Limite de mandatos, República e bom senso

Calimero

Um princípio republicano que me é particularmente caro resume-se nisto: a política é um serviço, não é uma profissão. Também porque o leninismo (em circunstâncias históricas que até o admitiam) criou a figura do revolucionário profissional, e a manteve, muitos países acabaram em monarquias norte-coreanas.

Entre nós mais que uma profissão transformou-se numa carreira, com jota-iniciação e passagem a sénior deputado ou autarca, com a agravante de nos partidos do arco se ir rodando pelo poder empresarial, que não busca nos políticos talentos mas mero tráfico de influências.

O anedótico episódio dos presidentes de câmara que querem mudar de concelho porque lhes limitaram os mandatos chega a ser caricato. É certo que o mal vem detrás, não faz qualquer sentido o típico pára-quedismo que admite aterragens em concelhos onde nunca se viveu, aproveitando normalmente famas mediáticas.

Mais um tribunal acaba de mandar Luís Filipe Menezes ganhar a vida noutro lado (que diabo, o homem até é médico, não fica desempregado), e a falta de clarificação da AR promete enriquecer o luso-anedotário; dificilmente o assunto será resolvido a tempo de, na altura da legalização das candidaturas e no curto prazo em que cada juiz as valida, haver jurisprudência nacional.

A insistência do PSD neste caso já brada aos céus. Como Passos Coelho se vai afirmando um reputado especialista em bodes expiatórios e calimerismos puros e duros, e não vendo nenhum ex-autarca do PSD no desemprego ou na emigração, começo a desconfiar que a insistência em seabras, menezes a até ribaus, tem um fito: chegar à noite das eleições e choramingar que a pesada e inevitável derrota eleitoral que se avizinha é culpa dos tribunais. Então se chegar ao Constitucional, vai ser um festival de lágrimas. É sabido que tendemos a julgar os outros como menos inteligentes do que somos, e nisso os políticos profissionais abusam; quando os dotes naturais são escassos, como sucede com esta linhagem que invadiu o PSD, lidar com os portugueses como sendo mesmo muito estúpidos, é perfeitamente natural.

Comments

  1. Ó meu caro João José, não me diga que só agora reparou que os lobos são sempre os mesmos, ou pelo menos da mesma matilha, e que as ovelhas são realmente estúpidas?

  2. xico says:

    João Cardoso
    E não é que estou de acordo?!
    Mas também, povo que aceita candidatos que nem conhecem a terra onde se candidatam, como é o caso do Costa das Caldas, merecem todos os buracos e rotundas e fontes e Manneken Pis que lhes caírem em cima.

  3. José Couto Nogueira says:

    Neste caso (das candidaturas no concelho vizinho) acho que a culpa vai toda para a AR. Primeiro legislou mal, de uma maneira indefinida (quiçá de propósito, pior ainda). Depois, devia ser a AR a esclacerer a indefinição que criou. Não custava nada reunir (fazem-no todos os dias), discutir (discutem todos os dias) e decidir. Temo que se escapem porque sabem qual é a resposta ética e não a queiram assumir, por causa das suas clientelas locais. (Mais) uma vergonha.

  4. Bufarinheiro says:

    Além disso, nada os impede de fazerem uma pausa sabática de quatro anos e de regressar nem que seja à mesma autarquia.

  5. … afinal os piegas são eles! “Bem prega frei Tomás, faz o que ele diz e não o que ele faz..” 😉

  6. Pisca says:

    Lendo os comentários, por aqui e por outros lados, só se pode concluir uma coisa, os Presidentes de Junta e de Câmara todos eles, são SEMPRE, corruptos, bandidos, maus gestores, e quando terminam os tais 3 mandatos, devem ficar inibidos de direitos civicos, alguns até acham que deveriam ser encerrados nas Berlengas que para o caso seria convertida em deposito dos mesmo por um ano, assim a coisa ficava decente ou deportados para as Selvagens para evitar perigo de contágio

    Lendo as noticias e o despachos, os mesmo são no meu entender o mais ridiculo que pode existir, um tribunal “determina” que fulano por força da tal lei às 3 pancadas, não se pode candidatar, mesmo que apenas tenha INTENÇÃO de o fazer, já que as eleições ainda nem foram marcadas, logo os respectivos processos de entrega e validação LEGAL das candidaturas ainda não aconteceu e nem se sabe em que datas irá acontecer

    É perigoso tal despacho(s), sobre intenções, posso ser condenado por um qualquer tribunal quando sair de casa atrasado para ir a algum lado, será EVIDENTE que TEREI A INTENÇÃO de exceder limites de velocidade

    Podem escolher mais exemplos, como vos aprouver

    • Amadeu says:

      E que tal o Cavaco por mais 2 ou 3 mandatos ? Seguidinhos, que a experiência é muito bonita.
      Se não fosse a demência senil ainda ia a tempo de bater o recorde de Salazar.

    • Conheço bons autarcas, que até o poderiam ser noutro lado. O problema não é esse: numa República não há autarcas profissionais. Gerir uma câmara não é gerir uma empresa, em muito menos uma profissão: deve ser serviço público e ao público. E nunca servir-se do público para se eternizar na função.

  7. Pisca says:

    Isto para além de virtuosas e defensoras do moral e bons costumes Revoluções Brancas me fazerem sempre soar qualquer coisa, que se sabe como começa mas não se sabe até onde vão

  8. Pisca says:

    Já agora diz a Lei Eleitoral para as Autarquica:

    Artigo 20º
    Local e prazo de apresentação
    1 — As listas de candidatos são apresentadas perante o juiz do tribunal da comarca competente em
    matéria cível com jurisdição na sede do município respectivo até ao 55º dia anterior à data do acto
    eleitoral.

    Alguém me diz se já foram marcada as proximas ????

  9. João says:

    Falta mencionar a profissão de intelectual do partido, muito em voga no PCP, e também a célebre dança das cadeiras autárquicas que anda a ser feita pela península de setúbal. A podridão afecta o panorama político nacional de um lado a outro.

Trackbacks

  1. […] que no Porto, Aveiro e Lisboa o PSD aguarda uma decisão do Tribunal Constitucional sobre a sua fraude republicana. De resto o choradinho vai-se preparando: os bons resultados em sondagens de Menezes e Ribau (olha […]

  2. […] Depois de o serem há um prazo para reclamações, e pelo menos um partido já avisou que reclamará contra todas as candidaturas encabeçadas por gente que pensa a política autárquica como uma profissão. Daí haverá recurso para o Tribunal Constitucional, que terá um prazo breve para se pronunciar. Espero que o faça de acordo com o óbvio e os princípios básicos do republicanismo. […]

  3. […] profissional que agora anda pelos negócios estrangeiros.  Fico-me pelo que já havia defendido: o princípio republicano da não profissionalização da actividade política levou uma chapada. Não por inconstitucionalidade, note-se, mas por interpretação de uma lei, […]

  4. […] profissional que agora anda pelos negócios estrangeiros.  Fico-me pelo que já havia defendido: o princípio republicano da não profissionalização da actividade política levou uma chapada. Não por inconstitucionalidade, note-se, mas por interpretação de uma lei, […]

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