Zuckerberg doa a Zuckerberg e foge ao fisco

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É impressionante a falta de sentido crítico dos nossos media na difusão da notícia da “doação” da fortuna de Zuckerberg à caridade internacional, transmitindo a ideia de um filantropo profundamente generoso, completamente desligado da volúpia do clube dos multimilionários norte-americanos, realizando um sacrifício pessoal por “um mundo melhor”.

Quando se lê com rigor a carta de Zuckerberg, percebemos que doará durante os próximos 45 anos (a doação não é imediata) 99% da sua participação na Facebook (cerca de 45 mil milhões de dólares) à fundação Chan-Zuckerberg que pertence à própria família Zuckerberg. Foi registada como uma sociedade de responsabilidade limitada, ou seja uma Chan-Zuckerberg Ltda. e não uma fundação caritativa. Este estatuto não obriga Zuckerberg a aplicar o dinheiro em ações caritativas, permitindo-lhe investir em tudo o que quiser, inclusivamente em investimentos lucrativos. Zuckerberg poderá também transferir para a fundação os lucros da sua participação na Facebook escapando aos impostos, mas ainda mais interessante é a possibilidade da sua família herdar a sua fortuna via fundação sem ser taxada.

Nada disto é novo, a fundação da família de Bill Gates funciona em moldes semelhantes e como já foi denunciado em várias peças de jornalismo de investigação, a sua atividade económica mais importante é o investimento em fundos e em produtos financeiros. A caridade é uma atividade quase de fachada financiada apenas com os juros e os dividendos da sua fortuna envolvendo quantias bem mais modestas que as transações da fundação de Gates nos mercados financeiros.

Comments

  1. José M. says:

    Após assistir ao espectáculo em que a nossa comunicação social transformou esta “doação” da treta, fica-me uma dúvida: para se ser jornalista em Portugal será obrigatório ser imbecil? Ou uma pessoa normal também pode ambicionar esse trabalho?

  2. José Monteiro says:

    Independentemente de poder estar certo na denúncia que faz quanto às intenções pessoais e familiares … dos “fundadores”, …parece desconhecer que uma Fundação saudável, que queira ser duradoura, eterna, como todas devem ser, só deve – só pode – viver o seu dia a dia, só pode financiar a sua actividade social, com os juros e dividendos – com PARTE dos juros e dividendos – que recebe, nunca com o capital …

    • Tudo bem, e sou um dos que já beneficiou de fundações que funcionam dessa maneira. Mas essas fundações (que são a esmagadora maioria) não se apresentam com fachadas de filantropia, nem estão a associadas a personagens que fazem grandes proclamações lançando a falsa ideia que estão a doar o próprio capital.

      • José Monteiro says:

        Assim não vale a pena. Não foi “disso” que eu falei … porque “disso”, nos casos em apreço, nem sei.

  3. joão lopes says:

    “é impressionante a falta de sentido critico…” acho que o problema esta mais aqui,sendo que o sentido critico não é confundivel com o “bota abaixo” mas sim com inteligencia e pensamento.há quem diga que as pessoas se dividem entre os que veem TV/facebook e emburrecem e os que se dedicam á leitura e evoluem(sendo que a leitura precisa de concentração e um tempo muito proprio,incompativel com sms,mail ou com os blockbuster de hollywood hipervelozes)

  4. Claro que esta decisão tem a ver com o chamado planeamento fiscal. E então? A solução seria a distribuir todo o dinheiro sem qualquer critério, desbaratando, melhor, liquidando, de forma absolutamente improdutiva esta descomunal fortuna?

  5. Rui Moringa says:

    Truques, atrás de truques, não há limites para a perfídia dos homens.
    O que mais me choca é ganhar dinheiro tendo como argumento o altruísmo.
    Há quem tenha colocado em evidência que o altruísmo é de facto uma forma de egoismo.
    Pelos vistos este caso é uma dessas provas.
    Não uso feicebuque.

    • Ana Moreno says:

      boa, também não uso feicebuque!
      Dos média, o que se requeria, era tão somente que informassem em profundidade, ou seja, com os detalhes apresentados no post…. nessa base, cada um faz o seu juízo. O problema é quando não são dadas as informações necessárias para tal…

    • Devia. Quanto mais não fosse para colmatar ignorância.

  6. Impressionante. Mais um abre-olhos.

  7. João says:

    Esta notícia peca por ser de análise muito superficial E revela muito pouco conhecimento de causa.
    Em relação ao ao formato que Mark Zuckerberg escolheu para cumprir o juramento que fez numa carta aberta à filha recém-nascida convém perceber o seguinte:

    Mark Zuckerberg, sendo como é um tipo inteligentíssimo, escolheu uma estrutura jurídica que, não sendo comum neste tipo de instituições (LLC Foundation – fundação de responsabilidade limitada, em vez do tradicional Trust Fund), vai lhe permitir ter muito mais controlo no dinheiro que prometeu dar e com uma eficácia muito superior.

    A nova LLC de Mark Zuckerberg bera pode fazer as seguintes coisas que estão vedadas a um Trust tradicional:

    1. Fazer investimentos for-profit e non-profit simultâneos.
    2. Fazer doações políticas. E , ao contrário das fundações de caridade não são obrigados a reportar quem ajudaram podendo desta forma ficar protegidos de lobbys e grupos de pressão civis bem como das forças políticas opostas. Pode parecer que não mas nos Estados Unidos isto é de somais importância.
    3. Havendo de facto dedução nos impostos que Zuckerberg teria de pagar, no entanto na constituição desta LLC fica estabelecido que qualquer rendimento gerado pela fundação será automaticamente reinvestido na mesma e reaplicado nos esforços e programas de caridade da Fundação.
    4. De facto, fundações privadas que são LLC podem gerar poupanças, ao nível dos impostos, para os seus proprietários. Mas só podem fazer essas deduções nos fundos dados pela fundação a entidades non-profit com registo 501(C). Ou seja, ele só vai deduzir impostos na medida igual do montante que doou a entidades registadas como de caridade non-profit.
    5. Este formato jurídico permite reagir rapidamente e decidir eficazmente onde melhor alocar o dinheiro sem as usuais restrições impostas aos tradicionais trusts.

    Convém perceber porque Mark fez isto!

    As anteriores doações de Mark acabaram por ser pouco eficazes porque a partir do momento em que ele dá o dinheiro perde controlo sobre ele. Quando Mark doou 100 milhões de dólares ao sistema de educação público de Newark maior parte do dinheiro foi para à mão de consultores e muito pouco verteu para o sistema foi um falhanço e serviu-lhe de lição.

    Todas as pessoas, que opinam com conhecimento e não como o autor do artigo que agora comento, percebem que foi a única solução possível e inteligente criar sim uma LLC e não uma típica 501(C) Trust. Em vez de dar dinheiro a diversas instituições e não ter controlo sobre o que é feito com ele, Mark optou por ter voz activa e controlo efectivo no que é feito com o SEU dinheiro.

    Em conclusão, não dêem ouvidos aos críticos ignorantes que são zero-contribuintes para o bem estar da humanidade.
    A Bill Gates Foundation, A Emerson Collective ( da viúva de Steve Jobs) e agora a Chang-Zuckerberg aliaram-se para revolucionar e inovar na questão do problema do custo da energia no mundo inteiro de modo a providenciar energia limpa e acessível a todo o 3 Mundo.

    É questão para perguntar aos críticos. O que é que vocês têm feito pelo Mundo ultimamente?

    • joão lopes says:

      tudo muito certo.agora critica os criticos porquê? perguntar ofende? investigar ofende? saber porquê ofende? nada contra o Mark ,mas o livro das caras …emburrece mesmo.

    • Rui Moringa says:

      Oh João, ajudo os meus vizinhos e os mais próximos e da forma que posso: trabalho, companhia, algum dinheirito.
      Não sou o Mark e não preciso de o ser. Reconheço que como Ser Humano em com toda a certeza muitas qualidades e à vista.
      Não sou a consciência dele…
      Contudo a habilidade, da doação a uma fundação sua, parece-me mais oportunismo.

      • Joao says:

        Compreendo a sua opinião Rui Moringa. De facto é mais difícil dar quando se tem pouco como é o meu caso. O que acho é que o artigo em causa não foi esclarecedor e até derrogatório no seu tom. Mark Zuckerberg está e estará sempre na posição de ser criticado por ter cão e por não ter cão. Acho muito bem que se critique mas na acepção mais nobre da palavra, ou seja, cada um tem direito à sua opinião mas ninguém tem direito aos seus próprios factos.
        No artigo comentado a opinião sacrificou os factos para dar voz a uma indignação interessante – Como é que Mark Zuckerberg, que não precisava de fazer isto nem da publicidade, se atreveu a criar uma instituição que vai doar um bilião de dólares, em media, por ano durante 45 anos, que sacaninha! ele quer é poupar nos impostos. Acho que , na minha opinião sublinho, tal posição esta imbuída de um cinismo exacerbado.

        @Joao “investigar ofende?” coisa que não houve neste artigo foi investigação muito menos aferir a razão dessa decisão.
        De outra forma o autor saberia que as passadas doações de Mark levaram-no a preferir uma solução que canalize o dinheiro para onde ele acha que deve ir. Afinal o dinheiro é dele não?
        Eu acho que é boa noticia há quem veja nisto oportunismo mas contra isso nada há a fazer. Se calhar o tipo é mesmo um oportunista da pior espécie que quer fugir aos impostos.

    • Ana Moreno says:

      Portanto, é muito bom para nós que o Sr. Zuckerberg possa escolher a quem faz doações políticas??? Por acaso também sabemos quais são as suas opções políticas? Sabendo que anda a ganhar esses montes de dinheiro vendendo os dados pessoais das armadas de facebuquistas, pouca confiança me dá; e embora podendo ser apenas “uma versão da verdade”, o filme “A rede social” também não inspira grande confiança sobre o personagem. É evidente, faz o que quiser com o seu dinheiro; e como é tão inteligente, esta até é bem capaz de ter sido mais uma jogada para se promover a si e ao seu negócio. Mas como diz Michael Edwards, do Think tank Demos: “Não acredito que a maioria dos americanos queira que seja um par de bilionários a determinar como deve ser o sistema escolar, que medicamentos devem usar e que sementes utilizam.”
      Trata-se pois de PODER; e de poder nas mãos de gigantes financeiros já temos suficiente e andamos a lutar para conseguir que não nos ponham de vez o pé em cima.

  8. Joao says:

    Concordo consigo Ana! no que diz respeito a doações a partidos políticos. Deveriam ser conhecidas. É uma fragilidade enorme no sistema eleitoral dos Estados Unidos.
    Estava somente a enunciar o que ele pode fazer com uma Limited Liability Corporation em comparação com uma tradicional Trust Foundation.
    E volto a sublinhar que não conheço o Sr. pessoalmente e que se calhar é o diabo encarnado. Contudo, até prova em contrario, fiquei satisfeito com a noticia.

  9. Não estou para discutir o mérito ou demérito das Fundações dos magnatas nos EUA. Sei é que uma sociedade onde tão poucos têm fortunas colossais e dezenas de milhões de homens, mulheres e crianças vivem na mais profunda miséria é o que já sabia e o post confirma.
    Adenda: sim eu sei, há fundações…

  10. Agostinho Silveira says:

    Deixem-me aproveitar: alguém pode me explicar para que serve a Fundação Mario Soares? Digam-me só 2 coisas que esta Fundação tenha feito para o bem comum. E outras 2 para bem do fundador. Pode ser?

  11. felipe nogs says:

    45 mil milhões é o mesmo que 45 bilhões né lindo?

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