Acordo? Ortográfico?

atar2by2bdesatarEm Díli, durante uma reunião da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), houve um momento de tensão, quando os representantes de Angola e de Moçambique rejeitaram a utilização do chamado acordo ortográfico de 1990 (AO90) na acta da reunião, sendo que o problema começou exactamente na própria palavra “acta”. Relembre-se que o AO90 não está em vigor naqueles dois países africanos.

(Mas o AO90 não veio impor uma ortografia única no mundo da lusofonia? A propósito, o que terá acontecido aos professores portugueses que, em 2013, davam formação a colegas angolanos?)

É curioso relembrar que, há dois anos, os representantes das agências de notícias dos países lusófonos reuniram-se, tendo como um dos objectivos a “escolha do padrão ortográfico” de um site comum.

(Mas qual seria a dúvida? Depois de o AO90 ter sido imposto no Brasil e em Portugal, o padrão ortográfico não estava escolhido por inerência? Mau, Maria!)

Há pouco tempo, Lúcia Vaz Pedro, professora de Português, formadora e cronista do Jornal de Notícias, afirmou que o AO90 “permitiu unificar a língua portuguesa”, frase equívoca resultante de equívocos vários, já que não houve sequer unificação ortográfica.

Costa Moura, secretário de Estado da Justiça português, presente na reunião de Díli, considerou que não era boa ideia “ter duas versões de uma mesma língua, de uma reunião, de uma comunidade, que fala uma língua”. O secretário de Estado tem, pelo menos, a desculpa de não ser professor de Português.

Os defensores do AO90, tarólogos da ortografia, dirão que isto é passageiro, que há um amanhã na próxima esquina em que a lusofonia toda adoptará, a uma só caneta, uma mesma ortografia. A realidade, tresloucada, no entanto, desmente: não há edições únicas, não há edições únicas, não há edições únicas e não haveria edições únicas. Nada disso impede os acordistas de afirmar que há uma ortografia única.

Entretanto, nos países que fingem ter adoptado o AO90, o caos ortográfico está instalado, com os alunos, o elo mais fraco, a serem castigados. Na CPLP, há outros países que se recusam a fingir.

Comments

  1. Essa Lúcia até mentiu, afirmando que as coisas estavam “bem encaminhadas” em Angola para a implementação do AO, o que é absolutamente falso e uma hipótese cada vez mais remota. Isto serviu para tornar a situação bem clara.

  2. As consequências da declaração oficial e solene de Angola e Moçambique são diferentes e bem mais espectaculares do que se poderia julgar: o que limpidamente decorre da Declaração de Dili é que o chamado “2º protocolo” que modificou o modo de vinculação dos países intervenientes no sentido de que deixaria de ser necessária a unanimidade de todos para a entrada em vigor do acordo, passando a bastar apenas a ratificação por 3 países, não é válido, porque precisava ele mesmo de ser unanimemente ratificado – e não o foi!
    É que, se o “2º protocolo” fosse válido, o acordo estaria, também, em vigor em Angola e Moçambique – não necessitando de mais ratificações para produzir efeitos!
    Mas o “2º protocolo” – uma tentativa de golpada – não é válido nem em Angola, nem em Moçambique, nem em… Portugal, nem em lado nenhum: é o texto original do tratado que está em vigor e, com ele a exigência da aprovação por unanimidade. O que não aconteceu.
    Simples!
    O “2º protocolo” não está em vigor na ordem jurídica internacional e, por isso, na interna de qualquer dos países intervenientes. Não está, seguramente, em Portugal, por via, desde logo, do artº 8º da Constituição da República.
    E não há nem assinaturas, nem carimbadelas, nem cuspidelas, de cavacos, inconseguidas, alçadas, sócrates ou lopes santanas que supram a vontade de dois estados soberanos, modifiquem o texto de um tratado e o Direito internacional!

    Assim, aliás, sempre pensaram os especialistas, entre os quais o actual Provedor de Justiça Faria da Costa e Doutor Francisco Ferreira da Almeida, ambos professores da Faculdade de Direito de Coimbra e que vêem hoje a sua opinião confirmada do modo mais eloquente (http://www.dn.pt/inicio/opiniao/interior.aspx?content_id=2300823&page=-1)

  3. P.S. Costa Moura tem a desculpa de não ser professor, mas não a de não ser jurista e, das duas uma: ou o 2º protoclo está em vigor, e, estando, o acordo vigora em Angola e Moçambique, pelo que a exigência de Angola e Moçambique deveria ser alvo de um protesto solene, invocando-se o tratado, ou Portugal, Brasil (para falar nos mais empenhados) acabam de reconhecer que o 2º protocolo não tem validade e o acordo não entrou em vigor em lado nenhum, nem entrará, até que seja unanimemente ratificado por todos os estados.

  4. Angola realizou o ano passado o censo da população. Para que não existissem multiplicação de localidades, foi imposta uma caligrafia única, utilizando nomes do tempo colonial. Por exemplo, escreveu-se Cuanza Norte e Cuanza Sul como província, quando vulgarmente se utiliza Kuanza ou mesmo Kwanza. O mesmo foi válido para Calandula que se escreve Kalandula. O coro de protestos e indignações que se levantou, levou o governo a explicar a necessidade técnica para efeito do Census 2014, mas que no futuro a questão voltaria a ser debatida. K, Y e W são utilizados no dia a dia com frequência. Com a massificação de erros ortográficos básicos cometidos pela maioria da população, incluindo estudantes universitários, face à influência das línguas nacionais e são várias, que se mistura com o português, a que se junta um calão mais a linguagem SMS., com a generalidade dos angolanos a gostarem de usar K, Y, ou Z, porque sim, porque se habituaram, o governo angolano não estará muito interessado em contrariar a população apenas para agradar a Lisboa ou Brasília…
    Acordo Ortográfico em Angola? Não creio que tal venha a acontecer nos próximos anos. A não ser que fique restringido a uso académico e mesmo assim não faltariam vozes a erguerem-se falando em neocolonização, argumento com muito peso por estas paragens…

    • O acordo não pode estar em vigor nuns países e não estar noutros. De facto, e de direito, não está em vigor em nenhum.
      A questão, no que respeita a Portugal reside em sabermos até que ponto vamos aceitar um simulacro de legalidade. Já é altura de deixar de brincar com a Lei: o acordo não vale mais do que a licenciatura de Relvas.

  5. Edgar says:

    E “ataram” ou não “ataram”? Se não “ataram” ficaram sem “ata”.

  6. Olá senhoras e meninas. Visitem o meu blog e deixem feedback https://martinhaecompanhia.wordpress.com/
    Obrigada ☺💋

  7. Edgar says:

    O Português é uma língua viva, em permanente evolução em cada país lusófono. A riqueza da literatura confirma este facto. Quantos acordos ortográficos vão ter que fazer para acompanhar essa evolução?

    • A permanente evolução não implica acordos nem afastamento. Concordará em que a língua inglesa está, também, em permanente evolução, é falava em mais de 20 países como língua oficial e não há quaisquer acordos nem as diferenças aumentam na ortografia. As diferenças ortográficas entre Portugal e Brasil não foram introduzidas pela evolução da língua mas por questões ideológicas.

  8. pedro barros says:

    Em situação normal, usa-se a ortografia do país em que é realizada a reunião. Quando todos os países da CPLP tiverem retificado aquilo que assinaram, a questão não se coloca.
    O que mais notável nisto é o representante de Angola querer que agora seja usada uma regra diferente para a redação das atas daquela que até aqui sempre foi usada. O desacordismo é feito de rancores e gosta de desentendimentos. Há de passar, isto não é problema.

    Problema mesmo é o ministro dos Direitos Humanos angolano não saber o quando é que “ata” é súmula de reunião, e quando é uma forma do verbo “atar”. Agora imagine-se os problemas de entendimento deste ministro angolano com “acordo”, “vela”, “muda” e dezenas de outras. É muito provável que ele pense que isto de homógrafas é coisa que apareceu com o AO ou que existe apenas em Português. Isto, sim, é um problema, mas um problema de capacidade intelectual geralmente observado nos desacorditas.

    Entretanto, isto de o ministro dos Direitos Humanos angolano andar tão ocupado com o “problema” das “atas” justifica que ele não tenha tempo para tratar de assuntos ligados aos direitos humanos em Angola, como se pode perceber por esta notícia:
    http://www.voaportugues.com/content/eurodeputada-diz-que-situacao-dos-direitos-humanos-em-angola-nao-pode-ser-pior/2807856.html

    • António Fernando Nabais says:

      O pedro nunca – mas nunca – me desilude.
      1 – “Quando todos os países da CPLP tiverem retificado [sic] aquilo que assinaram, a questão não se coloca.”
      Quando todos os países da CPLP tiverem o quê? Retificado? Como o pedro usa o AO90, é natural que escreva assim o verbo. Será que o pedro pensa que o acordo ortográfico deve ser rectificado? Ou será que queria ter escrito “ratificado”? Se o pedro não souber a diferença entre os dois verbos, pode sempre consultar um dicionário.
      Por outro lado, a confiança que o pedro mostra acerca da “retificação” do AO90 poderia revelar um pequeno tique colonialista, assim como se o pedro fosse dono da ortografia escolhida por outros países.
      Esta afirmação confirma, ainda, a tocante ingenuidade dos acordistas, quando sonham que os tratados e as actas da CPLP passarão a ser redigidos numa ortografia única. Vamos escrever “econômico” ou “económico”? “Concepção” ou “conceção”? O pedro limitar-se-á a dizer que isso depende do país em que se realizar a reunião, fingindo, à boa maneira acordista, que há uma ortografia única.
      2 – Já havia palavras homógrafas antes do AO90. Com o AO90 aumentaram. É simples. E estúpido, claro.
      3 – Neste, como noutros assuntos, o acordismo usa o velho argumento redutível à frase “Preocupam-se com umas coisas e não se preocupam com outras”. Toda a gente sabe que alguém que perca tempo a pensar sobre o AO90 não pensa em mais nada. Ó pedro, não me diga que o ministro angolano passará a pensar sobre os direitos humanos, assim que o seu país “retificar” o AO90!
      Por outro lado, este argumento faz-me pensar naquela afirmação delirante da Nota Explicativa acerca do espaço que as consoantes mudas ocupavam no cérebro das criancinhas, criancinhas essas que, coitadas, continuarão a aprender inglês, essa língua em que não se pronuncia, por exemplo, o T de “castle” ou o L de “salmon”. Nem sei, pobrezinhas, como irão aprender a pronunciar o apelido de Somerset Maugham.

      • pedro barros says:

        Como habitual, o António, à falta de carne, dedica-se a apanhar ossos sob a forma de erros. Se lhe “fás” (osso, antónio, apanha o osso) bem ao ego, eu vou continuar a deixar-lhe mais um ou “otro” (osso, antónio, apanha o osso) para o António apanhar.

        Quanto às ao ensino, como é evidente, o acordo ortográfico vai facilitar a aprendizagem dos miúdos. Qualquer professor que não esteja capturado pelo rancor (a grande maioria) diz isto mesmo, como, por exemplo, se pode ouvir aqui cerca do minuto 7:
        http://www.rtp.pt/noticias/index.php?article=828194&tm=202&layout=123&visual=61

        Quanto ao mais, eu acho que o Acordo unificou, porque se tivesse ficado tudo na mesma os racistas da ortografia não estariam tão zangado com ele.

        • Quanto ao ensino iria facilitar? O Bechara disse exactamente o contrário, há 2 ou 3 meses, e perante uma comissão do senado brasileiro. Diz mesmo, que a ortografia não tem rigorasamente a ver com a aprendizagem. Só em parte é verdade: uma letra contém informação para a leitura. Se se retira, são uns bits que deixam de estar ao serviço do leitor.
          O interessante é que o Bechara no Congresso Brasileiro não se permite dizer as chachadas que sem a mínima vergonha na cara servem aqui.
          https://www.facebook.com/contraoacordo/videos/vb.435046346557159/843334345728355/?type=2&theater

        • António Fernando Nabais says:

          Tem razão, mas a culpa é sua. O pedro não me dá carne: não tem ortografia, não tem argumentos, não tem educação. De si, só posso esperar ossos. Enfim, tenho uma vida de cão.
          Descobri, então, onde é que o Luís Filipe Redes produziu a célebre distinção entre consoantes e letras. Obrigado. Afinal, sempre me deu carne. É pena estar estragada.
          O seu último parágrafo é mais uma ossada: o pedro “acha” que o acordo unificou (não tem a certeza?) e aponta como causa para o seu “achamento” a zanga dos “racistas da ortografia”, essa expressão tão cheia do nada do costume.
          Três conselhos: leia muito, estude mais e peça desculpa aos seus pais por não estar à altura da educação que tão esforçadamente lhe quiseram dar.

          • pedro barros says:

            Pois eu tenho mais conselhos para lhe dar: leia muito, estude mais, de preferência fora da sua área de conforto para deixar de replicar imbecilidades ortográficas e outras, deixe de ser racista da ortografia, deixe-se de arrogâncias que mascaram certezas de inferioridade, e pela desculpa aos seus pais por se ter transformado num adulto patético porque acredito que não era isso que eles esperavam que você viesse a ser.

          • António Fernando Nabais says:

            Pronto, pedro, não fique assim, menino! Então o pedro quer falar sobre ortografia, dá erros ortográficos e faz de conta que é de propósito? Depois, à falta de argumentos, usa expressões ofensivas e acredita que ninguém lhe chamaria a atenção? Já que não quer ler ou estudar, beba muito chazinho, a ver se compensa o que não digeriu. Adeus. E cumprimentos ao silva.

    • Parece que pedro barros não percebeu que o intuito do “2º Protocolo” era que o acordo entrasse em vigor em todos os estados com apenas 3 (três) rAtificações, tornando as outras dispensáveis.
      O que Angola, Moçambique e Guiné-BIssau fizeram há 3 dias foi declarar que o 2º protocolo não entrou em vigor (porque não o ratificaram) e que, por isso, a regra original da unanimidade se mantêm.
      Isto quer dizer que o acordo ortográfico não está em vigor em lado nenhum, nem o governo português tem a mínima base legal para o que anda a fazer.
      Se queremos falar de direitos humanos, podemos começar exactamente por este atentado ao estado de direito.

  9. Em países democráticos os governantes seriam presos por imporem o novo acordo. O ao90 não está em vigor, tendo em conta que nem todos assinaram essa bosta.

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  1. […] as diferenças ortográficas, há muitas outras que continuarão a impedir que possam ser redigidos textos únicos em reuniões internacionais (por muito lusófonas que sejam) ou que possa haver edições únicas a viajar pelos países da CPLP, factos que, só por si, […]

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