Lettres de Paris #10

‘Faites de chaque sortie une aventure’…

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está escrito num anúncio de uma das lojas Au Vieux Campeur, do Boulevard Saint Germain. Eu esforço-me, mesmo porque e fácil fazer de cada saída uma aventura, nesta cidade cheia de coisas para ver. Não é que hoje sea tenha passado grande coisa, além de ter ido trabalhar, de o Ladyss estar vazio, como tem sido hábito e de ter voltado para casa, para mudar de estúdio.
Mas de manhã em vez de ir pelo boulevard Saint Germain, resolvi ir pela Rue de l’École de Médecine e ainda bem que o fiz. Dei com a Université René Descartes, bem bonita e com a Université de Paris III – Sorbonne Nouvelle. Muitas universidades e ‘ramos’ há nesta cidade. Sobretudo no ‘meu’ bairro. O bairro latino ou Quartier Latin. Universidades, cinemas, bares, livrarias, restaurantezinhos simpáticos como aquele em que jantei ontem, La Fourmi Ailée, que é como quem diz, a Formiga Alada, ou com asas, como quiserem,

Ontem, depois do passeio de barco noturno, em vez de vir pelo Quai Montebello até à Place Saint-Michel, resolvi inovar – faites de chaque sortie une aventure, bien sûr – e meti pela Rue de l’Hôtel Colbert, para virar um pouco mais à frente para a Rue Lagrange. Auando chego ao cruzamento desta com a Rue du Fouarre vejo o pequeno restaurante de montras lilases. Espreito lá para dentro e é lindo e tem um ar muitíssimo acolhedor. Surpreendi-me ao ver o restaurantezinho logo ali, porque há uns dias a Fabienne, uma francesa que conheci por causa de um outro projeto em Aveiro, me propôs que fossemos lá almoçar daqui a uns tempos. O dia já está marcado para daqui a uma semana e tal, mas fixei o nome, claro está. La Fourmi Ailée é um nome para fixar, sobretudo quando se gosta de nomes assim.

De maneira que tendo visto o restaurante, e tendo-me parecido acolhedor, lá empurrei a porta e entrei. O empregado solícito cumprimentou-me e perguntou-me se tinha reserva. Que não, digo eu. Como havia de ter se vim aqui dar por acaso? (isto não lhe disse, mas pensei). Pas de problème, madame. E sentou-me numa mesa muito confortável, com uma vista magnífica sobre o exótico sítio. Muitos livros em estantes nas paredes, quadros, candeeiros com formas diferentes, uma panóplia de coisas suficientes para me entreter. E pessoas, claro, que o sítio estava praticamente cheio. A comida era boa e o vinho que bebi (um copo, para aquecer a alma) também não era mau de todo. O empregado, já o disse, foi uma simpatia. Portanto, mais outro sítio onde ir, seguramente. Hei-de voltar lá antes do tal almoço com a Fabienne, pela certa.

É assim o meu bairro. Ou melhor, estou entre dois ‘bairros’: o 5º e o 6º. Não que os Arrondissements sejam bem bairros, são mais, como direi, áreas? Não sei bem dizer, mas bairros não serão, já que o Quartier Latin, esse sim um bairro, fica entre o 5º e o 6º Arrondissements. Seja o que for, o meu bairro é assim. Simpático e acolhedor e cheio de gente seja a que horas for.
Voltando a hoje, quando saí do Ladyss vim, pelo caminho habitual até à Maison Suger. Antes ainda parei no monoprix para comprar coisas que me faziam falta. Cheguei e comecei a mudar as tralhas do estúdio 638 para o 614. Quando abri a porta deste fiquei logo contente. É bastante maior, ainda que não seja grande. Tem uma casa de banho também maior e a cozinha não é uma kitchenette e está separada do resto (graças aos céus!). Tem uma janela ampla que dá para a Rue Suger, mas palpita-me que apanhará pouco sol. É no primeiro andar e a rua é muito estreita. Da janela vejo perfeitamente a casa em frente, quase como se estivesse lá. A alegria de mudar para um sítio maior (o que é bastante bom, claro) passou-me quando me apercebi da quantidade de coisas que não funcionam neste estúdio: o exaustor, o candeeiro de pé, o aquecedor da casa de banho. Perguntei ao rapaz que está de guarda à noite, ele veio ver, mas não podia arranjar. São arranjos maiores. Quarta-feira espero que pelo menos o aquecedor e o candeeiro sejam arranjados. Passam por aqui muitas pessoas por ano, é natural que as coisas se estraguem e não estejam nas melhores condições. A mim, as coisas estragadas aborrecem-me muito. Mas neste momento nada há que possa objetivamente fazer e amanhã é, tal como em Portugal, feriado. Nem precisei de sair mais de casa para ter uma aventura (esta não particularmente agradável, portanto).
Depois de tudo arrumado nos seus novos sítios – e vou ter de me habituar outra vez aos sítios das coisas – fumei um cigarro à janela, admirando a minha nova vista sobre a Rue Suger e os armários muito brancos da cozinha dos vizinhos da frente. Gosto de espreitar as casas dos outros, pelas janelas iluminadas, quase tanto como gosto de fazer peoplespotting. Coisas de socióloga, certamente. Ou apenas de cuscuvilheira. Desconfio desde há muito que a sociologia e a coscuvilhice têm pontos em comum. Ou melhor, um sociólogo tem de ser coscuvilheiro, o que não quer dizer que todos os coscuvilheiros sejam sociólogos, bem entendido, embora pareçam muitas vezes.
Agora, estou cansada da mudança. Parecendo que não, andei a mudar 35 quilos de coisas, talvez mais um bocadinho, porque já comprei aqui comida, pelo menos. O rapaz, simpático por sinal, que fica aqui durante a noite, perguntou-me se eu queria ajuda e ajudou-me com algumas coisas. Nas viagens, eu ia de elevador e ele pelas escadas. Quando lhe perguntei porque não ia de elevador comigo, respondeu-me o óbvio: se acontecer alguma coisa ao elevador, com alguém lá dentro, ele tem de estar fora para resolver o assunto. Posso ser coscuvilheira e socióloga e fazer de cada saída uma aventura, mas às vezes tenho muito pouco sentido prático.

Comments

  1. Anónimo says:

    Paris, a mentira combinada entre Holande e Durão Barroso;
    Paris, grande demais para ser multada por défice excessivo, portanto os pequenos, Grécia e Portugal, que paguem;
    Liberdade, Igualdade, Fraternidade, Impunidade, para os “grandes”, germanos e franceses; os pequenos servem para alimentar os grandes.
    A história repete-se, voltamos a ver os franceses de cócoras em conluio com os alemães, a trair e a corromper toda a Europa;
    Agora não invadem, mas roubam à descarada.
    E mais uma para o currículo do traidor Durão Barroso.
    Paris, a vergonha da Europa.

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