«Os animais não têm direitos»

apa_torres_vedras

Um dia depois do competentíssimo e sapientíssimo veterinário, mas também (ó coerência!) ganadeiro Joaquim Grave ter voltado a dizer que os animais não têm direitos, no extremamente imparcial programa da RTP Prós e Contras, moderado por esse grande (a mim até me parece cada vez mais inchado) vulto da televisão que é Fátima Campos Ferreira, os pobres animais foram alvo de mais um ataque hediondo e cobarde. 

As instalações, devidamente fechadas e vedadas, da Associação de Protecção aos Animais de Torres Vedras foram invadidas na calada da noite por alguém que envenenou sete cães. Três deles morreram e outros quatro encontram-se em estado crítico. O corajoso intruso roubou, sim roubou, já que os animais não têm direitos e não passam de objectos, considera-se que são pertença do seu detentor, logo, se alguém os leva sem falar com o seu dono ou detentor, não passa de um infame ladrão vários caninos.

Curiosamente (ou não), os mais de dez cães roubados são podengos, raça usada na caça. Ou seja, animais sem direitos roubados para apanhar outros animais sem direitos para gáudio e lucro de muitas bestas cheias de direitos.

Por coincidência (ou não), o ataque ocorreu em Torres Vedras, local que ficou tristemente famoso por ter sido aí que um grande e corajoso toureiro com nome de passarinho atacou, montado no seu cavalo, pois claro!, um grupo de manifestantes anti-touradas.

Só gente valente, esta que não gosta de animais ou que gosta para deles tirar lucros e benefícios!

Esperar o quê de um povo que nem pelos seus direitos luta, que se deixa entroikar à força toda, mas que em assuntos de futebol se encrespa assustadoramente?

Ah, gente com direitos, gentinha linda!

Comments

  1. Adoro animais. Não sou caçador e revolta-me ver animais presos ou maltratados, mas de facto, à luz do direito, os animais não têm direitos, nem podem uma vez que não lhes podemos exigir deveres. Os juristas podem explicar melhor, porque há direitos indirectos ou coisa que o valha. Essencialmente dependem dos nossos deveres para com eles. Gostaria de uma resposta sincera a esta pergunta: pretende pedir (reclamar) a proibição do consumo de carne?

    • Pela logica do “so tem direitos, quem tem deveres”, deve uma crianca de colo ter direitos na sua opiniao?

    • Orvalho says:

      Ó Xico, olha para a lua e não para o dedo …

    • A morte de uma vaca num matadouro, que idealmente deveria ser, tanto quanto possivel, isenta de sofrimento, para que outro animal sobreviva esta para um touro agredido sadicamente numa arena como a morte de um ser humano num hospital com toda a assistencia esta para uma violacao em grupo. A meu ver, esta questao da carne que se come como justificacao de qualquer barbaridade sobre os animais e chutar para canto.
      Morrer todos morremos, mais cedo ou mais tarde. E a lei da vida. Nao so os ditos animais irracionais mas tambem os seres humanos. A questao e se “vale tudo” ou se ha valores eticos aos quais nos estamos a fazer de cegos.
      (peco desculpa pela falta de acentos e cedilhas mas estou num teclado estrangeiro)

    • Noémia Pinto says:

      Xico,
      A questão dos direitos dos animais é muito complexa e ambígua e tem vindo a ser discutida ao longo dos séculos. Naquilo que aos direitos diz respeito, podemos pensar no seu sentido restrito – o direito deontológico, havendo quem defenda que os animais o têm ou no sentido mais lato – o direito moral. Quem defende que os animais têm direito deontológico, implicitamente aceita que eles também têm direito moral. Contudo, o inverso pode não acontecer. Ou seja, pode-se defender que os animais têm direito moral, mas não deontológico. E não me vou alargar mais sobre este assunto, deixando-o assim pela rama, por se tratar de algo que exigiria uma discussão e uma argumentação que não me parecem adequadas para este blogue, dada a sua complexidade e especificidade.
      Recordo apenas que existe a Declaração Universal dos Direitos dos Animais, que Portugal subscreveu, o que, por si só, já mostra que Portugal concorda que aos animais sejam reconhecidos direitos.
      Quanto à sua questão, respondo-lhe, sim, com toda a franqueza: pessoalmente não como seres sencientes. Considero que houve uma grande evolução na minha vida que me levou a conseguir ter a capacidade de tomar essa decisão. Contudo, não é pelo facto de eu não comer que reclamo que o consumo de animais seja proibido.
      O que reclamo, isso sim, é que os animais que são criados para consumo humano sejam tratados com a dignidade que merecem, que vivam felizes enquanto vivem, que as fêmeas não sejam constantemente inseminadas, vendo depois os filhotes recém-nascidos ser-lhes retirados porque o leite delas é mais importante para a venda.
      Acredito na evolução da humanidade e acredito que deixar de comer animais acabará por acontecer naturalmente. Eu vejo os animais como tendo o mesmo direito à vida que a mim me é garantido. Desde criança que faço coisas consideradas ridículas, como salvar mosquitos de se afogarem ou andar sempre a olhar para o chão e repentinamente dar uns pequenos saltos estranhos, para não pisar um carreiro de formigas. Sempre, desde que me conheço, tento respeitar a vida sob todas as suas formas.

      • Muito obrigado Noémia Pinto pela sua excelente resposta e sinceridade. O que eu pretendia realçar é que me parece errado atacar as touradas só por causa da dor infligida. Gosto de touradas e tento compreendê-las e compreender esse meu gosto. Não chego ao ponto de salvar mosquitos mas compreendo-a perfeitamente pois também me custa matar qualque animal que seja, e gosto de touradas! A produção industrial de carne, acredite, causa imensa dor aos animais. Eu, que gosto de touradas, fico sempre doente quando sou obrigado, por razões profissionais, a visitar aviários, pecuárias ou matadouros. Tudo aquilo é de uma indignidade que não encontro nas touradas onde a sevícia é, de todas as que provocamos aos animais, a menor. Daí a minha pergunta.Julgo que as touradas acabarão por obsoletas, por perderem o seu significado simbólico e se transformarem num simples espectáculo. Choca-me no entanto a piedade de algumas almas sensíveis. Algumas não hesitam em aprisionar um pássaro. Não conheço dor maior que impedir uma ave de voar. As comunidades que têm necessidade de matar um animal para comer, têm consciencia do acto trágico que cometem, por isso exorcizam-no com uma luta (touradas), caça ou com rituais de sacrifício. Perdemos esse sentido e preferimos não ver o que se passa num matadouro ou numa pecuária para corrermos para a porta de uma praça de touros protestar.
        O problema do consumo da carne não está no acto de matar mas na forma de criar. Matar um animal para comer depois de um tempo de vida razoável e digna não é o mesmo que a produção intensiva onde, por razões económicas, é impossível garantir qualquer dignidade ao animal, e o bem estar animal limita-se a não infligir dor física. Quanto à caça e ao vegetarianismo, não deixa de ser curioso e irónico que devemos o aumento de várias espécies de animais à caça. Animais que quase tinham desaparecido por causa da agricultura.

    • João Soares says:

      O animal humano portador de trissomia 21 ,ou um doente de Alzheimer, não tem direitos ??? – E deveres ???

Trackbacks

  1. […] Os animais não têm direitos O nojo que é a tourada e a caça num bom texto. Quanto a veterinários, sempre houve os de matadouro e os outros, são raças diferentes (não convém tratar os animais de estimação num consultório de veterinário de matadouro). Aventar. […]

Discover more from Aventar

Subscribe now to keep reading and get access to the full archive.

Continue reading