Tempo para preparar aulas: a importância de perguntar

O Público de hoje, na comemoração do seu aniversário, teve como director o filósofo José Gil. É próprio do filósofo perguntar, reflectir sobre o que não se sabe, pensar, até, sobre aquilo que não se pode saber. Assim, o programa proposto pelo director circunstancial do Público é de uma importância decisiva, exactamente porque é compreensivelmente raro um jornal não noticiar o invisível ou o incognoscível. Afirma, a propósito, José Gil:

Vivemos num país desconhecido. Por baixo da informação tangível, dos números e das estatísticas, correm fluxos de acontecimentos inquantificáveis e que, no entanto, condicionam decisivamente a nossa vida. Quantas doenças psíquicas foram desencadeadas pela crise? Quanta energia vital se desperdiça na fabricação da imagem de um rosto jovem necessário exigido por tal profissão? São “dados” incognoscíveis ou imateriais, não susceptíveis de se tornarem informação. São não-notícias.

Como professor, e tendo em conta a destruição sistemática das condições de trabalho da classe profissional a que pertenço, apetece-me realçar a pergunta a que ninguém, a começar pelo Ministério, quer responder:

Quantas horas os responsáveis estimam necessárias para os professores prepararem as lições?

Na realidade, esta pergunta ignorada é fundamental e deveria condicionar qualquer decisão política no âmbito de um estatuto profissional. Nos tempos economeses em que vivemos, é, apenas, um assunto a evitar. Sobre o mesmo tema, já escrevi aqui e aqui.

Comments

  1. Tiro ao Alvo says:

    Eu posso tentar responder a esta questão das horas: um professor ou uma professora que quer ser profissional excelente gasta muitas horas a preparar as suas lições; os que apenas querem cumprir com aquilo que julgam o estritamente necessários, perdem pouco tempo; os professores e as professoras incompetentes, não perdem tempo nenhum porque, pura e simplesmente, não preparam as aulas.
    Ora diga lá se não acertei?

  2. António Fernando Nabais says:

    Pois, então há que dar tempo a todos os professores para poderem ser excelentes e, a par disso, criar, finalmente, um sistema de avaliação capaz. O que se tem feito é retirar tempo aos professores e insistir num sistema de avaliação ineficaz. A consequência inevitável é a da perda de qualidade da Educação.

  3. Tiro ao Alvo says:

    Desculpe lá, porque não me fiz entender: há professores e professoras que não querem ser excelentes profissionais, mas apenas terem um emprego onde se ganha dinheiro. E, a esses, podemos dar-lhe todo o tempo do mundo para prepararem as aulas que eles nunca as prepararão convenientemente.

  4. Tiro ao Alvo, fez-se entender, sim, mas você é que não percebeu bem. Quando falamos de uma profissão qualquer teremos de falar em excelência, ou seja, contar com os profissionais que se entregam de corpo e alma. Logo, a alternativa que apresenta é tonta e inconsequente porque, como saberá, pessoas que querem apenas ter um emprego e ganhar dinheiro há-as em TODAS AS PROFISSÕES. Francamente, considero o seu comentário mal intencionado e obsceno. Haja ALGUMA honestidade intelectual. E já agora, afine a pontaria ou vá ao oftalmologista.

  5. António Fernando Nabais says:

    #4
    É difícil entendê-lo, é. Devo depreender, então, que não devemos conceder tempo extra-lectivo aos professores porque alguns são maus? Ou que só devemos conceder esse tempo aos bons e castigar os maus com mais turmas, piorando a qualidade de ensino? Ou será que devemos criar um estatuto profissional equilibrado que permita que a maioria dos professores desempenhe as suas funções da melhor maneira possível, o que inclui tempo extra-lectivo, formação contínua consistente e um sistema de avaliação rigoroso? Adivinhe qual das três hipóteses corresponde à minha opinião, vá lá.

  6. João Paulo says:

    #1 – A questão aqui não são os professores. São os alunos. Com mais tempo para eles, ganham. Com menos tempo perdem. Seguindo a sua lógica, como os maus professores não usam as horas disponíveis para preparar aulas,tiram-se horas a todos e assim ficam todos a ser maus! Que grande lógica!

  7. Tiro ao Alvo says:

    Sei bem que em todas as profissões há pessoas que apenas querem ganhar dinheiro e que seria bom que toda a gente pudesse beneficiar de “formação contínua consistente”. Quanto aos professores, o que estou mais de acordo, é que sejam todos apreciados por “um sistema de avaliação rigoroso”, por forma a evitar que todos atinjam o escalão salarial mais elevado, escalão que deveria estar reservado apenas para os que perdem muitas horas a preparar as aulas e que, também por isso, sejam, de facto, bons profissionais.

  8. António Fernando Nabais says:

    #8
    Desde que não haja quotas, não me parece mal pensado, em princípio. De resto, beneficiar de formação contínua consistente, no caso dos professores, não é bom, é necessário, é fundamental.

  9. Ou seja, quem deixar de ter vida própria e viver exclusivamente para o ensino, terá direito a uma carreira?

    (Mesmo assim, não sei se quem vai avaliar não achará que dormir menos de seis horas por noite e não ter fins de semana chegará para atingir o nível de excelência como docente… pois como pessoa, concerteza que atingirei o nível de insuficiente.)

  10. Tiro ao Alvo says:

    Não tenha dúvida, Eli, excelente, em qualquer profissão, quer dizer, sempre, muito trabalho e, por vezes, muito suor.
    Mas tenha calma, não é necessário que sejamos todos excelentes – basta que sejamos “apenas” bons, não fazendo de um modo de vida, um modo de morte. Portanto, para se ser bom profissional, por regra, não é necessário, nem é aconselhável, deixar de ter vida própria.

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