Mota Soares: soldado, ladrão, democrata, cristão

mota_soares.paginaNo dia 10 de Novembro, Pedro Mota Soares declarou o seguinte: “Hoje um casal com filhos pode receber quase 330 euros de rendimento mínimo, pode ter um conjunto de apoios de abono de família de 35 euros, pode ter um conjunto de apoios escolares de 276 euros, pode ter um apoio à renda de 280 euros, pode ter um apoio de transporte de cerca de 45 euros e chega ao final do mês com um rendimento de 950 euros.”

Pedro Mota Soares é ministro da Solidariedade. Há quem pense que isso faz tanto sentido como imaginar Hitler na presidência de uma hipotética Associação de Amizade Alemanha-Israel, mas a verdade é que Pedro Mota Soares é mesmo ministro e da Solidariedade também. Para que haja ainda menos humor, é importante lembrar que pertence a um partido democrata-cristão.

Uma alma mais ingénua ainda poderia pensar que Mota Soares estaria revoltado com o facto de haver famílias que sobrevivem com apenas 950 euros, mas parece que, segundo o ministro, isso é dinheiro a mais, constituindo, até, um “risco moral” porque pode levar os beneficiários a não procurar emprego. Aliás, não seria de espantar que alguém atribuísse o aumento do desemprego à falta de vontade de trabalhar, o que quereria dizer que os preguiçosos se multiplicaram desde que Passos Coelho chegou ao governo.

Como ministro competente, bom democrata e melhor cristão, Mota Soares deveria anunciar ao país o número de famílias que está a ser beneficiado com os ditos 950 euros.

O jornal Público fez a pergunta, mas, até hoje, não obteve resposta. O mesmo jornal, entretanto, soube que, entre 394 famílias que recebem Rendimento Social de Inserção (RSI) e que são acompanhadas pelas equipas da Santa Casa da Misericórdia de Almada, apenas oito têm “um acumulado de apoios superior a 700 euros, 2% do total de famílias beneficiadas”.  Acresce a tudo isso o facto de serem famílias numerosas, “a maioria com várias crianças”.

Embora aconselhe a leitura integral da reportagem, não resisto a mais uma citação. Isabel Baptista, investigadora do Centro de Estudos para a Intervenção Social, declarou à jornalista Andreia Sanches o seguinte: “Estamos a falar de que famílias? Quantas pessoas? Quantas crianças? Era bom que quando os nossos governantes referem estes números dissessem do que estão a falar, caso contrário a imagem que passa é a de que há uns malandros do RSI a receber 950 euros por mês (imaginam logo uma ou duas pessoas) e não fazem nada. (…) Basta olhar para os dados da Segurança Social para ver o que de facto poderá acontecer: só famílias com várias pessoas e várias crianças poderão acumular esse tipo de valores.”

Convém relembrar, a propósito, que Mota Soares pertence ao partido de Paulo Portas, o mesmo Paulo Portas que já tinha arremessado um lodo indiscriminado sobre o RSI, quando anunciou que alguns beneficiários tinham sido excluídos por terem contas bancárias com cem mil euros.

O título deste texto rima, é certo, mas nem tudo é verdade, porque um democrata não pode esconder informação útil ao povo. Mota Soares poderá, apesar de tudo, ser cristão, mas o seu confessor deve ter muito trabalho, porque é evidente que peca abundantemente por palavras, actos e omissões.

Comments

  1. MJoão says:

    O homem que mais se adora ouvir. Quando discursa fá-lo ” em circuito fechado.

  2. Miguel Castro says:

    Nas próximas eleições vamos fazer com que esta gente volte a ir para o parlamento de Táxi !

  3. Eu Mesma says:

    Cristão, do jeito que o diabo gosta.

Trackbacks

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  2. […] fingiu, há uns anos, que era jornalista e regurgitou umas generalizações acerca dos gregos. Mota Soares, alegado católico, lançou uma crítica nauseabunda sobre os beneficiários do Rendimento Social de Inserção, que […]

  3. […] a Estado Social (Pedro Mota Soares, então ministro – sem rir, agora – da Solidariedade Social, chegou a criticar as famílias – famílias! –  que recebiam cerca de 950 € de ajudas do Estado).  Essa destruição passa, até, pela substituição de palavras, como […]

  4. […] Solidariedade Social (vamos tirar esse sorrisinho da cara, já!), chegou a criticar o facto de que havia gente a ganhar fortunas à custa do Rendimento Social de Inserção, como todos os bons direitolas do mundo inteiro que se dedicam a chamar parasitas aos que recebem […]

  5. […] A melhor coisa a fazer ao pobrezinho é manter ou aumentar preços, baixar salários, a ver se o pobrezinho se mexe. Assim, é tudo ao contrário: é só facilidades e o pobrezinho lá continua a viver com a mulher e os três filhos, todos no mesmo quarto e todos desempregados. Pedro Mota Soares, há uns tempos, já tinha explicado tudo cristãmente. […]

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