O ritual da legislatura

Quando algo se torna corriqueiro, adicionalmente também ganha a propriedade da transparência. Passa por nós sem tom de surpresa, é ignorado, não choca. Mesmo quando não deixa de incomodar.

Veja-se quem pede esmola na rua, por exemplo.

É também o que acontece com as legislaturas. Há um ritual de acontecimentos que, se tirados do respectivo contexto, nos pasmariam mas, ligados à política, já os tomamos por certos. Do role das nomeações, tantas só porque o lugar existe e porque o cartão partidário é o correcto, aos ostensivos actos de sumptuosa governação, há um role de coisas que nos chocam, apesar de se anteciparem. Têm, portanto um quê de transparência.

É oportuno questionarmos-nos quanto à razão de assim ser.

A primeira constatação é que este padrão é independente do partido em causa. Repare-se no que tem acontecido com a nossa alternância partidária, com as diferentes câmaras municipais e, até, com países onde existiram soluções políticas que cá não tiveram lugar. Em segundo lugar, é claro que estas situações não se concretizariam se o estado não tivesse uma palavra a dizer quanto à nomeação destas pessoas. E por fim, em terceiro lugar, uma empresa tanto pode ser bem gerida, em teoria, no público como no privado.

Ora, não dependendo a qualidade do serviço da natureza pública ou privada do respectivo prestador mas sim de se controlar adequadadamente a qualidade do serviço prestado e sendo o sector empresarial do estado um viveiro de jobs for the boys, porque razão se manifestam alguns partidos de forma tão violenta contra as privatizações? E, por outro lado, até aceitando ruinosas nacionalizações?

O ritual das legislaturas não se resume à odisseia das nomeações, sendo a respectiva denúncia parte integrante. Uns ganham tachos, outros acumulam capital eleitoral. A nós, banais pagantes, resta-nos olharmos sem vermos.

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