E o impensável expectável aconteceu: na conferência de imprensa de ontem na Casa Branca, alguns órgãos de comunicação social, entre eles a CNN, a BBC ou o The New York Times, foram impedidos de assistir ao briefing diário do porta-voz da Casa Branca. Claro Sean Spicer não ficou a falar para o boneco, e a imprensa amiga, como a Fox ou o site de extrema-direita Breitbart News (ia linkar o site mas não consegui, é nojento demais), onde fez carreira Steve Bannon, o Goebbels do admirável regime novo de Donald Trump, foram devidamente autorizados a assistir à dose diária de factos alternativos produzidos pelo Ministério da Verdade norte-americano.
Steve Sack@Star Tribune
Há quem não se aflija muito com isto. O líder da oposição cá do rectângulo, em declarações à Renascença, afirmava em Novembro que “não embarcava nessa ideia” de que Trump seria assim tão mau. E até ver o que temos? Discursos incendiários, discórdia, muros, ameaças militares no tom mais grunho de que há memória, xenofobia, nepotismo, “factos alternativos”, o “massacre” de Bowling Green, o atentado na Suécia – Sweden, can you believe it? – e agora o regresso do lápis azul. E pouco mais de um mês passou desde que o troglodita moderno chegou ao poder.
Há até quem aprecie a experiência Trump. Quem aprecie o discurso do ódio. Quem esteja extasiado com a divisão e com a possibilidade de conflito. Quem seja estúpido a ponto de acreditar que Trump não representa o sistema quando Trump É o sistema. Estúpido suficiente para comparar este projecto neofascista aos gregos do Syriza, aos espanhóis do Podemos ou mesmo ao acordo à esquerda que fez um mic drop a meio mundo e espetou com o défice mais baixo da história da democracia portuguesa na cara da seita do apocalipse. Os fanáticos agarram-se a qualquer coisa.
Lei de Godwin my ass! Trump é perigoso, alimenta-se de ódio, dirige a superpotência militar que comanda o mundo, com bases militares espalhadas por todo o lado, é assessorado por um grupo de sujeitos sinistros e partidários da opressão, entre eles o próprio genro e já colocou em marcha o seu novo projecto censório. O que virá a seguir? A perseguição e detenção dos dissidentes e das minorias? Segregação racial? A invasão total do Médio Oriente para se apropriar dos poços de petróleo? A subjugação dos membros da NATO a troco de não serem dados a comer ao urso soviético? Armas nucleares?
Nada disso. É sorrir e acenar, que qualquer dia ainda assistimos a um incêndio no Capitólio, causado por comunistas, claro, e o tipo aproveita a deixa para encomendar uma coroa de louros, expulsar tudo o que não seja ariano, suspender a democracia por tempo indeterminado e começar a cobrar o dízimo aos seus parceiros. Just lay back and enjoy the ride. It’s gonna be amazing.
Só corrigir João, a BBC não é norte americana, de resto, excelente como sempre.
Sim, pode ter sido um “peão” feito pelo João, ao escrever o texto.
A BBC é de facto Britânica, mas ao que penso tem um serviço exclusivo para USA & Canadá.
Contudo isso não invalida o seu reparo.
Obrigado pelo toque, Francisco. Efectivamente, e apesar do que afirma, e bem, o Rui, não fiz a devida distinção. Escritas de madrugada costumam dar nisto 🙂
Um esquema de pensamento muito linear, carregado de reflexos primários, preto/branco, sem nuances.
1. Trump é um produto altamente contraditório da sociedade americana. O facto de ele não perseguir o projecto peregrino de uma querra com a Rússia, opondo-se à agenda da NATO, dos numerosos serviços secretos, do Pentagono, do complexo militar-industrial, mostra que é um indivíduo que os tem no sítio. O facto de ele desafiar a CNN, o New York Times, a BBC, as traves mestras da propaganda do establishment, mostra que Trump não é cachorro de colo à la Obama das habituais cliques multimilionárias. O facto de ele não surgir como um mata-mouros como o lulu Obama e o desmiolado Bush tem que se lhe diga. Que sossego ver um craque que não anda a fazer guerra na casa dos outros e se prefere meter com as máfias do seu próprio país.
2. Trump não é Hitler nem Bannon é Goebbels. Hitler queria conquistar o mundo, Trump está a arrumar a casa, com métodos um bocado discutíveis e pouco ortodoxos, é verdade, mas mesmo assim e mais uma vez, ele quer viver em paz com a Rússia. São palavras? São! Mas o que dizem e escrevem os media também são só palavras. Bannon=Goebbels? por amor de Deus! Fica-se a saber mais de quem compara, do que sobre a comparação.
3. Trump é um perigo? É. Mas o que fez Obama e o que fez e queria fazer a Clinton foi/seria mil vezes mais perigoso. Obama sorria como um vendedor de automóveis usados enquanto matava árabes, provocava a Rússia, armava a NATO. Não foram palavras, foram factos, guerras, mortes, ataques cobardes a velhos, mulheres e crianças com os seus drones. Um killer! O perigo Trump ainda está por se desvendar e é com os assassinos do seu país que ele se está a meter. Aguardar! Visões, profecias e outras fantasias são como as bolas de sabão, a sua beleza e a sua verdade estão no nada da sua memória.
Mais um a debitar puns que se sentirá perfeitamente inocente quando a conta de mortos do trump for apresentada.
Nessa altura muda os nicks/dizeres para tracks e jurará que nunca apoiou trump e que sempre viu nele um tipo capaz de gerar muito mais mortos que bush2.
Eu declaro aqui que não mudarei de nick, e que acho que o trump tem potencial para gerar milhões de mortos se não for travado pelos republicanos do senado e congresso.
Só um exemplo, pela doutrina trump, que impede a rússia de invadir a polónia, hungria e restantes países ex-leste para restaurar o império soviético e seus satélites? Nada. E quantos morrerão se isso acontecer? O equilíbrio de poderes rússia/EUA/Europa é frágil, e basta o trump vir dizer que se está a cagar para o resto do mundo e que a rússia pode tratar de quem quiser fora do interesse muito particular dos EUA, para trump e seus apoiantes serem culpados de todas as mortes que se gerarem, mesmo que o trump não dispare um tiro (pelo menos fora dos EUA, que dentro ele se o deixarem vai disparar e muito)