25 de Abril, em tempos de governo maldito

Estou bem no interior do Alentejo. Terra de pouca gente, larga maioria de idosos, mas de memória bem viva e sólida. Jamais esquecem a data. No café da vila, à hora do café e do bagaço após o almoço, combinavam os festejos para a meia-noite. Haverá febras, pedaços de Javali caçado na reserva do clube local e mais uns petiscos, pão alentejano… ah!, e o vinho d’um cabrão oferecido pela Junta, a escorregar pelas goelas abaixo, que é uma maravilha.

Sempre foi e continuará a ser assim – juram-me – as comemorações do 25 de Abril aqui na terra. – Não nos vergamos a esta cambada que nos rouba e desgoverna – diz-me um homem de cinquenta e tal anos. – Hão-de cair, como todos os que nos atraiçoam – acrescenta, confiante.

Ouvi apenas. Sem comentar. Evitei desiludir quem comemora e sente com alegria o 25 de Abril, desde sempre. De mim para mim, penso no Passos Coelho, na Paula Teixeira da Cruz, no Relvas que já partiu e no Pedro Pinto. Todos estes e congéneres, no 25 de Abril de 1974, viviam em Angola. Sem saber sequer  das mortes, dos sacrifícios e de inúmeros riscos de militares, idos da Metrópole, para defender as vidas e patrimónios das suas famílias. Iguais a tantas da burguesia colonial.

Um dia destes, falando dessa gente ignóbil e dos ‘gaspares’ que se lhe juntaram, dizia-me um alentejano: – Eles não são retornados…são apátridas. – É isso, apenas um conjunto de apátridas, à frente da governação, por escolha de um povo sem saber, sorte e norte, é capaz de tranquilamente transformar Portugal, no País envelhecido, deserto, falido, sem rumo, que os mais novos, e portugueses legítimos, são forçados a deixar para trás. Uns com amargura e saudade, outros ressentidos e dispostos a não regressar tão depressa.

O País, por força de políticas desumanas e anti-patrióticas,  está gravemente enfermo. Sem querer quebrar o ânimo alentejano dos festejos de logo, à meia-noite, com foguetes no ar, gritos de alegria, canções que a revolução inspirou, e vice-versa, lá regarei o pedaço de pão e a febra com o vinho que, também a mim, me transportará à excitação e esperança de ver regressar o 25 de Abril, do lugar onde está amarguradamente prisioneiro, livrando-se de amarras semelhantes àquelas que aprisionavam tantos  anti-fascistas libertados na histórica data de 1974, no derrube da ditadura.

Viva o 25 de Abril!

Comments

  1. Maquiavel says:

    VIVA!

  2. Tenho estado de acordo com a maioria dos seus comentários , tal como este sobre o 25 de Abril . Mas tenho cada vez mais dúvidas
    sobre o 25 de Abril . Realmente , estamos num mau Governo e es-
    tou á vontade para falar , porque fui apoiante do PSD , talvez mais que ninguém , no tempo do famigerado Cavaquismo , que nem que-
    ro ouvir falar e há mais de 20 anos que não voto .
    Cada vez mais estou convencido que estamos a ser dominados por esses apátridas retornados que parecem querer destruir o País e o Povo metropolotino , como se tivessemos culpa da maldita descoloni-zação , que foi mal feita , gerou guerras , injustiças , misérias e mui-
    tas desigualdades e muitas outras problemáticas , que ainda hoje
    continuaram a verificar-se . No fundo será uma questão de racismo
    porque no Ultramar havia muita discriminação .
    Às vezes dá vontade de dizer maldito 25 de Abril , qpesar de ser um
    pleno adepto da liberdade de expressão e de verdeira Democracia ,
    que me parece nunca ter existido e que cada vez mais se vai esfu-mando e apagando .

    • …fui apoiante do PSD , talvez mais que ninguém , no tempo do famigerado Cavaquismo ,,,e há mais de 20 anos que não voto…

      Fernado C, dos Santos,

      Você é um caso perdido, nem tanto por ter sido PSD mas com 20 para se redimir simplesmente não votou. Aptececia-me chamar-lhe um nome mas…sabia que o 25 de Abril não tem culpa nenhuma mas a culpa é toda de gente como você que não presta???

      • Não sei quem é a Bolota ou o Bolota , só sei que fui comentado por quem não dá a cara como eu dou , procurando ser justo , sincero
        e verdadeiro nos meus comentários . Só sei que estou na MISÉRIA
        por culpa dos políticos e partidos de esquerda e de direita , espe-
        cialmente do Cavaco .
        Não vislumbrei até hoje quem é melhor . Aderi ao PSD por me considerar seguidor de Sá Carneiro , respeitando sempre os ou-
        tros , fosse qual fosse a sua ideologia .
        Não será qualquer Bolota que tem o direito de dizer que não presto .
        Admito que discorde de mim , mas com fundamento .
        É contraditório quando você diz estar normalmente de acordo com os meus comentários e agora me ataca inexplicavelmente .
        Infelizmente , não podemos agradar a todos, mesmo que nos esfor-
        cemos para tal .
        Não me apetece chamar-lhe nenhum nome , nem ofendê-lo , nem
        desejar-lhe mal algum .
        A minha filosfia é desejar e ver toda a gente bem . E , para isso , critico aquilo que julgo que está mal .
        Quase de certeza que ninguém teve coragem de criticar e condenar o Cavaco como eu , mesmo no tempo em que fui militante do PSD .

        Desejo-lhe sorte , mas não me deite abaixo sem motivos nem razão
        e oxalá nunca passe pelo infortúnio que estou a passar nestes últimos
        anos , sem reforma e só me querem dar 178,00€ de RSI , sem rendi-mentos , sujeito a ir para a rua , vítima da Banca corrupta .
        Sou tão mau , que aqui , até os Comunistas me respeitam apesar
        de saberem que apoiei o PSD como ninguém ..

        Não vale a pena criar guerra entre nós Seres-humanos , lutar sim
        contra todos os que à esquerda e à direita nos exploram e lixam a Vida .

        Muito mais teria para dizer , mas fico por aqui .

        Com as melhores e maiores saudações me subscrevo .

        Bem haja para todos

  3. Carlos Fonseca,

    Soberbo texto, quando se é de Baleizão falar em bem no interior do Alentejo é sentir o cheiro a poejos, dos montrastos e da terra molhada.

    • Carlos Fonseca says:

      Caro Bolota,
      É um texto inspirado numa experiência real, deste Alentejo esquecido, desertificado, mas rico em homens e mulheres de um espírito de fina argúcia e humor. Cada terra com os seus usos, mas eu, lisboeta, amo o Alentejo desde que me lembro de ter as primeiras opiniões,

  4. celesteramos.36@gmail.com says:

    No Alentejo até o vento é livre – e eu que em abril não sabia nada de nada a não ser o que vivia e nem da terra que habitava saía, vivia feliz e descuidadamente – Mas já em Lisboa e ao ter que ir uma vez ao algarve a congresso os comboios eram tão complicados que tive de parar em Évora para seguir no dia seguinte e onde é que havia automóveis ?? – Mas tudo mudou e eu também – Além Tejo ?? sempre esquecido (aliás como Trás-os-Montes) mas era “o celeiro de Portugal” – e era mesmo “celeiro” que muitos acusam ter desertificado a região mas eu não creio pois que havia a sachada-cereal.sachada-cereal começando pelo cereal mais rico e trigo e nas rotações acabando pelo mais pobre (cevada) e a sachada lá ía dando fertilidade até o esgotar e, então, entrava em pousio porque a terra tinha, também, de descansar e recuperar a sua fertilidade pois que se esgotara para produzir – e aquele alémtejo enchia-se de plantas anuais de todas as espécies e cores e flor num encantamento e até ensinava os meses do ano com aquelas lindas “maias” a lembrar maio e os malmequeres brancos e os amarelos e o porco de montanheira no montado e os rebanhos de ovelhas e vacas e os cavalos e a paz e o silêncio e o horizonte sem fronteiras e os sobreiros a encher a paisagem e os homens a descortiçar – e as mulheres vestidas de forna singular a ceifar o trigo e fazer molhos e a deixá-los pelos terrenos que outros iriam recolher e cantavam quendo trabalhavam e outras levaram o “tarro” cheio de alimentos quando havia para dar aos seus homens pois que muitas vezes só havia o pão e o chouriço e o vinho claro – mas que beleza me parecia sem compreender tudo o que queria tal coisa dizer – mas havia muitas aves que comiam os grãos e havia espantalhos tão lindos para os afastar – e também e ainda os homens aos tiros para caçar pois que tudo me parecia rico e variado e as casinhas brancas de cal pintadas com o pincel espetado no cimo de uma cana e o rodapé das casas azul atlas e vermelho sangue de boi (que mais tarde vi igual em São Miguel) e era assim mesmo – mas hoje já não é – hoje depois da mecanização e de políticas agrárias desgraçadas, o alémtejo já não tem tantos rebanhos nem cantos de mulheres nem sequer trigo que é mais importado porque tudo desertificou e exauriu, e o calo do trator impedir que a chuva regasse a terra e continuasse no seu ciclo natural e tudo em favor de quê ?? mas ficou o cante – ficou a luz – ficaram os homens que não se suicidaram e viram seus filhos partir – mas ficaram os poetas pois que tão ricos são os seus versos e as célebres anedotas que só quem tem a grandeza da terra sabe inventar e o cante dolente – e a voz que não se cala – hoje transformaram aquela vastidão em regadio mas não para os alentejanos mas para os golfistas e os sobreiros sêcos e a morrer e os rebanhos já tão mais raros e os homens certamente que mais cansados a ver tudo e todos partir – Mas ainda há a OviBeja – que parece ter sido hoje inaugurada – os alentejanos suicidam-se uns mas os que ficam não desistem – maldita PAC mentirosa – maldita UE predadora – mas resta ainda o melhor queijo do mundo de Niza e o artesanato e os tapetes de Portalegre e Arraiolos e a grandiosa Extremoz e os seus barros – e resta Monsaraz e os Castelos de Alegrete e a gastronomia que só ali pode existir – e o alemtejo é ainda muito mais e é o local onde tudo é branco e limpo e imaculado e religioso e cuidado e até tem Antas e Menhires e Chromelek de Almendres a atestar a sua milenar ocupação humana e sabedoria ancestral e o saber viver com a natureza – e as Igrejas que não têm um grão de pó nem o negro dos CO2 nas fachadas e ornamentos, e os altares doirados e as imagens dos Santos – Assim os urbanos não andassem, eles sim, a desertificar e transformar sem grandeza – Alentejo não te deixes morrer

  5. MAGRIÇO says:

    No 25 de Abril cortaram-se as ervas daninhas mas, infelizmente, ficaram algumas raízes…

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