Droga, um negócio com futuro

Droga, a definição não é correcta, porque existem muitas outras substâncias classificadas como droga, mas a palavra está normalmente associada a substâncias psicoactivas. Uso, posse e comercialização, constituem actos ilícitos, sujeitos a penalizações judiciais. Aqui existem algumas variantes, de país para país, entre consumo e tráfico, que podem ir até à pena de morte ou prisão perpétua, na maioria dos casos aplicáveis apenas aos traficantes, mas não só, pois alguns países perseguem brutalmente consumidores. Na Europa a moldura penal é mais branda, mas qualquer que seja o quadro aplicável, o negócio continua a existir, proporcionando enormes lucros a cartéis de narcotraficantes e obrigando os Estados a enormes gastos, numa guerra sem trégua para erradicar o que consideram ser um flagelo.

Uma actividade que movimenta inacreditáveis quantidades de dinheiro, também corrompe o poder nalguns países, autoridades em muitos outros, e pode até estar intimamente ligada ao terrorismo.
Defendo em primeiro lugar que o uso destas e qualquer outra substância deve ser uma decisão individual. O que na verdade já acontece, apenas a hipocrisia da sociedade, não o reconhece. Se me apetecer fumar um charro, snifar uma base ou injectar heroína, sei muito onde e quem me poderá fornecer. E praticamente todos o sabemos. É um pouco como as casas de meninas, a prostituição é ilegal, mas em todo o lado o negócio existe. Para que fique claro, não defendo apenas a despenalização das drogas leves, o que seria um passo no caminho certo, mas um passo insuficiente.
O simples uso da Marijuana para fins terapêuticos gera dividendos financeiros, imagine-se o potencial de negócio da liberalização sem restrições ao uso para fins recreativos. E se além da Marijuana considerarmos a Cocaína, Heroína e outras substâncias, estaremos a falar num potencial incrível…
Estou a falar de substituirmos traficantes por farmacêuticas, dealers por farmácias, tudo devidamente rotulado e embalado com evidentes ganhos para a saúde, através de mecanismos de controlo de qualidade. Erradica-se o perigo das substâncias adulteradas, com menor grau de pureza, que permitem aos traficantes menos escrupulosos aumentar lucros. Com toda a cadeia de negócio envolvida, da produção à distribuição, serão gerados empregos e pagos impostos que os governos se quiserem podem utilizar no tratamento, os gastos que já existem, nomeadamente em consultas de desintoxicação, dependência, overdose ou efeitos secundários. As receitas é que não, circulam por aí algures, sempre foi afirmado que o ópio é uma das fontes de financiamento dos talibãs. E quantas ditaduras ou guerrilhas, não importa a ideologia, se financiaram na cocaína na América latina?
Muitos países, Portugal incluído, optaram por taxar fortemente tabaco e álcool, no sentido de dissuadir o consumo, mas na verdade o resultado é um exponencial aumento do contrabando, nomeadamente no tabaco. Porque se tornou um negócio lucrativo para redes criminosas, sabendo que as autoridades costumam apreender apenas uma pequena parte, será razoável supor que grande parte abastece os mercados, colocando em dúvida muitos dos resultados estatísticos que nos apresentam…
Estados Unidos, anos 20, vigorou a chamada Lei seca, que consistia na proibição do transporte, consumo e venda de álcool. De facto ninguém deixou de beber. Proliferou a indústria clandestina, sem qualquer controlo, a corrupção tornou-se generalizada, a Máfia teve enormes lucros, Al Capone foi talvez o “homem de negócios” mais bem sucedido da costa Leste, mas por todos os Estados os criminosos viveram a sua época dourada. Até que a Lei foi revogada em 1933. As conclusões são simples de tirar, reprimir nunca foi solução.
Homero descreveu na Odisseia efeitos do ópio, que chegou a ser comercializado no século XIX pela companhia britânica das índias orientais e até por cá tivemos a célebre carta do heterónimo de Fernando Pessoa, Álvaro de Campos a Mário de Sá Carneiro. Concordo que a par da liberalização do consumo seja disponibilizada informação, para que as pessoas livremente possam escolher. E quem melhor posicionado para o fazer, que as farmacêuticas que até já possuem experiência no ramo?
heroina
coca
cocaina

Comments

  1. Concordo em absoluto com o texto.

  2. Paulo Marques says:

    “Erradica-se o perigo das substâncias adulteradas, com menor grau de pureza, que permitem aos traficantes menos escrupulosos aumentar lucros. ”

    Coisa que nunca acontece com as farmacêuticas… ao menos os traficantes são penalizados.
    Quanto ao resto, sim, mas… a dependência nunca é uma escolha e os efeitos secundários continuavam a ser tramados para muitos e sem retrocesso.
    Ter certezas absolutas nesta matéria parece-me precipitado, porque é há muito tempo ilegal (e imoral?) estudar adequadamente as consequências.

  3. Konigvs says:

    “O estado proíbe ao indivíduo a prática de actos infractores, não porque deseje aboli-los, mas sim porque quer monopolizá-los.”
    (Freud)

  4. Fernando Manuel Rodrigues says:

    Há muito tempo que venho dizendo isto. O maior flagelo está na clandestinidade de toda a rede de comercialização e consumo das substâncias proibidas. Se fosse legalizadas e a sua comercialização controlada, estou convencido de que teríamos enormes ganhos para a saúde, mesmo dos que dependentes, e a vantagem acrescida de libertar enormes recursos do estado para o combate a flagelos talvez maiores (como os chamados “crimes de colarinho branco”).
    Por outro lado, e como disse outro comentador, as verdadeiras consequências do consumo não estão devidamente estudades, com isenção e sem preconceitos. Todos nós tomamos, ou já tomámos, medicamentos com contra-indicações (algumas bem grandes). Alguns medicamentos legais são susceptíveis mesmo de provocar dependência.
    Porque não estudar com isenção e sem preconceitos as consequências do consumo (controlado e com garantia de qualidade do produto) das substâncias agora ilegais?

Discover more from Aventar

Subscribe now to keep reading and get access to the full archive.

Continue reading