Narrei-o no ensaio 1 desta minha colecção de memórias. É possível ver, no campo de concentração, esses soldados assassínios, que levantam quarenta espingardas para nos fuzilar. Como não havia motivo, acabaram por deixar-me vivo num país que no dia anterior era uma democracia, e no dia seguinte, uma perseguição armada dos apoiantes do livremente eleito Presidente da República,  Dr. Salvador Allende. É assim que acontece quando não se sabe o que fazer. O meu amigo Bispo, sobre quem escrevi no ensaio de ontem, salvou-me a vida, conjuntamente com o meu chefe, Sir Jack Goody.

Quantos serão os mortos do ditador do Egipto? Era justo saber para, como Miloseviç e o do Chile, ser  levado ao Tribunal Internacional de Justiça.

Há os factos que gostamos e ficamos contentes: amar e ser amado; há os factos que não se curam nem com psicanálise e provocam-nos pesadelos, mesmo passados quase 40 anos, com esse delírio de perseguição que apenas a morte levará.

Congratulo o povo do Egipto e desejo-lhe a volta à democracia, como foi no Chile, Argentina, Uruguai e, esquecia-me, na Bolívia

Vivam os egípcios, viva a sua liberdade, dure ou não, estamos ainda na bebedeira do triunfo…

Te Recuerdo Amanda

Comments

  1. Olá Rau Iturra,

    Foi no Facebook, graças a este post sobre o Mubarak que te descobri.
    Desculpa o “tutoyement” – mas nestas coisas da net, é o mais prático.

    Serve este comentário para dizer que muito gostei do que li e que, agora que te descobri, e que descobri o teu riquíssimo percurso de vida, espero que a doença não te vença e que, por muitos mais anos, continues a deleitar-nos com os teus escrito, grávidos de experiência.

    Um ciberbeijinho desde França
    DD

  2. Raul Iturra says:

    Bonjour, Dulce Dias ! Jai vous remercie de votre commentaire. C’est qui moi raconte, a étai une très douloureuse réalité. Moi j’y pense qui tous les dictateurs poivraient non seulement être puni, mais fusillée.
    J’ai vous remercie de vôtre commentaire. Il-y – a était terrible pour moi et des autres.
    Je suis habitué de tutoyer les autres, après d’avoir travaillait avec mes amies Maurice Godelier et Pierre Bourdieu dans le Laboratoire d’Anthropologie Sociale. Après la décemment de Pierre, Jai retournées deux fois.
    Mes amitiés à Maurice, Marie-Elisabeth Handman et mon amie Philippe D’Escolá
    Merci par vôtres mots, je suis fière des votre mots
    Mes amitiés
    Raúl Iturra
    lautaro@netcabo.pt
    Estou muito doente e deve ser necesaria uma segunda operação de cancro. Mais…
    à toujours

  3. Hola Raúl !

    Hombre, !que tantas lenguas hablas!!!
    Fico a “fazer figas” para que a segunda operação se passe MUUUUUUUUUUUITO bem e que recuperes – e continues a escrever.

    Un bisou-solidaire
    DD

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