O valor do salário

No actual debate público em torno das políticas económicas e financeiras, quer em Portugal quer pela Zona Euro em geral, torna-se evidente que os ditames ideológicos do pensamento económico dominante, enquadram o salário com um mero custo. Por cá, chega-se mesmo a entender que fazem parte de gorduras a eliminar tanto quanto possível.

Esquece a lógica neo-liberal – para quem o lucro é sagrado e o mercado é tudo – que a saúde de qualquer economia se afere pela distribuição da riqueza que se concretiza pelos salários e pelos impostos. Uma economia com algumas grandes fortunas à custa de muitos assalariados remediados não é economia saudável: é escravatura contemporânea.

Tomar o salário como mero custo, é não perceber o quanto ele representa de avanço civilizacional de dignificação do trabalho humano, através da justa retribuição. E é não perceber, também, que a contracção salarial provoca contracção económica, empobrecimento, e consequentemente, mais crise em ciclo vicioso.

Hoje, para além de se continuar a associar salários baixos a competitividade, temos um novo ícone do pensamento neo-liberal para as políticas laborais, que é o aumento de trabalho com igual remuneração, o almejado aumento de produtividade.

Acontece que querer atingir mais produtividade à custa de mais trabalho pelo mesmo salário, é a mesma coisa que desejar atingir o sucesso à custa da dignidade humana. Se assim for, contemplemos, por exemplo, as pirâmides do Egipto, façamos delas um bom exemplo de capacidade produtiva, e apaguemos da memória o facto de terem sido construídas por escravos.

(Crónica publicada na edição de 30/11/2011 do semanário famalicense “Opinião Pública”)

Comments

  1. eurocético says:

    Boa reflexão.

  2. “Mai nada”! Mas há por aí umas quantas bestas que fingem não entender…

  3. MAGRIÇO says:

    “O mundo é de quem não sente! A condição essencial para se ser um homem prático é a ausência de sensibilidade.” Bernardo Soares (Fernando Pessoa) O Livro do Desassossego.
    Possivelmente reside aqui a explicação para a crise de valores que assola o nosso país. Esta classe política emergente é composta por jovens que nunca sentiram na pele as vicissitudes de um regime autoritário que não reconhecia direitos aos trabalhadores nem a quem não fosse alinhado com o pensamento único, que não foram obrigados a ir combater numa guerra em que não acreditavam e que sempre tiveram a vida facilitada por pais que cometerem o crasso erro do excesso de protecção e de liberdade precoce. Esse facilitismo aliado à falta de cultura histórica modelou o carácter ambíguo e extremamente egoísta de uma grande parte da nossa juventude. E é desta massa intelectualmente limitada que saem os mais ambiciosos aspirantes a estadistas, com o resultado e as consequências que todos sentimos na pele.

    • Para não falar nos filhos dos patos bravos (perdão a quem construíu como habitarmos hoje melhor) que foram para a universidade mas nada de universal aprenderam – ou os filhos que desde meninos tiraram a 4ª classe nos partidos políticos, odeiam português e história e nem pensar na matemática porque é demais para os seus miolos que não foram treinados a pensar e a deduzir.E como aulas de moral já passaram de moda – que horror aprender os 7 pecados mortais (e as 7 virtudes) ao menos como curiosidade intelectual – tornaram-se donos das leis que subvertem quando lhes apetecer nem que seja apenas para construir golfs nas áreas protegidas ou aeroportos na OTA ou ainda IPs inutilizando milhares de km de belas EN que já não servem para nada senão pontualmnte – ou abandonar o combóio em favor das IP e da destruição gratuita de paisagens e fertilidade, e da poluição e do consumo de enregias fósséis, ou fazer aterros sanitários gigantescos porque é moderno,que não se quizeram separar previamente, com mistura de materiais orgânicos e inorgânicos a fermentar e deitar molho negro para as ribeiras de água cristalina das nascentes da Aldeia de Bigornes (Bragança), inutilizando a água para uso dos habitantes, dos animais e para a agricultura e acharem que são fantásticos sujando e destruíndo os rios para onde escorre o molho negro, matandos os peixes, numa corrente contínua de situações anormais e de desolação, que poderia ser evitada se houvesse o mínimo de consciência e saber e assim vai todo o país – as leis que existem de protecção do ambiente e das paisagens e de ordenamento do território não interessam e há sempre quem lhe dê a volta para favorecer expropriados e autarquias e construtores – é fartar vilanagem

Discover more from Aventar

Subscribe now to keep reading and get access to the full archive.

Continue reading