Sucesso escolar, pólvora, fogo, roda

Há alguns dias, o Ministério da Educação voltou a descobrir o fogo, a inventar a pólvora e a criar a roda ou vice-versa. Graças a um estudo da Direcção-Geral de Estatísticas, conclui-se aquilo que já se sabe há muito tempo sobre os factores que influenciam o sucesso escolar: “o contexto socioeconómico continua a ser determinante.” Relativamente a um estudo anterior, relativo ao terceiro ciclo, já o ministério tinha reconhecido o mesmo.

É certo que, nos últimos anos, a mesma entidade, com outros ministros, tem tentado refutar a realidade. Nos finais do consulado socrático, chegou a publicar-se uma espécie de estudo cujas conclusões chocavam de frente com a realidade: com a coordenação de Cláudia Sarrico, afirmava-se que o sucesso dos alunos dependia pouco dos pais, ou seja, que o contexto socioeconómico era factor de pouca importância. Aqui pelo Aventar, o tema foi abordado várias vezes, não sendo difícil, na rede global, descobrir gente que trata o assunto com seriedade.

Com a chegada de Passos Coelho, Nuno Crato, aludindo à existência de estudos com títulos desconhecidos (técnica muito utilizada pelos políticos), insistiu na ideia de que os problemas dos alunos seriam resolvidos desde que os professores fossem bons. Logicamente, o insucesso dos alunos seria sempre da responsabilidade dos professores. Estas afirmações e outras tornaram fácil tomar medidas como, por exemplo, a de aumentar o número de alunos por turma: se a qualidade do professor fosse um factor determinante, a quantidade de alunos dentro da sala perderia importância.

A (re)descoberta da importância do contexto socioeconómico deveria obrigar qualquer governo a perceber que o sucesso escolar é uma questão social que não pode ser resolvida apenas pela escola. A esperança de que esta redescoberta tenha efeitos nas políticas, no entanto, é ténue, porque o que é preciso é evitar reprovações a qualquer preço, sem, na realidade, se perder tempo a pensar nos problemas sociais e educativos. O que vale é que, qualquer dia, volta um ministro que desvalorizará a importância do meio socioeconómico a quem sucederá um outro de sinal contrário, de adiamento em adiamento até à indecisão contínua.

Comments

  1. Konigvs says:

    É preciso ser-se muito desonesto pode refutar o óbvio: só alguém num contexto socio-económico muito favorável, pode comprar um doutoramento sem nunca ter posto os pés numa universidade!

    Quase sempre: “somos o que fazemos, e o que nós fazemos é o que o meio nos faz fazer”. E é por isso que quando vivemos numa cultura da cunha e da corrupção, toda gente vai perpetuar esse tipo de comportamento, até porque é muito mais fácil deixar-se levar do que remar contra a corrente.

  2. JgMenos says:

    A importância do contexto sócio-económico é uma evidência que dispensa qualquer estudo.
    Pode ser compensada? Pode, senão não haveria tantos ex-seminaristas com sucesso.

    Mas o grande objectivo dos treteiros de esquerda é acabar com exames que possam denunciar a sua incompetência, gastando rios de dinheiro sem compensarem porra nenhuma, ao serviço de políticas ‘igualitárias’ que tratam como igual o que é diferente.

    • António Fernando Nabais says:

      A esquerda está cheia de “treteiros”, é verdade, à semelhança da direita. A evidência que dispensa qualquer estudo foi negada, entre outros, por Nuno Crato. Os exames são instrumentos que devem ser utilizados sem preconceitos, o que não acontece à esquerda ou à direita.

      • José Fontes says:

        Caro António Fernando Nabais:
        Este treteiro e imbecil, dito JgMenos, não passa de um troll direitista, de seu nome verdadeiro João Pires da Cruz, um pretenso consultor financeiro, um consultor da treta (por isso ele usa o termo tão frequentemente).
        Escreve amiúde no Observador, onde expõe as suas mirabolantes teorias económico-financeiras.
        Não vale a pena dar muita corda ao cromo.
        Vigia o Aventar e o Ladrões de Bicicletas, onde a sua missão é provocar constantemente tudo e todos.

      • JgMenos says:

        Duvido que o Crato tenha negado uma evidência – excepções sempre as haverá ; provavelmente disse que poderia ser compensada, e aproveitou para ‘estimular’ os professores.

        • António Fernando Nabais says:

          Negou uma evidência, por palavras, actos e omissões.

  3. Patolas says:

    “A (re)descoberta da importância do contexto socioeconómico deveria obrigar qualquer governo a perceber que o sucesso escolar é uma questão social que não pode ser resolvida apenas pela escola”. O problema é que esta afirmação serve também para ilibar escolas e professores… afinal os problemas estão todos no exterior da escola e nada, ou muito pouco, se pode fazer no sei interior. Nos últimos 20 anos ouço esta afirmação em 80% dos conselhos de turma de avaliação, na maior parte das reuniões de conselho de ciclo e reuniões de conselho pedagógico! Caímos numa espécie de determinismo social… quem tem tem, quem não tem azar, ou então outra afirmação deveras interessante: sempre foi assim! As explicações de que alguns alunos (muitos) usufruem são um bom exemplo, ou seja, que as pode pagar está logo à partida em vantagem (o fenómeno das explicações está pouco estudado e seria interessante conhecê-lo melhor). Quanto a estudos sobre a importância da escola e professores no sucesso educativo dos alunos… devemos lembrar os estudos realizados pelos movimentos escola eficaz, da eficácia escolar e comunidades profissionais de aprendizagem, por exemplo.

    • António Fernando Nabais says:

      O facto de a escola não poder resolver tudo sozinha não nos deve levar a desvalorizar o papel dos professores ou das próprias escolas. É, aliás, necessário dar às escolas verdadeira autonomia, o que permitiria, por exemplo, levar a que os alunos pudessem usufruir de apoios mais próximos. Independentemente disso, é importante que o discurso dos ministros fosse também dirigido aos encarregados de educação e aos alunos. A importância do estatuto socioeconómico não deve ser um convite à desistência mas antes à procura de soluções equilibradas.

      • JgMenos says:

        «…levar a que os alunos pudessem usufruir de apoios mais próximos. »
        Podeis elaborar?
        Ps: cuidado com aquela cena da igualdade!

        • António Fernando Nabais says:

          Os apoios mais próximos implicam a diminuição do número de alunos por turma e a possibilidade de haver aulas de apoio individualizadas e tutorias para os alunos com mais dificuldades. O seu P.S. é obscuro.

          • JgMenos says:

            Chegar às turmas especiais para calinos, grunhos ou atrasados mentais é a tal barreira onde os igualitários começam a espernear.
            Não chegou lá, está seguro! Tudo corretíssimo.
            Desde que os melhores sejam retardados ficam as almas sensíveis mais confortadas.

          • António Fernando Nabais says:

            Ó menos, você é quase tão obscuro como a Pitonisa! Está a defender as turmas de nível? E porque não? As almas sensíveis ficam mais descansadas quando os melhores são retardados, é? O menos vive num mundo de estereótipos: o reino dos céus será seu.

          • José Fontes says:

            Caro António Fernando Nabais:
            Está a incorrer num grave erro.
            A dialogar na base da racionalidade com um troll, que só o pode fazer na base da irracionalidade, da provocação, do ódio.
            E ainda por cima ele é um ignorante: acha que já terá ouvido falar da regra do 3 terços (descoberta e por Jean Houssaye, da Universidade de Rouen) que prova que se geram sempre 3 grupos nas turmas (melhores, intermédios, mais fracos), independentemente do seu nível à partida?

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