Professores – o dia mais longo

Nunca o dia 30 de agosto foi tão amargo. E se calhar até foi, mas a memória de professor é mesmo assim – esquece facilmente, tal a quantidade de incompetentes que nos têm transformado a vida num inferno, um ano atrás do outro.

Falta um dia para que meia dúzia de milhares de professores dos quadros saibam uma de duas coisas: em que escola vão trabalhar ou, caso continuem sem horário, que na próxima segunda-feira terão que se apresentar na escola onde estiveram este ano para fazer não se sabe muito bem o quê.

Para os candidatos a um contrato o problema é bem maior e muito pior. Incomparavelmente pior. Uma parte muito significativa vai ficar sem colocação – e quanto a isso, não me parece que escrever por antecipação seja um problema. Como gostaria de amanhã ser desmentido pela realidade.

Os outros, os poucos que conseguirem um lugar, vão vacilar entre o que têm em mãos e outras ofertas a que se candidataram. Ao contrário do que se diz por aí, é possível rescindir e optar por algo melhor.

Tudo isto em cima do acontecimento – o arranque do ano letivo.

De 6ª para 2ª, milhares de portugueses vão ter que fazer as malas, deixar a família e partir. Ainda não sabem se para o Norte ou para o Sul, para mais perto do mar ou de Espanha. Não sabem se vão conseguir alugar casa ou um simples quarto, nem tão pouco o que vão fazer, que turmas ou anos vão leccionar. Nada.

Falta um fim-de-semana para começar o ano lectivo e há mais de 100 mil almas que neste país não sabem o que vão, profissionalmente, fazer na 2ª feira. A Escola Pública merece mais e o país precisa de mais e melhor Escola Pública.

Faz todo o sentido não aceitar este tratamento em silêncio e por isso, na 6ªfeira, às 18h vou estar no Porto, na Praça da Liberdade.

Comments

  1. Miguel says:

    “De 6ª para 2ª, milhares de portugueses vão ter que fazer as malas, deixar a família e partir. Ainda não sabem se para o Norte ou para o Sul, para mais perto do mar ou de Espanha. Não sabem se vão conseguir alugar casa ou um simples quarto, nem tão pouco o que vão fazer, que turmas ou anos vão leccionar. Nada.”

    Infelizmente, muitos outros milhares de portugueses já passam por isto à mais tempo no privado. Muitos já há muito foram despedidos, que é bem pior do que ir trabalhar para longe.

    Vocês, nisto tudo, são privilegiados. E já foram ainda mais.

    • Meu caro Miguel, agradeço o seu comentário, apesar de não estar, de todo, em acordo com a sua argumentação. Se me permite vou explicar porquê:
      1. O factor indecisão é grave para a vida das pessoas, os professores e as suas famílias. É mentira, sabe disso certamente, que qualquer outro trabalhador tenha este tipo de dificuldade de um dia para o outro. Mas, repare a situação é também grave porque mexe com os alunos. Este processo kafkiano prejudica a preparação do trabalho com os alunos – ninguém vai andar nas próximas duas semanas com cabeça (criatividade, por exemplo) para pensar em aulas ou em pedagogia quando tem que procurar casa,quarto, fazer compras, organizar transportes. E o ponto é este: poderia isto estar tudo pronto há pelo menos um mês? Podia. É só isso, percebe?
      2. Despedimento: muitos foram despedidos, logo faz sentido que estes também sejam. É um argumento muito interessante. Tão interessante que nem o comento.
      3. E quanto aos privilégios – refere-se a quê, em concreto?

      Obrigado,
      JP

      • Miguel says:

        1. Concordo consigo. Não estou a dizer que é fácil ter de “começar de novo”. Apenas digo que infelizmente, nesta conjuntura, já muitas pessoas tiveram de emigrar. O que na minha opinião, é um transtorno pior. E se para vós o governo (não temos governo…) poderia facilitar e seria escusado passar por isto, para estas pessoas não há sequer esta hipótese.
        2. Não quis dizer isso. Não conheço ninguém com contrato que tenha sido despedido, e para muitos ainda há a possibilidade de trabalhar longe, em outras escolas. Mas para outros Portugueses, não há sequer essa sorte. Foram para a rua e pronto.
        3. Os privilégios, se se pode chamar isso, são os que refiro acima.

        E obrigado por não me chamar ignorante à partida. Pelo seu post, se você for professor, é de certeza um bom professor.

    • maria says:

      …há mais tempo…

  2. Mónica says:

    Acho incrível como continua a haver tanta ignorância relativamente aos professores e às suas colocações, realmente fazem muita falta mais professores para ensinar este país. Aquilo que se fala neste post acontece todos os anos, há muitos anos. Os professores, contratados e do quadro sempre viveram na incerteza quanto ao ano seguinte. Este ano a diferença é que se tem a certeza que poucos professores contratados terão colocação e que muitos do quadro não saberão o que vão fazer. Mas não se preocupe Sr. Miguel porque há sempre muito para fazer numa escola e ninguém vai estar verdadeiramente desocupado. Quanto ao privado e a sua “vitimização” relativamente aos despedimentos o que acha dos professores contratados que não têm colocação, basicamente estão… despedidos, não é? E muitos sem direito a subsídio de desemprego e mais, durante muitos anos nenhum professor contratado sem colocação tinha direito a esse subsídio sequer…
    Não sei como pode chamar a esta situação “privilégios”.

    • Miguel says:

      ” realmente fazem muita falta mais professores para ensinar este país”.

      Não tenho nada contra, desde que sejam bons professores. E na minha altura de aluno, não eram assim tantos.

      “há sempre muito para fazer numa escola e ninguém vai estar verdadeiramente desocupado”

      Agora talvez. Antes do governo do Sócrates, nem tanto. A ocupação que os professores tinham nas férias de verão era tudo menos preparar aulas. Ou mesmo nos tempos curriculares que para isso serviam.

      • patribeiro says:

        Só faltava mesmo nem direito a férias os professores terem. Não conheço basicamente ninguém a não ser os workaólicos (que até deve ser o meu caso, infelizmente) em vez de pegarem na família e amigos e irem descansar ou aproveitar as férias para se divertirem ou organizarem os afazeres de casa e pessoais, estarem a preparar trabalhos para as empresas, ou indústrias. Já não basta termos perdido um direito segundo a constituição inalienável que foi o subsídio de férias e de seguida será o subsídio de Natal, ainda nem férias de Verão podemos gozar sem pensar em nada e sem trabalhar para a escola que somos apontados. Por favor, menos… esta perseguição aos professores da escola pública também já é demais. Férias essas obrigatórias sempre em Agosto (época alta) e por vezes a família com férias noutras alturas ( os professores não podem escolher o período de férias como muitos trabalhadores) é no fim do mês de Julho e em Agosto e acabou (sempre época alta). Também não vou pedir para mudar, pois compreendo, abracei a profissão pelos alunos e compreendo que não posso de ir de férias de verão no outono como muitos (agora o agosto nem tem sol) pois os alunos não podem ficar sem professores mas que tal em vez de olharem para os professores como os maiores privilegiados do país começassem a ver a realidade. Incrivelmente com tantos privilégios 12 anos contratada e a minha filha diz que não queria que fosse professora, estou sempre a trabalhar, não tenho dinheiro e nem tenho tempo para ela e estou sempre a olhar pelos meninos dos outros………… Ai, deixem-se de acusações e juntem-se a nós em defesa da escola pública que é de todos.

        • Miguel says:

          Não me refiro às férias que todos os trabalhadores têm direito. Refiro-me a férias de 3 meses dos alunos. Mais natal e Páscoa.

          “Também não vou pedir para mudar, pois compreendo, abracei a profissão pelos alunos”

          Realmente não há muito a fazer nesse aspecto. São os ossos do ofício.

          • patribeiro says:

            “Não me refiro às férias que todos os trabalhadores têm direito. Refiro-me a férias de 3 meses dos alunos. Mais natal e Páscoa.”

            A isso se chamam interrupções letivas e não férias, ao que os agrupamentos (pelo menos os que tenho conhecimento) têm mantido um calendário de trabalho intenso durante esse período. Claro que como em todas as profissões existem os bons e os maus profissionais. Há sempre aqueles que vivem à sombra dos outros. Mas não é por isso que se podem chamar privilégios são condições da profissão e que só quem a vive intensamente sabe o quanto é psicologicamente e fisicamente necessárias e obrigatórias acontecer.

            Uma coisa é certa cada profissão tem as suas vantagens e as suas desvantagens e irá ser sempre assim. Eu mesmo com as críticas da minha filha, mesmo com o meu cansaço, gosto muito do que faço mas não gosto do que estão a fazer à escola e aos professores e digo isto duplamente enquanto professora (não sou hipócrita) e enquanto mãe. Sempre respeitei os meus professores e sempre agradeci a presença deles na minha instrução. Se calhar fui uma feliz, ainda hoje estudo e continuo a perceber a importância do conhecimento na minha vida e o valor de todos aqueles que se esforçam para me transmitirem conhecimentos. Como mãe, acredito na escola pública e nos seus profissionais e entristece-me ver o que está a acontecer. e perceber que querem tirar qualidade à escola e passar constantemente esta imagem que a escola são apenas os professores e de preferência a minoria que não representa a qualidade dos restantes. Acordem, portugueses, estão a conseguir dividir e iludir os pais e a comunidade em geral. No fim, quem sairá a perder não são os professores será a sociedade em geral.
            Unir para vencer, pela qualidade da escola pública.

          • Miguel says:

            Eu não concordo com nenhuma política do governo em relação à educação. Não são pensadas, parecem saídas de pessoas que não sabem bem o que estão a fazer, então fazem algo para mostrar….

            Eu reconheço o importantíssimo valor dos professores em qualquer sociedade. Embora também ache que muitos professores não têm noção da sua importância e influência no futuro dos jovens. Tenham noção: VOCÊS PODEM FAZER A DIFERENÇA no falhanço ou sucesso dos jovens.

            Infelizmente, a maioria dos professores, são professores porque na sua altura era emprego garantido. Não há vocação ou gosto, apenas “tacho”. Aos professores a sério, uma vénia.

            O governo também nada faz em relação a isto. Avaliações sem sentido. Cortes sem sentido. Medidas sem sentido. Mas também, nas greves dos professores, não é isto que se discute pois não? É apenas a vossa insegurança e futuro. Não a dos alunos.

        • Patrícia says:

          “Mas também, nas greves dos professores, não é isto que se discute pois não? É apenas a vossa insegurança e futuro. Não a dos alunos.” Não discordo. Sou contratada, recente, e, como é óbvio, não escolhi esta profissão pela estabilidade. Não tenho vergonha de dizer que foi por amor àquilo que faço. Nas greves e manifestações quase NUNCA se discutem políticas educativas. Apenas condições de trabalho, e poucas vezes a dos contratados. Talvez seja por isso que nunca fiz greve. Penso que a maior parte dos professores está (legitimamente) preocupada com o seu posto de trabalho que entes era seguro e agora não tanto. Contudo, devíamos lutar pelas políticas: turmas de 30 alunos???? Não consigo exercer o meu trabalho a 100% quando tenho 30 alunos na sala de aula. E não se falou disto quando a lei saiu. Muito pouco. Só começaram a ver as consequências pela ótica do: “menos turmas, menos horários”. Ja para não mencionar tantas e tantas outras políticas que não visam a instrução, mas a estatística.

          • Miguel says:

            Não podia estar mais de acordo consigo. É exactamente isso que quero transmitir.

            Nota-se pela quantidade de “não gostos” que recebi, que os professores estão revoltados. Não pela educação, mas por si mesmos.

  3. Por ser a minha realidade JP… conseguiste comover-me!!
    Beijinho colega.
    Isabel

  4. bruno says:

    Sr. Miguel, sou professor e este ano estive colocado durante 5 meses e meio numa escola a 130 km de casa. Já não me vou referir à distância (já estou habituado e até já estive mais longe de casa) e à instabilidade, mas sim ao facto de para além de não receber subsídio de férias nem de natal e de um corte de 5% no vencimento, nem sequer tive direito à indemnização pela caducidade do contrato, coisa que no privado toda a gente tem direito. Quais são então os “privilégios” a que se refere?

    • Miguel says:

      Não vamos falar de direitos… Não são iguais entre privado e público.

      Eu no meu trabalho sou muitas vezes obrigado a ficar a > X000km da minha casa, durante várias semanas. Mesmo com contrato sem termo, se a empresa falir eu venho para a rua e pronto. Tenho de procurar emprego noutro lado.

      Privilégios? Apresentem-me um professor do quadro que tenha sido despedido.

  5. Joana Alves de Sousa says:

    Deveria ser requerida (e ministrada) uma formação específica para se desempenhar a carreira de professor (à semelhaça do Magistério Primário) pois muita gente tirou um curso superior sem saídas profissionais e por isso concorreu ao ensino e foi-se acomodando como pode a uma situação incerta por vezes ao longo de dezenas de anos e agora reivindica o direito à carreira profissional mais por antiguidade do que por vocação. Enquanto houve dinheiro as coisas foram corem mais ou menos bem mas agora que as carências obrigam a cortes os números impressionam. E a triste realidade é que mesmo assim ninguém quer abdicar de nada nem mesmo de um inútil pretenso serviço público de televisão que custa centenas de milhões por ano a um exercito de opereta sem qualquer importância para o país mas que dá de mamar a uns 50 generais e almirantes. Somos pobres mas continuamos a sonhar que somos um país de ricos. E como tal corta-se onde não se deve para distribuir o mal pelas aldeias: Corta-se na saúde, na educação, na justiça. Tem que se fazer escolhas mais acertadas senão é o futuro que está em causa.

    • Raquel says:

      Joana, concordo plenemente. Há vários anos que digo isto e recebo olhares de desaprovação…. coitados! O governo deixa, tu nao farias o mesmo??? Etc… Porque raio é que um adogado, engenheir ou arquitecto pode dar aulas?? Porque não existe Ordem dos professores, enquanto foi bom toda a gente se diziz professor…… agora que estamos nesta situação os eng. arquitectos, etc voltaram às suas áreas…. quem estudou para professor tem de aguentar, já que não podemos concorrer nem tentar outra área…. E para a sociedade o problema é nosso, não se iludam, ninguém tem a consciência do ridículo que é o concurso de professores todos os anos se nunca o usou.

  6. patribeiro says:

    Miguel: eu luto por tudo. até sou professora, mãe e cidadã, mas entendo o seu desabafo em relação a alguns dos objetivos de algumas pessoas quando fazem greve. Apoio o sucesso e a equidade entre todos. Aproveito e deixo um vídeo que considero muito importante: http://www.youtube.com/watch?v=pEZrHPo_3I0 . Bem haja, a todos aqueles que defendem uma escola de e para o sucesso e pela equidade social.

  7. Sousa says:

    Colega João nunca li um texto que, de forma tão objectiva e clara explicasse a situação dos professores neste país, principalmente nesta data. Eu, Graças a Deus tive a sorte de não ter que concorrer este ano mas para o ano lá estarei nas mesmas condições. Por já ter passado por esta situação tantas vezes, por saber a angústia que é não saber o nosso destino e porque sempre defenderei a honrada profissão de professor, estou de alma e coração solidária com todos os colegas que amanhã irão saber o que fazer da vida ou não. E, claro mais ainda com os colegas contratados. Parabéns pelo excelente texto. Boa sorte a todos.

  8. Colegas, estou solidário com as vossas angústias. Um governo que trata assim que tanto deu e dá ao país, imagino o que fará a quem nada deu!Quanto a si Miguel, lamento que não seja capaz de entender o drama que muitíssimos professores passam neste ,momento!!!

  9. Sou (é melhor dizer fui, ainda não me habituei) professora contratada desde 2001 e alguns dos comentários que li não me deixam indiferente.. Escrevi um post no meu blog que reflecte o que sinto em relação à forma como fui tratada pelos sucessivos governos. Não deixei nada por dizer, porque há coisas que têm de ser ditas, na ânsia de que doa menos. Deixo o link http://agoradigoeu.wordpress.com/2012/08/26/porque-os-bois-tem-cornos-e-ha-coisas-que-temos-de-chamar-pelos-nomes/

  10. clementina says:

    Boa tarde começo por dizer que sou a favor de todas as lutas justas seja qual for a área em que as pessoas se sintam lesadas, no entanto queria apenas colocar uma pequena pergunta que ainda não vi colocada, quando no governo sócrates, milhares de professores vieram para a rua combater contra a avaliação de desempenho(com as suas justas razões), a senhora ministra da altura ficou sem apoio, foi uma situação especifica em que se viu toda uma classe verdadeiramente unida, no entanto……agora….salvo melhor opinião, a classe está a ser totalmente depauperada dos seus efetivos, está em causa um bem maior que é o emprego que todos temos direito de lutar por ele para o conservar, pelo menos, e no entanto não vejo sindicatos, associações, “geração espontãnea” a vir para a rua e juntarem-se como naquela altura, para fazer valer a sua dignidade que é lutar pelo seu trabalho, como em qualquer empresa privada (já que colocram essa comparação). acredito que os diferentes sindicatos dos professores, estejam a tentar o “que podem e não podem”, nos bastidores para conseguirem alguns resultados mais positivos. Mas o que movimentou a sociedade naquela altura, a visibilidade que as suas reivindicações tiveram, agora……….!!!!!, os pais nem sequer se pronunciam!!!!!, se não fosse alguns orgão de comunicação social (em nota de quase rodapé) comentar o assunto, este pssava despercebido. É verdade c crise é para todos, é verdade a troika tá cá, é verdade q o governo só tá a cumprir a checklist da troika, é verdade q desemprego toca a todos, mas…bolas!, mesmo a nivel dos professores q pertençem ao quadro há décadas, os seus lugares estão ameaçados, daí alternativas??? não vejo essa luta pelo emprego, como qualquer privado….! Desculpem o meu “grande desabafo”

Trackbacks

  1. […] sem coragem para recorrer a este expediente, o governo lá vai procedendo ao abate do Estado, dos professores, dos doentes e de outras excrescências equivalentes. Não chego a perceber se se trata de gente […]

Discover more from Aventar

Subscribe now to keep reading and get access to the full archive.

Continue reading