A crise explicada às crianças

Era uma vez uma família que tinha 100 euros. Viviam felizes – os pais trabalhavam e os filhos andavam na escola. O Rex era o cão da casa e o Tareco era o gato.

Não eram nem mais nem menos do que outra qualquer família da sua terra, a terra das pessoas felizes.

Na televisão iam ouvindo que uns senhores, lá longe, na cidade, onde toda a gente vestia fatos cinzentos e gravatas azuis, andavam a fazer grandes negócios. Faziam coisas grandes, coisas muito grandes. É verdade que também faziam coisas menos grandes e algumas até muito pequenas.

Mas, de uma maneira ou de outra nunca usavam o seu dinheiro. Pediam emprestado. Iam aos bancos e diziam que precisavam de dinheiro para fazer uma rua nova. Faziam de conta que a rua custava 1000 euros, quando ela só custava 500. O Banco emprestava e eles faziam a rua por 500 euros e ficavam com os outros 500 só para eles. Muitas vezes os Bancos que emprestavam eram também parte do grupo que ia fazer a rua nova, mas isso explicamos mais tarde.

Mas, sabemos todos, quando pedimos uma coisa emprestada, temos que devolver. Certo?

Errado.

A família da terra das pessoas felizes não pediu nada emprestado a ninguém. E ainda tem os seus 100 euros.

Houve um dia em que os Bancos exigiram aos senhores dos fatos cinzentos e gravatas azuis o dinheiro que lhes tinham emprestado e que, claro, eles não podiam pagar, como os Bancos sempre souberam – eles tinham pedido dinheiro, mas tinham gasto o dinheiro todo em carros, em férias, em  pulseiras e em roupa.

E foi nesse dia que os homens dos fatos cinzentos e gravatas azuis se lembraram de começar a tirar o dinheiro das pessoas felizes. Elas, que não pediram nada a ninguém, se sempre trabalharam e sempre pagaram o que tinham a pagar.

A família começou por dar parte dos seus 100 euros, mas exigiram mais e os 100 euros não chegaram. Como os homens maus fizeram isto a todas as famílias, houve muita gente que ficou sem dinheiro para comprar comida nos supermercados e eles tiveram que fechar. Muita gente foi então despedida. Aconteceu isso ao pai da família da nossa história.

O Pai não encontrou trabalho e a mãe ficou doente – eles não tinham dinheiro para pagar a sua casa e tiveram que a deixar. Foram viver para casa dos avós – o Tareco e o Rex tiveram que ficar na rua porque não cabiam em casa dos avós.

Não tinham casa, não tinham emprego, não tinham dinheiro.

Deixaram de sorrir, deixaram de ser felizes.

Até o céu, quase sempre azul, ficou cinzento. Choveu.

Os filhos comiam na cantina da escola, onde cada vez mais gente comia. Nunca  a comida da cantina pareceu tão boa. Até a escola parecia mais bonita, apesar de terem visto na televisão que para ser licenciado e viver bem bastava ter um fato cinzento e uma gravata azul.

Os pais e os avós tinham cada vez mais dificuldade em ter dinheiro para comer e até houve dias em que não havia, no único supermercado aberto, comida para comprar.

Os homens dos fatos cinzentos e das gravatas azuis insistiam em tirar coisas aos mais pobres, que agora eram todos.

Houve então um dia em que as pessoas tristes decidiram recuperar o seu TESOURO.

Saíram todos à rua e foram dizer aos homens maus dos fatos cinzentos e das gravatas azuis que estava na hora de partirem e deixarem de roubar as pessoas, agora tristes.

Os homens maus dos fatos cinzentos e das gravatas azuis ainda tentaram explicar que não eram eles os culpados, que eram os estrangeiros que os obrigavam – que era só esperar mais uns dias e tudo ser iria resolver. Mas as pessoas tristes, que começaram a ver o sol a brilhar, não acreditaram em mais mentiras!

O sol voltou a brilhar e a Terra das Pessoas Felizes poderia voltar a existir, desde que as pessoas não voltem a acreditar nos homens maus dos fatos cinzentos e das gravatas azuis.

Comments

  1. Nacionalista says:

    Falta o resto da história:
    Então as pessoas ficaram felizes mas começaram a ficar confusas: como é que íam organizar agora que os “fatos cinzentos” se foram embora?
    Foi então que surgiram umas vozes: eu ajudo, eu sei como, os “fatos cinzentos” eram malvados e nós vamos ajudar! Nós estivemos nos outros países e vimos como se faz! Aqueles malvados disseram-nos para sair do nosso país mas nós voltámos!
    E as pessoas – que só queriam trabalhar e voltar para suas casas continuar com a sua vida de sempre – aceitaram. Aquelas pessoas que estavam a gritar queriam ajudar – que mal poderia isso fazer?
    Mas o que as pessoas não imaginavam (porque andavam muito preocupadas em recuperar a sua rotina) era que essas vozes eram fatos cinzentos disfarçados de pessoas como eles.
    E assim, passado pouco tempo, já os novos fatos cinzentos andavam a pedir dinheiro para fazer coisas às quais ninguém via utilidade. Mas eles diziam que era bom e todos os deixavam estar.
    Passado pouco tempo estavam todos na miséria outra vez.

  2. João Paz says:

    Excelente alegoria João Paulo.
    De facto as “pessoas dos cem euros” NADA têm a ver a ver com a dívida dos “casacos cinzentos”.
    Por isso SÓ REPIDIANDO A DÍVIDA que não é deles é que podem ver-se livres destes “casacos cinzentos” ou de outros “casacos cinzentos” que queiram aproveitar-se da miséria das “pessoas de cem euros” para os levar de novo à miséria.

  3. patriotaeliberal says:

    O Ulrich

    Depois de ter insinuado que o melhor era “refundar” o Estado Social, a Constituição e o Tribunal Constitucional, o Ulrich vem agora afirmar que ainda temos de sofrer mais austeridade. “Não podemos? Ai, podemos, podemos!”, afirmou ainda há pouco que eu por acaso ouvi.

    O que anda a fazer correr o Fernando Ulrich? O que é? O que é?

  4. Explicado de um modo simples e sem os palavrões que caracterizam as conversas de adultos.
    Cumps

  5. JotaB says:

    NO DIA EM QUE ACORDARMOS, OS HOMENS MAUS DE FATOS CINZENTOS E DE GRAVATAS AZUIS NÃO MAIS DORMIRÃO!

    Nós Portugueses – Impostos

  6. almaria says:

    É preciso pôr o Ulrich a pão e água…
    O que esta besta diz e a forma como o diz são um verdadeiro atentado às pessoas!
    Este “iluminado” é um terrorista.

  7. almaria says:

    Espero sinceramente que não aguente.
    E que se cale de vez.
    E, já agora que seja obrigado a devolver ao Estado e aos contribuintes portugueses o que banco dele tem andado a receber. Dava para fazer muito.

  8. Dora says:

    E ninguém saiu da sala quando o banqueiro proferiu estas palavras?

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  1. […] quando tento explicar a crise a quem vê o mundo nessa simplicidade, tenho dificuldade em explicar algumas coisas. É verdade […]

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