Todos contra a Barragem 0,1% – Depoimentos sobre o Douro e o Tua. 8 – Sant’Anna Dionísio (Fim)

(continuação)

« – 83,7 km Macedo de Cavaleiros, est (E); (537 m. de altura)

A via férrea cruza duas vezes a estrada de Mogadouro, seguindo em plano através das extensas folhas de cultivo (milhos, centeios, trigais, pomares, vinhas, campos de morangos), que nos acomoanham, de um lado e outro, mas principalmente do lado da montanha tranquila que se desenha a meia distância.

– 85 km Castelãos, ap. (D.)
Sucedem-se as colinas alongadas, ao mesmo tempo familiares e sem nome. A pouco e pouco, o perfil da serra de Bornes modifica-se. A linha sobe, cortando pequenas trincheiras, ao longo da ribeira de Azibo. À esquerda, ergue-se a ermida de S. Bartolomeu, cuja romaria anual é muito concorrida.

– 89,4 km Azibo, est. (E.)
A partir da Ponte de Azibo, a via férrea obe continuamente. A cada passo se descobrem neste belo pedaço do mundo, tão impressivo, chamado Trás-os-Montes. É ver aquele formoso souto, hermético e misterioso como todas as florestas desconhecidas, vistas de longe.

– 91 km Salselas, ap.
Aqui temos outro aspecto original de Trás-os-Montes, que nada fica a dever, em doçura e intimidade, aos mais sossegados e aprazíveis recantos de qualquer outra província rústica ou montanhosa. Uma bela campina, de altitude mediana, aqui e além soerguida em discretos outeirinhos e mamelões (Outeiro da Carrasqueira, Alto do Moutinho, Cabeço da Vela), distende-se, a perder de vista, à direita de quem sobe. À esquerda vai-se acentuando o volume de outra barreira orográfica. São as faldas da serra da Nogueira.

– 97 km Sendas, est. (D.)
Estamos a 657 metros de altitude.
A serra de Nogueira já se desenha com nitidez à esquerda de quem sobe. Avista-se, relativamente próxima, a aldeia de Fermentãos. Do lado oposto aponta-se Vila Franca e Quintela, onde noutros tempos as pesadas diligências faziam a sua habitual pausa e muda de cavalos.

– 102 km Fermentãos, ap. (D.)
Uma vez por outra, descobre-se, à esquerda, a estrada que segue também para Bragança, em demorados estirões, escoltados por renques de freixos e negrilhos.

– 104 km Salsas, ets. (D.) (789 metros de altitude)
Genuína paisagem da Meseta. Centeios, soutos, matas de carvalhos negrais. Por momentos, a subida abranda. Segue-se em plano, através de uma macia palnura frumentária de altitude. Transpõe-se, em dado passo, a chamada Portela de Macedo.
Ao longe, para os lados do nascente, vislumbram-se as alturas de Além-Sabor, ou seja: as indefinidas larguezas do planalto mirandês e os cerros distantes de Mogadouro.
Aproxima-se o ponto culminante deste demorado percurso ascendente. A via férrea faz uma vigorosa inflexão, cruza a fita alcatroada da estrada e alcança, por fim, a custosa linha da cumeada, em

– 110 km Rossas, est. (D.)
A serra da Nogueira ergue-se nitidamente ao lado, com os seus belos flancos arborizados.
Prosseguindo, agora em descida, entre frondosos soutos e mantas de retalhos de centeio, perfura-se um íngreme cabeço vizinho da aldeia montanhosa de Rebordaínhos. É o túnel de Arufe (225 metros), assim designado por ser cortado à vista da quinta desse nome. Segue-se ao longo de uma extensa cumieira.
Paisagem bastante sinular, com belos tufos de arvoredo e impressivos horizontes.

– 117 km Sortes, ap.
Pequeno túnel à saída da paragem. Acentua-se a descida.
O volumoso arcaboiço da montanha domina-nos de um lado, avistando-se, ao cimo, os torreões dos dispositivos electrónicos da Marconi; do lado oposto, em baixo, estão as funduras verdes de um recortado vale voltado para nascente. Outro túnel (túnel de Remisquedo).

– 120 km Remisquedo, ap.
A linha desce, cortando a cada passo profundas trincheiras. Nos intervalos breves descobrem-se inúmeros soutos, harmoniosos relevos, indefinidos ermos onde, aqui ou além, se vislumbra a mancha movediça e esbranquiçada de algum rebanho, cada vez mais raros, consequência parece que a irreversível da intensa imigração.
Cruza-se a estrada nacional que segue para Bragança. A seguir, transpõe-se um fundego sobre um alto viaduto (de 124 metros).
Nova passagem de nível e novo declive. Estamos a dois passos de Rebordãos, vila antiga e decaída, outrora aforalada e acastelada. No extremo de um extenso segmento rectilíneo, de 3 km, regista-se quarta passagem de nível.

– 125 km Mosca, est. (D.)
Horizontes desafogados no quadrante norte e nascente. Ao longe, avista-se a barreira orográfica leonesa da Sanábria, cujos cumes, numa boa parte do ano, são de reluzente brancura, resíduo persistente dos grandes nevões.
A via férrea afasta-se da estrada nacional, aproximando-se da antiga terra monástica de Castro de Avelãs. Estamos, finalmente, à vista da Airosa e decantada capital do nordeste de Trás-os-Montes. A linha descreve uma larga ronda de reversão, entrando na cidade pelo norte. Eis-nos em

– 133 km., Bragança, estação-terminus da Linha do Tua (670 metros de altitude).

Sant’Anna Dionísio, Guia de Portugal

(FIM)

Outros textos:
1 – Francisco José Viegas
2 – Guilherme Felgueiras
3 – Eça de Queirós
4 – Miguel Torga
5 – Pedro Homem de Mello
6 – Daniel Deusado
7 – Manuel Monteiro
8 – Sant’Anna Dionísio – I, II, III, IV

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Comments

  1. Caro Ricardo

    Parabéns… Excelente trabalho

    O Futuro , os nossos filhos e netos lhe agradecerao, toda a preocupação que teve e tem , em fazer a apologia desta obra épica.. que os “amorfos” de hoje não compreendem…

    grande abraço

    mario carvalho

    Ps disponha sempre

Trackbacks

  1. […] Outros textos: 1 – Francisco José Viegas 2 – Guilherme Felgueiras 3 – Eça de Queirós 4 – Miguel Torga 5 – Pedro Homem de Mello 6 – Daniel Deusado 7 – Manuel Monteiro 8 – Sant’Anna Dionísio – I, II, III, IV, FIM […]

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