Lettres de Paris #74

«Nós… pimba!»

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acordei, acreditem ou não, com alguém do lado de fora da janela a cantar «e se elas querem um abraço ou um beijinho, nós… pimba, nós… pimba!». Fiquei momentanemante mais baralhada do que já sou quando acordo. E estou a ser simpática para comigo mesmo, quando digo que acordo ‘baralhada’. «Nós pimba?» pensei meia estremunhada. A pessoa, um homem, continuava a cançoneta do lado de lá da janela e eu levantei-me, abri as cortinas, abri uma fresta pequenina da janela, porque estou outra vez constipada (deve ser o meu corpo a ter uma reação alérgica ao meu regresso a Portugal, obviamente), entraram menos 3 ou 4 graus para dentro do quarto, mas assim mesmo, meti o nariz de fora para identificar o cantor. Acontece que era um rapaz, empoleirado nos andaimes do prédio em frente, a trabalhar com umas ferramentas esquisitas e armado em artista do Olympia. Meti-me para dentro, nunca suspeitei que os trabalhadores da obra em frente fosse portugueses, mesmo porque juro que já tinha ouvido um rádio em altos berros com canções que me pareceram árabe, mas posso estar enganada e estar já tão desusada de ouvir falar português à minha volta que quando ouço me parece árabe.
Seja como for, o rapaz continuou o seu trabalho, acrescentando ao repertório outras músicas igualmente de fino recorte, que eu não consegui identificar. Fui tomar o pequeno almoço, com o nariz completamente entupido e a lamentar que a constipação… pimba!… tenha aparecido outra vez e eu ainda para mais sem cêgripes. Quando saí passei na farmácia e deram-me uma coisa qualquer homeopática. A ver. Já tomei dois, conforme as instruções e não me sinto particularmente melhor. Uma parte do dia passou entre fungadelas e espirros e assoadelas de nariz, alguma tosse. Até que às duas e meia apanhei o 27 e fui ter com a Anne-Marie à entrada do metro da Opéra. Foi a primeira vez que vi, neste tempo todo, o fantástico edifício à luz do dia. Já o havia visto também assim, de outras vezes, mas desta foi uma estreia. O edifício é lindo, realmente, tal como Café de la Paix ali ao lado. Lindo e bastante caro, diga-se. Mas vale a pena lá entrar ao menos uma vez. Não foi hoje, já tinha feito isso outro dia. Eu e a Anne-Marie fomos a um café mais modesto, ali ao lado. Não conhecia pessoalmente a Anne-Maria, apesar de já ter trocado emails com ela e gostei bastante de a conhecer. Falámos de trabalho, de Paris, de Lisboa, da França, de Portugal e da vida em geral e quando dei por mim, pimba, já passava das quatro e meia e a luz do dia estava a desvanecer-se. Lá se iam os meus planos de me despedir às claras de aguns dos sítios de que mais gosto em Paris.

Ainda assim, tirei fotografias à Place de l’Opéra, à própria Opéra, ao obelisco da Place Vêndome que se vê, naturalmente ao fundo da Rue de la Paix, fui pela Avenue de l’Opéra até à Place du Carroussel para ver o Museu do Louvre e as Pirâmides antes que a escuridão se abatesse sobre Paris. Enquanto ali andava, a noite foi chegando, e as luzes da cidade foram-se acendendo devagar. A Tour Eiffel também se iluminou para lá das Tuileries e do Sena, tal como a Grande Roue de Paris, lá ao fundo, na Place de la Concorde. Fui até à Pont du Carroussel e lá estava o Sena a reflectir as luzes e lá estavam as pontes e os barcos iluminados, agora com poucos turistas. Está muito frio. Compreende-se. Apanhei ali mesmo ao lado o 27 de volta, mas saí na paragem antes à Place Saint-Michel. Vi outra vez a Pont Neuf iluminada, atravessei a Pont Saint-Michel a olhar para aquilo tudo. Atravessei a Place Saint-Michel, depois a Saint-André des Arts e virei na pequena Rue Francisque Gay para o Boulevard Saint-Michel. Se eu já gostava de Paris, desta vez apaixonei-me mesmo. A conversa com a Anne-Marie ajudou a que chegasse, há bocado, a esta conclusão. Gosto de pessoas que me contam histórias dos lugares de que gosto ou daqueles que ainda não conheço. Há muita gente na rua às 7 da tarde, apesar do frio. Antes de entrar em casa, vou comprar uma baguette à Rue Saint-André des Arts. Suponho que também tenha de me despedir das baguettes e por um lado, ainda bem. Eu que raramente como pão, no meu dia a dia, como aqui bastante pão com queijo, com manteiga… com qualquer coisa. Nem é que a generalidade das baguettes sejam de perder a cabeça. Não estamos a falar de pão alentejano, vá, cozido em forno de lenha. Mas, ainda assim, sabem-me bem o raio das baguettes. E por isso, devo igualmente, despedir-me delas.
Depois, à noite, para me despedir do Le Champo (outra vez) fui ver um filme que estreou aqui há muito tempo e em Portugal também, mas que não tive ocasião de ver antes. Café Society*, de Woody Allen. Não é um filme, são três, e há bastante repetição, nas histórias, nos diálogos, nas piadas. Assim mesmo, não sendo um bom filme de Woody Allen, é um filme bastante aceitável, por referência a muitos outros. E há o Jesse Eisenberg, claro, que adorei ver a fazer de ‘woody allen’. E há Manhattan (também há Los Angeles e, claro, Holywwood). E há o jazz, muito jazz, sempre o jazz e aquela cantora no clube de New York, com uma voz que quero ouvir mais vezes: Kat Edmonson** ora ouçam lá). Portanto, não dei nada a noite de cinema por perdida. À saída do Le Champo, despedi-me de Monsieur Tati com um ‘à bientôt’, bem entendido qué até breve e não um longo adeus. Vou ter saudades dele e dos filmes de Le Champo.
Depois voltei pelo Bulevard Saint-Michel, a dizer ‘a bientôt’ a tudo, entrei pela Rue Serpente, passei pelo mk2 a que também disse o mesmo até breve e entrei na Rue de L’Éperon, que ainda verei, tal como a Rue Suger, antes da partida. Pus-me a ouvir a Kat Edmonson e a pensar que era bom que os rapazes que trabalham aqui em frente cantassem assim, e standards de jazz em vez do ‘nós pimba’, talvez eu acordasse menos baralhada e precisasse de menos tempo para me habituar ao mundo, mesmo sendo esse mundo Paris, por mais uns instantes.
*O trailler de Café Society aqui
** Kat Edmonson interpretando o standard ‘Mountain Greenery’ imortalizado, entre outros por Ella Fitzgerald e Bing Crosby, a mesma música que canta no clube de Café Society, aqui

 

 

Comments

  1. Alexandra Martins says:

    Jamais recuperarei o tempo que perdi a ler este desperdício de espaço num pobre servidor indefeso. E já vai na 73ª edição? Como é que é possível? Não há aqui conteúdo, não há qualquer mensagem a ser transmitida (a não ser que a autora tem uma constipação, não gosta de produtos homeopáticos e quem limpa os vidros para as bandas dela tem um reportório musical que não lhe agrada). Não percebo porque é que algumas publicações são cortadas após uma breve introdução e só lê o resto quem quer enquanto outras estão escarrapachadas quase na íntegra na página principal do blog. bem, lá vou eu à procura do tempo perdido para outras paragens que não Paris.

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