Eduardo Catroga é o melhor amigo de José Sócrates

 

Eduardo Catroga defende a mobilidade total. Um professor de Setúbal poderá ser convidado a trabalhar nas Finanças do Porto.

Descoberto aqui.

 

Eduardo Catroga, que terá sido convidado para Ministro das Finanças de um futuro governo PSD, sempre deslumbrado com a modernidade, terá afirmado que o futuro da função pública está na mobilidade, não só espacial como funcional. O funcionário público do futuro estará sempre munido de uma tenda e de uma mochila, porque outros amanhãs poderão cantar. É claro que um governo que se proponha fazer isto àqueles que estão sob a sua tutela, será ainda mais permissivo face às empresas que, qualquer dia, mesmo na Europa civilizada, poderão dispor do direito de vida ou de morte dos seus funcionários

É certo que seria importante conhecer o contexto em que estas afirmações foram produzidas, mas já temos duas ideias absolutamente chocantes:

1. A absoluta falta de sensibilidade relativamente àquilo que é a vida das pessoas. Passará pela cabeça deste senhor que alguém que trabalhe em Setúbal tenha família em Setúbal? Saberá o homem que o Porto não fica propriamente a caminho do Portinho da Arrábida?

2. A ideia de que os funcionários públicos são profissionais indiferenciados e, no fundo, sem qualificações. Assim, um professor pode ser funcionário das Finanças de um dia para o outro, do mesmo modo se pode saltar de uma repartição de Finanças para uma sala de aula?

Entretanto, também é engraçado aquele “convidado”. Já estou a imaginar um diálogo entre o chefe de uma repartição de finanças no Porto e um subordinado:

– Ó chefe, sabe quem é que era mesmo jeitoso para nos ajudar no processamento do IMI?

– Quem?

– O Antunes, um gajo que é professor em Setúbal.

– Pronto, convida lá o gajo!

– Então, e se ele não quiser vir?

– Pedes ao Catroga, que ele explica-lhe.

Para os economistas de pacotilha que nos governam há anos, ultraliberalizando o mundo em gabinetes luxuosos, a economia é um jogo de tabuleiro e não uma actividade que poderá ter implicações na vida das pessoas. O Antunes, eventualmente casado, pai de duas filhas, uma no infantário e outra na escola primária, sócio do Vitória de Setúbal, professor de Matemática e talvez amante de caminhadas pela Serra da Arrábida, terá de abraçar o nomadismo, condição essencial para se ser trabalhador no Portugal moderno. Entretanto, graças a alarvidades destas, José Sócrates consegue enganar mais alguns, fazendo de conta que é o campeão do Estado Social.

Comments

  1. Jaime Marques says:

    “Entretanto, graças a alarvidades destas, José Sócrates consegue enganar mais alguns, fazendo de conta que é o campeão do Estado Social”
    Estava-se mesmo a ver que a culpa era desse ser omnipresente de seu nome José Sócrates!

    • António Fernando Nabais says:

      Pois, foi isso que escrevi: a culpa dos disparates de Catroga é de Sócrates. Boa leitura.

  2. bruno says:

    concordo- a principal coisa a realcar éo PSD nao apresentar ninguém de novo e pior colocar vira casacas mentiroso (nobre) e Catroga, que temmuitas lacunase falhas na sua vida politca. com 10 milhoes de habitantesescolheu logo um quejá la esteve e temváriias ligacoes ao grupo melo.

  3. Há três anos deixei todos os familiares e amigos, à excepção da minha esposa e filha, em Aveiro, e mudei-me para Vila Real. Fui convidado (lá está) para uma micro-empresa (como em “somos dois”), e penámos durante um ano porque a minha esposa esteve desempregada.

    Nos entretantos, foi convidada para um trabalho em Aveiro, que recusou depois de alguma ponderação conjunta – preferimos continuar a apertar o nosso orçamento familiar do que desagregar o nosso núcleo familiar, mas se o orçamento estivesse mais descontrolado, teríamos tomado a opção contrária. Felizmente, a espera compensou.

    Tudo isto que refiro se passa e passou no sector privado. Saí duma (grande) empresa privada para uma (micro) empresa privada. A minha esposa saiu do ensino superior para o desemprego e daí para uma empresa privada. Não vejo porque o sector público há-de ser diferente. Queres, óptimo. Não queres, força aí no sector privado.

    Tempos extraordinários pedem medidas extraordinárias.

    Em suma: não me choca, e até concordo. Afinal, os militares e elementos das forças de segurança passam pelo mesmo.

    • Sr.Nabais, cada um entende as coisas como quer, ou como consegue………É evidente que o senhor só está a fazer um número de retórica, porque possivelmente nem leu a ideia defendida pelo Prof.Catroga, ou o que eu acho mais provável, deverá ser um dos muitos funcionários públicos que tem o “seu” garantidinho ao fim do mês, se entretanto vier o dinheiro dos malvados “troikeiros”, e que foge como o diabo da cruz, a questionar o seu confortozinho, porque quem quiser que seja “mobilizado”……..”Eu é que não”…..É evidente que nos países civilizados onde este tipo de medidas são tomadas, as coisas são feitas com graduação, e não à bruta. O problema é que aqui temos um Partido Socialista de raiz pequeno-burguesa, que tal como Salazar, não quer discutir nada……Mas enfim, tenho esperança que o Dr.Passos Coelho possa pôr o engº Pinto de Sousa, o tal que se licenciou num domingo, na devida ordem, e possa começar a atribulada tarefa (não lhe gabo a sorte), de começar a pôr de novo este País a andar para a frente.

      • António Fernando Nabais says:

        Caro Paulo Lobão

        O que eu li, como deixei claro, foi uma afirmação atribuída a Eduardo Catroga. Não sei o que é um número de retórica: limito-me a comentar o que pude ler. Provavelmente, terá lido outra frase.
        Sou professor e o meu patrão é o Estado, é verdade. Não sei se tenho o “meu” “garantidinho”: espero que sim, tal como espero que aconteça com qualquer trabalhador deste país, porque acredito que o trabalho deva ser justamente remunerado (não sei se considera isto uma heresia). Para além disso, o caríssimo leitor não me conhece de lado nenhum para saber se questiono ou não o meu “confortozinho” (gosta de diminutivos, já percebi), mas da minha vida não lhe vou contar muito mais, até porque não escrevi sobre mim: se se tivesse dado ao trabalho de ler, em vez de estar preocupado com a minha pessoa, descobriria que escrevi sobre todos os que podem ser afectados por um governo que trate as pessoas como números, sem preocupações sociais (sociais tem a ver com “sociedade”, aquele aglomerado feito de pessoas e de famílias, não sei se está a ver…).
        É curioso que, depois, venha defender que medidas destas, num país civilizado, devem ser introduzidas gradualmente. Já não é mau que o diga, embora eu mantenha o que já disse: os trabalhadores do Estado não estão capacitados para desempenhar qualquer função, como pensam os iluminados da flexibilidade e da mobilidade.
        Estou completamente de acordo consigo acerca do PS e de Sócrates. No entanto, parece-me que ambos terão em Passos Coelho e em Eduardo Catroga dignos sucessores e o País continuará a andar para a frente, na direcção do abismo.

    • António Fernando Nabais says:

      Caro Marco

      Quando o Catroga diz “convidado” está a dizer “transferido”, o que implica que não se possa escolher, como o Marco fez. Não me espanta que isso possa acontecer, espanta-me que quem possa vir a governar um país fale de assuntos que podem afectar a vida pessoal dos cidadãos com esta leviandade.
      Também eu já deixei familiares e amigos por razões de emprego. Também já estive desempregado devido a opções pessoais.
      Se me parece leviano olhar para qualquer funcionário (público ou não, como referi) como sendo um número, o pior está no modo como se pode achar possível que um professor possa ser funcionário das finanças, como se fossem tarefas que se pudesse desempenhar indiferentemente (não porque uma seja melhor ou pior do que a outra).
      Noto que a sua mulher tomou a decisão de aceitar ou recusar um convite, em nome de um valor que deve ser valorizado, passe o pleonasmo: a família. As políticas sociais devem fazer o mesmo e não contribuir para a desagregação social ou familiar, sempre que possível.
      O problema dos tempos é que, em Portugal, devido à crise crónica, são sempre extraordinários.

      • Mas vivem-se tempos extraordinários, certo? As medidas sociais ideais têm um limite material nas medidas económicas exigidas.

        Catroga disse explicitamente “convidado”. Aceito que tenha sido no sentido “o seu posto de trabalho será extinto, mas convido-o desde já a ser colocado numa repartição de finanças no Porto”. O funcionário tem sempre alternativa: não aceitar o convite, e tentar a sua sorte no sector privado, como milhares de outros seus concidadãos.

        Passou-lhe ao lado o ponto que queria demonstrar no exemplo da minha esposa: a nossa opção implicou a continuidade no desemprego (e sem subsídio, que nunca tinha descontado o suficiente para isso). Em desespero, que não era o caso, tinha aceite o… convite. Mais uma vez, há sempre opção.

        Finalmente, o exemplo dado por Catroga é linear, assertivo e correcto: passar um funcionário especializado (em práticas pedagógicas, neste caso) para uma função não-especializada (os balconistas das finanças são especializados? se são, a maioria dos que tive contacto não parece). O contrário, como é lógico, não pode acontecer.

        Ainda assim, se continua a defender esse tipo de protecção social, peço-lhe um comentário ao caso dos militares e elementos das forças de segurança – e, já agora, dos políticos, em especial os deputados da AR e do PE.

        • António Fernando Nabais says:

          Se se vivem tempos extraordinários, haverá que aceitar medidas extraordinárias. O problema é que as medidas são sempre ordinárias, recaindo sempre sobre os mesmos. Nestes tempos extraordinários, entre outras coisas, há sempre uma diabolização dos funcionários públicos, erigidos em inúteis de serviço. Os que pagam os erros que levaram a que estes tempos fossem extraordinários não são os responsáveis pelos erros.
          De resto, se discutirmos ideias gerais, e em abstracto, a mobilidade e a flexibilidade podem fazer sentido. Efectivamente, manter artificialmente uma vagas inúteis para garantir empregos é inaceitável. No entanto, mesmo em abstracto, entendo a sociedade como solidariedade e não como competição e acredito num Estado regulador de injustiças ou auxiliador de dificuldades, o que não quer dizer que acredite num Estado omnipresente. É por isso que acredito, também, que o trabalhador deve ser tendencialmente protegido. Acredito, igualmente, que as políticas laborais não podem reger-se apenas por critérios economicistas e confesso que não haja soluções fáceis ou plenamente satisfatórias.
          Saindo do abstracto, temos o problema concreto de vivermos num país em que as decisões políticas têm sido tomadas sempre contra os trabalhadores por conta de outrem. Essas decisões, para cúmulo, são tomadas por uma classe política parasitária rodeada de parasitas que sugam os recursos do Estado, para, depois, aparecerem com soluções para os problemas que criaram, com a desfaçatez de Eduardo Catroga, que já teve oportunidade para governar o país e continua a governar-se a si mesmo.
          O exemplo do professor que passa a funcionário das Finanças continua a parecer-me absurdo por falarmos de funções tão diferentes (mesmo aceitando o seu argumento de que os funcionários das Finanças são menos qualificados, do que duvido, até porque uma qualificação considerada superior pode revelar-se inoperante noutros contextos ditos inferiores). Para além disso, as decisões de fechar vagas no ensino não têm tido nada a ver com critérios efectivamente relacionados com a Educação, ao contrário do que se tem afirmado. Na realidade, o que se passa é que há um desinvestimento na Escola (não só em termos financeiros) que terá reflexos na qualidade do ensino: os vários professores que vão ficar no desemprego este ano são necessários ao sistema. Com catrogas e mariasdelurdes o que nos espera é um abuso acéfalo dos conceitos de mobilidade e de flexibilidade, uma desresponsabilização do Estado numa área em que o Estado deve ser absolutamente interventivo e cuidadoso. Os professores, entretanto, entre muitos outros, continuam a pagar (http://osdiasdopisco.wordpress.com/2010/05/06/empregados-financiam-patrao/).
          Por outro lado, diz o Marco que o contrário (um funcionário das Finanças passar a professor) não pode acontecer. Face à desvalorização da formação inicial e contínua dos professores e face a muita legislação que tem saído, o Marco não imagina como isso pode, efectivamente, vir a acontecer.
          O Marco expôs o seu caso e isso merece-me todo o respeito, como me merecem todos os elogios aqueles que correm riscos e que se empenham nos seus sonhos e nos seus projectos, com pouca ou nenhuma rede e não me esqueci de que a escolha da sua esposa implicou sacrifícios. Não sei é se há sempre opção. No vosso caso, houve.
          Não lhe sei dizer, sinceramente, o que deveria ser feito no caso dos militares e das forças de segurança, mas de certeza que não defendo que tenham menos direito a protecção social. A ser absolutamente necessário que tenham de ser sujeitos a mobilidade, isso deveria acontecer o menos possível e sempre com direito a compensações. Para além disso, segundo o pouco que sei, os polícias são obrigados a comprar a farda e a pagar do bolso qualquer problema que suceda com um carro durante uma perseguição. Não me vai dizer que deve ser assim, porque acontece com muita gente no privado, pois não?
          Os políticos que estão no PE e no AR têm direito a compensações, que eu saiba, o que me parece justo. Não me parecia justo que tivessem direito a reforma ao fim de dois mandatos.
          Entretanto, na minha opinião, aquilo que diz Catroga, na estratosfera abstracta da macro-economia, pode fazer sentido. Na realidade, é uma patetice. Mais uma.

          • Pronto, concordamos então em discordar numa base que será mais ideológica do que outra coisa.

            Especialmente, faz-me confusão que “até porque uma qualificação considerada superior pode revelar-se inoperante noutros contextos ditos inferiores”. Brrr!…

            (e também me faz confusão que a largura das respostas encolham)

            Parece-me, pelo texto, embora conceda que possa ser a fraseologia a fintar-me, que não sabia que isto já acontece aos militares et al; não é “ser absolutamente necessário que tenham de ser sujeitos a mobilidade”, mas sim “já estão sujeitos”.

            Mas, pronto, foi dos melhores toma-lá-dá-cá que tive na ‘Net nos últimos tempos. É um prazer discutir assim.

            (pelo motivo já citado do encolhimento das repostas, vou-me abster de responder a outra resposta sua – é que isto da largura mete-me mesmo muita confusão!)

  4. António Fernando Nabais says:

    Marco, o prazer foi mútuo e também não gosto do encolhimento. Sempre que queira continuar a discutir, comece um novo comentário. Obrigado por passar por aqui.

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