O impaciente inglês

o-paciente-inglesUm paciente inglês, sujeito às agruras de uma lista de espera, impacientou-se e resolveu operar-se a si mesmo. A história tem mais alguns nós, mas dá que pensar. O pior, para alguns mais tendenciosos, será o facto de o pobre homem ter andado quinze anos inclinado para a esquerda, esperemos que sem cair em extremismos.

Portugal é um país com alguns hábitos estranhos, como, por exemplo, a manutenção, há anos, de épocas de incêndios e de cheias, infelizmente nunca coincidentes. Não sou de ler o Diário da República, mas, diante da constância de fogos estivais e invernais inundações, não me admiraria que as referidas épocas resultassem de decretos. Chegou mesmo a haver um ministro a explanar uma verdadeira teologia da enxurrada, que, para isso, pelo menos, os ministros servem, sejam de Deus ou do Diabo.

Outro hábito estranho é o das listas de espera nos hospitais, numa contradição evidente, já que a espera pode fazer mal à saúde. Se há sítios em que a palavra ‘paciente’ faz sentidos, é nos hospitais.

As listas de espera resultam, certamente, de vários factores e o mercantilismo economês não será um dos menos importantes, com os espécimes que gerem hospitais muito preocupados com competitividade, porque tudo é um campeonato. Os que (se) ocupam (d)o Estado têm, de qualquer modo, tecido o esvaziamento dos hospitais públicos, favorecendo empresas, porque ao lado de uma lista de espera há sempre um hospital privado a abrir. O cidadão que seja desinformado ou desabonado ficará sentado na lista de espera e não faltará muito tempo para que os portugueses, desenrascados como são, passem a tratar da própria saúde, seguindo o exemplo do impaciente inglês.

Não me espantaria que, face à desenvoltura do português, ainda que doente, os neoliberalóides ponderem o despedimento de todos os profissionais de saúde, numa espécie de desinfestação do Orçamento do Estado. Camilo Lourenço, aliás, já explicou que o melhor que pode acontecer a Portugal é ter enfermeiros a trabalhar noutros países. Nos sonhos encharcados destes profetas, os hospitais passarão a ser self-services da saúde, IKEAS das cirurgias, com as gentes a poderem montar a sua própria sala de operações em casa, aproveitando um canto da cozinha, porque é mais fácil limpar o sangue dos azulejos. A única lista de espera será a das linhas de caixa, em que o utente poderá pagar os jogos de bisturis em promoção e as caixas de seringas de marca branca e, já agora, dizia-me quais são as melhores serras para amputação, não, não é para mim, não se preocupe, é para o meu marido.

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