Fachos de Coelho não chegam ao céu

fachoOuvi finalmente o seu discurso  a propósito da proposta de orçamento de Estado para 2016 e tive uma epifania: Passos Coelho é um facho confesso. O homem está perfeitamente a borrifar-se para as pessoas, para o povo. Para o povo que o elegeu, embalado pelas suas aldrabices, cegas de ambição pelo “pote”, no mais vergonhoso assalto ao poder de que há memória em democracia, e para o povo que 4 anos depois não o elegeu, retirando-lhe categoricamente a confiança traída. De facto, como os seus apaniguados o classificaram, um discurso brilhante. Brilhante como um facho a queimar mentiras.

Depois de, como é hábito, recalcitrar na mentira, desta vez a de que a proposta de OE apresentada pelo Governo se limita a dar com uma mão o que tira com outra, mantendo incólume a austeridade, e depois de insistir na facécia de que o poder lhe foi usurpado pelo parlamento, Passos Coelho, para justificar o anúncio de que votaria contra o orçamento – o que só lhe fica bem -, sintetizou exemplarmente as razões pelas quais o povo, que despreza, lhe retribuiu o chuto no cú com desprezo.

Diz ele, a partir do minuto 12′ 30”, o seguinte:

O país inteiro sabe qual era a estratégia orçamental que nós executaríamos se estivéssemos no Governo. Defenderíamos uma mais gradual, mas permanente remoção da austeridade para não tropeçar no excesso de voluntarismo e não obrigar os portugueses a ter que pagar no futuro, novamente com mais sacrifícios, a imprudência do presente“.

Defenderia uma mais gradual remoção daquilo que no seu entender este orçamento não remove, a austeridade. Porque este orçamento a remove precipitadamente… O esplendor da congruência, portanto.

Apostaríamos numa fiscalidade mais favorável para as empresas e para o investimento, para promover melhor o crescimento sem dívida e o emprego sustentável. Mais e melhor investimentos e empresas hoje representam mais e melhores empregos e rendimentos amanhã“.

Apostaria em menos impostos para as empresas e em vistos gold e outras benesses de resultados estrondosos, e também na lotaria, nas corridas de cavalos e no euromilhões. Com o dinheiro roubado aos salários dos portugueses, medida temporária, mas estrutural, como anunciou em Bruxelas, bem entendido.

Seríamos mais exigentes na disciplina das contas públicas e mais ambiciosos na redução da dívida, nomeadamente antecipando mais reembolsos nos empréstimos do FMI e poupando mais nos juros. E sim, isso teria reflexo no curto prazo em matéria orçamental. Mas Portugal estava em posição mais previdente e mais segura“.

Seria mais exigente na disciplina das contas públicas e mais ambicioso na redução da dívida. Que, como se sabe, com resultado da sua indomável ambição, diminuiu, entre 2011 e 2015, de 96% para 128,9% do PIB… Claro que isso teria reflexo no curto prazo, mas isso também seria temporário. A vida é temporária. O mundo é temporário. Só a mentira de Passos é permanente.

Trocaríamos bem uma parte do esforço fiscal que este Governo pede aos portugueses para fingir que remove austeridade por uma reforma da segurança social que trouxesse por via fiscal sustentabilidade às pensões e reduzisse o défice implícito e explícito no sistema previdencial gerando assim confiança e segurança nos contribuintes nas pensões em pagamento e nas pensões futuras“.

Trocaria, traria, reduziria e assim geraria confiança e segurança nos contribuintes, equivalentes para já a um anunciado corte de 600 milhões de euros nas pensões… Tal como retirar rendimentos, cortar nas prestações sociais, desinvestir na educação, na ciência e na saúde, expulsar 500.000 portugueses do país, viria a criar doses industriais de confiança e segurança aos “contribuintes”.

Estaríamos a fazer a reavaliação da primeira vaga de reformas estruturais já realizadas e a preparar uma agenda ambiciosa de uma nova vaga de reformas estruturais mais voltadas para o aumento da produtividade dos serviços públicos, para a atracção de mais investimento externo e para promover uma maior abertura da nossa economia e o crescimento das nossas exportações, para inverter a recessão demográfica e para atacar as causas económicas e sociais das profundas desigualdades que persistem há décadas em Portugal“.

Estaria a reavaliar a primeira vaga já realizada, ambiciosa como só ela, e a preparar uma agenda, mais ambiciosa ainda, claro, de uma nova vaga. Uma new wave vaga, pelo campeão da vacuidade e da governação pela sangria, a carregar ambiciosamente nos mesmos de sempre: aumento da produtividade dos serviços públicos, talvez explorando as 45 horas semanais e a remoção dos feriados restantes; atracção de mais investimento estrangeiro, provavelmente atribuindo maiores incentivos fiscais ao capital e liberalizando os despedimentos;  abertura da nossa economia, possivelmente promovendo a prostituição, e inverter a recessão demográfica, certamente abolindo o uso do preservativo.

Menção honrosa para a misericordiosa referência às profundas desigualdades de que ele não teve culpa, porque persistem há décadas em Portugal. O facto de entre 2011 e 2012 se ter registado, em Portugal, uma subida de +0,9% na taxa de pobreza e de se terem vindo a agravar as desigualdades sociais desde 2010 (depois de uma melhoria entre 2007 e 2009), também é absolutamente irrelevante, mesmo que isso tenha representado um recuo de 10 anos em termos de desenvolvimento.

E não, não estaríamos a falar de renegociação da dívida como um pirómano se deleita com a destruição da reputação e de valor da economia como sucede com a actual maioria do Governo“.

Ainda disse, sabendo muito bem que a renegociação da dívida não consta dos acordos de esquerda e não tem sido suscitada pelo Governo, muito embora todos saibamos que é necessária e que deverá, mais cedo ou mais tarde, ser discutida no seio da UE.

É curioso notar que neste discurso brilhante não brilham uma única vez palavras ou expressões como dignidade humana, qualificação, desenvolvimento, povo, cidadãos ou mesmo pessoas, as óbvias destinatárias de qualquer medida de política pública e seus naturais juízes. O mais longe que Passos Coelho, o facho fosco, consegue chegar é a “contribuintes”.

 

Comments

  1. Mas se ele lá estivesse, talvez não tivéssemos sido brindados com mais estes 16 ‘aumentos’ e cortes:
    1-Reversão das pensões vitalícias
    2-Aumento do IMI
    3-Aumento do imposto no combustível (7c.+ IVA !!!)
    4-Aumento das propinas
    5-Aumento do preço dos serviços dos CTT
    6-Aumento do tabaco
    7-Aumento do selo dos carros
    8-Corte no subsídios para automóveis eléctricos
    9-Taxa nos cartões multibanco
    10-Selo nas comissões dos bancos
    11-Subida do imposto de selo
    12-Fim do quociente familiar
    13-Corte no orçamento das escolas
    14-Congelamento da progressão nas carreiras
    dos funcionários públicos
    15-As taxas de imposto de selo aplicáveis às
    operações de crédito ao consumo aumentam 50%
    16-Taxa de acesso ás estradas pelas garagens
    17-Aumento do preço dos carros novos (12,5%).
    Mas o Costa é que é o bom. Olhem, a mim aumentou-me 2 (dois) euros na pensão…

    • joão lopes says:

      os CTT? mas os CTT não foram vendidos?

      • j. manuel cordeiro says:

        Lá no partido não lhe facultaram a lista actualizada.

    • Ricardo Garcia says:

      1 – Subvenções. Reversão pedida por muitos deputados de todos os partidos.
      2 – Aumento do IMI? Onde?
      3 – Nos países desenvolvidos anda-se de transportes públicos e bicicleta, e anda-se muito bem.
      4 – Aumento das propinas? Onde?
      5 – CTT são privados.
      6 – Eu não quero pagar a sua quimioterapia. Se o fumador paga mais impostos é porque o seu vício é um problema de saúde pública que lesa o Estado (logo, lesa-nos a todos os não fumadores) em milhões de euros por ano. Deixe de fumar.
      7 – Vide ponto 3.
      8 – Estavam sobredimensionados. Não se justifica um imposto tão grande para um tipo de veículo que representa uma fatia residual do mercado.
      9 – Taxa no MB? Onde?
      10 – As comissões são cobradas sobre o setor financeiro.
      11 – Idem.
      12 – Dedução fixa por filho, mais benéfica para as famílias.
      13 – O número do azar, não posso discordar de tudo. Esta é inexplicável.
      14 – As carreiras já estavam congeladas.
      15 – Medida anti-endividamento. Bem.
      16 – Medida do anterior Governo (duh).
      17 – Vide ponto 3.
      Se a sua pensão aumentou, não se queixe. A PáF ia cortar 600 milhões na Segurança Social.

      • Nightwish says:

        ” Nos países desenvolvidos anda-se de transportes públicos e bicicleta, e anda-se muito bem.”
        Neste país não, desinveste-se e piora-se. Só é realmente bom em Lisboa e zonas ocasionais do Porto.

        “Eu não quero pagar a sua quimioterapia. Se o fumador paga mais impostos é porque o seu vício é um problema de saúde pública que lesa o Estado (logo, lesa-nos a todos os não fumadores) em milhões de euros por ano. Deixe de fumar.”
        Pois, mas os fumadores já pagam bem acima dos custos para o estado, agora são só um bode expiatório recorrente.

        • “Só é realmente bom em Lisboa e zonas ocasionais do Porto.” Conhece pouco do país então.
          “(…) agora são só um bode expiatório recorrente.” Põem-se a jeito. Com a informação que hoje há sobre os malefícios do tabaco, fumar não é só uma opção acéfala. É também um despudorado hedonismo umbiguista (passe a redundância).

          • Nightwish says:

            E então, que é que o estado tem a ver com o assunto se já tem o dinheiro?

      • tekapa23 says:

        Agache-se… agache-se e defenda-os, que é o que ‘eles’ querem. Fiquei admirado por não aproveitar e dizer mal de Salazar.
        E jáagora : Vai de bicicleta para o trabalho ? Não vai ? Então é tipo São Tomaz : Faz o que eu digo, não faças o que eu faço.

        • Mas há alguma coisa a dizer bem do “Doutor Salazar”?
          Infelizmente a minha prótese do trocanter não permite passeios de bicicleta. Vou de scooter.

    • António Sequeira says:

      Oh Augusto, anda um bocado baralhado. Esqueceu-se do corte de M€ nas pensões, que estava já prometido no PEC entregue em Bruxelas.

  2. john says:

    Excelente artigo, Parabéns, e porém perdone, “o chuto no cú” dispensa o acento, se basta um bom assento debaixo do cu. Pela mesma regra que o dispensam palavras agudas em i e em u, caju, peru, tatu e assim aqui, ali, dali e… venha um substantivo, o Mali.
    Já em saí e aí a coisa é diferente, se precisa acento por não fazer ditongo, ai, ai, meu, sai daí …

    • jpfigueiredo says:

      obrigado! tem razão mas sempre gostei de acentuar o cu, talvez pela interacção fálica do ´ com o u: nesse sentido, cú é sempre mais obsceno do que cu…

  3. Ana Moreno says:

    Belo, belo, belo texto. Ele é tudo, o teor informativo, o fluxo da escrita, o finíssimo sarcasmo e a pontaria da análise. Belo!

  4. Pode dar um grande prazer a conversa da treta, mas até hoje foi o unico governo em que a produção nacional excedeu as importações. Factos não alegram os propagandistas.

    • j. manuel cordeiro says:

      É engraçado. Umas vezes, as vozes de direita falam de o Estado não criar emprego. Outras, falam em governos que fazem a economia andar.

      Mas tudo são ilusões. Porque as exportações nacionais são Galp, VW e mais umas coisitas. Nada tem a ver com governação.

    • jpfigueiredo says:

      Cristof9, se não percebeu, eu falava de governar para as pessoas e pelas pessoas. Pessoas, percebe?Tretas é tudo o que o aldrabão do Coelho e da sua cáfila acéfala atiraram para cima de todos nós. E uma governação absolutamente incompetente e desastrosa. Mas está coberto de razão. Em matéria de exportações, foi imbatível: exportou 500.000 portugueses destruindo o esforço de qualificação de uma década.

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