Carta aberta a Pedro Passos Coelho

José-Manuel Diogo

Caro Pedro Pedro Passos Coelho, ouvi com atenção o senhor dizer que estar desempregado afinal é bom. Que é uma oportunidade. Sabe que mais? Teoricamente penso que tem toda razão mas, na prática, não sabemos de quem fala.

Li outro dia que os chineses não têm um caractere para crise. Na sua escrita, onde os sinais representam ideias em vez de letras, uma situação de crise é representada por dois símbolos: um representa oportunidade e outro ameaça.

Foi com certeza com base nisto que o senhor se exprimiu publicamente esta semana e, deixe-me que lhe diga, teoricamente, faz todo o sentido. Uma economia com baixa produtividade precisa de empreendedores não de funcionários.

Vi também um estudo recente onde se refere que os recém licenciados portugueses preferem ter um emprego a empreender um negócio. Se a estes somarmos todos os outros desempregados da nossa sociedade o problema fica ainda mais sério pois não há empregos na nossa economia.

Temos pois que empreender. Ter ideias que se transformem em dinheiro e consequentemente em empregos.  Mas meu caro Pedro Passos Coelho, é precisamente aqui que a porca torce o rabo.

Durante gerações, talvez mesmo desde sempre, a escola portuguesa privilegiou precisamente o contrário disto mesmo. A criatividade (processo de germinação das ideias) nunca foi uma coisa muito valorizada no processo educativo. Sempre fomos mais do género enciclopédico. Um  marrão com boas notas sempre foi o arquétipo do rapaz com quem gostaríamos de casar a nossa filha. Que deus nos livrasse de um pintor ou um designer.

Em Portugal 80 por cento das pessoas trabalha por conta de outrem, nos Estados Unidos apenas 30. Se o modelo a seguir é o de uma sociedade empreendedora, estes números, caro Pedro Passos Coelho, não o podem deixar indiferente. Pois é consigo que todos contamos para inverter esta situação. Este é o único caminho: a nossa oportunidade é a educação. Não o desemprego.

É por isto que digo que não sabemos de quem está a falar. Estar ocioso e desempregado é uma oportunidade apenas para quem sabe, e pode, ter tempo para pensar. E esse não é o perfil dos desempregados portugueses. Os nossos jovens licenciados têm, desde o 25 de Abril, um ensino desajustado às necessidades do país e, entre a nossa população activa, menos de 30 por cento das pessoas concluiu o ensino secundário. Uma verdadeira tragédia.

Negócio é uma palavra com origem latina – “negotio” – que quer dizer, como o próprio nome indica, negação do ócio. É sempre da acção que vem o dinheiro.

O problema é que na nossa escola ninguém nos ensina a pensar assim.

Comments

  1. Quem é este tipo?

    Mesmo na batata; é o meu herói da semana.

  2. Tiago Santos says:

    “Em Portugal 80 por cento das pessoas trabalha por conta de outrem, nos Estados Unidos apenas 30.” Gostava de saber onde foi buscar tal alarvidade…

  3. Dora says:

    A única variável referida é a da educação?

    Considero muito redutora esta análise.

    E depois, o ensino tem evoluído muito no sentido de mais criatividade, inovação, trabalho de equipa, etc. Ainda falta muito, é verdade. E as novas políticas educativas vão no sentido de um ensino mais enciclopédico e desfasado da realidade:

    – maior concentração de escolas;
    – maior nº de alunos por turma;
    – retorno à ênfase nos exames.

    Tudo isto prejudicial a aprendizagens que promovam a criatividade, o empreendedorismo, a inovação.

    Quantos estágios a sério são criados pelas empresas, onde os jovens possam evoluir e ter maior contacto com o trabalho?

    Onde?

  4. Dora says:

    Do schools kill creativity?

    (um vídeo muito interessante)

    http://www.ted.com/talks/ken_robinson_says_schools_kill_creativity.html

  5. maria celeste ramos says:

    Pelos vistos não basta o ensino – se não há economia nem actividades inventar emprego só se for para OFERECER algo de borla aos governantes que só sacam e nada consomem PAGANDO – consomem até pessoas e dignidade de quem ainda a tem

  6. David Mendonça says:

    «Em Portugal 80 por cento das pessoas trabalha por conta de outrem, nos Estados Unidos apenas 30»
    Com professores que inventam dados assim, não admira o estado da educação. Informe-se melhor sff :
    http://www.jornaldenegocios.pt/home.php?template=SHOWNEWS_V2&id=555265&pn=1
    E quanto à história do caracter chinês, é só mesmo uma história, http://en.wikipedia.org/wiki/Chinese_word_for_%22crisis%22

  7. Maquiavel says:

    Cheira-me que houve um engano nas percentagens. Vendo as estatísticas da OCDE e quejandos faria mais sentido dizer «Em Portugal 80 por cento das pessoas trabalha por conta própria, nos Estados Unidos apenas 30».

  8. Pedro Oliveira says:
  9. Números completamente errados, “argumentação” sem tino. Não têm por aí ninguém que consiga lamber melhor o cu ao Passos?

  10. Caros só agora tenho tempo para este esclarecimento

    Meu caro Ricardo Campelo de Magalhães

    Por empreendedores compreende-se a soma daqueles que são trabalhadores por conta própria e os empresários (que criam empresas) não apenas as empresas. Acresce que nos Estados Unidos da América a prática fiscal beneficia qualquer cidadão que se constitua uma empresa. Estes dois argumentos explicam os valores escritos no texto original publicado no aventar que pode ser lido em http://aventar.eu/2012/05/16/carta-aberta-a-pedro-passos-coelho/

    Cumprimentos e bom sábado

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  1. […] Original no Aventar (que na minha terra – Minho – se lê “Avental”, mas essa palavra […]

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