Convido o caro leitor a descer comigo até ao submundo da imbecilidade, onde a propaganda política é lei e o debate sério foi substituído pelo fundamentalismo político-partidário. Preparado? Então vamos lá: Miguel Macedo foi hoje formalmente acusado pelo Ministério Público pela prática de três crimes de prevaricação e um de tráfico de influências, o que o coloca acima de José Sócrates, contra quem nunca foi deduzida acusação, na cadeia alimentar do crime de colarinho branco. Quer isto dizer que Macedo é pior que Sócrates, o que me leva a concluir que, se Costa era colado a José Sócrates durante a campanha eleitoral, e estando o PàF ainda em campanha eleitoral, é igualmente legítimo colar Passos Coelho a Miguel Macedo, o que faz de Passos Coelho pior que António Costa no que a trafulhice diz respeito. Até porque não temos conhecimento de qualquer Tecnoforma associada ao líder do PS.
Regressando ao plano mentalmente são, falemos de coisas sérias: a justiça raramente consegue pôr a mão nas elites políticas e Miguel Macedo, presunção de inocência à parte, está numa situação extremamente delicada. Fez ontem exactamente um ano que o homem forte de Pedro Passos Coelho apresentou a sua demissão da chefia do Ministério da Administração Interna e, um ano volvido, vê-se agora sujeito à medida de Termo de Identidade e Residência e está proibido de contactar os restantes arguidos.
Mas este caso não se resume a Miguel Macedo. Para além dos restantes envolvidos num caso que, vá-se lá saber porquê, não captou grande atenção da imprensa nacional durante a recente campanha eleitoral, mais interessada no estafeta da Telepizza do que nesta rede criminosa, existe gente graúda com o seu nome associado ao escândalo:
- Marques Mendes, apanhado em escutas a pedir favores a outro acusado, António Figueirado, ex-director do IRN e pai de Luísa Figueiredo, sócia de Marques Mendes na empresa JMF Projects e Business Lda., é consultor da Abreu Advogados desde 2012, por onde passaram 1 em cada 3 casos de pedidos de Vistos Gold (200 no total), “detalhe” que deu origem a uma notícia na edição online do DN, entretanto apagada, não sem antes ser resgatada pelo João José Cardoso;
- Luís Vaz das Neves, juíz e presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, apanhado em escutas com António Figueiredo nas quais se apresenta estranha e excessivamente disponível para “tudo o que o soutor entenda que posso ser útil”, “pessoal e institucionalmente”, escuta essa que deu origem a um inquérito, entretanto arquivado pelo Supremo;
O universo de cunhas paralelo ao caso dos Vistos Gold parece não ter fim. Até Miguel Relvas pediu favores ao antigo director do IRN. Mas verdadeiramente singular é o caso de Bruno Anes, filho de Maria Antónia Anes, também acusada pelo MP pela prática de 1 crime de corrupção activa, 1 crime de corrupção passiva e 1 crime de tráfico de influências, que recebia, desde 2008, uma avença mensal de 1544 euros mais ajudas de custo e transporte, suportadas pelo IRN. Maria Antónia Anes era, quando o escândalo rebentou, Secretária-Geral de Justiça.
A ver vamos onde isto vai parar. Apesar de ter perdido grande parte da minha fé – sim, da maneira que isto está só com fé é que a coisa vai – na justiça portuguesa, desconfio que alguém vai receber um Visto Gold para Évora. Estou em pulgas para ver os fanáticos que sonham com Sócrates dia e noite fazerem de conta que isto não está a acontecer.
Só acredito quando vir. Dá-me a ideia que a justiça tem dois pesos e duas medidas consoante esquerda e direita.
Tenho ainda a ideia que a própria população é mais exigente com a honestidade dos políticos de esquerda que com os da direita.
É como se um defensor da livre iniciativa e do capitalismo selvagem seja considerado coerente quando rouba, mesmo que muito, e um apoiante da liberdade igualdade e fraternidade seja severamente condenado a nível moral quando rouba nem que seja poucochinho.
Daí que seja mais eficaz colar o Costa ao socras quando o Costa desde 2009 que está fora dos governos do que colar o passos ao Macedo embora tenham sido amigalhaços (e sejam).
O exemplo mor disto é o Marco António ter desaparecido na campanha porque a sua imagem é o que se sabe, mas tenha aparecido a comentar como porta-voz logo no próprio dia das eleições, sem isso suscitar qualquer incómodo aos eleitores de direita (que provavelmente até ficaram satisfeitos com a blague tipo “vejam como o nosso passos é um traficante competente”.
Só espero que o autor deste texto tenha isenção no que escreve. Na comunicação social já não exíste isenção. Ou são esquerda, e falam mal direíta, ou são da direita, e falam mal da esquerda. Eu hein? Haja paciência! Portugalete em que estamos???