Diz que tal, para eu dizer mal II

Fiquei estupefacto com a veemente indignação que se gerou com a inclusão de Fernando Nobre nas listas de candidatos a deputados do PSD, sendo certo que, ao fim e ao cabo, esse despeito até não seria, assim, tão difícil de prever.

Vamos por partes.

As “auto-putativas” cabeças pensantes deste País enraiveceram-se com o facto de Fernando Nobre ter aceite o convite de PPC. E porquê? Por uma mole de razões cujo fio condutor parece assentar quer no incumprimento do afirmado pelo ex-candidato presidencial, quer na possibilidade do PSD, através duma suposta “baldroca”, estar só a tentar angariar votos.

Quanto ao PSD, o seu Presidente anunciou (muito antes de ser eleito, cfr. livro “Mudar”) o seu desejo de integrar no seu projecto, individualidades que se destacassem pelo seu mérito, fossem ou não provenientes do seu partido ou, mesmo, da sua área política. E é o que está fazer, supondo-se que esta é a primeira “aquisição” e que outras se seguirão. E qual é mal disto? Simplesmente nada. Pelo contrário, é vantajoso quer para o PSD, quer para a Sociedade quer para o País. É positivo, é muito positivo, que o acesso a cargos políticos de destaque se não faça, somente, através da ascensão partidária. É óptimo que aqueles que se vão revelando e relevando pela sua actividade, comportamento e excelência sejam cooptados para participar na gestão pública. E, desde já, rejeito, o argumento que Fernando Nobre não tem essas qualidades, porque a sua vida fala por si. Aliás, e demonstrativo do que verdadeiramente impele estas “virgens” raivosas, é o facto de estarem a ser aduzidas circunstâncias que já eram públicas aquando da campanha presidencial (por exemplo, o organigrama da AMI) e que nunca foram publicitadas. Só agora é que são importantes. Sim, porque um candidato a deputado pelo PSD deve ser muito mais escrutinado que um candidato a Presidente da República. Pois.

Continuando. Disse Fernando Nobre que não se envolveria com os partidos? Disse e não cumpriu. É verdade e é indesmentível. Agora, deve ficar agarrado a essa declaração? É a minha sincera convicção que não. Fernando Nobre deve ter a possibilidade, como qualquer outra pessoa, de mudar de opinião. Tem a obrigação de fundamentar, bem, essa alteração, mas tem o direito de tal lhe ser permitido. Os “irados” que se revoltaram, definem-se, normalmente, como tolerantes e defensores das liberdades individuais. Mas, de vez em quando, mais de vez que em quando, parte-se-lhes o verniz e mandam, às “malvas” a tolerância e a liberdade. É a tal superioridade moral que lhes permite indiciar, acusar, julgar e condenar alguém em público. Pois.

Aliás, nesta altura do campeonato, realmente, o grande crime ético, relevante, foi Fernando Nobre ter assumido um caminho que tinha dito que não percorreria. No pântano delinquente em que mergulhou quem nos governa, no “chorrilho” de aldrabices, fraudes e embustes que tem sido característica do governo deste País, na trajectória corrupta dessas figuras, cujo passado se configura muito mais em cadastro que em currículo, realmente, o facto de Fernando Nobre ter aceite participar num projecto que pretende, não só, afastar essa gente, como também, mudar o paradigma da actividade política em Portugal, faz cair o Carmo e a Trindade. Pois.

O PSD convidou, e bem, Fernando Nobre para integrar as suas listas de candidatos a deputado. Fernando Nobre, e bem, achou que, desta vez, há um lado da barricada em que é preciso estar. Qual é o problema?

Francamente, o que toda esta indignação lembra são aquelas conversas de cabeleireiro em que as protagonistas esfolam a reputação da vizinha. Só que estas “virgens” escrevem e falam melhor.

Comments

  1. Renato says:

    Qualquer um pode mudar de opinião. Aliás, a coerência é uma coisa sobrevalorizada, já dizia o Pessoa. O problema é que não foi uma mudança de opinião, foi mesmo uma mudança de paradigma. O “categoricamente, não”, trasnformou-se em “categoricamente, sim”. É que foi o Nobre que alardeou um imensa superioridade moral, precisamente, sobre os partidos. Surgiu um Homem Novo na politica. Foi com isso que ele conseguiu seiscentos mil votos. Não se queixe ele agora, como virgem ofendida, de que muitos do que o apoiaram por isso, fiquem agora um bocado estupefactos e indignados, e que os seus adversários o ataquem. Quem anda à chuva molha-se e ele é que a atraiu, ainda por cima. Quanto ao resto, se o PSD o escolheu bem, é coisa que se vai ver. Não estou a ver o Nobre e reunir os seus seiscentos mil votos de malta desiludida com os partidos, com os votos da malta do PSD, todos juntinhos de braço dado. Seria uma coisa fantástica e nunca vista.

    • Luís says:

      Não vale a pena andar agora com desculpas de mau pagador amigo C. G. Osório!
      É tal é qual como o Renato diz – as centenas de milhares de votos foram-lhe entregues porque acreditaram nas promessas do sujeito, na tal mudança de paradigma.
      O sujeito não é só incoerente, é também aldrabão!
      Mais um!
      Cumps

  2. Quando o Dr. Fernando Nobre passa de apoiar Durão Barroso para apoiar Miguel Portas é encarado como a nova reencarnação de Cristo na terra ou melhor é visto como o novo Che Guevara (peço desculpa aos BEs anti-clericais que por aqui existem) e aí não tem nenhum problema de coerência nem é um traidor.

    Esta (todas, aliás) esquerda só gosta de independentes se forem ‘compagnions de route’, se forem daqueles independentes que são mais dependentes que os próprios militantes.

    Ganhem ao menos vergonha na cara!

  3. Já não está mal: já só é o “categoricamente” e a malta do PSD.
    Primeiro não foi um “bocado” indignados. O ataque ao Fernando Nobre foi avassalador e, manifestamente, com o único objectivo de o “assassinar” politicamente.
    Segundo, o “categoricamente” é importante, mas não pode ser decisivo. Todos somos livres de mudar de opinião. É, realmente, mais difícil de justificar depois de se ter afirmado “categoricamente” e isso obriga a uma explicação fundamentada. Mas, ninguém pode ficar preso por uma palavra, principalmente, nestes tempos em que é um imperativo nacional, tomar partido.
    Terceiro, gosto imenso da expressão “malta do PSD” e “malta dos partidos”. Alardeia uma superioridade moral interessante. Mais ou menos equivalente à tolerância que demonstra com Fernando Nobre. Principalmente, quando as maiores acusações que se fazem aos partidos é a forma de ascensão dos seus quadros e o serem fechados à sociedade.
    Quarto, se os 600.000 votos não são propriedade de Fernando Nobre, também ele não é propriedade dos 600.000 eleitores, e duvido muito que se em vez do PSD a escolha tivesse sido pelo BE, irrompesse esta indignação. Mas, essa é outra das vertentes da superioridade moral de quem não faz parte da “malta dos partidos”.

  4. António Fernando Nabais says:

    Registo algumas coisas interessantes:
    – pelos vistos, Fernando Nobre deverá explicar por que razão passou do “nunca” ao “pronto, está bem, eu vou”;
    – ao admitir-se que há valores maiores do que o da palavra dada, está a ser admitido que foi quebrado um valor.

    A troca de “camisola” tem tanto mais valor quanto se passa do mais “forte” para o mais “fraco”. Assim, teria muito mais valor a passagem do Passos Coelho para o CDS do que a do Paulo Portas para o PSD, passe o absurdo. A ser verdade que o Fernando Nobre apoiou o Durão Barroso (não me lembro disso, sinceramente) para, depois, apoiar o BE, o comportamento do senhor já é negativo. Do mesmo modo que sou benfiquista e não gosto do que diz o Luís Filipe Vieira, também não gostaria de ter um cata-vento do meu lado político, mesmo que trouxesse votos. Pode ser de mim, mas tudo isto cheira a oportunismo e não à integração nobre de um homem da “sociedade civil”. Independente? Quem, o Fernando Nobre? Um homem que escolhe o partido que vai ganhar as eleições e concorre para ser Presidente da Assembleia? Está no seu pleno direito. Como está sujeito a críticas. Paciência.
    O Carlos Alberto fica agitado quando lhe cheira a esquerda. Não se preocupe com isso, que, deste lado, também pululam figuras de percurso errático, com muito que se lhe diga, desde o exemplo recente do Manuel Alegre (que deve precisar de pagar a campanha e, por isso, lambe as botas a Sócrates) até outros mais antigos como o Vital Moreira ou a Zita Seabra (adenda: nunca votei no PC, mas estes saltos sempre me cheiraram muito mal). Posso não gostar ou discordar de Marcelo Rebelo de Sousa ou de Nuno Melo, mas merecem-me respeito, porque políticos podem merecer-me respeito. Surfistas, não.

  5. Renato says:

    O Carlos pegou no “malta” e achou que eu estava a querer mostrar superioridade moral. Mas isso de “malta” realmente, não significa isso tudo que pensa, não quer dizer grande coisa. Eu até também sou da malta dos partidos. Já fui malta de três partidos e até andei de bandeira. Portanto, sou um troca tintas, sou até moralmente inferior. Nunca cheguei aos calcanhares do Fernando Nobre, que homem mais decente e integro e tudo e tudo, é coisa muito rara.
    Carlos,mais uma vez, o problema não são os partidos. Ninguém ataca o PSD (para além de alguns do próprio PSD que acham que foi um tiro no pé, mas isso é com o partido) Quem se critica é o Fernando Nobre. É que o Fernando Nobre não é “malta dos partidos”. Está acima dessas coisas baixas. Não é assim? Porque se havia de mostrar tolerância? Eu tenho a certeza de que o Fernando Nobre demonstrará quando cá chegar, por a+b que este percurso tem toda a lógica, pronto. Por enquanto, não estou a ver.
    Se a escolha fosse pelo BE, irromperia a indignação do lado contrário, como é óbvio. Há só um pormenor: a escolha não foi do BE. Que se há-de fazer a isto? Diz um ex-assessor dele que houve um contacto informal dele com o PS, mas que não houve proposta concreta (foi isso mesmo que disse), ao contrário do que aconteceu com o PSD. Portanto, não tendo havido nenhuma proposta concreta, aconteceu o quê? Alguém do PS o convidou para fazer uma proposta abstrata (seja lá o que isso for) ou para tomar uma bica e falar do Benfica? Mas com isto tudo, como também é perfeitamente lógico, cabe ao PS provar que esse estranho contacto nunca existiu.

  6. Pedro M says:

    Não tenho uma opinião formada em relação à participação de FN num governo PSD até ao primeiro confronto entre o que me parecem ser concepções fundamentalmente diferentes do que é o Estado.
    Este momento é inevitável, e deverá ocorrer antes do dia 5.

    Existem duas hipóteses nessa eventualidade:

    FN discorda com o programa de PPC e este último altera-o segundo o “seu” cabeça de lista, mostrando que a bem-intencionada e bem-vinda integração de independentes reflecte-se nas políticas do partido, ou então FN discorda e sai, não estando disposto a ser uma mascote independente num programa de governação em que não se revê.

    Ou então FN concorda com todo o programa de PPC e aliena todo o seu eleitorado de inclinação à esquerda- que por esta reacção não será pouco- e terá inevitavelmente de se tornar numa personagem firmemente no centro-direita e sacrificar as suas credenciais de independente.

    Até aí, não sei a minha opinião e qualquer júbilo como neste post ou qualquer ataque como na página de FB do FN parece-me francamente prematuro.

  7. Caxineiro says:

    “no “chorrilho” de aldrabices, fraudes e embustes que tem sido característica do governo deste País, na trajectória corrupta dessas figuras, cujo passado se configura muito mais em cadastro que em currículo, realmente, o facto de Fernando Nobre ter aceite participar num projecto que pretende, não só, afastar essa gente, como também, mudar o paradigma da actividade política em Portugal, faz cair o Carmo e a Trindade. Pois.”

    e para “afastar essa gente” foi enfiar-se no PSD…pois

    Você é engraçado

  8. .. Como é dito, no anterior comentário, pelo Pedro M, a procissão ainda vai no adro.

    Acho necessário e prudente deixar que Fernando Nobre se explique. É necessário ouvir a razão da ou das mudanças; muito embora, realmente, só faça sentido a hipoteca do seu anterior discurso se for para ser, de facto interventivo. E pode, até, acontecer que, na ou nas suas experiências políticas recentes, tenha concluído não serem os corredores e as pessoas que frequentou o terreno adequado à concretização das suas ideias…

    Honestamente, conhecendo a estrutura do País e não conhecendo as ideias de Fernando Nobre, não penso que seja fácil encontrar as pessoas e o corredor certos, porque, mesmo que ameace não parecer, serão sempre os partidos a traçar e a segurar as linhas-mestras —do PSD ou do BE, foi sempre dos partidos que sairam os convites; e não acredito que o tenham convidado por pensarem alterar as suas filosofias, mas, antes, por acharem que no homem reside o suporte moral que angariou 600 000 votos, os quais podem ser úteis à “esquerda” ou à “direita”. Para mim, apenas isso.

    Se dúvidas houvesse —e é possível que ainda haja— o convite foi feito para, se o PSD ganhar as eleições, Fernando Nobre se tornar Presidente da Assembleia da República… Aquilo a que chamo uma “figura decorativa”; que pouco mais faz do que, de cronómetro na mão, controlar os tempos de uso da palavra, dando indicação, a quem estiver a orar, de que deve terminar o discurso; e, dirigindo-se a outro “religioso” na expectativa, dizer que é a sua vez de ser ouvido…

    Ora, por que razão Pedro Passos Coelho não o convidou para primeiro-Ministro?… Bem!…, porque esse lugar, em princípio, será o dele. Quer dizer que, logo à partida, Fernando Nobre não teve escolha, não propôs; aceitou o que, em nome do Partido, lhe propuseram. Os partidos, sempre os partidos.

    E admito —porque admito— que Fernando Nobre não tenha ideia nenhuma; que o seu discurso vago seja apenas isso, o reflexo das ideias vagas de um Homem que teve o azar de criar expectativas. Pode ser que o convite —o tipo de convite que lhe foi feito— seja já isso mesmo, o reconhecimento de que Fernando Nobre não seja capaz de ser mais do que “figura de estilo”; uma alma de onde não virá mal ao mundo… e que, ainda por cima, pode render votos… Pode ser.

    Pela parte que me toca, já não lhe augurava grande futuro, aquando da sua prestação na campanha para as presidenciais. Nunca me pareceu o homem com a força, física e mental, para os combates na área da política. Eu vi, sempre, em Fernado Nobre, uma espécie de Madre Teresa: voluntarioso… mas sem conhecer, minimamente, os caminhos pedregosos da política —mil vezes mais fácil acudir ao sofrimento das vítimas das guerras e de outros flagelos; das crianças ameaçadas de morte prematura, do que litigar entre feras e abutres.

    Acho que as pessoas que se indignam com a mudança de Fernando Nobre estão a ser injustas, porque pretendem que o Homem tem feito tudo calculadamente. Eu acho —eu, pessoalmente— que Fernando Nobre tem estado a ser vítima da sua própria desorientação; de não saber por que ponta lhe pegar. Por ingenuidade e vontade de influenciar o futuro, vai pondo o pé em tudo o que é ramo verde; e penso, inclusive, que alguns daqueles em que acreditou o desiludiram. O que há de mais fácil; Cunhal acabou a lamber as feridas.

    Eu disse, já, por palavras ditas e por palavras escritas, que os estado do País se deve, em grande parte, à incoerência das forças de “esquerda” —mais propriamente, a pessoas de “esquerda”. Foram elas quem teve o País na mão; foram elas que nunca tiveram um projecto; e foram e são muitas dlelas que, discursando à “esquerda”, praticavam à “direita” —deixo o exemplo da Joana Amaral, por ser o protótipo de uma “esquerda” patética, que eu diria ridícula, por tão cheia de pose. Estou em crer, até, que muitos dos meninos que são de “esquerda” nunca se questionaram sobre a proveniência dos dinheiros e dos haveres de que as famílias gozam.

    E terei que lembrar, a este propósito, muitos dos que, investidos por alguma forma da justiça, passaram a dar luta à corrupção, sem saberem(?) que foi possível formarem-se e arranjar colocação, porque os seus ascendentes eram corruptos. A Vida é um campo, imenso, de metáfora e de antíteses…

    Talvez Fernando Nobre tenha tido, outra vez, a ingenuidade de deixar que se vissem os seus zig-zagues… Quem privou com Mário Soares já devia saber como podem os zigue-zagues ser subterfugiados. Deveria saber ser possível ser-se de “esquerda” e aceitar-se, como ex-Presidente da República, as mordomias vitalícias. Dveria saber que, enquanto Conselheiro de Estado, com direito a gabinete próprio, pode na sua fundação, patrocinada, também, com dinheiros do Estado, alugar, ao mesmo Estado, um dos compartimentos por 600 contos por mês —isto foi dito na Comunicação Social, sem que alguém desmentisse.

    Meu Caro Fernando Nobre, permitindo-me acreditar na sua bonomia, se me pudesse ler, eu aconselhá-lo-ia a parar por aqui. Não sabendo, verdadeiramente, quais as suas intenções, se elas são as melhores, poupe-as, porque o País não tem salvação. Lembre-se de Savonarola, e veja se se lembra de quem foi à lenha e lhe deitou o fogo.

    Dir-lhe-ia que esquecesse o Dr. Mário Soares —e outros que tais— e tentasse perceber, em definitivo, de que é feita a realidade; e que soubesse, por último, que não há ninguém vivo capaz de, num ou noutro momento, evitar a incoerência.

    Lembrar-lhe-ia que estou cansado de “esquerdas” e de “direitas”, não podendo, portanto, qualquer que seja o quadrante em que se situe, contar com o meu voto; porque não voto; porque sei como tudo acontece; e sei, também, o que todas as pessoas querem. Se tiver dúvidas, frequente os antros da Cultura ou vá a um estádio de futebol. Veja como, aflitiva e desonestamente, as pessoas querem ser felizes. A verdade e o amor-próprio são o grande empecilho do Instinto.

  9. Ficou estupefacto porque não deve considerar que a hipocrisia seja um problema. Estupefacto ficaria eu se visse menos clubismo político na defesa desse tipo de atitudes. Já que pergunta, eu digo-lhe qual é o problema. Fernando Nobre é um hipócrita!
    Se tiver dificuldade em perceber este conceito moral vá ver num dicionário.

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