Os professores explicados aos não professores (II)

Escrevi há dias sobre o facto de Nuno Crato estar a despedir professores à custa de menos escola – é verdade que a Escola Pública tem hoje menos, muito menos, Professores, mas isso foi conseguido, fundamentalmente, à custa de menos horas com os alunos.

Por outro lado, Nuno Crato não conseguiu mexer na pérola que Maria de Lurdes Rodrigues deixou na escola pública – a burocracia.

O comentador falou em acabar com o MEC, deixar para os professores a tarefa de “ensinar”, seja lá o que isso for, mas a verdade é que tudo continua na mesma, para não dizer pior.

E, na Escola, a Burocracia manifesta-se de muitas formas, mas tem como principal argumento a necessidade da cadeia de comando se defender do chefe, isto é, quem está abaixo justifica-se ao de cima e de papel em papel fica para trás o mais importante – educar.

Trabalhar no 1º ciclo não é o mesmo que ensinar no secundário, tal como ser Professor de Educação Física não é o mesmo que ensinar Filosofia. Mas há três momentos cruciais no trabalho de um professor: a aula propriamente dita e dois momentos associados, um antes, o de preparação e um depois, o de avaliação.

Ora, para fazer um trabalho sério e exigente, como deve e tem que ser a Escola Pública, cada uma destas dimensões tem que ser real, tem que existir e quanto mais consolidadas forem, melhor será o trabalho.

Pois bem, a dimensão burocrática que MLR introduziu e Nuno Crato continuou, associada à nova tarefa de tomar conta de canalha, vem trazer o horário de trabalho dos professores para uma área que não é sua, isto, considerando a sua matriz profissional.

Estamos a ser pagos para tomar conta de miúdos, estamos a ser pagos para preencher papeladas quando deveríamos estar a preparar aulas, a ler livros, a pesquisar na net, a reunir com os colegas para preparar o trabalho, etc., etc…

Sem este tempo para estudar, para pensar, para planear, a qualidade da aula (o momento chave de todo o processo) é, sempre pior – uma aula de improviso pode acontecer uma vez, mas não pode ser parte da rotina. É claro que todos sabem as matérias que têm para dar e chegar à sala, abrir o livro e fazer uns exercícios, todos conseguem, mas a pergunta é: os alunos aprendem?

Todos os alunos aprendem?

Neste momento, haverá leitores do Aventar a pensar que nem todos poderão ser Doutores – pois se calhar, mas pelo menos todos podem tentar, não?

Quando eu não tenho tempo para preparar um aula e depois a coisa sai na base do improviso são os alunos com mais dificuldades que vão ficar a perder – estamos, por isso, a acrescentar problemas às dificuldades.

Nuno Crato está a fazer MENOS escola quando despede Professores e está a fazer PIOR escola quando obriga os restantes a perder tempo precioso à volta de burocracias sem sentido.

Já sei, é a TROIKA e o Gaspar que obrigam.

Mas, só é obrigado quem quer, não?

 

Comments

  1. maria says:

    Se o sr. professor doutor Pedro geógrafo ler isto vem já argumentar o contrário. É que o sr. Pedro simpatiza muito com o MEC

  2. omaudafita says:

    Podes ficar com as jóias, o carro e a casa
    Mas não me avalies.
    E até as contas do banco, e a casa de campo,
    Mas não me avalies.
    Podes ficar com o resto e dizer que eu não presto,
    Mas não me avalies.
    Tira-me tudo na vida, e o mais que consigas,
    Mas não me avalies.

    • luis says:

      Não sabes ler?
      “há três momentos cruciais no trabalho de um professor: a aula propriamente dita e dois momentos associados, um antes, o de preparação e um depois, o de avaliação.”
      Agora, preencher papelada (ADD) tem muito pouco de avaliação, lá isso é verdade.

      • isto não é avaliação nenhuma, é uma perseguição ao professor, simplesmente. mas quem tem talas nos olhos como omaudafita esquece-se que o trabalho que tem sido feito até aqui nas escolas é apenas para a destruir. e se fosse mentira quantos alunos não desistiram já e não é só universitários. e quantos profs estão no olho da rua, e quem disse que quanto menos melhor?

        • omaudafita says:

          Talas nos olhos deves ter tu… Aproxima-se a dança das cadeiras para os vinculados. Quem não tiver colocação vai parar à mobilidade, mas nem assim os professores se manifestam a sério contra este governo… Dá para entender que é uma classe profissional mais dada a obedecer ao pau do que à cenoura, e nisso de pau a direita sabe jogar com mestria.

          • João Paulo says:

            Tenho pensado muito nisso e acho que há são duas as razões: há profs, de direita, que estão do lado de Nuno Crato e o MEDO, muito medo hoje nas escolas… medo… MESMO!
            JP

    • Estamos todos para perceber o que é que a avaliação docente – depreende-se dessa pimbalhada que escreveu – tem a ver com este post!

      • omaudafita says:

        Quem está a comentar sobre avaliação docente?! Pensei que estávamos a falar de “despedir professores à custa de menos escola”. Só estou a querer demonstrar diferença brutal de comportamento da classe entre o mobilizar-se para enfrentar a avaliação da classe docente (o antes) e o despedimento massivo de professores (o agora), e por fim o fim da escola pública de qualidade para todos (o futuro).

        • “Quem está a comentar sobre avaliação docente?! (…) Só estou a querer demonstrar(…) entre o mobilizar-se para enfrentar a avaliação da classe docente (o antes)…”. Eu diria que quem falou na avaliação docente foi… você, no seu comentário inicial.
          E, sinceramente, não percebi a que propósito.
          Se o propósito foi este que agora refere – demonstrar a diferença entre a capacidade de mobilização para enfrentar a avaliação docente Vs mobilização para enfrentar o despedimento massivo – então só nos deu metade da música!
          Mas em relação ao seu mais recente comentário, deixe-me que lhe diga, parece-me um problema global, de toda a sociedade, não exclusivamente dos professores.
          Não temos visto uma mobilização da sociedade proporcional à acção do governo.

          “Quem impõe tantos sacrifícios às pessoas e não cumpre, merece ou não merece ser responsabilizado civil e criminalmente pelos seus actos?”

          Sabe quem o disse? Pedro Passos Coelho (http://www.publico.pt/politica/noticia/passos-coelho-quer-responsabilizacao-civil-e-criminal-por-maus-resultados-da-economia-1464636)
          Se calhar não são apenas os professores que não se estão a mobilizar.

          • omaudafita says:

            “Se calhar não são apenas os professores que não se estão a mobilizar.” Tem toda a razão, mas são os únicos em que se encontra “um enorme” diferencial entre o antes e o agora. A minha crítica não é aos professores… é aos sindicatos. Penso que grande parte dos professores já perceberam que foram traídos por interesses internos e externos dos sindicatos.

          • António Soares says:

            Por algum motivo não aparece o “Comentar” no seu texto, maudafita!

            Sim, maudafita – que raio de nickname foi escolher-, concordo consigo em relação aos sindicatos. Não apenas em relação ao dos professores mas a TODOS os sindicatos.

            Ainda em relação aos professores, se me permite, creio que a questão da avaliação não está em causa. Parece-me lógico que exista avaliação docente. A questão pela qual os professores se manifestaram foi em relação ao “como” e “por quem” seria feita essa avaliação.
            À parte disso, o processo avaliativo deve contemplar alunos, professores, programas, escolas e o próprio sistema de ensino. Mais, a avaliação deveria contemplar secretários de estado, ministros, ministérios… mas vá, vou deixar de ser utópico 🙂

            Infelizmente não é só ao nível da educação – e dos professores – que algo vai mal e deveria mudar. Todas as estruturas do nosso país têm vindo a ser assassinadas por uns pulhíticos [de pulha, não de polis], que se têm instalado nas cadeiras do poder.

            Mas isto já é fugir ao tema, por isso dou por encerrada a participação.

            Cumprimentos,o maudafita

      • João Paulo says:

        Pois… eu próprio tenho essa dúvida…
        JP

    • Meu caro, avaliação? Mas… Leu o post?
      JP

  3. … os alunos são “canalha”?

    • António Fernando Nabais says:

      Na zona do Grande Porto, “canalha” não tem sentido pejorativo: é um substantivo colectivo que designa um grupo de crianças ou as crianças em geral.

      • Obrigado Nabais. Só estava a “meter-me” com o João Paulo. Esta coisa do estatuto do professor especial de corrida, 31 xpto que coitadinho tem de passar um tempão a preparar aulas (do primeiro ciclo…) com o cautela científica dum “rocket scientist” e que depois se exalta porque lhe pedem para preencher uns “papéis” é algo que me deixa nervoso… Sobretudo quando outra gente (com qualificações semelhantes e superiores) passa a vida a esgalhar com um stress danado na pele, preenche a “papelada” que o patrão lhe pede, não os discute, e se não cumpre os objectivos vai para o olho da rua… Enfim, somos todos iguais, havendo alguns com a sorte de ser mais iguais que outros…

        • António Fernando Nabais says:

          Pois, Luís, acontece que concordo com o João Paulo (já sei que serei considerado parcial por também ser professor). Há demasiada burocracia inútil no sistema de ensino e preparar aulas não me parece menos importante do que construir foguetões (e não é possível construir foguetões sem gente que tenha preparado bem as suas aulas). O facto de haver quem tenha de aturar patrões piores do que o Ministério da Educação não é razão suficiente para que os professores deixem de se queixar. Para além disso, como o JP explicou, e bem, o facto de se retirar tempo aos professores prejudica os alunos. Vai desculpar-me, mas é demasiado leviano reduzir o problema à imagem de elementos de uma classe profissional que se exaltam porque alguém lhes pede para preencherem uns “papéis”, especialmente se a grande maioria desses “papéis” é absolutamente inútil. Para se conhecer este ambiente a fundo, é preciso estar nas escolas ou perguntar a quem lá anda. Não é minha intenção condicionar o seu direito a emitir opiniões sobre a actividade docente, mas não resisto a uma provocação: dou aulas há 26 anos. E o Luís?

          • Eu sei que você e o Paulo tem alguma razão… Nestas coisas como em outras não existem verdades absolutas. A minha “exaltação” vais sobretudo para uma certa ideia de imobilismo, conservadorismo e resistência permanente à mudança que se observa amiúde na “versão” mais corporativa da “luta dos professores”. Essa sim, é para mim, muitas vezes, autista e reprovável… Sobretudo quando mistura excessivamente as “lutas” e “defesa de direitos” (legítimos) com qualidade (e evolução, quando é o caso…). Já tocámos esta “tecla” noutras alturas…
            Respondendo à pergunta: não dou aulas. Vejo televisão, leio jornais, conheço algum mundo, pago impostos, sou pai… E ambiciono um País decente.

          • António Fernando Nabais says:

            Pegando no seu último parágrafo, a única diferença é que dou aulas. Com a Escola a ser destruída – porque está a sê-lo -, não haverá país decente.

      • João Paulo says:

        Ora nem mais, aqui Canalha e putos é coisa “comum”, sem stress 🙂
        JP

  4. Primeiro ciclo o que é? Estas modernices de meia tigela confundem-me.

  5. Manos professores, menos escolas, fazer com que professores e alunos saiam da sua terra, alterações de gramáticas, de disciplinas, imposições de acordos ortográficos. Tanta, tanta coisa que é prejudicial ao ensino e à aprendizagem dos alunos.

  6. luis says:

    O que é a Educação quando comparada com o pagamento de uma dívida ilegítima? Nada, pois claro.

  7. Só não concordo com a palavra “educar” na expressão “fica para trás o mais importante – educar”.
    Claro que a escola educa, mas não creio que, dito a grosso modo, seja essa a sua função. Educar é tarefa dos pais, ensinar/formar é tarefa da escola.
    Independentemente desta questão lexical, creio que todos estamos de acordo numa coisa: a educação é o pilar de uma sociedade. A nossa [ou as nossas: educação e sociedade] está a desmoronar-se.

    • Em relação ao meu próprio post, deveria ter distinguido “educação” e “Educação” 🙂

      Etimologicamente, educar vem do latim “educare”, e significa “instruir”, “guiar”. Nesse sentido, faz sentido que a escola tenha o papel de educar, claro.
      É um papel que está confinado à escola e aos pais, contudo, é a escola que tem sido “sobrecarregada” com o dever de dar resposta a tudo aquilo que a sociedade não consegue ou não quer dar.
      Toxicodependência, sexualidade, homossexualidade, aborto, etc. A sociedade procura a resposta para todos os problemas na escola.
      Não digo que seja errado. Actualmente, os alunos passam mais tempo na escola, com os professores, do que em casa, com os pais. Não é por isso, na minha opinião, descabido que os assuntos sejam incorporados no currículo escolar. Não obstante, isto não pode ficar associado à desresponsabilização dos pais em relação à educação dos jovens.
      E foi neste sentido que fiz a distinção entre “educar” e “ensinar”.

      Mas acredito que este comentário “dê pano para mangas” 🙂

  8. omaudafita says:

    O post anterior foi apenas uma pequena provocação! Não levem a mal. Apenas o fiz para lembrar o tempo das mega manifestações contra o anterior governo e as tímidas acções dos dias que correm. Primeiro grandes acções contra a avaliação da Lurdinhas, agora, em plena jogo da cadeira com direito a brinde de mobilidade para quem não a arranjar anda tudo muito mais civilizado.

    • João Paulo says:

      Tenho dificuldades em justificar isso, só lhe posso dizer, com conhecimento de causa, que não é por falta de vontade da FENPROF…
      JP

  9. Manuel Reis says:

    Ficou por dizer que a principal razão de ser necessário menos escolas e menos professores é a própria demografia, que leva a que hoje haja apenas cerca de metade de cidadãos em idade escolar do que aqueles que havia na década de 80.

    http://oinsurgente.org/2011/12/21/a-demografia-e-os-professores-a-mais/

    Mas os sindicatos dos professores não querem saber destes factos. Para os sindictos, o que importa é meter o máximo de associados a serem pagos principescamente com os nossos impostos, nem que seja necessário roubar ao contribuinte cerca de 30% do seu rendimento bruto e ainda mais dois subsídios extra por ano.

    • António Fernando Nabais says:

      Se ler com atenção os comentários do João Narciso ao texto do insurgente, pode ser que perceba que não foi a natalidade que ditou o despedimento de professores. Sobre isso também já escrevi: http://aventar.eu/2011/12/29/educacao-isso-agora-nao-interessa-nada/.
      Os sindicatos? Quais sindicatos?

    • António Soares says:

      Caro Manuel Reis, em relação a isso, creio não ter os mesmos dados.
      Nem faz muito sentido. Repare, do baby boom até 90, as taxas de natalidade foram caindo, não obstante a escolarização foi aumentando. Não faz muito sentido afirmarmos que quando a escolaridade obrigatória era até à 4ª classe tínhamos mais alunos a estudar que quando passou a ser o 9º ano!
      Estabelecer uma relação Natalidade Vs Escolarização, apenas, é uma forma muito redutora de analisar as coisas.

  10. Ana A. says:

    E o lema “Dividir para reinar” continua e continuará a surtir efeito!

  11. torturamix says:

    Assim de repente ,acho que o refilanço dos prof´s já vem do Neanthertal.

    • João Paulo says:

      Mas, refilar? Estou a falar dos putos, do contexto que permite ou não que eles aprendam. Esqueça lá os profs…
      JP

  12. jose dias fernandes says:

    Eu só gostava que me dissessem onde anda esse grande defensor dos professores o MÀRIO NOGUEIRA, anteriormente era na televisão, era nas manifestações o homem não parava. Onde é que ele se meteu? que é feito deste “grande” defensor dos direitos dos professores?o márito perdeste o pio?que se passa homem?

  13. celesteramos.36@gmail.com says:

    Pois é isso tudo – e o inferno também

  14. Reblogged this on Sonhos desencontrados and commented:
    Uma boa reflexão sobre alguns dos problemas da educação em Portugal.

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