E novidades sobre o acordo ortográfico? Não há!

11337_10204484140098622_8880294994241081779_nPronto, confesso, o título é ligeiramente enganador. Em verdade vos digo que no Brasil o dito e chamado acordo ortográfico (AO90) passa a ser obrigatório, terminando, assim, o período de transição.

No entanto, e no fundo, não há novidades. Vejamos.

Alguns defensores do chamado acordo mostraram um tímido contentamento, festejando a ilusão de que, agora sim, passa a haver sintonia ortográfica entre Brasil e Portugal. Convém re-re-relembrar que a par de algumas aproximações ortográficas, o AO90 mantém muitas diferenças preexistentes e, re-re-re-pasme-se!, cria diferenças anteriormente inexistentes, obrigando, por exemplo, a que os hotéis portugueses deixem de ter recepção.

Para que a memória continue a não falhar, re-re-relembre-se que, para além de todas as diferenças ortográficas, há muitas outras que continuarão a impedir que possam ser redigidos textos únicos em reuniões internacionais (por muito lusófonas que sejam) ou que possa haver edições únicas a viajar pelos países da CPLP, factos que, só por si, deveriam ter sido suficientes para que se tivesse desistido de mais uma triste tentativa de unificar o que não pode ser unificado.

De qualquer modo, mesmo que o milagre da uniformização ortográfica tivesse acontecido, a maioria dos países lusófonos continua a não aplicar o AO90, o que leva a que a palavra “acordo” faça tanto sentido como o adjectivo “irrevogável” na boca de Paulo Portas. Alguns dirão que todos assinaram o acordo e que há ritmos diferentes e que têm a sopa ao lume, mas  a situação é tão absurda como assinar um contrato de promessa de compra e venda sem marcação de um prazo para a escritura.

Também não há novidades no que respeita ao carácter ortográfico do acordo: o acordo que não é acordo também não é ortográfico. O “princípio fonético” e as decorrentes “facultatividades”, entre outros disparates, continuam a destruir os próprios fundamentos da ortografia enquanto conceito, mesmo que se viva na ilusão de que não há problemas, quando se sabe, por exemplo, que há gente letrada a encher o espaço público (Diário da República incluído) de “fatos” e de “contatos”, reduzindo-se tudo a um fenómeno de hipercorrecção cujas causas não interessa conhecer.

A ausência de novidades constata-se também nos efeitos que o AO90 vai provocando na pronúncia de algumas palavras, como nota o Rui Miguel Duarte. Parece, portanto, que a “memória auditiva” a que se referia, esperançosamente, Lúcia Vaz Pedro está a ficar afectada.

Portugal é um país tão desgovernado que não sabe sequer tomar conta da ortografia. Que importância tem, então, que no Brasil o AO90 seja obrigatório? Não, não há novidades, infelizmente.

Comments

  1. Esta do “acordo” entrar em vigor no Brasil tem a sua graça. É que no Brasil, segundo o “acordo” não há uma única palavra – sim, não há uma única – que perca uma letra que seja. Isto é, será difícil dar por isso…
    O “acordo” continua por ratificar, de modo que o que entra em vigor no Brasil pode dizer respeito a ortografia, mas não é o “acordo”.

  2. Boa notícia! Não sabia. Há sem dúvidas algumas correções a fazer. Urge fazer. E contrariamente ao que o senhor “a” diz, no Brasil houve mudanças. Por exemplo a perda das tremas, inúteis.

    • António Fernando Nabais says:

      O trema não é uma letra, guz. Não sei se é inútil. E que correcções há a fazer?

      • Várias. Espetador, receção, excecional, entre outras. O acordo é uma coisa boa. Só falta limar arestas.

        • Mas essas palavras ficaram assim para seguir a “lógica” do acordo, segundo a qual só se escreve o que se pronuncia. Agora, e pela mesma lógica, as arestas a limar consistem em tirar todos os HH iniciais os UU entre Q e E/I, bem como alargar o número de facultatividades para que cada região escreva como pronuncia: “bamos, baca, etc. no Norte, “Lesboa” na capital e por aí fora.

          • Para a Maria quanto pior melhor.

          • Maria P says:

            Muito bom o comentário de Maria Martins! Este (des) acordo é uma verdadeira estupidez, uma aberração, uma mutilação da língua portuguesa – não ‘brasileira’, leia-se, que não existe! As consoantes mudas ‘cortadas’ pelo acordo, têm uma razão de ser; não estão lá por acaso! E, realmente, pela lógica de seguir a oralidade, então teríamos que abolir os HH iniciais, etc., como diz, e bem, o comentário de Maria Martins. Além disso, nunca será uma pretensa ortografia idêntica que promoverá uma unidade na escrita, porque portugueses e brasileiros usam expressões e palavras diferentes, constroem frases de maneiras diferentes etc… O inglês é língua oficial de quse 50 paísis, e em todos se fala (pronuncia) e escreve de maneira diferente, e nunca houve qualquer problema por causa disso. E nunca Reino Unido se sujeitaria a ‘mutilar’ a sua língua para agradar a americanos, por exemplo ( como nós, os lorpas portugueses, estamos a fazer com o Brasil, uma ex-colónia nossa!!!!)

        • António Fernando Nabais says:

          O guz é a favor do acordo e a favor da recuperação das consoantes mudas? Todas? Algumas? Quais? Não sabe que o “critério fonético” do AO90 leva à supressão dessas consoantes?

      • O trema é totalmente inútil. No Brasil há gente que rasga as vestes por eles. Espero que o saibam usar.

        • António Fernando Nabais says:

          Mas o guz sabe para serve o trema?

          • Sei para que serve o trema e conheço o acordo. Talvez por escrever com naturalidade nas duas grafias a minha preocupação seja sobretudo política. Gosto do atlantismo e gosto de convergências entre os povos lusófonos. Sei que mesmo em termos de acordo esta convergência ainda é longínqua. O António tem razão numa coisa: quais palavras a alterar? Eu subjetivamente sei de algumas que me causam urticária. Referi duas ou três. No entanto, é, sem dúvidas, um critério pessoal (ainda que partilhado por mais gente). Assim, talvez reconsidere a minha posição sobre o acordo e ache que o mais certo é não mexer em nada do que está acordado – ainda que não esteja completamente convencido. Acho que era bom haver aprimoramentos técnicos. A Maria P fala em “ex-colónia” e com isso apresenta bem o que está por detrás de muita argumentação anti-acordista, apenas com medo que mexam na Língua que pensam ser dos portugueses. Algumas petições miseráveis tinham balelas deste género.
            Não precisam agradecer por ter ajudado com o contraditório e ter levantado questões que podem ser pertinentes.
            Um abraço democrático.

          • António Fernando Nabais says:

            Misturar política e ortografia é mau para ambas. As ambições políticas dos autores do AO90 levaram-nos a descurar o saber científico e a criar um mau instrumento ortográfico (com consequências visíveis – e audíveis). Ao mesmo tempo, como não conseguiram alcançar a uniformização com que sonhavam, falharam também politicamente (o exemplo mais gritante é o da impossibilidade de criar edições únicas).
            Também gosto do atlantismo e de convergências com países lusófonos. Nada disso depende de um acordo ortográfico, especialmente se falhado. Aliás, o modo como este acordo foi concebido pode, até, redundar em menos atlantismo e mais divergências (convém lembrar que o AO90 só está a ser aplicado em três países).
            Mais uma vez, gostaria que me desse exemplo de alguns “aprimoramentos técnicos”. Para mim, é fácil: basta regressar a uma convenção tecnicamente superior, a de 1945.
            A alusão a possíveis xenofobias ou a hipotéticos complexos colonialistas não me diz respeito, ou não fosse eu “filho” das velhas edições Abril, dos primeiros álbuns do Tintim em português do Brasil, do Chico Buarque, do Caetano, do Drummond ou do Jorge Amado, entre muitos outros. E a ortografia nunca me fez confusão, ao contrário de diferenças lexicais que o tempo foi resolvendo.
            E agradeço-lhe o contraditório, claro.

  3. Em países realmente democráticos, este pseudo-acordo nunca entraria em vigor, pelas várias e importantes ilegalidades de que enferma, e ainda por ser uma verdadeira aberração, denunciada como tal pelas entidades competentes e que até foram consultadas. Mas os governos (principalmente os de Portugal) fizeram orelhas moucas a esses pareceres bem como a petições do povo. A negociação foi feita muito secretamente para não levantar ondas, e no fim, “tomem lá, que nós é que mandamos, legalmente ou não”. E nós (salvo seja, que nem todos) aceitamos tudo, como aceitamos outras formas de corrupção.

  4. Eu qá até gosto do aqordo. Axo qe devia ter cido maís ambicioso.
    Não fás centido termos letra mudas ou mais qe uma letra a reprezentar o mesmo çom. Os italianos, entre outras qoizas, aboliram o “h”. Escrever “ipopotamo” é respeitável na pátria de Dante.
    Porqe qarga de água para reprezentar o som “q” temos por opção o “q” e o “c”? Os noços antepaçados á cento e cinqo anos aboliram o “k” e o “ch” (como em “chimica” e “architecto”), devíamos continuar a obra deles.
    Esta jente xora por ter perdido o “p” do “Egipto”. Nunca ví ningem reclamar por nunca ter visto um “escripto”. Tiveram um cequlo para se abituarem ao “escrito”. Çó iço.

    • EMS: Na sequência do seu comentário, deixo aqui o link para outro texto do mesmo cariz e ironia. Já é bastante conhecido e foi escrito em 2009, mas pode alguém não conhecer e ele está um mimo, escrito pela Maria Clara Assunção:
      http://abibliotecadejacinto.blogspot.pt/2009/08/o-acordo-ortografico-e-o-futuro-da.html

      • Mark Twain quando debateu a possibilidade de reforma no inglês escreveu uma brincadeira parecida.
        Isto das reformas ortográficas não é uma originalidade lusa. A A maioria das línguas europeias fez uma ou mais alterações na sua escrita nos últimos 150 anos. O inglês que toda a gente do contra OA gosta de usar como argumento é das poucas que não fez alguma reforma.

        • O texto do link que deixei é mais que uma mera brincadeira: é uma ironia, e a autora é profundamente anti-AO. Julguei que o seu texto também tinha um sentido irónico, pelo que me lembrei deste. Quanto às línguas europeias terem feito reformas, do que tenho lido tais reformas foram mínimas (talvez no italiano tenham sido mais importantes) e nunca tantas como as que a nossa língua já sofreu nos últimos 100 anos. Quando fala de “toda a gente do contra”, isso faz-me pensar que o EMS é “a favor”, pelo que o seu primeiro comentário me deve ter induzido em erro. Eu também já fui por alguma simplificação gráfica, mas quando comecei a ver como este “acordo” foi cozinhado de qualquer maneira e imposto à bruta, contra a grande maioria dos pareceres avalizados, violando as regras dos tratados internacionais, e além disso não servindo a pretendida unificação, mas trazendo confusão q.b…., bem, depois de ver isso tudo e muito mais que não cabe aqui, posso dizer que também sou contra este pseudo-acordo, reforma, ou o que lhe queira chamar.

    • António Fernando Nabais says:

      Os italianos escrevem “ippopotamo”. Assim mesmo, com P geminado. É uma gente que desperdiça consoantes que até podem estar a fazer falta noutro sítio qualquer.
      De qualquer modo, o que é preciso é comunicar. Se rosnar for suficiente, por que diabo havemos de nos preocupar com ortografia? Roarrrr!

      • Bolas, apanhou-me pelo “p”.
        Não é por mudarmos ou ignorarmos a ortografia que passamos a ter uma comunicação mais primaria, como os rosnados.
        Considero a uniformização da ortografia útil. Não que eu seja um grande fã de regras mas porque num texto onde as palavras são escritas de uma forma previsível e uniforme não gastamos tanto esforço a decifra-lo.

        • António Fernando Nabais says:

          Caro EMS

          Não sei se a uniformização é útil. A verdade é que, com o AO90, continua a não existir.
          As “facultatividades” como caráter/carácter ou amámos/amamos são suficientes para estar garantida a imprevisibilidade e para se abrir a Caixa de Pandora que tem soltado erros ortográficos que não existiam.

  5. Há Plágio no Aventar says:

    A propósito de Acordo Ortográfico:
    O Aventar admite textos plágio ?
    É que o texto do Paulo Silva sobre Jaime Azinheira e a Escultura Portuguesa é um plágio descarado.
    Se não, veja-se:
    “Este artista produz esculturas de vincado desenho, feitas em materiais normalmente frágeis e com uma técnica original de moldagem, …
    criando singulares e cenográficos objetos artísticos, muito expressivos, …
    volumosos e até mesmo monstruosos, mas profundamente humanos”,

    (página de antigos alunos ilustres da Universidade do Porto)
    ———————
    As suas esculturas salientavam-se por serem feitas em materiais frágeis … através de uma técnica original e única de moldagem.
    Os seus trabalhos de escultura de uma enorme singularidade, cenográficos, são objectos artísticos muito expressivos.
    Nos seus trabalhos Jaime Azinheira serviu-se de figuras caricatas, em situações do dia a dia, muitas vezes monstruosas, mas sempre com um lado humano muito patente.

    Texto plágio do Homem Especial Paulo Silva

  6. Pedro Marques says:

    Também eu espero novidades suas Sr. Professor. Não se esqueça das minhas perguntas por favor.

    Cumprimentos,
    Pedro Marques

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