É lastimável o estado a que chegou a social-democracia europeia.

[Rui Naldinho]

Como já aqui escrevi, o Presidente François Hollande foi o Chefe de Estado Francês mais fraquinho que os gauleses elegeram até hoje, desde o fim da segunda guerra mundial. Já meditei com os meus botões algumas vezes e me perguntei a mim mesmo, se este fulano, numa hipotética França ocupada militarmente por um exército invasor, não seria ele um novo Philippe Pétain.

Hollande é de uma inconsistência a todos os níveis, até no plano moral. Numa atitude cobarde, face aos resultados que as sondagens lhe atribuíam, não ultrapassando uns míseros 15% das intenções de voto, na melhor das hipóteses, depois de cinco anos de uma presidência desastrosa, em que nem a sua atitude firme para com o terrorismo abafou a sua mediocridade, afastou-se de uma possível recandidatura, para não se sujeitar a uma humilhante derrota. Sarkozy apesar de tudo mostrou mais coragem. 

Nessa medida sobrava para os seus descendentes políticos, em especial os ministros que fizeram as delicias dos governos franceses sob o seu mandato, começando logo por Manuel Valls, o francês de ascendência catalã que foi seu primeiro ministro, passando por Arnaud Montebourg, ex-ministro da Economia, a Benoît Hamon  ex-ministro da Educação, a hipótese de se candidatarem.

O PS para esse efeito fez eleições internas, as primárias, para encontrar alguém que os representasse na corrida ao Eliseu. Efetuada a consulta aos militantes, não sei se em França os simpatizantes também votam, ou só os militantes têm esse direito, a verdade é que foi escolhido Benoît Hamon, ficando na 2.ª volta, Manuel Valls arredado da disputa eleitoral.

O que se esperaria deste desfecho, era que o candidato vencido desejasse boa sorte ao vencedor, e este representasse os eleitores franceses, socialistas presumo eu, que votaram nessas eleições internas. Sabemos que há sempre umas ovelhas tresmalhadas, pois o voto é livre. Mas o que eu nunca imaginei, nem de certeza a maioria dos simpatizantes do PSF, era que depois de derrotado, Manuel Valls fosse apoiar um candidato independente Emmanuel Macron, que nem a votos foi dentro do partido, uma vez que já o tinha abandonado há anos. Esta atitude parece-me ridícula, mesquinha, de mau perder, uma espécie de birra de crianças, do estilo, se não sou eu o escolhido, então vou apoiar alguém que não seja da nossa família. Valls faz-me lembrar o Coordenador Autárquico do PSD. O que interessa é que Benoît Hamon não ganhe, mesmo sendo do meu partido. A ideia por ele vendida, de não querer correr riscos com uma presumível eleição de Marine Le Pen é patética e roça o absurdo. O espaço do centro político em França vai ser disputado por três candidatos, François Fillon, Emmanuel Macron e Benoît Hamon, uma vez que a direita tem Marine Le Pen, e a esquerda tem Jean-Luc Mélenchon. Manuel Valls sabe tão bem quanto todos os outros franceses, que Fillon está condenado politicamente pelo escândalo da esposa e dos filhos. Logo, os votos do centro direita vão ser divididos entre Macron e Le Pen. E sabendo disso, dá o seu apoio ao candidato independente deslocalizando potenciais eleitores socialistas indecisos, para Macron, inviabilizando assim qualquer hipótese de Benoît Hamon ser o eleito para a segunda volta. Acresce que em termos ideológicos, não sei em que é que Benoît Hamon seja tão diferente de Macron. E diria mais, com excepção de Mélenchon e de Le Pen, “os outros são todos farinha do mesmo saco”.

Ficamos então com a sensação de que isto é mais uma guerra de protagonismo e de vaidades, e não uma eleição para a Presidência da República, alguém que condicionará os destinos da França nos próximos cinco anos. Também já sabíamos que Manuel Valls gosta pouco da social-democracia. Até quis mudar o nome do partido, coisa original sem dúvida, o que não lembraria a Passos Coelho. E que o PSF foi apenas um espaço político e mediático para o filho de um emigrante se afirmar na ribalta do poder, ascendendo aos mais altos cargos do país, em vez de ficar no anonimato como acontece com a maioria dos descendentes de emigrantes. Isso é bom, e louva-se, mas convinha mostrar que é uma pessoa coerente e com princípios.

Eu sei que a social-democracia europeia está em crise. Dijsselbloem é um bom exemplo disso. Mas chegados aqui, perguntar-se-á o que querem os Franceses, incluindo os socialistas? Se pretendem uma França amarrada a um Tratado Orçamental cego, o qual nunca cumpriram, diga-se, cada vez mais estrangulador da economia europeia, tornando-se a breve prazo os próximos reféns dos mercados, ou arrepiar caminho e contribuir para uma mudança de políticas na Europa. Se não querem cumprir esse papel, provavelmente serão outros a receber os votos de quem já não se revê nesta social-democracia infestada de oportunistas. Disso tenho eu a certeza. E Manuel Valls está a contribuir para isso.

Comments

  1. Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

    Não é um problema da Social-Democracia meu caro Rui Naldinho. É um problema do Socialismo, o partido travestido de rosa e de rosinha ao peito.
    Não se confunda Social-Democracia e Socialismo. São congregações partidárias que deveriam ter orientações e objectivos bem diferentes. A única coisa comum é o trabalho em prol do povo e aí, estamos conversados. Nem PS, nem PSD o fazem, seja em Portugal, seja em França ou mesmo em Espanha.
    A queda do Comunismo conduziu, na política internacional, a uma queda abrupta para a direita e extrema direita. Isso é visível em toda a Europa.
    O problema é a travestização da política que se define como a incapacidade (ou cobardia, se quiser) de conservar os seus valores, conduzindo tal cobardia, a mudar o encarnado para o rosa e a mãozinha fechada (a tal que nunca deu nada a ninguém, no dizer da direita) em rosinha.
    É esta falta de coragem que destrói estes “travestis” políticos onde entram os PS’s português, Espanhol e Francês.

    O povo não tem memória curta e estes contínuos recuos têm uma factura. Como terão para os Sociais Democratas que se colaram aos partidos da extrema direita Europeia e agora são um e um só.
    Mas o povo, na sua simplicidade, por um lado e pelos valores culturais que defendeu e dos quais ainda ainda se não esqueceu, não vai na música.
    A França é a Pátria da Revolução Francesa e da criação dos EUA. E o povo francês que eu conheço muito bem, sabe disso perfeitamente. Tal como o Espanhol e o Português que viveram os longos anos do fascismo. E por isso não vão com “travestis” políticos, sejam eles Soares, Sócrates, Holande, Valls, Gonzalez ou Zapatero.
    1980, marca o ano da renúncia socialista aos valores tradicionais e à transformação do PS num partido Social Democrata. É esta mistura de conceitos, alijamento de valores e sobretudo, de renúncia de objectivos que faz com que os PS’s estejam em queda. Salva-se o Português, para já, embora venha de uma crise profunda e que continuará uma vez desfeita a actual aliança.

    A Social Democracia tem exactamente o mesmo problema. A Social Democracia verdadeira, é a praticada nos países nórdicos. Vejam a aplicação dos princípios doutrinários do Partido Social Democrata Sueco, Dinamarquês, Norueguês ou Finlandês e comparemo-lo com o extremismo de direita de um Passos Coelho, de um Rajoy ou mesmo daqueles políticos de direita franceses afogados em escândalos.
    Este é o problema da Europa. Os PS’s ocupam o espaço dos PSD e os PSD’s caíram para a extrema direita. O CDS português e os CDS’s lá dos sítios, ocupam o mesmo campo: o do fascismo para onde tendem vertiginosamente os PSD’s.

    Mas o povo, na sua simplicidade não é burro.
    Eis porque os “travestis” não passarão. Politicamente o povo, o que vota, sabe que eles são contra natura.

    • Rui Naldinho says:

      Caro Ernesto
      Não existem diferenças significativas, se ê que as há, entre os Partidos Socialistas Europeus e os Partidos Sociais Democratas Europeus e Partidis Trabalhistas.
      O Socialismo Democrático e a Social Democracia são a mesma coisa, ainda que utilizem denominações diferentes por razões históricas e de percurso político. Por exemplo, um Partido Trabalhista é na sua base um Partido Socialista, mas a sua origem vem do sindicalismo. Foi a partir dos sindicatos que se formou o partido e não a partir da elites intelectuais. E isso percebe-se bem na Grã Bretanha.
      Nos é que temos um PSD que de social democrata teve muito pouco, e agora nem isso existe. No início tinha um cheirinho a social democracia mas foi Sol de pouca dura.
      Quanto ao resto, concordo com a sua análise. Hoje, nós Europeus, estamos como estamos porque a Social Democracia se prostituiu. “E como sabe, a prostituição pode causar doenças graves, cuja cura é difícil e dolorosa.”
      É pró que estamos!

      • Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

        Há diferenças caro Rui Naldinho.
        O problema é que o socialismo, parafraseando Mário Soares, foi “metido na gaveta”, para agradar a Carlucci, lembra-se?
        E nos outros países foi, com certeza, para agradar a outros tantos Carluccis. Assim entendemos, por exemplo, porque é que a NATO, com pezinhos de lã tomou conta de nós e acabou com a ideia de um exército europeu…
        E neste contexto, concordo completamente consigo: PS’s e Sociais democratas são hoje, uma e a mesma coisa.

        • Assim seja.... says:

          Lembro-me perfeitamente e no dia em que o bochechas meteu o socialismo na gaveta e se vendeu ao Carlucci…. nesse dia, caguei (desculpem) para o Marocas bochechas…

          • Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

            Já somos dois. E creio que nesse dia, os esgotos ficaram entupidos 🙂

  2. Emmanuel Macron não precisa se esforçar muito, já ganhou a eleição, a não ser é claro, que as perca por um qualquer facto ou erro que nesta altura ninguém vislumbra ser possível.
    Tem a meu ver a vantagem de liberalizar a economia e porque não deve favores nem está condicionado à esquerda ou direita, pode afrontar os sindicatos, algo que não lhe permitiram enquanto ministro. Por outro lado, socialistas e direita serão obrigados a repensarem e mudarem de vida. Outro factor positivo que resultará da Fillon, será provavelmente o fim da promiscuidade entre políticos, família e lugares públicos.
    Sem estar refém e com legitimidade própria, talvez seja mesmo Macron que possa reformar e modernizar a França de vez. Mas terá que manter coragem, porque irá doer a muitos interesses instalados…

    • Rui Naldinho says:

      Caro António. Não estou a criticar Emmanuel Macron. Estou é a criticar Valls. Isto é aquilo que vamos vendo na social democracia europeia, hoje.
      Macron foi coerente. Saiu do PSF e fez-se à vida. Nada a dizer.
      Valls não fez nada disso. Aproveitou o tempo de antena para se promover. Foi derrotado, e então optou por apoiar o outro candidato que não o de seu partido.
      António, cá para nós que somos do Norte. Temos uma boa definição para estes gajos, não temos? Escuso de a pronunciar que você qual é.

      Já agora, este link.

      https://ionline.sapo.pt/artigo/555919/em-que-momento-se-ha-jodido-o-psf-?seccao=Opiniao_i

  3. Eu mesma says:

    Ainda existe social-democracia? Ainda existe socialismo?

  4. Nascimento says:

    Realmente Macron fez-se á vida: BFTMTV ,LE MONDE,ETC. ..Ao colinho!!!
    O senhor Rothschild gosta muito de “reformismos”.Para quem não conheçe o senhor Macron é bom lembrar o que aí vem: neocon do mas fino calibre! Esperem para ver.Eu sei. Ando há anos a ver este Garçon e o modo como se “Move”.
    Já chamou de bêbados trabalhadores em vias de despedimento que lutavam pelos seus postos de trabalho..e quanto a continhas é curioso o que o Garçon DECLARA EM TERMOS DE RENDIMENTOS!!Ou não? Pois aí vem uma Merkel de fatinho!!! Pois preparem as cuecas para 2018!!!Já não nos aguentamos com os alemães e vamos gramar com os franciús….ui tão bom!!!E o Garçon só tem 39 aninhos e carinha laroca tão ao agrado das sopeiras e dos velhinhos do tipo dos Almeidas da Europa!

  5. Paulo Só says:

    Rui Naldinho, me perdoe mas a comparação do François Hollande com o Pétain parece-me especialmente deslocada. Acusações desse tipo são demasiado graves para fazer de ânimo leve, ou de modo hipotético. Quanto ao PS francês a grande diferença em relação ao português, apesar do Antonio Costa, é que Portugal não é senhor das suas políticas. Então o PS português não precisa nem de ter linha política. De resto todos os PS europeus estão enfeudados às políticas de austeridade, e todos vão assinar o CETA e assinariam o TTIP se o Trump não tivesse desistido, apoiando a finança casino predatória, os paraísos fiscais, a privatização da justiça econômica e outras maravilhas do capitalismo triunfante, assim como a política americana no Oriente Médio e alhures. O François Hollande não é muito diferente do resto, o que não significa que todos os socialistas europeus sejam “petainistas”. O Hamon, é exatamente um socialista que está a querer voltar a uma linha política popular, coisa que os socialistas europeus já esqueceram pelo menos desde o Tony Blair. Quanto à conjuntura eleitoral francesa, a questão é bater a Le Pen. O que não é tão óbvio quanto se pensa. Devido à abstenção provável de muita gente, cansada de votar no PS capitalista de Hollande/Vals/Macron.

    • Rui Naldinho says:

      Por acaso você não desconhecerá que François Miterrand reconheceu ter colaborado com os nazis durante a II Guerra Mundial.

    • Rui Naldinho says:
      • Paulo Só says:

        Conheço muito bem o antes e o depois das fascinações dos socialistas franceses pelo nazismo. Daí a acusar o Hollande retroactivamente vai uma distância desnecessária, injusta e inútil. Ele oferece outros ângulos de ataque mais pertinentes e partilhados por muitos outros socialistas em outros países, sem relação com a história da França no século XX.

        • Rui Naldinho says:

          Eu não fiz nenhuma acusação. Até porque a França não está ocupada por ninguém. Apenas formulei uma dúvida uma sobre o seu caráter. Até porque é a primeira vez na República do pós Guerra, que um Presidente não se recandidata a um segundo mandato. Admitiria-o por motivos saúde e os familiares, por exemplo. Agora, por cobardia, nunca! Até Sarkozy se propôs concorrer, e afastou-se por ser derrotado nas internas.
          Até hoje todos os Presidentes Franceses se recandidataram, que me lembre. Mas também é verdade que nenhum deles prometeu uma coisa e fez precisamente o seu contrário.
          Hollande é um camaleão. Os partidos socialistas estão impregnados de gente dessa. E esses são os mais perigosos. Não são os da direita, porque esses a gente conhece-os, e pode combatê-los logo de início.

        • Rui Naldinho says:

          A História de Pierre Laval, que fez parte da Presidência de Petain como seu Vice.
          https://pt.m.wikipedia.org/wiki/Pierre_Laval

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