Peidódromo Nacional

Ontem, a noite de Prós e Contras (contra quê?) atingiu o seu pleno e Fátima Campos Ferreira não teve de poupar cordas vocais, coisa que honra lhe seja feita, raramente faz.

A RTP convidou umas tantas sumidades que nos betões daquilo a que se designa por “universidade”, fazem render a faina da recolha do seu marfim. A palavra universidade é por esta gente tida como uma espécie de condomínio medieval e a posse de um testemunho de uma passagem por esse purgatório, permite o mastigar entre risos escarninhos, de nomes com Y, Th, K e citações a bel-prazer.

Refastelado no meu sofá e com a Luna ao colo, fui trincando umas bolachas ricanela, atentamente seguindo um concurso de basófias mais ou menos circunspectas. Abundaram os sobrolhos carregados, os esgares indignados e os sorrisos de contentamento pelo imaginado sucesso da auto-complacente empáfia. Uns tantos remoques “pró do lado” – José Reis e João Salgueiro – e um longo empanturrar de “sonhos, ousadias, quereres e paradigmas”. É claro que não entendi patavina e o rebuscado das receitas era de uma ordem tal, que não se descortinava o peixe da carne, nem os nabos dos alhos e tudo isto condimentado com doses cavalares daquelas bem conhecidas especiarias descobertas algures no século XIX e que tão bons resultados deram nos ruminantes ocidentais. A prova disso, é o constante avolumar de gasosas barrigonas que de vez em quando convém desaustinar através do pipo bocal que na melhor das hipóteses, evita a mais óbvia e usual válvula terminal do sistema digestivo. Para isso, temos as tv’s da “tudoemaisalgumacoisalogia” actual.

Vejamos. Se bem me lembro dos convivas do serão, retenho a voz contristada de um daqueles padres que já não fala “achim”, rendido à resignação pela pobreza alheia. Este bem prega frei Tomás, cozinhou uma autêntica spaghetinada a la putanesca, com os necessários picantes a sugerir o cilício em forma de quentinha barraca nacional colectiva, fazendo ressoar os versos daquela velha canção que gemia sob o modesto peso de um quartinho de primeiro andar, num lar pobre mas sempre a abarrotar de mais alegria. Também se escutaram os ditos de umas conhecidas sumidades de cátedras de outras décadas. Uma delas que escreve Espanha com agá, traçou a pernoca e aproveitou o espaço para desenfardar uns eflúvios de annales, terminando com um infalível ditame da “óbvia proibição” da restauração da Monarquia, claro… Estranho, tal coisa não pareceu assim tão óbvia à atenta Fátima Campos Ferreira.

Também escutei um “filósofo” – são os meus favoritos – de fala tão arrefinfalhada de regueifas e retorcidinhos, que qualquer trabalho de talha rococó, parecerá um artefacto saído do atelier de Saarinen. Trouxe-me logo à memória uma descontínua e um tanto ou quanto caótica melodia de outros tempos.

Podia dar mais uns tratos de polé à cachimónia, tentando recordar algo que tivesse absorvido de toda aquela libertação de gases raros, mas sinceramente, apenas retenho o apresentar de credenciais pela maioria dos pneumáticos presentes. As frases infalíveis em qualquer programa deste género, são aquelas em que o sapiosoentrevistado aumenta o tom de voz e esclarece acerca da sua “gratificante experiência académica no E-S-T-R-A-N-G-E-I-R-O*“, “o sentido prático anglo-saxónico que T-I-V-E* o privilégio de interiorizar” ou para os mais avaros defensores da sua torre natal, “os alunos que na  U-N-I-V-E-R-S-I-D-A-D-E* me têm P-E-D-I-D-O* orientação acerca das possibilidades de pós graduações, mestrados e doutoramentos, entre as quais o estudo da vida bissexual das amibas, consite num aspecto nada desdenhável da nossa plena integração na comunidade científica internacional“.

Não temos arcaboiço ou clima para cortejos alegóricos de Fevereiro, nem mulatas semi-nuas de plumas e á borla pelas avenidas. Quanto a reis-momos, esses temo-los de sobra e pagamo-los em conformidade e à razão de centenas por Palácio. O Sambódromo é coisa tropical, valiosa para cativar turistas e libertar desejos e paixões. Infelizmente não possuímos a alegria e o saber-viver para tanto.

Resta-nos o Prós e Contras, cada vez mais o Peidódromo nacional.

* Não se assustem, pois as maiúsculas representam o súbito aumento de decibéis.

Comments

  1. Artur says:

    Ainda bem que não vi.

    • Albano Coelho says:

      Pois eu, pelo contrário, tenho pena de não ter visto. Infelizmente ainda não nos é possível receber as TVs e Rádios portuguesas na Galiza apesar mesmo de certas recomendações com força de lei emanadas de Bruxelas e que já levaram à aplicação de uma multa ao Estado Espanhol, e da aprovação por unanimidade no Parlamento Galego de um decreto no mesmo sentido. Daquela ainda não se avançou nem um milímetro. Bem sei que em vários âmbitos a nossa modesta (e regional) TVGa produz com melhor qualidade do que as quatro TVs portuguesas juntas. Digo-o com isenção, sem nenhum sentido “nacionalista”, simplesmente por ser verdade. Apenas se compare as séries (“telenovelas”) e a programação (dita) infanto-juvenil e chega-se à mesma conclusão. Ainda assim é fundamental para salvar o Galego a imersão linguística que se poderia proporcionar através dos media portugueses.

      Bom, e já que estamos no tema aproveito para pedir um esclarecimento ao Nuno. “Uma delas que escreve Espanha com agá (…)”. Hummm… Acaso deveria ser “España”? Isso é na língua de Castela… Nós (os reintegracionistas, leia-se) sempre escrevemos “Espanha”, com agá. É certo, quase nunca escrevemos assim pois o normal é nomearmos essa entidade como “Estado Espanhol”, “Reino Bourbónico” ou outros merecidos desqualificativos; é verdade também que por vezes escrevemos “espaÑa” quando nos referimos, por exemplo, aos setores fascistóides do tal Estado Espanhol.

  2. Nuno Castelo-Branco says:

    Não, Albano, ele escreve Hespanha!

  3. José Vaz Almeida says:

    Vi. Como certamente alguns milhares de Portugueses.
    O painel de convidados (adiante designado por paineleiros) esforçaram-se por dar uma imagem de Portugal muito diferente daquela que (infelizmente) tem.
    E digo infelizmente porque nenhum dos paineleiros convidados apresentou caminhos para o futuro, apenas palavras, ocas, desfazadas da realidade em que vivemos.
    Já sabemos que a Universidade e a Escola de hoje, nada têm a vêr com o passado não muito longínquo, em que só alguns podiam ter acesso e só os melhores dos melhores tinham “direito” a levar em frente a sua vida profissional.
    Mas eram outros tempos, tempos difíceis, em que a maior parte dos jovens Portugueses tinham como garantia de futuro uma incursão por terras ultramarinas, territórios entretanto abandonados à sua sorte.
    Mas, voltando ao tema, é curioso verificar que salvo raras excepções, todos os paineleiros convergem numa análise demasiado académica, nem sempre acessível a outros públicos, menos esclarecidos.
    E depois, todos teimam em considerar que a solução da crise, passa, pela “intervenção” da Universidade. Como se da Universidade dependesse o futuro.
    Provavelmente o “seu” (deles) estará em vias de ser comprometido, graças às políticas desastrosas que a nível da Educação foram implementadas desde a famigerada revolução abrilesca.
    E assim se vê a “fauna” intelectual” que temos: banqueiros aposentados, escritores bolorentos, pensadores de primeira apanha, jornaleiros, enfim paineleiros.
    O País somos nós, com todas as vantagens e desvantagens que daí advêm.
    Comparar Portugal com outro qualquer País é um erro profundo. Passamos o tempo a comparar o que não tem comparação. Portugal tem séculos de História, várias vezes manchada de sangue de Homens Valorosos e tem também registo de páginas negras que ficam para sempre a “manchar” a nossa imagem.
    São as manchas da traição à Pátria, do facilitismo, do clientelismo, do abuso de poder, da ditadura dos partidos (a partidocracia).
    Aqui reside o “cancro” que mina a saúde de um País!
    Haverá soluções?
    Claro que há, dolorosas, “tiradas a ferros”, provavelmente na rua, tantas vezes esquecida e tantas vezes proclamada.
    E quando se fala em revoluções, como se se tratasse de uma espécie de shampoo anti qualquer coisa, lembrem-se de procurar nas páginas da História de Portugal o ambiente que se vivia em Portugal antes do ano de 1926.
    Lembrem-se do folclore da 1ª República e do antídoto encontrado para debelar o mesmo “cancro”, o “cancro” de sempre.
    Um País que já não produz (sequer) aquilo que come, um País que continua dependente dos outros, um País que desbaratou a sua frota de pesca, um País que desprezou os seus Agricultores (Lavradores), um País que “acantonou” milhares e milhares de licenciados em listas de espera para a Função (dita) Pública, um País que se preocupa em retirar os crucifixos das escolas e depois ameaça a Família com medidas avulsas, tiradas à sorte, penalizando as Famílias Numerosas, legalizando o aborto e também aí desbaratando os recursos da rede hospitalar que devia estar antes a defender a Vida, um País que “vibra” e chora com o Futebol, mas que não se levanta das cadeiras quando toca o Hino Nacional, um País que recebe hordas de estrangeiros, uns mais estrangeiros que outros, não se importando com o desemprego dos seus, enfim é um País sem futuro, pelo menos se estas condições se mantiverem nos próximos tempos.
    E os próximos tempos vão ser difíceis, não pelas dificuldades, mas sim pela forma como lidamos com as mesmas.
    Concorde-se ou não, o País (nós) só terá viabilidade quando começar a Revolução, mas a Revolução Nacional.
    Até lá vamos “aliviando” a pressão com estes desabafos e com programas do tipo “tu cá tu lá do disparate”.
    Mas a paciência do Povo também tem limites.
    Os senhores do Poder que se acautelem e olhem à sua volta.

    • Artur says:

      Vaz Almeida, está muito enganado se pensa que uma revolução nas ruas iria trazer alguma coisa de util. Precisamos de mudança nas mentalidades e não apenas uma mudança de liderança governativa, e isto não se faz de um dia para o outro nem através das multidões a berrarem nas avenidas. E como a mudança de mentalidades não pode ser forçada ou feita à pressão teremos que ter alguma esperança que até lá, esta democracia não descambe em tiranias daqueles que nos querem obrigar a sermos felizes de acordo com o seu próprio conceito de felicidade e que sabem o que é bom ou e o que é mau para cada um de nós, seja através de nacionais-xenofobismos, de esquerdismos ou do beatismos.
      Quanto aos paineleiros, penso que serão pessoas suficientemente inteligentes para não acreditarem nas próprias lenga-lengas que apregoam…contudo…the show must go on.

  4. José Vaz Almeida says:

    Caro Artur,
    As revoluções nem sempre se traduzem em bem estar imediato e muitas vezes são o início de novos ciclos, de rupturas com modelos de sociedade que asfixiam o cidadão; veja-se o exemplo da revolução portuguesa – a par da liberdade de expressão entretanto restabelecida, veio a catastrófica descolonização – como se pode então acreditar numa revolução?
    Perguntarão alguns?
    Vivemos num País em tudo se discute.
    Dá-se ao Povo o que ele quer, futebol, fado, folclore, férias, festas e por aí fora.
    Permite-se que o poder exija aos cidadãos o cumprimento rigoroso das suas obrigações, sejam elas de natureza fiscal, ou outras, e o mesmo poder no que concerne à sua atitude perante os cidadãos não dá o exemplo, nem quer dar.
    E numa altura da nossa História, em que parte considerável da nossa soberania está posta em causa, não lhe parece, Caro Artur, estarem reunidos todos os “condimentos” para que uma revolução possa eclodir?
    E numa altura em que vêm para a rua milhares de pessoas, tentando reeditar os “fantasmas” do PREC, não lhe parece que basta um pequeno rastilho para provocar um conflito?
    Claro que daí a estarmos perante uma revolução vai uma certa distância, mas veja o que aconteceu em alguns Países, com protestos frequentes, sempre em “banho maria”, e de um momento para o outro o poder caiu na rua.
    Nós, o Povo, não precisamos de um regime que se baseia na liberdade – para a reprimir, que se baseia na livre iniciativa – para a limitar, que se arvora em defensor da riqueza – para distribuir a pobreza.
    E neste momento cerca de um milhão de Portugueses estão limitados na sua cidadania, porque não têm trabalho. Sim, cerca de um milhão, contrariamente aos números que o des(governo) refere.
    E os outros?
    Aqueles que foram enganados com as promessas do “novo-empreendedorismo”, para logo a seguir ficarem na miséria?
    E que dizer a tantos que se sacrificaram durante décadas, nas Empresas que ajudaram a construir, para serem literalmente “despejados” das mesmas, com a justificação torpe de reestruturação empresarial?
    O que por vezes parece “politicamente incorrecto” conforme depreendi da sua crítica, aos olhos do Povo pode ser a sua última oportunidade.
    O Capitalismo pode ter alguma dificuldade em distribuir a riqueza, mas o Socialismo consegue distribuir equitativamente a pobreza.
    E porque de pobres falamos, não esquecemos os pobres de espírito, aqueles que se refugiam em palavreado erudito. Aqueles que se consideram “fazedores de opinião” e que constantemente tentam iludir ainda mais os que lhes concedem “tempo de antena”.
    Quanto às referências que fez em relação a nacionais-xenofobias, esquerdismos e beatismos, penso que numa sociedade que se pretende livre, não faz sentido excluir quem quer que seja; mas quando é o futuro da Pátria que está em jogo, aí sim, devem os sinos tocar a rebate e o povo deve sair à rua, por muito que isso possa custar a certos democratas…..

  5. Hummm … Os senhores forma modestos em soberba … O Padre estava desconfortável. O Filósofo estava excitado pela própria impotência. O Salgueiro tentou Fazer Marketing do ser para ele arrecadar mais ter 🙂 … A Doutorinha colocou bandeira num Facto: ficar com Licenciatura é 1 espécie de ensino Primário, o Prof. Doutor sem Gravata exerceu a sua arrogância Y injectou veneno ( mesmo q tenha algo magnífico Y secreto para ensina, bem pode ficar com a sua sabedoria só para ele q ninguém o quer por perto, o tal clássico pseudo-modesto cagão pela calada ). Pelo meio apareceu um Prof. Doutor generoso não retive o nome …
    Yep. O Reitor da Faculdade de Letras … Limitou-se a nada dizer num infinito citel de palavreado… 1 génio.

  6. José Vaz Almeida says:

    Concluindo, foi uma curta metragem digna de exibição, por exemplo, no “Fantasporto” do ano que vem.

  7. Penso numa coisa: Ó que engraçado seria se a Fatinha se atrevesse a convidar para 1 Prós & Contras 1 único Convidado! Não é tarefa Impossível ( ele é q é capaz de n lhe apetecer). Mas por certo esse convidado que espantaria o Portugal pela genialidade seria o António Franco Alexandre. … Penso muitas vezes nisso qd vejo que nunca lhe é dada visibilidade. Incompreensível este facto.

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