Sobre padarias e não só…

Não faltou indignação perante as declarações menos conseguidas por parte do responsável da Padaria Portuguesa, entrevistado pela SIC-N. Até poderia começar por perguntar aos indignados quantos empregos já criaram, mas nem vou por aí, prefiro antes dizer que declarações medíocres, porque incapazes de explicar o que se pretendia, geraram reacções também elas medíocres. Estão bem uns para os outros…
Mais interessante foi ver invocada a velha luta de classes para vociferarem contra o capitalismo, misturando conceitos como liberalismo e capitalismo no mesmo saco, muitos sem a mínima noção do que dizem. Traduzindo a coisa às mentes menos esclarecidas eu diria que pode existir bom e mau capitalismo. O desejável é que exista sempre uma concorrência livre e saudável, porque muitos capitalistas instalados não querem concorrência, preferem a estagnação, o status quo, que lhes permita manter ganhos e privilégios sem grande esforço. No mesmo barco costumam estar os seus trabalhadores, principalmente os que se sentirem confortavelmente instalados, levando uma vidinha sem grandes sobressaltos, sem nunca correr o risco de desemprego que seria inevitável caso a empresa se torne obsoleta e encerre.

Um dos maiores erros da velha e obsoleta teoria da luta de classes consiste obviamente no conceito da relação de exploração entre patrão e trabalhador, esquecendo todavia que num mercado livre funcionando em pleno, investidores não procuram apenas os melhores produtos e boa localização para os vender, necessitam dos melhores empregados para maximizarem o lucro. E os melhores empregados costumam ter salários mais altos. Isto se existir um mercado de trabalho livre, o que não acontece quando estão obrigados a negociar contractos colectivos de trabalho, metendo no mesmo saco profissionais de excelência ou calaceiros, acabando por penalizar empresas, trabalhadores, a economia em geral.
Ainda a propósito da padaria, questão menor a meu ver, ontem discutia-se a diferença entre salário e custo do trabalho. Sem pretender entrar na discussão sobre o valor ser excessivo para quem o paga ou baixo para quem o recebe, um valor de 557 Euros mensal durante 14 meses representa o mesmo que um valor de 650 Euros durante 12. Isto importa porque quando entramos em comparação com outros países, esquecemos que existem estas diferenças no sistema remuneratório, pelo que apenas podemos comparar o que é comparável, ou seja o salário anual.
A parte que maior indignação gerou foram as 60 horas que supostamente o padeiro terá defendido. Sem querer ser advogado, pergunto. Se eu tiver um emprego de 40 horas semanais, nada me proíbe de conseguir um part-time noutra empresa. Seja para pagar as minhas dívidas, sustentar a minha família ou simplesmente porque me apetece ir ao Casino, o que faço com o dinheiro ganho à custa do meu trabalho ainda é problema meu, apesar do Estado tentar sucessivamente controlar os vícios de cada um, seja através de impostos sobre o tabaco ou até mais recentemente sobre produtos com açúcar. Ainda assim vai-se conseguindo escapar ao big brother… Mas se quiser negociar livremente com a minha entidade patronal um período de 20 horas já não o posso fazer, porque a Lei do Trabalho o proíbe. Ou seja, posso trabalhar de 2ª a 6ª feira na empresa e arranjar um biscate nocturno, ou de fim de semana, mas diz o Estado que para meu bem, para me proteger do abuso da minha entidade patronal, não posso prolongar o horário. E sim, eu posso mesmo querer prolongar o horário, não porque a entidade patronal o exija, mas porque eu posso querer mais dinheiro. Desde que exista acordo entre as partes, não estou a ver qualquer problema. Porque a empresa também pode não me querer prolongar o horário, daí a ressalva do “acordo entre as partes”. É por isso que não gosto de regras nem confio em sindicatos, ninguém defende os meus interesses melhor que eu. E se não for capaz de obter o melhor para mim, problema meu…

Comments

  1. Serão multiplos os argumentos contrarios, por isso não comento o conteúdo que ilustra bem a isenção do autor : refere calaceiros trabalhadores e esquece os “generosos” criadores de “empregos”! Esquece que mesmo com a “proibição” dos despedimentos, os mesmos sempre foram possiveis : COM JUSTA CAUSA DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA! mas isso custava tempo e dinheiro, maçadas que os “excelentes empresários” pagam ..MAS NÃO AOS TRABALHADORES! para não ter

  2. Paulo Marques says:

    Pois claro, o que toda a gente sabe é que um contracto de trabalho é um contracto entre iguais onde há sempre muita oferta.

  3. Konigvs says:

    A minha mente ficou bem mais esclarecida.
    “Pode haver bom ou mau capitalismo”.
    Pode haver boa ou má pedofilia.
    Boa ou má violência doméstica.
    Bancos bons e bancos maus.
    Boas ou más ideias.
    Bons ou maus textos.

  4. tá bem tá says:

    post repulsivo de quem gosta é de “empresários” como o padeiro. e que saudades do tempo da escravatura – a outra – que esta também merece o nome.

  5. Rui Naldinho says:

    “…Até poderia começar por perguntar aos indignados quantos empregos já criaram, mas nem vou por aí…”

    Mas, António de Almeida, criar empregos não me parece um acto de filantropismo, nem de solidariedade, nem sequer uma atitude cívica. Não será antes um comportamento normal de uma entidade patronal que necessitara de força de trabalho, seja ele físico ou intectual para a prossecução de um determinado objetivo empresarial?

    “E os melhores empregados costumam ter salários mais altos. Isto se existir um mercado de trabalho livre, o que não acontece quando estão obrigados a negociar contractos colectivos de trabalho, metendo no mesmo saco profissionais de excelência ou calaceiros, acabando por penalizar empresas, trabalhadores, a economia em geral.”

    Acha mesmo que é assim? E que é essa a razão para que exista um contrato coletivo de trabalho? É um Código de Trabalho?
    Olhe, desculpar-me-á, mas eu desconheço esse local de trabalho, onde o calaceiro ganha o mesmo que o trabalhador excelente. Pelo menos no sector privado! Muito menos nas pequenas e médias empresas. Na administração pública ou nas grandes empresas com monopólio de actividade, eu admito-o sem grandes reservas. Mas isso tem muito mais a ver com o compadrio político partidário, e a promiscuidade entre chefes de serviço e funcionários, do que com a natureza do contrato coletivo de trabalho.
    Que seja do meu conhecimento, no sector privado os bons trabalhadores ganham sempre mais do que aqueles que não sendo calaceiros, são menos dotados, ou se quiser menos eficientes. Se não ganham pelo contrato, ganham-no por fora.

    “…Mas se quiser negociar livremente com a minha entidade patronal um período de 20 horas já não o posso fazer, porque a Lei do Trabalho o proíbe…”

    Ninguém o proíbe de trabalhar 60 ou mais horas. Pode até nem descansar o número de horas suficientes para no dia seguinte desempenhar cabalmente a sua função. Agora, não deve ser dada à entidade patronal essa prerrogativa, fora do quadro legal. E o que a lei determina fora do horário normal de trabalho são as horas extraordinárias. Na melhor das hipóteses a chamada isenção de horário, mas sempre dentro do quadro legal do Código de Trabalho, estando mencionado o nome do trabalhador em causa e o número de horas a mais que este acordou trabalhar para a entidade patronal.
    Somos um Estado de Direito. E isso deve ser assim para tudo. Não só para aquilo que nos der jeito.
    http://www.cite.gov.pt/pt/legis/CodTrab_L1_005.html

    O que se passou com o Nuno de Carvalho foi aquilo a que temos vindo a assistir nos últimos anos.
    A SIC escolheu a dedo um empresário específico das dezenas que devem ter sido entrevistados. Optou por aquele, por dizer aquilo que eles pretendiam, ou melhor, aquilo que os diretores de informação pretendiam passar para a Opinião Publica.
    Ou acha que a Jornalista da SIC entregou casuisticamente naquele local, e descobriu aquele iluminado para dizer aquelas banalidades, como quem joga no Euromilhões e lhe sai a “sorte grande”?
    Bolota a repetir aquilo que disse:
    Nuno Carvalho representa aquele subproduto que uma certa direita elitista gosta de apresentar aos “calaceiros” e aos “piegas Tugas”, como o homem de sucesso. O estereótipo do “gajo que subiu na vida a pulso”. Uma espécie de novo rico, que ainda ontém era um merdas, e hoje, à custa do seu suor, partilha a mesa dos barões.
    Lamento, mas eu já dei para esse peditório.
    Aquilo que a SIC fez não passa de uma demonstração de mau jornalismo.
    E Nuno Carvalho um palerma que se pôs a jeito!

    • Rui Naldinho says:

      Deve ler-se

      Volto a repetir aquilo que disse:

      • Rui Naldinho says:


        E um Código de Trabalho?

        há custa do seu suor…

    • Em lado algum defendo o livre arbítrio da entidade patronal. Num mundo ideal nem seriam necessárias Leis. Mas sabemos que não existe mundo ideal. Por isso concordo com um Código do Trabalho, preferencialmente minimalista que deixe às partes o que é das partes, negociarem livremente. E por último mas não menos importante, defendo uma descida da TSU, mas acompanhada de descidas no IVA, IRS, IRC, derramas e todas as taxas e taxinhas que parasitam a economia, quer seja à empresa, quer seja ao trabalhador. Imposto é forçarem-me a ficar sem uma parte do que produzo, bem como forçar o empresário que me dá trabalho a ficar sem uma parte do lucro. E como não chega taxar as receitas para alimentar o monstro, ainda somos taxados no consumo que fazemos ou na propriedade que compramos…

      • Rui Naldinho says:

        Se com este Código de Trabalho revisto em 2012, já se verificaram imensos os abusos, com um ainda mais minimalista seria o caminho para o regresso à velha doutrina, do “pobres, mas orgulhosos!”
        Aliás, foi esse o mote do Congresso do PSD. “O país está melhor, mas as pessoas estão piores.”
        Olhando bem para os sacrifícios impostos à maioria dos cidadãos e os resultados económicos alcançados, diríamos que
        a coisa correu bastante mal.
        Só resta dizer que uns eram os pobres. Os outros, os orgulhosos de um país melhor.

        Com uma Inspeção de Trabalho que foi sendo despovoada de quadros, tal como a própria ASAE, com a desculpa da crise, como se esse facto por si só, não devesse motivar a tutela a reforçar o número de inspectores, e dadas instruções precisas para minimizar os abusos decorrentes dos próprios constrangimentos económicos que a Troika nos impôs, não, o governo anterior preferiu ignorar essa realidade, de forma a atingir os seus objectivos.
        Um Código de Trabalho minimalista era tentar asiatizar as relações de produção em Portugal.
        Aliás, Singapura era na boca do ex primeiro ministro o seu modelo económico.
        Mas temo, que mesmo esse, para Passos Coelho fosse demasiado progressista.

  6. Se a oferta de emprego for baixa, a procura será muita e, independentemente dos lucros, os empresários tenderão a baixar os salários. Qual a parte que o António Almeida não entendeu, neste contexto, sobre a liberdade de opção do empregado versus a faca e o queixo do empregador, se não houver regulamentação? Onde é que ficou a livre opção entre partes iguais que são desiguais? Até se pode dar o caso de querer trabalhar de graça só para assegurar o lugar. Só se trabalha 60 horas porque os salários são baixos. O que o dono da padaria podia dizer é que a riqueza gerada pela sua empresa será justamente distribuída. E isso não disse. Aliás, as crianças do Bangladesh até devem agradecer aos seus patrões, pela sopa que lhes dão, porque de outra fome passariam ainda mais fome.

    • Para não ir mais longe, experimente contratar padeiros ou cozinheiros e diga-me se os consegue por baixos salários… E se forem mesmo bons, daqueles que fidelizam clientes com a qualidade do que produzem, verificará que frequentemente são aliciados pela concorrência. E mesmo empregados de mesa ou balcão, conheço alguns que não andam a trabalhar pelo salário mínimo, nem perto disso…
      O mercado funciona, apesar de excessivamente regulado.

      • Rui Naldinho says:

        Estou completamente de acordo consigo. Mas não é assim em todos os sectores de actividade.
        Daí a contratação coletiva variar de sector para sector.
        A única pisa que eles têm de salvaguardar é o salário mínimo nacional.

        • Sabendo que tem de existir imposto, sobre o trabalho preferia uma flat tax, querendo salvaguardar um mínimo de dignidade às pessoas, porque não através do imposto negativo?

  7. No Bangladesh o mercado de trabalho é livre, por isso é que os salários lá são muito altos!

  8. atentoàs cenas says:

    há coisas que precisam ser lidas primeiro para acreditarmos que foram escritas.

  9. Jorge says:

    Ninguém cria empregos por beneficência.
    Um empregador cria empregos porque precisa de quem produza para si, para gerar lucro.

    E os salários não são caridade.
    São uma compensação paga ao trabalhador em troca do tempo que passaram a produzir o lucro do patrão.

    O valor do salário acima da pobreza não é uma reivindicação comunista.
    É bom senso que o trabalhador receba o suficiente para se sentir bem, para ser consumidor.

    Não faz sentido proteger empresas que não podem pagar salários dignos.
    Faz sentido dar incentivos às empresas com bons produtos, que geram valor acrescentado significativo, que enriquecem a economia e que distribuem uma justo proporção por quem a criou: o trabalhador.

    Em democracia não é preciso ser patrão para poder tecer comentários sobre as regras laborais, não é preciso ter criado empregos para saber as consequências dos diferentes níveis salariais.
    No tempo do fascismo, aí sim, o respeitinho era muito lindo…

    António de Almeida, o que você precisa não é de uma Padaria Portuguesa em cada esquina. Nem tão pouco de uma lição sobre democracia, justiça, equidade, ou sequer bom senso. O que você realmente precisa é de um cérebro!!!

    • Jorge says:

      Acrescento só que pode, e deve, tentar aprender alguma coisa com o post do António Alves, e seguir o link desse post para ler as respostas de Franklin D. Roosevelt deu a gente que tinha um “pensamento” como o seu… há mais de 80 anos atrás!!!

      O que defenderá o acéfalo do António de Almeida a seguir? A proibição dos sindicatos? O fim do voto das minorias? O fim da igualdade salarial das mulheres? A proibição das greves? O regresso da escravatura?

      Infelizmente a economia dos acéfalos, da sua estirpe, já existe.
      Chama-se Google, Apple, Amazon, Uber, etc, no fundo todos os que já entraram naquilo a que se chama pomposamente “4ª revolução industrial”.

      Pagamento de impostos sobre lucros estratosféricos? Zero.
      Obrigações contratuais com trabalhadores? Zero.
      Criação de empregos nos mercados que dão lucro? Zero.
      Resposta perante o estado de direito dos estados? Zero.
      Distribuição da riqueza criada? Zero.
      Preocupação em não destruir a natureza? Zero.
      Contas bancárias fora dos paraísos fiscais? Zero.
      Trabalhadores com contratos a sério, em vez de falsos recibos verdes? Zero.

      E qual é o resultado desta economia acéfala? Nunca, desde a 2ª guerra Mundial, estivemos tão perto do Apocalipse!

      Mas nada disso interessa. O importante é que 8 acéfalos tenham tanta riqueza roubad… acumulada, como os 50% mais pobres do mundo, ou seja, 3.6 MIL MILHÕES DE PESSOAS!!!

  10. Paulo Só says:

    E curioso. Não é a primeira vez que ao ser atendido na Padarias Portuguesas, geralmente após certa espera e bastante confusão, reparo no ar extenuado dos empregados. É sempre com certo desconforto que lá vou, e nem acho o pão grande coisa.como aliás em 90% dos padeiros em Lisboa. Ah que saudade da baguette parisiense! É que, como o patrão, a farinha também é de segunda.

  11. Rui Stuart says:

    Mas o “porco fascista” do dono da Padaria Portuguesa só paga o ordenado mínimo (por 14 meses) a 25% dos empregados (sem experiência) e os outros 75%? Querem lá ver que o grande “explorador” “sem um pingo de vergonha” até se rege pelo código do trabalho em vigor… e eu a pensar que ele tinha implementado a política de “um empregado, um cartão” que serve para os contratados passarem quando vão ao WC… ou quando há menos clientes… ou… tal como acontece em algumas cadeias de “fast food” multinacionais… Mas essas gigantescas multinacionais que nos levam as divisas já está tudo bem… É ver as filas dos boicotes à frente das muitas caixas registadoras… Haja paciência com a inveja do Tuguinha que não suporta ver um conterrâneo a ter sucesso…

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