Agenda para o crescimento: uma cena tipo coiso

Na Califórnia imaginária do século XIX da minha infância, acompanhei Zorro, o valente mascarado; no Portugal infinitamente merdíocre em que vivo, não conseguimos arranjar mais do que um Zorrinho. O primeiro usava a espada para ensanguentar com um Z decidido o peito dos opressores; o nosso Zorrinho serve-se da caneta de tinta permanente para traçar um Z vaidoso e vão com que finge não oprimir.

Zorrinho, por ser pequenino, descobre, na adenda agendada, uma grandeza épica: depois de ter participado, durante seis anos, numa agenda de encolhimento do país, simula acreditar no poder mágico da escrita e obriga a maioria a inscrever as palavras “crescimento” e “emprego” num tratado orçamental que provocará o inverso, o que será explicado a seu tempo com culpas para a meteorologia ou descobrindo um desalinhamento planetário.

A maioria parlamentar, fantasiando um amuo, atribui-se, também, uma grandeza imaginária, ao aceitar a adenda da agenda, e enche a boca de palavras enganadoramente calóricas como “coesão” e “credibilidade”. Para poder ceder sem transigir, aceita um acto adicional, depois de ter recusado um protocolo adicional, num número triste de circo pobre.

Os cavernícolas de Lascaux, ao que parece, acreditavam que o desenho de um auroque garantia a sua captura: era uma questão de fé. Os politicotes florentinos que vivem entre Belém e São Bento escrevem palavras, sabendo que nunca corresponderão à realidade.

Comments

  1. MAGRIÇO says:

    De facto, esta classe política roça já o ridículo! Tanto alarido e tantos festejos por um odre cheio de nada. Este documento tem o mesmo efeito prático para o crescimento que teve a célebre fatia de bolo-rei de Cavaco.

  2. jorge fliscorno says:

    Muito bom! E lá vamos nós mudar o país (outra vez) com uma lei ou coiso parecido.

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