O romântico Coelho usa a cenoura para seduzir os socialistas

O debate desta manhã, na Assembleia da República, revelou um Primeiro-Ministro dócil, em vez de severo, terminando as intervenções com uma declaração romântica, deveras enternecedora:

Tenho felizmente namorado com a minha mulher,

Disse em resposta a Heloísa Apolónia dos ‘Verdes’, a propósito do “namoro pegado” do chefe do governo com a ‘troika’, o CDS e o PS. Creio que apenas o incontido Berlusconi, ex-PM de Itália, foi mais longe neste tipo de confidências, em actos públicos.

Todavia, nas supostas passagens mais sérias dos discursos de PPC, ressaltam dois temas de especial significado para a vida dos portugueses:

  1. A reunião extraordinária do Conselho de Ministros de 3.ª feira próxima, com o objectivo único de aprovar ‘as linhas da estratégia de crescimento e fomento industrial’, a submeter em documento aberto aos partidos, PS em especial, parceiros sociais e à sociedade em geral.
  2. A intenção de repetir o convite ao PS para debater e obter maduro consenso das medidas de ‘poupança de carácter estrutural’ – o programa da tal economia de 4 ou 4,5 mil milhões de euros na despesa pública.

PPC, como em ocasiões anteriores, não foi um político hábil, e admito que tenha dificuldade em sê-lo nestes domínios.

Com efeito, nesta prestação parlamentar, e sendo ele Coelho, inverteu o destinatário da atracção através da cenoura. – Ofereço uma solução estratégica de crescimento e emprego, se, reciprocamente, aceitarem o nosso plano de reforma do Estado – disse para o auditório, mas o destinatário principal foi Seguro.

Separando os dois temas, e começando pela estratégia, tenho especial curiosidade, e sobretudo muitas reservas, a respeito de um plano eficaz, a curto e médio prazo, nesse domínio. Para fundamentar essa opção, o PM começou por afirmar:

Agora estamos mais certos dos resultados do caminho da consolidação

Restou-lhe precisar que esses resultados são desfavoráveis: evolução negativa do PIB (- 3,2% em 2012, previsão de – 2,3% para 2013); Défice Orçamental (6,4% do PIB em 2012 e estimativa de 5,5% para 2013); Formação Bruta de Capital Fixo/Investimento (- 14,5% em 2012, previstos – 7,1% para 2013);Procura Interna (- 6,8% em 2012, previsão de – 4,12% para 2013); Exportações (3,3% em 2012, projectos 2,2% para 2013); Desemprego previsto para 2013; 18,5% – o Banco de Portugal foi a fonte utilizada para recolher estes valores

Com as adversidades resultantes destas e de outras variáveis, maioritariamente endógenas, dificilmente haverá investimento significativo vocacionado para a procura interna. Por sua vez, há a registar a tendência decrescente da procura externa (- 2,6% de valores exportados em Fevereiro passado) – o FMI prevê para a Zona Euro uma contracção de ¼% para 2013 e as expectativas de incrementar as exportações estarão, naturalmente, sujeitas a consideráveis constrangimentos este ano.

É, portanto, neste cenário de dificuldades que a probabilidade do governo desenvolver uma estratégia de crescimento e emprego de sucesso é diminuta, para não a classificar de alta improbabilidade.

Todavia, é esta a cenoura com que Coelho pensa seduzir o PS, em especial António José Seguro, para aquilo que verdadeiramente interessa à ‘troika’ e ao governo. Se os socialistas caírem na armadilha, ficam despojados de razão para refutar a co-responsabilidade em medidas anti-sociais, resultantes dos cortes dos 4 a 4,5 mil milhões de euros. A função pública, em matéria de cessações de vínculos laborais, será muito afectada – há meses que é citada a saída compulsiva de mais de 50.000 professores, por exemplo.

Esperemos futuros desenvolvimentos destas histórias. O ‘bloco central’ demonstrou ser especialista em explorar a técnica de um tipo de suspense, cujo desfecho é quase sempre previsível e que se designa por decepção. Aguardemos, pois.

Comments

  1. José Galhoz says:

    O governo PPC/Gaspar (com CDS a reboque) está, de facto, num beco sem saída (e sem unhas para saltar o muro do fundo). Com uma Troika que exige consensos como exige austeridade e dinheiro para os seus Bancos, ou seja, “custe o que custar”; com um governo remendado (nem deu para a recauchutagem); com um PR que só os abençoa pela frente enquanto os mordisca por trás; com um PS/Seguro que já se demarca (bom trabalho PPC!); com parceiros sociais que já não acreditam nas soluções “troikantes” (tal como a maioria da população); é evidente só lhes resta a fuga em frente, para se estatelarem contra o muro do beco em que se meteram. Tudo isto daria imenso gozo se o dito governo não se estatelasse montado nos burros de carga que somos todos nós, deixando de fora os ricos e os amigos.

    • Carlos Fonseca says:

      Completamente de acordo. Impreparados politicamente e recorrendo à austeridade pela austeridade, criaram uma situação catastrófica ao país. Serão necessárias décadas para sair do buraco em que estamos encurralados.

  2. edgar says:

    Por que é que este governo, sustentado pelo FMI, pelo BCE e pela Comissão Europeia, tendo a maioria na Assembleia da República, um Presidente que o apoia e, no essencial, uma oposição fraca do PS, insiste tanto no consenso, na necessidade urgente de consenso?
    Resposta óbvia: já não consegue governar, nem os portugueses querem que continue a governar!

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