O relevante facto da irrelevância do Acordo Ortográfico

ptoi

Esta notícia, bem recebida “no mercado”, foi confirmada através de um comunicado à CMVM e de um Facto Relevante. Perdão, fato: Fato Relevante.

Quando Zeinal Bava, Nuno Vieira e Luís Pacheco de Melo tiverem tempo, expliquem-me, sff, como é que vão descalçar a bota dos ‘contactos’ e dos ‘factos’ presentes no comunicado. Gostaria imenso de conhecer a reacção dos parceiros da Oi a tais exotismos ortográficos.

Escusado seria repetir que “convém reflectir sobre a dimensão desagregadora do exercício AO 90, considerando os inúmeros casos em que no Brasil se conserva a grafia anteriormente comum, passando em Portugal a adoptar-se uma grafia obscura e exclusiva”.

Contudo, no comunicado à CMVM, temos “respetivas holdings assinaram”, “assumirão, respetivamente, o cargo”, “os respetivos passivos”, o respetivo relatório de avaliação (laudo)” e “o respetivo arquivamento”, embora, no Fato Relevante, apareçam “respectivas regiões de atuação”,  “respectivo laudo submetido”, “equivalentes a, respectivamente, R$ 5,8 bilhões”,  “respectivos direitos de prioridade”, “respectivas participações”, “respectiva eleição”, “assumirão  respectivamente“,  “respectivo valor patrimonial” — pronto, já chega.

Não, não chega: no Fato Relevante, temos “perspectivas e expectativas“, mas, no comunicado à CMVM, surgem perspetivas e expetativas“. Sim, expetativas e não expectativas  isto é, quando a semelhança aparece, recorre-se ao expediente desagregador.

Aguardo, confesso, com alguma expectativa, os próximos episódios desta telenovela da “unidade da língua portuguesa” e “[d]a sua universalização” ou da “unidade essencial da língua portuguesa” e do “seu prestígio internacional” — relativamente a este aspecto, a doutrina, aparentemente, divide-se.

Enquanto aguardo, com a tal expectativa,  aproveito para fazer uma pergunta que nada tem a ver com (orto)grafia: os clientes portugueses da CorpCo poderão aceder ou terão de acessar? Era só uma pergunta.

E dois pedidos de esclarecimento: convinha explicar quer o motivo de o significado de ‘laudo’ aparecer no comunicado à CMVM, quer a razão para surgirem “5,8 mil milhões de reais” no comunicado à CMVM e “R$ 5,8 bilhões” no Fato Relevante. Afinal de contas, não nos esqueçamos, está em causa a “unidade essencial”.

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Comments

  1. João Galizes says:

    O nosso David nunca pretendeu vencer o Golias, aliás, até ouvi o senhor Bava, todo embevecido, a pronunciar (perdão, pronunciando) Portugaw! 🙂

  2. seria repetir que “convém reflectir sobre a dimensão desagregadora do exercício AO 90, considerando os inúmeros casos em que no Brasil se conserva a grafia anteriormente comum, passando em Portugal a adoptar-se uma grafia obscura e exclusiva”.
    A desagreagação do pais em termos económicos pelo menos, e administrativos com aquela história de que não se sabe ainda que consequências com a agregação de aldeias sobretudo fora das cidades, passou pela desagregação cultural de que a língua é veículo (quando é) E nem sequer se pode justificar o servilismo de Portugal para com o Brasil que não parece ser país exemplar para nada nem ninguém senão abate das árvoresmienares da amazónia para comércio de madeiras com inglaterra e frança (fora o resto da inundação com novas barragens gigantescas de terras onde ainda vivem tribus que restam na sua raía e não querem sequer contactos com a civilização e vão desaparecer ) pois que já basta para com a UE – pois Portugal não tem a bandeira nacional ao contrário – tem tudo e mesmo assim há que vote ainda na continuidade incluindo os “falsos opositores” que se denominam independestes – não dá vontade de rir sequer desagregação continua -e o benfica não consegue ganhar nada excepto muito dinheiro que é mais do que imoral e como diz o treinador António José o benfica é um problema psiquiátrico – McNamara volta pela 4ª vez à Nazaré para se limpar o areal (Portugal é mesmo um país porco os autarcas coitados não vão a praia) e surfar “a sua onda” e haverá festival de surf e Carcavelos onde virão “as melhores do mundo” – acho bem – precisamos de divisas estrangeiras através do turismo de. desporto pelo menos

  3. façam como eu …escrevo segundo a ortografia “antiga” por escolha consciente!

    • best says:

      Acho que a ortografia antiga é a brasileira do acordo (1943).
      A portuguesa, que está em vigor, é de 1945.

  4. é lamentável, de facto, aquilo para que isto está a conduzir-nos. Como se não bastassem todos os outros desnortes, até na forma como comunicamos conseguiram criar fossos que vão demorar a fechar, se de facto conseguirmos parar esta espiral recessiva de AO. Dói na alma ver o que fizeram à Língua. E como os deixaram! Que gente é esta, afinal? Será gente?

  5. Jorge Marques says:

    Devia começar a informar-se.
    O Brasil ainda não implementou o acordo ortográfico, e afinal, qual é o problema do AO???
    A língua evolui e nos também temos de evoluir, porque se gostam tanto da língua de camões, podem ir fazer um excelente exercício que é ler o camões na versão original, ai esta o vosso português que tanto defendem e gostam 😀

    • nightwishpt says:

      “e afinal, qual é o problema do AO???”
      Desafio-o a encontrar um texto que seja escrito com o AO90 sem um único erro ortográfico, e escusa de começar pelos relatórios feitos pela comissão que o defende que lhe garanto que estão cheios deles.

  6. Sem querer entrar no mérito da neocacografia imposta em Portugal e no Brasil, ninguém, que eu saiba, escreve “respetivas”, “respetivamente” ou “expetativa” no Brasil. E a razão é simples: até onde sei, em todo o Brasil, de norte a sul, a consoante C é pronunciada nestes vocábulos, sempre grafados “respectivas”, “respectivamente” e “expectativa”.
    Sergio Pachá, Rio de Janeiro.

  7. É preciso considerar que perante um assunto da mais gravosa importância, a delapidação e uso da PT segundo os caprichos deste governo e de um tal Bava (de onde veio este tipo senhores?), este blogger masturba-se com problemas deste nível. Sobre o caso, sobre o “negócio” nem uma palavra: quando o sábio aponta para a lua, o idiota olha para o dedo. Já repararam?

  8. Luís Reis says:

    Serão 5 biliões ou mesmo 5 bilhões (bilhas)?

  9. Facto continua a escrever-se facto em Português de PT, porque o “C” é dito. Respetivo (ou variantes) já é sem C porque o C é mudo na linguagem oral. A maioria dos que falam mal do novo acordo não o conhecem, porque ele, DE FACTO, não gera grande confusão.

    • António Fernando Nabais says:

      Se, de facto, o AO não gera grande confusão, por que razão há cada vez mais gente, em Portugal, a escrever “fato” em vez de “facto”, entre muitos outros erros que não eram habituais, antes de ser aplicado o AO? Se não sabe ou não acredita, pode procurar os textos que o Francisco Miguel Valada já escreveu sobre as ocorrências (e respectiva frequência) desse erro no “Diário da República”. Sim, sim: no “Diário da República”.
      Sobre as consoantes “mudas”, haveria muito para dizer, desde o carácter diacrítico de muitas delas até à importância da etimologia. Por falar nisso, ‘bora exterminar o H inicial? ‘Bora lá!

  10. André S. says:

    Chama-se a isto variação interna de uma língua. Ou devíamos todos escrever e falar exatamente da mesma maneira? Nem em Lisboa falam e escrevem todos todas as palavras da mesma maneira.

    • António Fernando Nabais says:

      Variação interna de uma língua? Mas está a referir-se à ortografia? Quando afirma que nem em Lisboa escrevem todos todas as palavras da mesma maneira, quer dizer que há regras ortográficas diferentes de bairro para bairro ou que os habitantes de Lisboa têm liberdade para escrever conforme lhes der na gana? Será que uns podem escrever “tou”, outros “xtou” ou outros, ainda, “estou? Tá tudo bem assim?

      • André S. says:

        Em Lisboa nãopode e podia escrever febra e fêvera, ou moiro e mouro? É e já era conforme lhes der na gana, sim. O problema para alguns só apareceu quando o Brasil (o papão Brasil, uuu) se meteu ao barulho. No norte de Portugal prefere-se mouro, em algumas zonas do centro e sul prefere-se moiro. No Brasil prefere-se fato, em Portugal prefere-se facto. Mas pelos vistos também há quem diga fato em Portugal e que assim escreve a palavra e também deve haver quem diga e escreva facto no Brasil. Isto acontece com algumas poucas palavras e reflete a variação interna de uma língua. Existe em todas. Ou devíamos todos escrever e falar exatamente da mesma maneira?

        • best says:

          Em inglês escreve-se do mesmo maneira na Nova Zelândia, em Inglaterra, no Canadá ou no USA. E se um brasileiro ou um português quiseram escrever inglês, terá de o escrever como se escreve em Londres, tirando algumas variações conhecidas – com que os falantes do inglês não se importam nem motivaram quaisquer “acordos ortográficos”.
          De resto, a evolução da ortografia, como ensina o Prof. António Emiliano, consiste na sua estabilização, tanto maior quanto melhor o sistema de ensino e o nível de literacia. Tendo o Brasil o penúltimo lugar no «ranking global de qualidade de educação» dum recente estudo levado a cabo pela britânica Economist Intelligence Unit a que há a somar o uso da ortografia como bandeira nacionalista com laivos proto-fascistas (a “ortografia nacional” do Estado novo brasileiro)* será difícil a defesa de um “acordo” que se baseia, além do mais, em ideias cediças, historicamente marcadas e ultrapassadas.
          Quanto aos exemplos que aponta (ouro/oiro) não são variações ortográficas de uma mesma palavra, mas palavras diferentes, correspondentes a estadios fonológicos diferenciados.
          Bem diferente é, em nome de ideias velhas de 250 anos, criar diferenças artificiais entre o português de Portugal, de Angola e de Moçambique a somar às já criadas no Brasil, como aconteceria, por exemplo, com recepção, que passaria a ter uma versão frankenstein-imperial-burocrática para uso na ex-metrópole: “receção”!
          Acresce que nem Moçambique nem Angola, países que têm feito grandes esforços no campo da educação, estão interessados em contribuir para fins políticos (como confessa Malaca), ademais delirantes, de teor nostálgico e tardo imperial de brasis e portugais que já foram.

          *http://www.filologia.org.br/revista/artigo/5%2815%2958-67.html

          • André S. says:

            Que chorrilho de asneiras. O inglês tem tanta ou mais variação interna do que o português, com a diferença que em inglês as variações são sobretudo ortográficas em vez de serem baseadas em diferenças que existem na fala, que também existem. Em português com o acordo quase deixa de haver variações ortográficas, as que se mantêm têm a ver com pronúncia diferente de algumas palavras, como já era antes do acordo.

            Muito gostam vocês de continuar a tomar a cultura e “o exemplo” inglês e americano como modelo, como bons colonizados, apesar de tudo o que isso nos tem feito. E o resto das línguas europeias, fazem ou não fazem reformas, mudam ou não mudam a escrita? O professor antónio emiliano saberá imensa coisa, mas pelos vistos se calhar não sabe que precisamente por não mudar o inglês é a língua europeia que mais dificuldades de aprendizagem causa em alunos, o que está mais que comprovado em inúmeros estudos científicos. Mas o professor antónio emiliano é que é bom, os outros linguistas que andam para aí a trabalhar usando o acordo devem ser todos burros.

            Oiro / ouro é o mesmo que facto / fato, sem tirar nem pôr. Não são casos de variação ortográfica, são casos de variação interna da própria língua que depois têm reflexo na escrita. Quem pronuncia oiro e facto escreve oiro e facto, quem pronuncia ouro e fato escreve ouro e fato. Qual é a dúvida? E se em Portugal há pessoas a dizer fato, como há mesmo muitas e sempre houve, é normal que passem a escrever fato com o tempo. É assim que a língua evolui, sem espartilhos do século XIX a mudar a forma como falamos. Já em inglês, quem pronuncia color escreve obrigatoriamente color se estiver nos EUA e colour se estiver no RU, mesmo que isso não tenha nada a ver com a sua pronúncia. Entende a diferença?

            Quanto aos estudos da britânica e portanto mui-conceituada e acima de qualquer suspeita economist intelligence unit, nem tem relevância para o caso nem lhes dou qualquer credibilidade neste ou noutro assunto qualquer.

  11. Contrariamente ao que se supõe, a tendencia natural não é para a evolução mas para a degradação. Em Física chamam-lhe Entropia e é lei fundamental. Em medicina chama-se envelhecimento. De modo nenhum renovação ou nascimento.

    Mas evolução? Para existir precisa de exemplo que sobressaia por excelência, não por decreto de mediocridade (que parece ser regra mundial, ainda não tornada lei).

    A corrupção entende-se. Mas a estupidez flagrante, e a tirania do posto, do idiota de serviço? Chamar-lhe democracia não a faz. Apenas a destroi, chamando-lhe também … evolução.

    Pois sim… Vê-se!

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  7. […] Sem AO90, não é necessário traduzir decepção. Sem AO90, há decepção em Portugal e no Brasil. Com AO90, só há decepção no Brasil. Como o jornal A Bola decidiu aderir ao AO90, dando o seu contributo para a bem conhecida – aqui e alhures – «defesa da unidade essencial da língua portuguesa», eis a necessidade de explicar aos leitores portugueses o significado de decepção, através de uma das muitas aberrações ortográficas (deceção) criadas pelos autores do AO90 (há mais, sim, há mais). […]

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