Um presidente mediocre

Rui Naldinho

Quando me falam das crises dos Partidos Socialistas e Sociais Democratas da Europa lembro-me sempre de uma entrevista recente dada pela politóloga e filósofa francesa, Chantal Mouffe, e cito apenas um pequeno excerto da entrevista:

Como sabe, hoje em dia, a classe operária vota maioritariamente na Marine Le Pen, e vota nela porque se sentiu completamente abandonada pelos socialistas. Os eleitores socialistas são a classe média e os imigrantes. Há um think tank, que se chama Terra Nova [próximo dos socialistas franceses], que afirma que a classe operária está perdida para os socialistas. É por isso que se concentram na classe média e nos imigrantes, que julgam que nunca votarão na Frente Nacional. Os governos socialistas ofereceram a classe operária a Marine Le Pen. Um problema fundamental é que a classe operária é também aqueles que são os perdedores do processo de globalização. E os socialistas interessam-se mais pela classe média, que ganhou com esse projecto. [Chantal Mouffe, em entrevista a Nuno Ramos Almeida, no i de 3/10/2016]

Discordo apenas da última afirmação de Chantal Mouffe. Para mim, uma boa parte da classe média também está a perder com a globalização. A única classe média que ainda se mantém à “tona da água”, corresponde a um sector intelectual ligado à ciência e às novas tecnologias, com profissões ainda bem remuneradas dada escassez no mercado europeu deste tipo de mão de obra qualificada, mas que a breve prazo se tende a massificar. Basta recordarmos que hoje a profissão de médico não tem emprego garantido, coisa que outrora não acontecia.

António Costa interpretou bem este fenómeno político, e, numa tentativa que parece estar a resultar, a História o julgará, conseguiu aparentemente inverter o percurso de definhamento do Partido Socialista Português.

Essa é a razão pela qual eu defendo coligações de partidos em contraponto a maiorias absolutas, que até podem ser Geringonças. Elas têm muito mais a ver com esta tendência dos barões socialistas de se esquecerem rapidamente das suas promessas eleitorais, bem como dos anseios do eleitorado que os elegeu.

François Hollande foi eleito em 2012 para a Presidência Francesa trazendo para o debate politico um conjunto de ideias e promessas de voltar a colocar a França no caminho da social democracia. Não se inibiu de sugerir intervenções do Estado na economia como forma de redistribuir sacrifícios, e libertar os mais pobres da miséria. Uma das suas promessas era precisamente taxar o grande património imobiliário, tal como está a acontecer em Portugal.

Acontece que Hollande com o andar dos tempos foi metendo a social democracia na gaveta, e vai deixando cair muitas das suas promessas eleitorais. Essa é uma delas!

No artigo “La nouvelle taxe sur les propriétaires ne verra finalement pas le jour“, mesmo para quem não domina um francês fluente, percebe-se que a sobretaxa de património imobiliário em França, já era!

O Chefe de Estado Francês tem sido um desastre. Desacreditado e com sondagens em mínimos históricos, Hollande não tem autoridade para impor calma e respeito aos militantes e dirigentes. O Primeiro Ministro Manuel Valls que é da ala direita do partido parece estar mais preocupado em salvar França dos ataques terroristas de que tudo o resto. Se isso é deveras importante para a segurança de todos os cidadãos, incluindo os estrangeiros, o resto da política não pode ficar para trás. Aliás, Valls até já propôs a mudança de nome do partido, o que não deixa de ser irónico.

Com uma gestão medíocre dos assuntos económicos, e uma má relação com os parceiros sociais, impediu um crescimento mais pujante da economia e criou um clima de insustentável instabilidade social durante largos períodos do seu mandato. Hollande prometeu baixar o desemprego para níveis inferiores aos de quando tomou posse, mas parece que a tarefa se apresenta difícil. O deficit gaulês é bem maior do que o dos outros parceiros europeus, incluindo Portugal, e não fosse a França ser um dos países fundadores da EU e do Euro, provavelmente já estaria num aguerrido contencioso com o Srª Merkell e o Sr.º Wolfgang Schäuble.

Em França, parece que o tão apregoado regresso à social-democracia está a ter resultados desastrosos.

Comments

  1. Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

    O Partido Socialista, naquela ânsia do nacional porreirismo que o caracteriza, dissolveu-se qual bloco de gelo em água quente. Prefere agradar (ou tentar agradar) a seguir um rumo.
    Rumo que não tem, nunca teve, em boa verdade e nunca terá, pois não pode um partido dito socialista “jogar” com o capitalismo como estes Partidos Socialistas europeus despudoradamente fazem.
    Entre o meter na gaveta as poucas linhas programáticas que os caracterizavam e lhe davam um “esqueleto” e o “repintar” da bandeira, substituindo a mão fechada pela rosa, os Partidos socialistas vão-se prostituindo ao sabor das correntes neo-liberais, confundindo-se com eles.
    O pior inimigo destes Partidos Socialistas, são os próprios ditos socialistas, a maior parte dos quais anda travestido de neo liberal e com estes jogam o jogo da finança. O discurso é o mesmo, exactamente o mesmo. A única diferença é a pouca vergonha destes “socialistas” que se continuam a afirmar como tal. Os neo-liberais, são muito mais honestos, politicamente, que os socialistas.
    Muito antes de Hollande meter o socialismo na gaveta, já Mário Soares havia feito o mesmo perante o seu bem amado Carlucci.
    Pessoalmente não tenho dúvidas que o grande objectivo de toda a luta do Partido Socialista foi contra os comunistas, até os destruir ou reduzir à expressão mais ínfima. Esqueceram-se esses democratas de meia tigela que a democracia assenta na convivência política. Fez o jogo da direita e extrema direita de quem agora tanto se queixam.
    O Socialismo, tal como qualquer Partido Socialista o definiu antes, não existe mais. Os “submarinos” tomaram conta dele, prostituiram-no com a canção dos “comedores de crianças ao pequeno almoço” e este povinho, na sua maioria inculto (excepto na bola) foi na canção.
    Os Partidos Socialistas têm hoje aquilo que merecem. São governados por interesses e por gente sem coluna vertebral.
    A seguir a Hollande virá um Emmanuel Macron (veja-se o percurso dele para se perceber como os neo-liberais chegam a socialistas) mas como se diz na política “a merda é sempre a mesma, as moscas é que mudam”

  2. Estava eu tão sossegado... says:

    Depois aparece um Costa !
    É um Marxista a soldo do Kamarada ” Jirónimo” e que tem uma ministra das Finanças “piquinininha” e ela é que manda!

  3. Estava eu tão sossegado… com que então, à espera de uma ressaca que afinal não veio.

  4. À atenção de António Costa. Costa, ao arrepiar caminho percebeu claramente que a política de terra queimada inconsequente seguida pelas estranhas alianças e compromissos com a Direita só enfraqueceria ainda mais o PS. Pelo que rompeu com a tradição. O exemplo espanhol e o caminho do PS francês é demonstrativo.

    • Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

      E o Português também. Ver Mário Soares.

  5. O Partido Socialista em Portugal tem de acabar de vez com o neoliberalismo, a terceira via, e o clericalismo, que se infiltra no partido e o destrói por dentro.

    Deve-se tornar democrático, republicano, e laico.

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