Num manual de Português de 9º ano, reencontro o poema “Uma pequenina luz”, de Jorge de Sena. O manual, evidentemente, segue (ou tenta seguir) o chamado acordo ortográfico (AO90). Reparo que os vv. 21 e 28 contêm o adjectivo “indefectível”, assim mesmo, com C. Como sempre articulei aquela consoante, pareceu-me óbvio que ali se mantivesse, porque, segundo o espírito do AO90, consoante articulada é consoante grafada.
Um estranho instinto, um não sei quê, fez-me consultar, em primeiro lugar, o Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa. Como se pode ver, pela imagem acima, o C articula-se. Na“Introdução” do referido dicionário, ficamos a saber que todas “as entradas lexicais apresentam transcrição fonética, dada entre parênteses rectos, segundo a norma culta, aproximada, de Lisboa e Centro do país […].” Fiquei mais descansado: a minha articulação era culta.
Sabendo-se que os autores do AO90 afirmam basear-se na ou numa norma culta, seria de esperar que este “indefectível” constasse das obras de referência. Decidi-me por um passeio virtual e só não me espantei com os resultados porque espantoso seria que não me espantasse, tendo em conta a confusão ortográfica em que vivemos.
A verdade, ó leitores, é que, no Priberam, na Infopédia, no próprio Vocabulário Ortográfico Português, o “indefectível” passa a “indefetível”, sem que se consiga perceber em que pronunciação toda esta gente se baseou. Como é evidente, toda a família fica afectada, com o C a desaparecer de “indefectibilidade”, de “indefectivelmente” ou de “defectível”, palavras que terão de ser pronunciadas de acordo com uma norma talvez menos culta ou, no mínimo, distraída. Note-se que não existe sequer a possibilidade de uma dupla grafia: é “indefetível” ou não é.
Pergunto-me se os autores do VOP, guardiães da nova ortografia, terão consultado o Dicionário da Academia, coordenado pelo professor Malaca Casteleiro, um dos autores do próprio AO90.
A exposição já vai longa, mas não posso deixar de chamar a atenção para o seguinte: no Brasil, continua a escrever-se “indefectível”. O AO90 consegue, assim, desperdiçar uma oportunidade de manter uma única grafia da mesma palavra, criando uma diferença que o chamado “critério fonético” não autorizaria.
Confusos? É natural que sim, mas, no que se refere a esta ortografia, estar confuso é normal.
O post é que é extremamente mal escrito. Claro que para quem é contra o AO e não vê forma de o apurar tecnicamente, resta comentar que o seu post é imprestável como o AO. Imprestável, sem qualquer reforma possível.
O AO90 nasceu torto e não se pode endireitar. Nem quem é acordita ferrenho percebe estas contradições.
Folgo em saber que o return considera o AO imprestável.
Oh return, que confusão mental 🙂 Não admira que o texto lhe pareça mal escrito.
O AO é o esplendor da incompetência, da ignorância e da mediocridade.
Obrigado, António F. Nabais, por mais texto extremamente acutilante.
Bem me parecia que não podemos confiar no Vocabulário Ortográfico Português (VOP). A incompetência manifestada no AO tinha de estar presente também no VOP.
Ora vamos lá ver – se o acordo tivesse eficácia jurídica, isto é, se estivesse em vigor, seria uma norma legal, tal como qualquer outra, obedecendo aos princípios da interpretação das normas jurídicas. A grafia a observar seria a que decorre do texto do acordo: assim, a seguir o que lá está , “reescrever”, “reelegar”, etc deveria começar a escrever-se re-escrever, re-eleger, etc. conforme a Alínea b) do parágrafo 1 da Base XVI sobre o hífen e prefixos, que estipula que se deve usar o hífen. “Nas formações com prefixos “como, por exemplo: […] b) Nas formações em que o prefixo ou pseudoprefixo termina na mesma vogal com que se inicia o segundo elemento”
É o que lá está.
E não se diga que o “re” não consta do corpo do parágrafo 1: essa enumeração é meramente exemplificativa.
Talvez não se tenham sabido exprimir bem, mas a lei manda presumir exactamente o contrário: “Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador […] soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.”
Felizmente, que o acordo não tem qualquer força legal por lhe faltar a ratificação que exige no seu texto original – que não pode ser modificado senão por unanimidade.
Na RTP1 os comentadores comentam o disparate “marcelo é o melhor aliado de antónio costa”.
A extrema direita, de que a RTP1 é porta voz, ainda não compreendeu que o presidente de direita não tem a mínima razão nem obrigação para demitir o governo de esquerda que, ainda por cima, governa muito melhor do que o incompetente e desonesto governo do PSD/CDS.
Não entendem que o presidente não oiça as queixas e argumentos da extrema direita, mentiras e falácias que eles produzem para a sua comunicação social, que as ecoa até à exaustão.
Não lhes entra na cabeça que este presidente de direita, que eles elegeram, não demita o governo de esquerda, e lhes restitua o tacho do poder, que só a eles pertence.
E se organizássemos uma manifestação para mostrarmos aos políticos quem somos e o que queremos? Não chega já desta palhaçada do acordo (ab)ortográfico? Os exemplos de confusão são em catadupa.
Uma pessoa que não percebe nada do AO a escrever sobre o AO. Sol na eira e chuva no nabais.
Ó return, fiquei esmagado pela sua capacidade de argumentação! É obra!