Bravo António Costa

A linguagem da política já não serve. As palavras da política não prestam. Não basta dizer transparência a torto e a direito para que tudo fique visível – muito pelo contrário, pois a palavra transparência, que significa a verdade límpida, é um manto grosso de opacidade lançado sobre tudo o que a acção política esconde, ou aquilo em que é omissa. Não chega escrever transparência, ou honestidade, ou competência nos cartazes para sê-lo. É que já não basta parecê-lo. Talvez a palavra mais urgente seja clareza, a palavra clareza tornada claríssima por quem a pratica por intermédio de enunciados e acções claras. Nos cartazes que mandou imprimir para a campanha autárquica, António Costa foi bastante claro: “Preciso do seu voto”, disse sem mais rodeios nem transparências.

Em contramão com as práticas endémicas da comunicação política em Portugal, António Costa demonstrou uma vez mais ser um político que pensa pela sua própria cabeça. No rescaldo da noite eleitoral de Domingo passado, foi o único que referiu a abstenção e os votos brancos e nulos para falar da alternativa que o PS ainda não é – se é que vai voltar a sê-lo sem uma coligação de esforços à esquerda. “Há aqui um espaço que está por mobilizar”, disse Costa. Isto é ser claro, é não fingir que não se é de cá e que só se veio ver a bola, mesmo que se tenha metido o golo da vitória, é estar atento e não fazer de conta que não há um grave problema de representatividade do sistema democrático. António Costa, que é um político a sério e não um empresário temporariamente em funções políticas, bem sabe que 54,9% dos cidadãos de Lisboa se abstiveram de votar, e que isso questiona seriamente o edifício democrático – seja o da câmara que agora reganhou para o seu projecto lisboeta, seja o do País.

Comments

  1. inteiramente de acordo.
    Consigo Sarah Adamopoulos e com o António Costa.

    “alternativa que o PS ainda não é – se é que vai voltar a sê-lo sem uma coligação de esforços à esquerda”.
    Há anos que digo isto. Mas dito pelo António Costa tem muito mais impacto e pertinência.
    Para isso se precisa de políticos a sério, com voz que porte até ao galinheiro político.

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  1. […] que é feita a maior poupança.” Bem digo que as palavras da política não prestam para nada. […]

  2. […] possas ser the man, é o que nos desejo: alguém que pensa pela própria cabeça, capaz de dignificar a política, recuperando-a para a […]

  3. […] possas efectivamente ser the man, é o que nos desejo: alguém que pensa pela própria cabeça, capaz de dignificar a política, recuperando-a para a […]

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