Quando eu tinha cinco anos, o meu tio semi-gangster apareceu lá em casa. Eu não o conhecia e não lhe fiz grande caso, até porque cinco anos já é um bocado tarde para conhecer um tio. Despedi-me dele com o beijo contrariado de boas-noites que me obrigaram a dar-lhe, e deixei-o na sala com um último olhar ressentido porque ele ficou a jogar com o meu cubo mágico.
Quando despertei na manhã seguinte, já ele se tinha ido embora por cinco anos mais, deparei-me com o cubo em cima da mesa, as faces todas alinhadas, perfeito como só tinha estado na loja. Eu nunca tinha conseguido, claro, e ergui de imediato o meu tio ao altar infantil dos heróis titânicos.
Durou pouco. Uns dias depois, ouvi os adultos comentarem como tinha sido feita a proeza: ele tinha desmontado todas as peças para recolocá-las pela ordem certa.
Era batota, pois era, mas feita para me alegrar e tinha resultado, pelo menos por uns dias.
Acho que foi por aí que aprendi que ninguém é de uma só cor.
Ninguém é de uma só cor, mesmo. Até os tios inteiramente gangsters… os “semi” têm pelo menos umas duas ou três de bónus.