O Poço Escondido

Adoro poços velhos, de pedra bonita da idade, rodeados de flores e ervas, transformados em suporte para vasos, tornados lugares belos e deliciosos.
Um dia descobri aquele da foto na minha terra com vista para o famoso castelo medieval que remonta já ao século XI e resolvi fotografá-lo. Passados poucos dias, ao passar por lá outra vez, já não o vi. Fiquei revoltada: tinham construído um muro alto, feio, uma fortaleza, sem graça, egoísta. 
Ainda bem que o fotografei! Agora também é meu e posso tê-lo e vê-lo quando eu quiser.
Lembrei-me agora de O Principezinho de Saint-Exupéry (1900-1944) que diz a certa altura:
 
– Vamos à procura de um poço…
– Então tu também tens sede? – perguntei eu. Mas ele não respondeu à minha pergunta. Disse simplesmente:
– A àgua também pode ser boa para o coração…
(…)
O que torna o deserto bonito – disse o principezinho – é haver um poço escondido em qualquer parte…
 
Aproveite-se, guarde-se, registe-se a beleza que existe ao nosso lado.
Nunca se sabe até quando nos deixam ver de graça as coisas bonitas…
 

Comments

  1. MAGRIÇO says:

    Bonita fotografia, expressivos texto e citação.

  2. marai celeste ramos says:

    Céu – ai que lindo o seu poço e as palavras eu já esquecera mas assim você fez-me lembrar um poço assim de onde se retirava água com um balde e uma corda – mas que ginástica e esforço mas eu nunca fiz isso – e também me lembro de uma mina de água pura e cistalina e se via o fundo e alimentava um tanque de raga que era, também, tanque de lavar a roupa mas que estava sempre limpo e nem se notava o sabão, e não se ria, minha mamã lavava no tanque e estendia a rupo ao sol e cheirava a lavado e para eu não fazer traquinices metía-me dentro do cêsto que mal recordo mas parece-me ser parecido com os cêstos de vime escuro das vindimas. Só sei que “escapulí-me” e embora ao lado dela, caí no tanque, e nem sei que fundura tinha, e de repente ela atirou-se à água para me salvar e ainda hoje sinto que sinto o que senti de deslizar direitinha na água sem mêdo – só deslizar – hoje estou aqui e que bom foi fazer-me recordar tudo isso e também o princepezinho que ainda conservo entre todos os meus amigos cheios de palavras bonitas como as suas – Também me lembro de um poço com os alcatruzes da nora e que lino o som da água a cair, e a mulinha de olhos tapados a retirar água para se viver – Creio que em 2008 ainda vi em Trebilhadouro (aldeiinha fantástica toda em granito do concelho de Vale de Cambra, de casinhas lado a lado com o curral dos animais, igualmente em granito e encimada de grande painel de pedra com a data de construção, uma mina muito parecida àquela do lugar onde vivi, onde não havia electricidade e o despertador era os chocalhos das vacas a comer, pois o Ti Francisco levantava-se cêdo para as alimentar e depois ía para a horta regar por gravidade, quadrado a quadrado de culturas protegidas com cômoros, e aprendi a regar assim e a ver nascer a vida. Não havia vacas loucas e vivia-se completamente ao ritmo do sol e da lua e das estações, e ainda estudei à luz da candeia de azeite pendurada na parêde branca ou assente numa belíssima prateleira a que não liguei senão muito tarde, mas gostaria de ter ainda hoje, e havia ainda o candeeiro de petróleo com que se “passeva” de divisão em divisão, peça bonita que guardei, como guardei um outro, mas extremamente pequenino, de bojo de metal e vidro branco e fosco encaixado num gargalo arrendado – que preciosidade da Vacuum Oil Campany “made in Danmark” – Ai, e tenho também um “biblot” que é um fogareiro a petróleo de cobre já fabricado em Portugal onde minha mamã cozinhava – Como se vivia e se vive hoje, e não tendo saudades de nada, senão dela, recordo porém com ternura como se vivia com tanta grandeza simples e saudavelmente, e sem outras referências que não fossem as do nosso lugar que, igualmente, me permitiu ver os coelhinhos a nascer na palha e a franzir o nariz através da rêde, e os pintaínhos a picar os ovos e a piar logo que nasciam, e o cuidado do Ti Francisco que toda a noite não saía do pé da égua até nascer o pôtro – Pois é, estou a vê-lo mesmo agora lindo vivaço e castanho cor de mel deitado na palha limpa e perfumada de campo. E cá fora a grande figueira e como se abria a cana numa das extremidades para arrancar os figos lá do alto e comer logo a seguir, pois era assim que se fazia, torcendo a cana para o figo se dar, e fazia bem a todos e a natureza estava dentro de nós

  3. Céu Mota says:

    Obrigada!!!

  4. Desconhecida Céu Mota
    Respeito a sua tendência para gostar de poços velhos, e tanto me impressionou a sua comoção estética latente na descrição daquele poço que subitamente se lhe deparou, como a estupenda fotografia que conseguiu. Pela minha parte, sou um apaixonado por castelos, em especial aqueles mais abandonados e menos acessíveis, sem [quase] nenhum retoque do Estado Novo.
    Qual é o castelo a que se refere?

    Post scriptum – Emocionou-me também a descrição daquela vida de aldeia pela [desconhecida] Marai Celeste Ramos. Apesar de ter nascido em Lisboa, em criança passava as férias escolares na aldeia de familiares de meu pai, e por isso senti retratadas as minhas vivências desse tempo e lugar.

    Abraços emotivos para as duas.
    Geraldes Lino

  5. António André says:

    Obrigado por este bocadinho de emoções. Com o teu poço viajei pela infância na minha aldeia: poços, ninhos, veredas, caminhos, lavras, sementeiras….e as gentes…e lá no alto a aldeia e mais além a Senhora das Preces… e a vida a passar tão depressa.

  6. Céu Mota says:

    O «meu» castelo é o de Sta Maria da Feira, agora mais conhecido pela Viagem Medieval que se tem vindo a realizar entre finais de Julho / início de Agosto. Fica o convite…

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